APELAÇÃO CÍVEL Nº 5015026-58.2016.4.04.7108/RS
RELATOR | : | GISELE LEMKE |
APELANTE | : | GENECI DA SILVEIRA |
ADVOGADO | : | VAGNER STOFFELS CLAUDINO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. SERVIÇOS GERAIS. PROVA DEFICIENTE DA NATUREZA DA ATIVIDADE. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. SENTENÇA ANULADA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL.
Constatado que a instrução probatória foi insuficiente, não restando demonstrada a nocividade ou não das atividades desenvolvidas pela parte, apontadas como de serviços gerais/auxiliar geral, constata-se deficiência na fundamentação da sentença, impondo-se a decretação de sua nulidade e o restabelecimento da fase instrutória para a realização de prova testemunhal e pericial em juízo, como forma de bem delinear as tarefas que eram praticadas pelo autor à época em que exercido o labor apontado como especial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, prover parcialmente o apelo, para anular a sentença e determinar a reabertura da instrução processual, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de fevereiro de 2018.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Gisele Lemke, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9280213v5 e, se solicitado, do código CRC 3973AB0B. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5015026-58.2016.4.04.7108/RS
RELATORA | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
APELANTE | : | GENECI DA SILVEIRA |
ADVOGADO | : | VAGNER STOFFELS CLAUDINO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação pelo rito ordinário proposta por GENECI DA SILVEIRA (52 anos), contra o INSS, pretendendo a obtenção de aposentadoria especial ou de aposentadoria por tempo e contribuição, postulando o reconhecimento de atividades laborais caracterizadas como especiais que a parte autora alega ter desenvolvido desde 1989.
A sentença (prolatada em 07/07/2017) julgou parcialmente procedente o pedido por reconhecer a especialidade do tempo de serviço nos períodos de 26/06/1989 a 26/05/1992 e 26/06/1992 a 11/12/1997. Condenada foi a parte autora, por sua sucumbência majoritária (CPC, art. 86, parágrafo único), ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios sucumbenciais, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 4º, inc. III, do CPC/2015, cuja exigibilidade, restou suspensa diante da concessão da AJG.
Apela a parte autora insurgindo-se contra o provimento sentencial, pretendendo a anulação da sentença e realização de perícia técnica para comprovação do labor especial nas empresas Bison Indústria de Calçados Ltda. e Calçados Beira Rio S/A, ou, alternativamente, seja julgado procedente o pedido inicial.
Intimado a contra-arrazoar o recurso, renunciou ao prazo o INSS, subindo os autos ao Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Da remessa necessária em sentenças meramente declaratórias
A remessa necessária (ou remessa oficial, ou reexame necessário) é um instituto que surgiu no direito processual civil brasileiro sob a égide do Código Buzaid, em 1973 (art. 475), prosseguindo na filosofia implantada pela apelação de ofício do art. 822 do CPC39 (e mais remotamente o recurso de ofício da Lei nº 4 de 1831, art. 90), com o objetivo de proteger o patrimônio público contra revezes eventualmente ocorridos em decisões de primeiro grau de jurisdição.
No momento da criação do instituto, a realidade da advocacia pública no Brasil requeria alguma tutela, por sua falta de estrutura especializada, mesmo no âmbito da União. Tal realidade modificou-se muito ao longo dos anos, tanto que, com a reforma do Código Buzaid pela Lei nº 10.352/2001, diminui a importância conferida à remessa oficial, a qual passou a sujeitar, no âmbito do art. 475, §2º, apenas aquelas sentenças ilíquidas que representassem montante maior que 60 salários mínimos.
O novo CPC por muito pouco não dispensou o instituto de seu texto, mantendo-o apenas como forma de atender a municípios sem estrutura de defesa jurídica, embora, por questão de isonomia federativa, tenha mantido a remessa necessária também com relação à União e aos Estados, como se verifica na Exposição de Motivos ao novo CPC produzida no Senado:
"A remessa necessária não é um grande problema de ser reexcluída, já que é uma das proposições da comissão, quando se trata de demandas onde envolva a União, ou de demandas que envolvam inclusive os estados, todos os estados têm uma democracia pública extremamente estruturada, o que me preocupa é com o município. Como ficam os municípios? 5.600 municípios, onde boa parte sequer tem uma Advocacia Pública estruturada, boa parte dos advogados de municípios acaba sendo advogados privados, que têm dificuldade inclusive com o Direito Público, não dominam a questão. E o que isso vai acontecer? Como haverá essa defesa dos municípios? A remessa necessária serve, sim, para a proteção do patrimônio público, volto a dizer, para estado, para município... Para estado e para a União isso seguramente não seria imprescindível, podemos conviver sem a remessa necessária. Mas um ponto de reflexão, a reflexão diz respeito aos municípios que têm poucos recursos e nem sempre uma Advocacia estruturada, e seguramente serão os maiores prejudicados. Então o primeiro ponto de reflexão" (Código de Processo Civil: anteprojeto/Comissão de Juristas Responsável pela Elaboração de Anteprojeto de Código de Processo Civil - Brasília: Senado Federal, Presidência, 2010, p. 341. Extraído em 22/11/2017, de: https://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf)
O texto final do art. 496 acabou por manter a remessa necessária nos casos em que os valores envolvidos representarem mais de mil salários mínimos e desde que não haja súmula de tribunal superior ou acórdão de recurso repetitivo no mesmo sentido da sentença em questão; trata-se, claramente, de um instituto em vias de extinção.
No entanto, a remessa necessária existe e deve ser aplicada, apenas deve ser observada como exceção, não como regra, em atendimento à mens legis, e, bem por isso, a interpretação do âmbito de sua aplicação deve ser restritiva.
Quanto ao momento de incidência da norma, deve-se ter em consideração o princípio tempus regit actum, que tem relação direta com o princípio constitucional da irretroatividade das leis, o qual possui previsão nos arts. 5º, XXXVI, da CF, e 6º da LINDB (Texto do Ministro Luiz Fux em: https://www.conjur.com.br/2016-mar-22/ministro-luiz-fux-cpc-seguranca-juridica-normativa, cons. em 22/11/2017). Desta forma, as sentenças proferidas a partir de 18/03/2016 devem obedecer ao previsto no CPC2015 (artigos 1.045 do CPC2015 e 1.211 do CPC1973).
Esta Turma já consolidou entendimento de que a sentença não pode ser propriamente considerada ilíquida quando contém ou refere todos os elementos necessários para se apurar, mediante cálculo aritmético de baixa complexidade, o valor final da condenação. É posição desta Turma, quanto aos feitos previdenciários, que os valores a serem considerados no cômputo são aqueles apuráveis na data da sentença, não se havendo de ponderar por quanto tempo se estenderá eventual benefício, o qual, no caso das sentenças meramente declaratórias, sequer possui representatividade econômica no momento da decisão, como ocorre no caso destes autos.
Assim, correta a sentença ao negar a remessa necessária.
MÉRITO
Compulsando os autos, verifico que a parte autora pretende a concessão de aposentadoria especial em razão de atividades laborais caracterizadas como especiais que alega ter desenvolvido desde 1989, com pedido subsidiário de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
O juiz da causa julgou parcialmente procedente o pedido, considerando que a prova juntada seria suficiente para a aferição da especialidade do labor para todos os períodos elencados.
Não obstante o juízo originário tenha avaliado a prova como suficiente, não reconheceu o trabalho especial durante todo o período pretendido pela parte autora. Em razão disso, a parte autora requer a anulação da sentença para prosseguimento da instrução no que se refere às empresas Bison e Calçados Beira Rio.
No que diz respeito à empresa Bison Ltda. (27/07/1998 a 07/08/2012), o juízo sentenciante baseou-se apenas na descrição do formulário datado de 2007 (evento 7, PROCADM2, p. 9/10), que possui base em laudo somente após 01/2004, apesar de a autora ter trabalhado na empresa desde 1998, não havendo, também, carimbo do CGC no PPP. Necessária a prova pericial no caso, bem como seria esclarecedor haver prova testemunhal para melhor delinear as atividades exercidas.
No que se refere à Calçados Beira Rio S/A, os autos parecem possuir instrução suficiente, não havendo razão para reabertura da instrução processual pretendida pela autora quanto a esta empresa. Contudo, sendo reaberta a instrução, a parte naturalmente poderá fazer mais provas, se assim entender pertinente.
De outro lado, constato que, quanto à empresa Brochier S/A (26/06/1992 a 11/12/1997), não há descrição adequada em documentação idônea para a definição da real ocupação que foi exercida pelo demandante. A descrição da atividade como "serviços gerais" e o formulário preenchido por sindicato não conferem a fidedignidade necessária às informações a permitir o reconhecimento ou não da especialidade, devendo ser produzida prova oral para que se afira a natureza das funções exercidas no ambiente de trabalho.
Percebe-se, portanto, uma flagrante carência de produção probatória quanto aos períodos questionados, havendo nos autos importante dúvida quanto à constatação de exposição efetiva do segurado a agentes nocivos nos períodos elencados, dificultando a caracterização ou não da especialidade da atividade laboral, razão pela qual considero inexistir nos autos elementos de prova suficientes para firmar convicção sobre a especialidade nos períodos de atividade supramencionados.
Forçoso considerar, pois, que a instrução probatória restou efetivamente comprometida, impondo-se a decretação de nulidade da sentença, de fundamentação deficiente, para que, restabelecida a fase instrutória, se determine a realização de provas testemunhal e pericial para os períodos apontados, abrindo-se a possibilidade para que as partes apresentem quesitos para que se possa apurar que espécie de labor era exercido pela parte demandante no ambiente de trabalho à época, delineando-se quais as atividades que desenvolvia junto às empresas e em que setor trabalhava.
Por fim, anoto que, embora a empresa Bison não tenha sido objeto específico do recurso da parte, em sendo anulada a sentença para incremento da prova quanto à empresa Bison Indústria de Calçados Ltda. (27/07/1998 a 07/08/2012), não há razão para que, reaberta a instrução processual, mantenha-se o acervo probatório deficiente quanto à empresa Brochier S/A Indústria de Saltos e Calçados (26/06/1992 a 11/12/1997), uma vez que, não obstante o juízo sentenciante tenha considerado haver elementos de prova suficientes quanto a esta, conforme acima explicitado, parece haver necessidade de produção de prova pericial e testemunhal para complementação do acervo probatório.
Portanto, na forma da fundamentação, tenho que deve ser anulada a sentença para reabertura da instrução processual.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por prover parcialmente o apelo, para anular a sentença e determinar a reabertura da instrução processual, nos termos da fundamentação.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/02/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5015026-58.2016.4.04.7108/RS
ORIGEM: RS 50150265820164047108
RELATOR | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | GENECI DA SILVEIRA |
ADVOGADO | : | VAGNER STOFFELS CLAUDINO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/02/2018, na seqüência 668, disponibilizada no DE de 09/01/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU PROVER PARCIALMENTE O APELO, PARA ANULAR A SENTENÇA E DETERMINAR A REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI | |
: | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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