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PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. TRABALHADOR EM INCUBADORA DE AVES. EXPOSIÇÃO A FORMALDEÍDO. APOSENTADORIA ESPECIAL. NECESSIDADE DE AFASTAMENTO DAS ATIVIDAD...

Data da publicação: 29/06/2024, 11:01:08

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. TRABALHADOR EM INCUBADORA DE AVES. EXPOSIÇÃO A FORMALDEÍDO. APOSENTADORIA ESPECIAL. NECESSIDADE DE AFASTAMENTO DAS ATIVIDADES NOCIVAS. 1. O formaldeído (formol) é substância prevista no item 1.2.11 do Decreto 53.831/1964, por se tratar de tóxico orgânico, estando dentre as substâncias reconhecidas como cancerígenas pela Portaria Interministerial MTE/MS/MPS 09, de 07/10/2014 (publicada no dia 08/10/2014), que divulgou a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos - LINACH. 2. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral no RE 788.092/SC (Tema 709), firmando a tese de que é constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. 3. Implantado o benefício - desde quando preenchidos os requisitos - deve haver o afastamento da atividade tida por especial, inexistindo inconstitucionalidade no § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991, não sendo justificável o condicionamento de sua implantação ao prévio distanciamento da atividade nociva. 4. Cabe à autarquia, na fase de cumprimento de sentença, verificar o preenchimento dos requisitos para a concessão tanto da aposentadoria especial como para aposentadoria por tempo de contribuição e apurar o melhor benefício, possibilitando à parte autora a escolha pelo que lhe for mais conveniente, considerando a necessidade de afastamento da atividade em caso de concessão de aposentadoria especial. (TRF4, AC 5000738-09.2019.4.04.7009, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relatora ELIANA PAGGIARIN MARINHO, juntado aos autos em 21/06/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000738-09.2019.4.04.7009/PR

RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

APELANTE: VALDIR ANTONIO EDUARDO DA SILVA (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta em face de sentença que julgou procedente em parte o pedido (evento 41, SENT1), nos seguintes termos:

Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos, resolvendo o mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de condenar o Instituto Nacional do Seguro Social a:

a) reconhecer e averbar em favor da parte autora os períodos de atividade especial de 02/06/1986 a 26/01/1988 e 11/05/1989 a 30/04/2006, determinando sejam estes convertidos em atividade comum urbana com aplicação do multiplicador 1,4;

b) conceder à parte autora o benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição nº 186.410.686-4, com DIB em 17/10/2017 (DER);

c) pagar em favor da parte autora as prestações vencidas, a contar da DIB, acrescidas de correção monetária a partir do vencimento de cada prestação e de juros de mora, a contar da citação, nos termos da fundamentação da sentença.

A parte autora recorre (evento 46, RecIno1),postulando o reconhecimento de tempo especial nos intervalos de 01/05/2006 a 05/01/2017 e 06/01/2017 a 17/10/2017.

Oportunizada a apresentação de contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.

No evento 5, DESPADEC1 foi decidido:

Ante o exposto, defiro o pedido da tutela provisória de evidência, devendo o INSS implantar o benefício concedido na sentença, no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, incumbindo ao representante judicial da Autarquia que for intimado desta decisão dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da ordem.

É o relatório.

VOTO

Juízo de Admissibilidade

O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.

Mérito

Tempo de Serviço Especial

O reconhecimento da especialidade da atividade é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.

Dito isso, tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.

Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:

a) no período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei 3.807/1960 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei 8.213/1991, em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto quanto à exposição a ruído e calor, além do frio, em que necessária a mensuração de seus níveis, por meio de parecer técnico trazido aos autos ou simplesmente referido no formulário padrão emitido pela empresa;

b) a partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção daquelas a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14/10/1996, que revogou expressamente a Lei em questão - de modo que, no interregno compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei 9.032/1995 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva da exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído, calor e frio, em relação aos quais é imprescindível a perícia técnica, conforme visto acima;

c) após 06/03/1997, quando vigente o Decreto 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei 9.528/1997, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

d) a partir de 01/01/2004, passou a ser necessária a apresentação do Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, que substituiu os formulários SB-40, DSS 8030 e DIRBEN 8030, sendo este suficiente para a comprovação do tempo especial desde que devidamente preenchido com base em laudo técnico e contendo a indicação dos responsáveis técnicos legalmente habilitados, por período, pelos registros ambientais e resultados de monitoração biológica, eximindo a parte da apresentação do laudo técnico em juízo. Nesse sentido, cumpre destacar que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que, em regra, trazido aos autos o PPP, dispensável a juntada do respectivo laudo técnico ambiental, inclusive em se tratando de ruído, na medida em que o documento já é elaborado com base nos dados existentes no LTCAT. Ressalva-se, todavia, a necessidade da apresentação desse laudo quando idoneamente impugnado o conteúdo do PPP (STJ, Petição 10.262/RS, Primeira Seção, Relator Ministro Sérgio Kukina, DJe de 16/02/2017).

Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/1973 (Quadro II do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo II) até 28/04/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/1973 (Quadro I do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo I) até 05/03/1997, e, a partir de 06/03/1997, os Decretos 2.172/1997 (Anexo IV) e 3.048/1999, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4.882/2003. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível, também, a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP n. 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/06/2003).

Ainda, o STJ firmou a seguinte tese no Tema 534: As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991).

Acerca da conversão do tempo especial em comum, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial Repetitivo 1.151.363, do qual foi Relator o Ministro Jorge Mussi, pacificou o entendimento de que é possível a conversão mesmo após 28/05/1998.

Assim, considerando que o § 5.º do art. 57 da Lei 8.213/1991 não foi revogado nem expressa, nem tacitamente pela Lei 9.711/1998 e que, por disposição constitucional (art. 15 da Emenda Constitucional 20, de 15/12/1998), permanecem em vigor os artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios até que a lei complementar a que se refere o art. 201, § 1º, da Constituição Federal, seja publicada, é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28/05/1998.

Agente Nocivo Ruído

Em se tratando de agente nocivo ruído, indispensável a existência de laudo técnico pericial para comprovar a exposição permanente e habitual ao agente agressivo, acima do limite permitido, a fim de caracterizar a atividade como especial.

O código 1.1.6 do Decreto 53.831/1964 previa que a especialidade deveria ser considerada para exposição a níveis de ruído superiores a 80 dB(A). Com a edição do Decreto 2.172, de 06 de março de 1997, esse índice foi alterado para 90 dB(A) - código 2.0.1. Ainda, após 18/11/2003, o limite foi fixado em 85 dB(A), conforme dispõe o Decreto 4.882/2003.

De outro lado, ainda que a partir da Lei 9.732/1998 seja obrigatória a informação pelo empregador acerca da utilização de tecnologia de proteção individual ou coletiva para diminuição/eliminação dos agentes nocivos presentes no ambiente de trabalho, com base em laudo técnico (art. 58, §2º, da LBPS), quanto ao agente agressivo ruído o uso de EPI, ainda que elimine a insalubridade, não descaracteriza o tempo de serviço especial.

Registro que o Supremo Tribunal Federal, em decisão proferida nos autos do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 664.335, em que foi relator o Min. Luiz Fux, cuja ata de julgamento foi publicada no DJE de 17/12/2014, definiu que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial.

O Tribunal assentou, ainda, a tese de que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.

Com relação à variação do nível de ruído a que foi submetido o segurado, houve julgamento do acórdão paradigma do Tema 1.083 do STJ em 18/11/2021, com publicação em 25/11/2021, em que restou fixada a seguinte tese:

O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço.

Portanto, não é mais aplicável a média ponderada ou aritmética. Necessária apresentação de laudo técnico com indicação do nível equivalente de ruído e, em caso de ausência, há possibilidade de utilização do pico.

Quanto ao método de aferição do agente nocivo ruído, esta Corte Regional tem posicionamento segundo o qual a utilização de metodologia diversa da prevista na NHO-01 da FUNDACENTRO não inviabiliza o reconhecimento da especialidade, bastando que a exposição esteja embasada em estudo técnico realizado por profissional habilitado para tanto (AC 5015224-47.2015.4.04.7200, Turma Regional Suplementar de SC, Relator Paulo Afonso Brum Vaz, em 19/09/2019; AC 5001695-25.2019.4.04.7101, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, em 06/08/2020; AC 5003527-77.2017.4.04.7129, Quinta Turma, Relatora Gisele Lemke, em 08/07/2020).

Do Caso Concreto

Os pontos controvertidos nos presentes autos dizem respeito ao reconhecimento da especialidade nos intervalos de 01/05/2006 a 05/01/2017 e 06/01/2017 a 17/10/2017​​​​​​, em que manteve vínculo com a empresa SHB Com. e Ind. de Alimentos S.A., como operador de produção.

O PPP referente ao lapso de 01/01/2013 em diante, emitido em 05/01/2017, refere que o autor laborava no Incubatório de Aves Castro, incumbindo-lhe classificar ovos, transferi-los e lavar as caixas e a sala. A partir de 01/01/2017, realizava a incubação dos ovos, limpava a incubadora, entre outras atividades. O formulário informa a presença de ruído de 82 dB(A) até 31/12/2015 e de 75,1 a partir dessa data. Refere, ainda, a presença, durante todo o vínculo, de poeira e o contato com formaldeído. Contudo, o PPP referente ao período anterior a 31/12/2012, informa tão somente a presença de ruído abaixo do limite de tolerância (evento 7, PROCADM1, p. 10/14).

No curso do processo, o autor apresenta novo PPP (evento 33, PPP3), emitido em 06/08/2019, referente ao período de 01/01/2013 a 17/10/2017, com informações idênticas ao anterior, com exposição a ruídos inferiores ao limite de tolerância, poeira e formaldeído.

Conquanto, efetivamente, não seja possível o reconhecimento da especialidade em razão da exposição a ruído, importa referir que o formaldeído (aldeído) é substância prevista no item 1.2.11 do Decreto 53.831/1964, por se tratar de tóxico orgânico.

O formaldeído, inclusive, está previsto dentre as substâncias reconhecidas como cancerígenas pela Portaria Interministerial MTE/MS/MPS 09, de 07/10/2014 (publicada no dia 08/10/2014), que publicou a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos - LINACH, onde constam três grupos de agentes: Grupo 1 - carcinogênicos para humanos; Grupo 2A - provavelmente carcinogênicos para humanos; e Grupo 2B - possivelmente carcinogênicos para humanos.

Assim havendo registro no CAS - Chemical Abstracts Service e constando no GRUPO 1 do anexo da aludida Portaria Interministerial 09/2014, sendo, portanto, o agente cancerígeno para humanos, a simples exposição (qualitativa) enseja o reconhecimento da atividade especial independentemente do nível de concentração do agente químico no ambiente de trabalho e independentemente de existência de EPC e/ou EPI eficaz.

Ainda que o formulário informe o contato com o agente químico somente a partir de 01/01/2016, considerando que as atividades desenvolvidas foram as mesmas durante todo o vínculo, há que ser reconhecida a omissão do formulário, estendendo-se o reconhecimento a todo o período postulado.

Desta forma, deve ser reconhecida a especialidade do período de 01/05/2006 a 05/01/2017 e 06/01/2017 a 17/10/2017.

Requisitos para Aposentadoria

O INSS computou 30 anos, 1 mês e 2 dias de contribuição, porém não enquadrou nenhum período como tempo especial.

Considerando o tempo especial reconhecido nestes autos, tem-se que o autor implementa 30 anos, 1 mês e 2 dias de tempo especial, fazendo jus ao benefício de aposentadoria especial, desde a DER.

CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO

TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL

Data de Nascimento04/07/1970
SexoMasculino
DER17/10/2017

Nome / AnotaçõesInícioFimFatorTempoCarência
1-02/06/198626/01/19881.001 anos, 7 meses e 25 dias20
2-11/05/198930/04/20061.0016 anos, 11 meses e 20 dias204
3-01/05/200605/01/20171.0010 anos, 8 meses e 5 dias129
4-06/01/201717/10/20171.000 anos, 9 meses e 12 dias9

Marco TemporalTempo de contribuiçãoCarênciaIdadePontos (Lei 13.183/2015)
Até a DER (17/10/2017)30 anos, 1 mês e 2 dias36247 anos, 3 meses e 13 dias77.3750

Do Afastamento da Atividade Especial

A Lei 8.213/1991 prevê, em seu art. 46, que o aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno.

Por outro lado, o § 8º do art. 57 (que trata da aposentadoria especial) da Lei 8.213/1991, incluído pela Lei 9.732, de 11/12/1998, dispõe:

§ 8º Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei.

O Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral no RE 788.092/SC (Tema 709), firmando a seguinte tese:

I - É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; II - Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.

E do corpo do acórdão se extrai:

Na aposentadoria especial, a presunção de incapacidade é absoluta – tanto que, para obtenção do benefício, não se faz necessária a realização de perícia ou a demonstração efetiva de incapacidade laboral, bastando apenas e tão somente a comprovação do tempo de serviço e da exposição aos agentes danosos. Nessa hipótese, a aposentação se dá de forma precoce porque o legislador presume que, em virtude da nocividade das atividades desempenhadas, o trabalhador sofrerá um desgaste maior do que o normal de sua saúde. Dito em outras palavras, o tempo para aposentadoria é reduzido em relação às outras categorias porque, ante a natureza demasiado desgastante e/ou extenuante do serviço executado, entendeu-se por bem que o exercente de atividade especial deva laborar por menos tempo – seria essa uma forma de compensá-lo e, sobretudo, de protegê-lo.

Ora, se a presunção de incapacidade é, consoante dito, absoluta; se a finalidade da instituição do benefício em questão é, em essência, resguardar a saúde e o bem-estar do trabalhador que desempenha atividade especial; se o intuito da norma, ao possibilitar a ele a aposentadoria antecipada, é justamente retirá-lo do ambiente insalubre e prejudicial a sua incolumidade física, a fim de que não tenha sua integridade severa e irremediavelmente afetada, qual seria o sentido de se permitir que o indivíduo perceba a aposentadoria especial mas continue a desempenhar atividade nociva? Como se nota, sob essa óptica, a previsão do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91, é absolutamente razoável e consentânea com a vontade do legislador.

Desarrazoado, ilógico e flagrantemente contrário à ideia que guiou a instituição do benefício é, justamente, permitir o retorno ao labor especial ou sua continuidade após a obtenção da aposentadoria – prática que contraria em tudo o propósito do benefício e que significa ferir de morte sua razão de ser.

Desta forma, uma vez implantado o benefício – desde quando preenchidos os requisitos – deve haver o afastamento da atividade tida por especial, inexistindo inconstitucionalidade no § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991, não sendo justificável o condicionamento de sua implantação ao prévio distanciamento da atividade nociva.

Não obstante, constatada a continuidade do exercício de atividade nociva, eventual suspensão do benefício não pode dispensar o devido processo legal, cabendo ao INSS, na via administrativa, proceder à notificação do segurado para defesa, oportunizando prazo para que comprove o afastamento da atividade nociva ou, então, para que regularize a situação.

Por fim, nada impede que o autor opte, em fase de cumprimento de sentença, pela implantação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde que igualmente atendidos os requisitos para tal com a conversão do tempo especial em comum, mantendo-se a possibilidade da continuidade do labor, inclusive na atividade nociva, vez que a vedação é aplicável apenas no caso da aposentadoria especial com tempo reduzido.

Correção Monetária e Juros

A atualização monetária das parcelas vencidas deve observar o INPC no que se refere ao período compreendido entre 11/08/2006 e 08/12/2021, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02/03/2018), inalterado após a conclusão do julgamento, pelo Plenário do STF, de todos os EDs opostos ao RE 870.947 (Tema 810 da repercussão geral), pois rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.

Quanto aos juros de mora, entre 29/06/2009 e 08/12/2021, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança, por força da Lei 11.960/2009, que alterou o art. 1º-F da Lei 9.494/97, conforme decidido pelo Pretório Excelso no RE 870.947 (Tema STF 810).

A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, impõe-se a observância do art. 3º da Emenda Constitucional 113/2021, segundo o qual, "nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente".

Honorários Advocatícios

Modificada a solução da lide, pagará o INSS honorários advocatícios fixados em 10% do valor das parcelas vencidas até a data do acórdão, a teor das Súmulas 111 do STJ e 76 desta Corte, conforme tese firmada pelo STJ no julgamento do Tema 1.105, sendo excluída a condenação da parte autora.

Da Tutela Específica

A tutela de urgência foi deferida, tendo sido implantando o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição em cumprimento provisório de sentença (evento 18, EMAIL3).

Cabe, em fase de cumprimento de sentença, a apuração pelo INSS do melhor benefício, devendo a parte autora optar por aquele que considerar mais vantajoso, considerando a necessidade de afastamento da atividade nociva no caso de concessão do benefício de aposentadoria especial.

Prequestionamento

No que concerne ao prequestionamento, tendo sido a matéria analisada, não há qualquer óbice, ao menos por esse ângulo, à interposição de recursos aos tribunais superiores.

Conclusão

- Dar provimento ao recurso de parte autora para reconhecer como tempo especial os períodos de 01/05/2006 a 05/01/2017 e 06/01/2017 a 17/10/2017, bem como o direito também ao benefício de aposentadoria especial, desde a DER.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação do autor.



    Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004418402v6 e do código CRC 96506102.Informações adicionais da assinatura:
    Signatário (a): ELIANA PAGGIARIN MARINHO
    Data e Hora: 22/4/2024, às 15:5:27


    5000738-09.2019.4.04.7009
    40004418402.V6


    Conferência de autenticidade emitida em 29/06/2024 08:01:07.

    Poder Judiciário
    TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

    Apelação Cível Nº 5000738-09.2019.4.04.7009/PR

    RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

    APELANTE: VALDIR ANTONIO EDUARDO DA SILVA (AUTOR)

    APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

    EMENTA

    previdenciário. tempo especial. trabalhador em incubadora de aves. exposição a formaldeído. aposentadoria especial. necessidade de afastamento das atividades nocivas.

    1. O formaldeído (formol) é substância prevista no item 1.2.11 do Decreto 53.831/1964, por se tratar de tóxico orgânico, estando dentre as substâncias reconhecidas como cancerígenas pela Portaria Interministerial MTE/MS/MPS 09, de 07/10/2014 (publicada no dia 08/10/2014), que divulgou a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos - LINACH.

    2. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral no RE 788.092/SC (Tema 709), firmando a tese de que é constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.

    3. Implantado o benefício – desde quando preenchidos os requisitos – deve haver o afastamento da atividade tida por especial, inexistindo inconstitucionalidade no § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991, não sendo justificável o condicionamento de sua implantação ao prévio distanciamento da atividade nociva.

    4. Cabe à autarquia, na fase de cumprimento de sentença, verificar o preenchimento dos requisitos para a concessão tanto da aposentadoria especial como para aposentadoria por tempo de contribuição e apurar o melhor benefício, possibilitando à parte autora a escolha pelo que lhe for mais conveniente, considerando a necessidade de afastamento da atividade em caso de concessão de aposentadoria especial.

    ACÓRDÃO

    Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação do autor, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

    Florianópolis, 20 de junho de 2024.



    Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004418622v3 e do código CRC e1747d7d.Informações adicionais da assinatura:
    Signatário (a): ELIANA PAGGIARIN MARINHO
    Data e Hora: 20/6/2024, às 21:1:39


    5000738-09.2019.4.04.7009
    40004418622 .V3


    Conferência de autenticidade emitida em 29/06/2024 08:01:07.

    Poder Judiciário
    Tribunal Regional Federal da 4ª Região

    EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 13/06/2024 A 20/06/2024

    Apelação Cível Nº 5000738-09.2019.4.04.7009/PR

    RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

    PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

    PROCURADOR(A): MARCELO VEIGA BECKHAUSEN

    APELANTE: VALDIR ANTONIO EDUARDO DA SILVA (AUTOR)

    ADVOGADO(A): THIAGO BUENO RECHE (OAB PR045800)

    ADVOGADO(A): ROGERIO ZARPELAM XAVIER (OAB PR049320)

    ADVOGADO(A): CLAUDIO ITO (OAB PR047606)

    APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

    Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/06/2024, às 00:00, a 20/06/2024, às 16:00, na sequência 704, disponibilizada no DE de 04/06/2024.

    Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

    A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR.

    RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

    Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

    Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

    Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

    LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

    Secretária



    Conferência de autenticidade emitida em 29/06/2024 08:01:07.

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