D.E. Publicado em 06/08/2018 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017607-28.2015.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | DALVANI ALDA BAGGIO |
ADVOGADO | : | Mauricio Ferron |
APELADO | : | (Os mesmos) |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. COMPROVAÇÃO. TEMPO ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. POEIRA VEGETAL. RECONHECIMENTO. AVERBAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS.
1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas. 2. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida. 3. A exposição a poeira vegetal é prejudicial à saúde, ensejando o reconhecimento do tempo de serviço como especial. 4.Os equipamentos de proteção individual não são suficientes, por si só, para descaracterizar a especialidade da atividade desempenhada pelo segurado, devendo cada caso ser apreciado em suas particularidades. 5. Assegura-se à parte autora o direito à averbação dos períodos de tempo rural e especial reconhecidos, bem como o direito à conversão do tempo especial em tempo comum, para fins de obtenção de futura prestação previdenciária. 6. Sucumbente no feito deverá o INSS ser condenado ao pagamento de honorários advocatícios, ao patrono da parte autora, fixados em 10% sobre o valor da causa. 7. O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado na Justiça Federal e na Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao apelo da parte autora e dar parcial provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de julho de 2018.
ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Relator
Documento eletrônico assinado por ALTAIR ANTONIO GREGORIO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9405186v9 e, se solicitado, do código CRC 5BEC3BA5. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Altair Antonio Gregorio |
Data e Hora: | 26/07/2018 16:18 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017607-28.2015.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | DALVANI ALDA BAGGIO |
ADVOGADO | : | Mauricio Ferron |
APELADO | : | (Os mesmos) |
RELATÓRIO
Dalvani Alda Baggio propôs ação ordinária contra o Instituto Nacional de Seguro Social - INSS, em 6/3/2013 (fl. 2), postulando a averbação para fins de obtenção de futuro benefício previdenciário, dos períodos de 23/4/1977 a 28/2/1980 e de 16/12/1983 a 6/1/1986 em que exerceu labor rural, em regime de economia familiar, bem como o reconhecimento do desempenho de atividades em condições especiais nos períodos de 12/7/1995 a 31/12/1997 (Calçados Kalyta Ltda.), 26/10/1999 a 23/12/1999 (Matrezan Indústria de Móveis Ltda.), 1/6/2000 a 26/1/2004 (Inplasfer Injeções de Plásticos Ferrari Ltda.).
Em 27/7/2015 (fls. 193/200) sobreveio sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado na inicial, nos seguintes termos:
Diante do exposto, com fulcro no artigo 269, inciso I do CPC, julgo PROCEDENTE EM PARTE a ação ajuizada por DALVANI ALDA BAGGIO contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, para efeito de:
a) RECONHECER o período de atividade agrícola exercida pela autora nos períodos 23/04/1977 a 28/02/1980 e de 16/12/1983 a 06/01/1986;
b) RECONHECER a especialidade do período de labor urbano de 26/10/1999 a 23/12/1999, bem como o direito da parte autora à conversão dos mesmos em tempo comum, com a incidência do fator de conversão 1,20.
c) DETERMINAR que a parte ré proceda na averbação do período reconhecido.
Diante da sucumbência recíproca, condeno a parte ré no pagamento de 30% das custas processuais e honorários advocatícios aos procuradores da parte autora, que fixo em R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais), em atenção ao disposto no art. 20, §§3° e 4°, do CPC.
Condeno a autora no pagamento do restante das custas (70%) e honorários advocatícios ao réu, que fixo em R$ 750,00 (quinhentos e oitenta e cinco reais), em atenção ao disposto no art. 20, §§3° e 4°, do CPC. Suspensa a exigibilidade, eis que litiga sob o pálio da AJG.
Permitida a compensação, na forma da Súmula 306, do STJ e art. 21 do CPC.
As custas processuais serão devidas pelo INSS por metade em face do artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121, de 30 de dezembro de 1985, bem como da Súmula 2 do extinto TARGS1. Justifico a não aplicação das disposições contidas da Lei nº 13.471/2010, diante da declaração de inconstitucionalidade daquele diploma legal pelo Órgão Especial quando do julgamento do Incidente de Inconstitucionalidade n.º 70041334053.
Sentença não sujeita ao reexame necessário.
Inconformadas as partes interpuseram recursos de apelação.
O ente previdenciário (fls. 201/214) preliminarmente, defendendo a necessidade de submissão do feito ao devido reexame necessário. No mérito defende a ausência de provas materiais, corroboradas por prova testemunhal idônea, capaz de demonstrar o efetivo desempenho de atividade agrícola em regime de economia familiar. Quanto ao tempo especial refere a não suplantação dos limites de tolerância, previstos como nocivos, para o agente ruído, nos decretos regulamentadores da matéria. Finalizou postulando, em caso de manutenção da sentença, a necessidade de isentar a autarquia do pagamento das custas processuais.
A parte autora, por sua vez, recorreu (fls. 216/220) buscando a majoração da verba honorária devida pela autarquia ao seu patrono.
Com contrarrazões ao recurso do INSS (fls. 221/238), vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Remessa oficial
Nos termos do artigo 14 do novo CPC, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".
O intuito do legislador foi salvaguardar os atos já praticados, perfeitos e acabados, aplicando-se a nova lei processual com efeitos prospectivos.
Nesse sentido, as sentenças sob a égide do CPC de 1973 sujeitavam-se a reexame obrigatório se condenassem a Fazenda Pública ou assegurassem ao autor direito equivalente ao valor de sessenta salários mínimos ou mais.
A superveniência dos novos parâmetros (NCPC, artigo 496, § 3º), aumentando o limite para reexame obrigatório da sentença, traz a indagação quanto à lei aplicável às sentenças publicadas anteriormente e ainda não reexaminadas. Uma das interpretações possíveis seria a de que, em tendo havido fato superveniente à remessa - novo CPC - a suprimir o interesse da Fazenda Pública em ver reexaminadas sentenças que a houvessem condenado ou garantido proveito econômico à outra parte em valores correspondentes a até mil salários mínimos, não seria caso de se julgar a remessa. Inexistindo o interesse, por força da sobrevinda dos novos parâmetros, não haveria condição (interesse) para o seu conhecimento.
No entanto, em precedente repetido em julgamentos sucessivos, o STJ assentou que a lei vigente à época da prolação da decisão recorrida é a que rege o cabimento da remessa oficial (REsp 642.838/SP, Relator Ministro Teori Zavascki).
Nesses termos, em atenção ao precedente citado, o conhecimento da remessa necessária das sentenças anteriores à mudança processual observará os parâmetros do CPC de 1973, aplicando-se o novo CPC às sentenças posteriores.
Se a sentença sujeita a reexame necessário é a que condena a Fazenda Pública em valor não excedente a sessenta salários mínimos, impõe-se aferir o montante da condenação na data em que proferida, pois é neste momento que é feita a avaliação quanto à obrigatoriedade da remessa. Valores sujeitos a vencimento futuro não podem ser considerados para este efeito, pois não é possível estimar por quanto tempo o benefício será mantido.
No caso dos autos, como a sentença tão somente declarou o direito a averbação de períodos de atividade rural e especial, não se pode cogitar de condenação em parcelas vencidas até então, nem em resultado econômico da demanda. Em tais condições, resta afastada, por imposição lógica, a necessidade da remessa para reexame, restando mantida a sentença monocrática, no ponto.
Atividade rural
Para a comprovação do tempo de atividade rural com vista à obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, é preciso existir início de prova material, não sendo admitida, em regra, prova exclusivamente testemunhal (artigo 55, § 3º, da Lei 8.213/91 e Súmula 149 do STJ).
A respeito do assunto, encontra-se longe de mais alguma discussão, no âmbito dos tribunais, a necessidade de que o período de tempo de atividade seja evidenciado por documentos que informem, a cada ano civil, o seu exercício (TRF4: AC 2003.04.01.009616-5, 3ª Seção, Relator Desembargador Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 19/11/2009; EAC 2002.04.01.025744-2, 3ª Seção, Relator para o Acórdão Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, julgado em 14/6/2007; EAC 2000.04.01.031228-6, 3ª Seção, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, DJU 9/11/2005). Também já está fora de qualquer dúvida, a possibilidade de que os documentos civis, como certificado de alistamento militar, certidões de casamento e de nascimento, em que consta a qualificação, como agricultor, do autor da ação, assim como de seu cônjuge ou de seus pais (Súmula 73 deste Tribunal), constituem início de prova material (STJ, AR 1166/SP, 3ª Seção, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 26/2/2007; TRF4: AC 2003.71.08.009120-3/RS, 5ª Turma, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, D.E. 20/5/2008; AMS 2005.70.01.002060-3, 6ª Turma, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, DJ 31/5/2006).
A prova material, conforme o caso, pode ser suficiente à comprovação do tempo de atividade rural, bastando, para exemplificar, a existência de registro contemporâneo em Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS de contrato de trabalho como empregado rural. Em tal situação, em tese, não haveria necessidade de inquirir testemunhas para a comprovação do período registrado.
Na maioria dos casos, porém, a documentação apresentada é insuficiente à comprovação do tempo de atividade rural, do que resulta a habitual complementação por meio do depoimento de testemunhas.
Em razão disso, a qualidade do início de prova material não pode ser isoladamente avaliada sem que seja compreendido o contexto probatório, a que se aduz, em regra, a produção da prova oral. Decorre dessa orientação, que a diversidade de documentos que podem constituir início de prova material impõe conclusões judiciais igualmente distintas, sem que para tanto deva existam premissas invariáveis como, aparentemente, poderia constituir a obrigatoriedade de presença nos autos de documentos relacionados ao começo do período a ser comprovado, ou, ainda, a retroação da eficácia temporal, de modo fixo, a um número restrito de anos.
A irradiação temporal dos efeitos do início de prova material dependerá do tipo de documento, das informações nele contidas (havendo distinções conforme digam respeito ao próprio autor da ação, ou a terceiros) e das circunstâncias que envolvem o quadro fático descrito no processo.
Registre-se que os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando relacionados à respectiva titularidade dos pais ou do cônjuge, consubstanciam admitido início de prova material do trabalho rural.
Com efeito, como o artigo 11, §1º, da Lei 8.213/1991, define regime de economia familiar como a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes, deverá ser cauteloso o exame da prova, na medida em que, no mais das vezes, os atos negociais do grupo parental são formalizados, não individualmente, mas em nome do pai da família ou cônjuge masculino, que naturalmente representa a todos.
Essa compreensão está sintetizada na Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Por fim, a respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.321.493-PR, recebido pela Corte como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
No referido julgamento, o STJ manteve decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, havendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua carteira de trabalho (CTPS), constando vínculo rural no intervalo de 01 de junho de 1981 a 24 de outubro de 1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Conquanto o acórdão acima transcrito aprecie benefício diverso do postulado na presente demanda, as diretrizes fixadas pelo Superior Tribunal de Justiça em relação ao início de prova material também devem ser observadas para os casos de cômputo de tempo rural como boia-fria para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
A parte autora, nascida em 23/4/1965, filha de Zenor Pontel e Catarina Lourdes Pontel, buscou o reconhecimento do exercício de trabalho rural, em regime de economia familiar, nos períodos compreendidos entre 23/4/1977 e 28/2/1980 e entre 16/12/1983 e 6/1/1986, os quais restaram reconhecidos na sentença, nos seguintes termos:
"(...)
No caso dos autos, a atividade rurícola relativa aos interregnos de 23/04/1977 a 28/02/1980 e de 16/12/1983 a 06/01/1986 restou demonstrada pelos seguintes documentos encartados aos autos pela parte autora, à medida em que apresentou início de prova material relativamente ao período postulado:
- CTPS da autora que comprova seu primeiro vínculo urbano apenas em 14/03/1980, o qual perdurou até a data de 24/02/1982, concomitante a esse está o segundo vinculo urbano anotado de 29/02/1980 a 24/02/1982, o terceiro vínculo empregatício entre as datas de 01/12/1982 a 15/12/1983 e o quarto vínculo no período de 07/01/1986 a 09/07/1993;
- certidão de registro de imóvel rural em nome de sua genitora;
- histórico escolar em nome da autora emitido por escola rural referente aos anos de 1972 a 1977, 1980 e 1983;
- notas fiscais de produtor rural, dos anos de 1984 a 1986, em nome de seu genitor;
Consigno que o fato de os documentos que constituem início de prova material estarem em nome dos genitores da autora não afasta a condição de laboradora rurícola da mesma, uma vez que à época do labor a autora era solteira, razão pela qual, plenamente possível que os documentos comprobatórios da atividade rurícola estejam em nome de seus genitores, uma vez que consistia prática consuetudinária que a figura masculina, na pessoa do "pai de família" aparecesse frente aos negócio da família, tendo em vista a característica eminentemente patriarcal da sociedade daquele tempo, bem como, costumeiramente, os filhos permaneciam junto ao grupo familiar dos genitores até seu casamento e, não raro, nas oportunidades em que não contraído matrimônio, permaneciam junto aos pais indeterminadamente.
(...)
De outra banda, frente ao largo lapso temporal decorrido, não é possível exigir vasta gama de documentos e, no caso dos autos, os documentos acostados demonstram o exercício da atividade rurícola no período pretendido.
Cumpre observar, ainda, que conforme depoimento uníssono das testemunhas inquiridas, a parte autora laborou na agricultura em companhia de seus genitores, dedicando-se às lides campesinas.
Neste sentido, mister transcrever o depoimento da testemunha Izair Pomatti, a qual destaca que a autora exercia atividade rurícula no período que busca reconhecimento:
Juiz: O senhor conhece a dona Dalvani desde quando? Testemunha: Desde, desde criança. Juiz: O senhor conheceu então os pais dela? Testemunha: Conheço. Juiz: Qual era a profissão dos pais dela? Testemunha: Agricultor. Juiz: E ela morava com os pais? Testemunha: Sim. Juiz: Essa terra era própria, era arrendada? Testemunha: Era deles mesmo. Juiz: Quantos hectares de terra mais ou menos eles possuíam? Testemunha: Exatamente eu não sei, mas era em torno de uma colônia por ali, em torno de 24 hectare. Juiz: A dona Dalvani vivia com a família dela, certo? Testemunha: Sim. Juiz: Ela auxiliava a família na agricultura?
Testemunha: Sim. Juiz: A partir de que idade o senhor viu que ela já estava ajudando na agricultura? Testemunha: Na roça assim com 7 anos por ali, 7,8 anos já...Juiz: O senhor viu que com que essa idade ela já estava ajudando a família? Testemunha: já estava ajudando sim. Juiz: O senhor tem conhecimento se a família possuía empregados ou não? Testemunha: Não, empregados eu não sei. Juiz: O senhor sabe se o sustento vinha exclusivamente da terra ou algum outro membro da família tinha outra fonte de renda? Testemunha: Não, era da roça mesmo. Juiz: A dona Dalvani sempre morou com os pais ou depois de uma idade saiu de casa, mudou de profissão? Testemunha: Ela saiu de casa quando já era mocinha, saiu uns anos mais depois voltou de novo. Juiz: Ficou alguns anos fora depois ela voltou pra casa dos pais? Testemunha: É ela voltou. Juiz: Nesse período em que ela ficou fora, o senhor tem ideia de quanto tempo foi isso? Testemunha: Mas eu não tenho ideia, mas acho que foi lá uns dois, três anos. Mas não tenho certeza. Juiz: E depois voltou pra casa dos pais de novo? Testemunha: Voltou. Juiz: E ai ela voltou a trabalhar na agricultura? Testemunha: Trabalhando. Juiz: Nesse período que ela ficou fora, o senhor não sabe qual profissão ela exerceu? Testemunha: Não. Juiz: E depois que ela voltou pra casa dos pais, ela sempre ficou com os pais ou ela saiu de casa de novo?Testemunha: Não, quando que ela voltou ela ficou eu não sei quantos anos que ela ficou, ela ficou trabalhando na roça junto com os pais de novo, depois daí na segunda vez que ela saiu daí sim...
Juiz: Não voltou mais? Testemunha: Não voltou. Juiz: Ela casou? Testemunha: Casou. Juiz: Ela saiu de casa quando casou? Testemunha: Não. Juiz: Foi antes ainda? Testemunha: É. Juiz: E o senhor sabe depois que ela saiu de casa o que ela passou a fazer, se ela não tem profissão? Testemunha: Não, eu não sei. Juiz: Pra aonde ela foi morar? Testemunha: Também não sei. Juiz: Pelo autor alguma pergunta? Parte Autora: A família tinha máquinas agrícolas pra fazer o serviço? Testemunha: Não, naquela época, o serviço era manual mesmo. Era boi, enxada. Parte Autora: E produção, o senhor tem ideia de como eles costumavam fazer? Testemunha: Plantar? Parte Autora: É. Testemunha: Naquela época plantavam milho, trigo, batatinha,batata e fumo. Parte Autora: O principal era isso? Testemunha: É isso. Parte Autora: (...) Pra consumo, nada mais [...].
No mesmo sentido, a testemunha Theolide Ana Poli, inquirida em sede de justificação administrativa, destacou:
Juiz: A senhora conhece a dona Dalvani desde quando? Testemunha: Desde pequenininha, agente morava pertinho. Juiz: Quando era criança ainda?Testemunha: Sim. Juiz: Então a senhora conheceu os pais dela também? Testemunha: Sim. Juiz: Qual era a profissão dos pais dela?Testemunha: Agricultor. Juiz: A terra era própria ou era arrendada? Testemunha: Era própria deles. Juiz: Tem ideia de quantos hectares a família dela possuía? Testemunha: Não sei quantos, mas acho que em torno de uma colônia por ai. Juiz: E a Dalvani ajuda a família na agricultura? Testemunha: Sim. Juiz: A partir de que idade a senhora viu ela já trabalhando com os pais na agricultura? Testemunha: Naquela época era bem pequeninha, 7, 8 anos era meio dia no colégio e meio dia trabalhando. Juiz: A família possuía empregados ou só os membros da família trabalhavam? Testemunha: Não, só família. Juiz: Algum membro da família que a senhora tenha conhecimento, possuía outra fonte de renda, ou o sustento vinha exclusivamente da agricultura? Testemunha: Era só da agricultura, só do produto.
Juiz: A dona Dalvani sempre morou com os pais, ou a partir de uma certa idade ela saiu de casa, a senhora sabe se mudou de profissão? Testemunha: É, ela...na verdade a mãe dela morreu, ela era pequeninha ai ela tinha uma irmã que era freira, depois que ela tava grandinha que ela terminou o colégio lá, ela saiu um pouco, a tia dela levou ela. Juiz: Que idade a Dalvani tinha quando saiu de casa?Testemunha: A eu não lembro mas devia ter uns 15 anos por ai, não sei também. Juiz: E ela desde então não voltou mais pra casa ou ela voltou? Testemunha: Não ela voltou, ela ficou um pouco adolescência ali fora, depois ela voltou. Ficou em casa mais. Juiz: Quanto tempo ela ficou fora de casa? Testemunha: Deve ter ficado uns dois, três anos, depois voltou pra casa. Juiz: Quando ela voltou, ela continuou trabalhando na agricultura? Testemunha: Continuou, ajudando os pais dela, a madrasta e o pai. Juiz: E desde então ela sempre esteve em casa com os pais ou saiu de casa depois, casou, saiu de casa mudou de profissão? Testemunha: Não, ela ficou mais uns anos em casa, e ai depois sim ela saiu. Juiz: A senhora sabe pra aonde ela foi? Testemunha: Ela veio pra Nova Prata. Juiz: E aqui em Nova Prata, a senhora sabe se ela passou a trabalhar como empregada, o que que ela passou a fazer aqui? Testemunha: Eu não acho...veio sair pra trabalhar, ela ficou mais uns anos em casa, uns 4 ,5 anos. Juiz: Depois que ela voltou pra casa ela ficou mais uns 4 , 5 anos em casa? Testemunha: Sim, ela ficou trabalhando com pais na agricultura. Juiz: O que que é que eles cultivavam la na propriedade, a senhora sabe? Testemunha: Era milho, trigo, batata, fumo, o sustento. De tudo um pouco, uma vaquinha de leite... Juiz: Pela parte autora. Parte Autora: A senhora sabe se eles tinham maquinário agrícola? Testemunha: Não, era tudo manual. Parte Autora: Era sistema antigo? Testemunha: Sim, sim tudo manual. Parte Autora: A senhora chegou a ver ela trabalhando, viu ela varias vezes? Testemunha: A já vi sim [...]
Destarte, tendo a parte autora logrado êxito em comprovar o efetivo exercício do labor rural em regime de economia familiar durante a integralidade do período de 23/04/1977 a 28/02/1980 e de 16/12/1983 a 06/01/1986, faz jus à averbação do respectivo tempo, desde que o interregno esteja dentro dos limites etários concernentes ao termo inicial autorizador do cômputo.
Os documentos apresentados constituem início razoável de prova material do labor rural no período indicado porque denotam a vinculação do autor e de sua família ao meio rural e, para complementá-los, foram ouvidas testemunhas, cujos depoimentos confirmaram de modo coerente e seguro o desempenho de atividade agrícola, em regime de economia familiar, no lapso temporal em questão.
De resto, não se exige comprovação documental ano a ano do período que se pretende comprovar, tampouco se exige que os documentos apresentados estejam todos em nome do próprio autor, vez que a atividade rural pressupõe a idéia de continuidade e não de eventualidade, sendo ilógico exigir um documento para cada ano trabalhado.
Deve ser ressaltado que já foi decidido pela Terceira Seção desta Corte, que "é possível o cômputo da atividade agrícola em todo o período anterior ao primeiro documento juntado nos autos" (Embargos Infringentes 2004.71.00.045760-5, 3ª Seção, Desembargador Federal Celso Kipper, por unanimidade, D.E. 15/12/2011), mormente nos casos em que, como o dos autos, há prova testemunhal confirmando o labor rural no período em questão.
Importa referir que em famílias de tradição rurícola, na medida em que os filhos vão atingindo a idade adulta, eles vão procurando colocar-se no mercado de trabalho, uma vez que a vida no campo é dura e o retorno financeiro é pequeno. Ocorre que a adaptação à realidade urbana e a própria inserção no mercado de trabalho dos indivíduos egressos do meio rural, de regra, não se dá de forma imediata, sendo casuística a situação em que se abandone as lidas rurícolas em um dia para, no dia seguinte, assumir posto como empregado urbano. No mais das vezes, dada a pouca escolaridade, suas tentativas de trabalho formal são inexitosas, o que os obriga a retornar para o campo, até que nova oportunidade de trabalho lhes seja propiciada.
Concluindo o tópico, julgo comprovado o exercício da atividade rural nos períodos de 23/4/1977 a 28/2/1980 e de 16/12/1983 a 6/1/1986 devendo ser mantida a sentença monocrática, no ponto.
Atividade Especial
O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente à época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/9/2008; EREsp 345554/PB, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ 8/3/2004; AGREsp 493.458/RS, Quinta Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJU 23/6/2003; e REsp 491.338/RS, Sexta Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 23/6/2003) e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (EINF 2005.71.00.031824-5/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 18/11/2009; APELREEX 0000867-68.2010.404.9999/RS, Sexta Turma, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, D.E. 30/3/2010; APELREEX 0001126-86.2008.404.7201/SC, Sexta Turma, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 17/3/2010; APELREEX 2007.71.00.033522-7/RS; Quinta Turma, Relator Desembargador Federal Fernando Quadros da Silva, D.E. 25/1/2010).
Feitas estas observações e tendo em vista a sucessão de leis que trataram a matéria diversamente, é necessário inicialmente definir qual deve ser aplicada ao caso concreto, ou seja, qual a que se encontrava em vigor no momento em que a atividade foi prestada pelo segurado.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:
a) até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei 3.807/1960 (LOPS) e suas alterações e, posteriormente, a Lei 8.213/1991 (LBPS), em sua redação original (artigos 57 e 58), era possível o reconhecimento da especialidade do trabalho mediante a comprovação do exercício de atividade prevista como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou, ainda, quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor (STJ, AgRg no REsp 941885/SP, Quinta Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 4/8/2008; e STJ, REsp 639066/RJ, Quinta Turma, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 7/11/2005), quando então se fazia indispensável a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar a nocividade dos agentes envolvidos;
b) a partir de 29 de abril de 1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14/10/1996, que a revogou expressamente - de modo que, para o intervalo compreendido entre 29/4/1995 (ou 14/10/1996) e 5/3/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei 9.032/1995 no artigo 57 da LBPS, torna-se necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;
c) a partir de 6 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da LBPS pela Medida Provisória 1.523/1996 (convertida na Lei 9.528/1997), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
A respeito da possibilidade de conversão do tempo especial em comum, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial Repetitivo 1.151.363, do qual foi Relator o Ministro Jorge Mussi, assim decidiu, admitindo-a mesmo após 28 de maio de 1998:
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL APÓS 1998. MP N. 1.663-14, CONVERTIDA NA LEI N. 9.711/1998 SEM REVOGAÇÃO DA REGRA DE CONVERSÃO.
1. Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/91.
2. Precedentes do STF e do STJ.
Assim, considerando que o artigo 57, §5º, da Lei 8.213/1991 não foi revogado, nem expressa, nem tacitamente, pela Lei 9.711/1998 e que, por disposição constitucional (artigo 15 da Emenda Constitucional 20, de 15/12/1998), permanecem em vigor os artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios até que a lei complementar a que se refere o artigo 201, §1º, da Constituição Federal, seja publicada, é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28 de maio de 1998.
Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/1973 (Quadro II do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo II) até 28/4/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/1973 (Quadro I do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo I) até 5/3/1997, e os Decretos 2.172/1997 (Anexo IV) e 3.048/1999 a partir de 6/3/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4.882/2003. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/6/2003).
O período controverso de atividade exercida em condições especiais está assim detalhado:
Período: 26/10/1999 a 23/12/1999
Empresa: Matrezan Indústria de Móveis Ltda.
Ramo: Fabricação de móveis
Função/Atividades: Serviços gerais em madeira
Agentes nocivos: Ruído inferior a 90 decibéis e pó de madeira
Enquadramento legal: Códigos 1.2.11 do Anexo do Decreto 53.831/1964 e 1.0.19 do Anexo IV do Decreto 3.048/1999 (poeira vegetal)
Provas: CTPS (fls. 29), PPP (fl. 52) e Laudo pericial judicial (fls. 118/143)
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição ao agente nocivo pó de madeira.
Quanto ao agente nocivo ruído adota-se o entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de limitar o reconhecimento da atividade especial aos estritos parâmetros legais vigentes em cada época (RESP 1333511 - Castro Meira, e RESP 1381498 - Mauro Campbell), de modo que é tida por especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto 2.172/1997. Após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibéis. Com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18/11/2003, o limite de tolerância ao agente físico ruído foi reduzido para 85 decibéis (AgRg no REsp 1367806, Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, vu 28/5/2013), desde que aferidos esses níveis de pressão sonora por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.
Desse modo, deve ser parcialmente provido o recurso do INSS, no ponto, para afastar o enquadramento das atividades exercidas no período, em razão do agente físico ruído, tendo em vista que neste lapso temporal não foi suplantado o limite de tolerância de 90 decibéis previstos nos decretos regulamentadores da matéria. Outrossim, a especialidade resta mantida em todo o interregno, uma vez que o formulário e o laudo apontam exposição a poeira de madeira.
Isto porque, a poeira oriunda do beneficiamento da madeira, seja nas serrarias ou na indústria moveleira, é prejudicial ao trabalhador e enseja o reconhecimento da atividade como especial, desde que a ela exposto de modo habitual e diuturno em sua jornada de trabalho. Embora, a rigor, possa haver alguma dificuldade em enquadrá-la como agente químico ou orgânico típico, trata-se de agente patogênico com características físicas, químicas e biológicas, e o sistema do organismo mais comumente lesado pelo contato é o trato respiratório. Por ser partícula relativamente grande, sua inalação frequente pode provocar dermatite de contato no delicado tecido das vias aéreas superiores e no sensibilíssimo tecido pulmonar. A literatura médica relata com frequência a incidência de alergias, asma e pneumonia por irritação, em que a inflamação do pulmão e bronquíolos dá-se não em razão da presença de agentes químicos em si, mas pela intromissão do agente físico irritante em local desprovido de qualquer resistência. Isto se dá de forma gradativa, escapando, no mais das vezes, à atenção do trabalhador. Os sintomas podem surgir de forma mais rápida se o indivíduo inalar a poeira de madeira pela boca. Assim, o processo lesivo ao organismo nem sempre é aparente, constituindo-se, no mais das vezes, em tosses secas crônicas, dificuldade respiratória, bronquite crônica, rinites, entre outros, podendo evoluir, com o tempo, para doença pulmonar obstrutiva crônica, quando seus efeitos maléficos tornam-se mais evidentes e, em geral, irreversíveis.
Em suma: a poeira de madeira provoca, ao longo dos anos, redução da função pulmonar, em maior ou menor escala, conforme o indivíduo. Ademais, o pó de madeira também pode ser veículo para agentes químicos tóxicos (presentes em tintas, solventes e outros) e biológicos (fungos), igualmente agressivos ao trato respiratório. Nestes casos, em geral a asma é a patologia mais frequente, e tem natureza alérgica. Portanto, as atividades exercidas sob as condições acima descritas ensejam seu reconhecimento como especial, desde que demonstrada a exposição por meio de laudo técnico.
Comprovada a agressividade do agente e o malefício à saúde do trabalhador, pela exposição continuada ao longo da jornada de trabalho, o reconhecimento da especialidade pode ser feito mesmo sem enquadramento nos decretos regulamentadores, pois seu rol não é exaustivo. De qualquer sorte, podendo ser veículo de agentes químicos e biológicos, e mesmo tóxicos, cabe enquadrar a poeira de madeira sob os Códigos 1.2.11 do Anexo do Decreto 53.831/64, e 1.0.19 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99.
Nesse sentido os precedentes desta Corte, v. g.: Apelação/Reexame Necessário nº 00213525020144049999, Rel. Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, D.E. 05/08/2016; Apelação/Reexame Necessário nº 0004852-35.2016.404.9999, Rel. Des. Federal Vânia Hack de Almeida, D.E. 23/06/2016, e Apelação/Reexame Necessário nº 5013425-26.2011.404.7000, Rel. Des. Federal Celso Kipper, julgado em 24/07/2013.
Ademais, para a caracterização da especialidade, não se exige exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de trabalho, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada, salvo exceções (periculosidade, por exemplo). Habitualidade e permanência hábeis para os fins visados pela norma - que é protetiva - devem ser analisadas à luz do serviço desenvolvido pelo trabalhador, cujo desempenho, não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas, químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho. Nesse sentido: EINF 2004.71.00.028482-6/RS, Relator Desembargador Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 8/1/2010 e EIAC 2000.04.01.088061-6/RS, Relator Desembargador Federal Fernando Quadros da Silva, DJU 3/3/2004.
Quanto à utilização de equipamentos de proteção individual (EPI), observo que este Tribunal, no julgamento do processo º 5054341-77.2016.4.04.0000/SC, recebido como recurso representativo da controvérsia, fixou a seguinte tese, relativamente ao Tema IRDR15/TRF4: A mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário.
Nesse mesmo julgamento foram fixadas, também, as situações que dispensam a análise referente à utilização de EPIs, cabendo o reconhecimento do tempo de serviço especial ainda que o PPP da empresa indique a adoção de EPI eficaz:
(...)
a) Períodos anteriores a 3 de dezembro de 1998:
Pela ausência de exigência de controle de fornecimento e uso de EPI em período anterior a essa data, conforme se observa da IN INSS 77/2015 -Art. 279, § 6º: Somente será considerada a adoção de Equipamento de Proteção Individual - EPI em demonstrações ambientais emitidas a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, e desde que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade e seja respeitado o disposto na NR-06 do MTE, havendo ainda necessidade de que seja assegurada e devidamente registrada pela empresa, no PPP, a observância: (...)"
b) Pela reconhecida ineficácia do EPI:
b.1) Enquadramento por categoria profissional: devido a presunção da nocividade (ex. TRF/4 5004577-85.2014.4.04.7116/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Fed. João Batista Pinto Silveira, em 13/09/2017)
b.2) Ruído: Repercussão Geral 555 (ARE 664335 / SC)
b.3) Agentes Biológicos: Item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.
b.4) Agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos: Memorando-Circular Conjunto n° 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS/2015:
Exemplos: Asbesto (amianto): Item 1.9.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017; Benzeno: Item 1.9.3 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.
b.5) Periculosidade: Tratando-se de periculosidade, tal qual a eletricidade e vigilante, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI. (ex. Apelação/Remessa Necessária 5004281-23.2014.4.04.7000/PR, Relator Ézio Teixeira, 19/4/2017)
(...)
No caso sob análise, ainda que alguns documentos façam referência ao uso de equipamentos de proteção, não restaram demonstrados o efetivo fornecimento pela empresa, a intensidade de proteção proporcionada ao trabalhador, o treinamento e uso efetivo do equipamento durante toda a jornada de trabalho e a respectiva fiscalização pelo empregador. Assim, o eventual emprego desses acessórios não é suficiente para descaracterizar a especialidade do tempo de serviço em exame.
Ademais, para que se pudesse presumir a neutralização do agente agressivo, seriam necessárias provas concretas da qualidade técnica do equipamento, descrição de seu funcionamento e efetiva medição do quantum que os artefatos podem elidir - ou se realmente podem neutralizar - o que não ocorreu no caso em apreço. Qualquer referência à neutralização do agente agressivo por meio de equipamento de proteção, para ser considerada, deve ser palpável e concreta e não feita de maneira genérica. É indispensável que se comprove, pelo uso da tecnologia e mediante demonstração razoável, que o equipamento neutraliza o agente, se efetivamente é permanentemente utilizado e desde que período; do contrário, não pode ser afastado o enquadramento da atividade como sujeita a agentes nocivos.
Portanto, deve ser mantida a sentença quanto ao reconhecimento da especialidade das atividades exercidas no período de 26/10/1999 a 23/12/1999.
Conversão do tempo especial em comum
Acerca da conversão do tempo especial em comum, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso especial repetitivo nº 1151363, em 23/3/2011, do qual foi Relator o Ministro Jorge Mussi, pacificou o entendimento de que é possível a conversão mesmo após 28/5/1998, nos seguintes termos:
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL APÓS 1998. MP N. 1.663-14, CONVERTIDA NA LEI N. 9.711/1998 SEM REVOGAÇÃO DA REGRA DE CONVERSÃO.
1. Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/91. 2. Precedentes do STF e do STJ.
Assim, considerando que o parágrafo 5º do artigo 57 da Lei 8.213/1991 não foi revogado nem expressa, nem tacitamente pela Lei 9.711/1998 e que, por disposição constitucional (artigo 15 da Emenda Constitucional 20, de 15/12/1998), permanecem em vigor os artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios até que a lei complementar a que se refere o artigo 201, § 1º, da Constituição Federal, seja publicada, é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28/5/1998, restando mantida a sentença monocrática. tópico.
O fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é o previsto na legislação aplicada na data concessão do benefício, e não o contido na legislação vigente quando o serviço foi prestado. Assim, implementados os requisitos para aposentadoria na vigência da Lei nº 8.213/1991 o fator de conversão deverá ser 1,4 (homem - 25 anos de especial para 35 anos de comum) ou 1,2 (mulher - 25 anos de especial para 30 de comum).
Nestes termos, assegura-se à parte autora o direito à averbação dos períodos de tempo rural e especial reconhecidos, bem como o direito à conversão do tempo especial em tempo comum, para fins de obtenção de futura prestação previdenciária.
Honorários advocatícios e custas processuais
Sucumbente em maior parte deverá o INSS ser condenado ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da atualizado da causa, restando provido o apelo da parte autora.
Por outro lado, destaco que a autarquia é isenta pagamento das custas na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual 8.121/1985, com a redação da Lei Estadual 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADIN 70038755864, julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS); para os feitos ajuizados a partir de 2015 é isento o INSS da taxa única de serviços judiciais, na forma do estabelecido na lei estadual 14.634/2014 (artigo 5º), restando provido o apelo do INSS no ponto.
Honorários periciais
Deve o INSS suportar o pagamento dos valores fixados a título de honorários periciais. Caso tal despesa processual tenha sido antecipada pela administração da Justiça Federal, o pagamento dos honorários periciais será realizado mediante reembolso, de acordo com o artigo 32 da Resolução 305/2014, do Conselho da Justiça Federal.
Conclusão
Manter a sentença quanto ao reconhecimento do exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, nos períodos de 23/4/1977 a 28/2/1980 e de 16/12/1983 a 6/1/1986; quanto ao reconhecimento da especialidade das atividades exercidas no período de 26/10/1999 a 23/12/1999; bem como quanto ao direito à conversão do tempo especial em tempo comum, para fins de obtenção de futura prestação previdenciária
Dar parcial provimento ao apelo da autarquia para para afastar o enquadramento das atividades exercidas no período de 26/10/1999 a 23/12/1999, em razão do agente físico ruído (mantido reconhecimento da especialidade da integralidade do interregno em razão da exposição a poeira de madeira); bem como para isentá-la do pagamento das custas processuais.
Dar provimento ao apelo da parte autora para condenar a autarquia ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo da parte autora e dar parcial provimento ao apelo do INSS.
Altair Antonio Gregorio
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 24/07/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017607-28.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00009441320138210090
RELATOR | : | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
PRESIDENTE | : | Osni Cardoso Filho |
PROCURADOR | : | Dr. Eduardo Kurtz Lorenzoni |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | DALVANI ALDA BAGGIO |
ADVOGADO | : | Mauricio Ferron |
APELADO | : | (Os mesmos) |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 24/07/2018, na seqüência 121, disponibilizada no DE de 03/07/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
: | Juíza Federal LUCIANE MERLIN CLEVE KRAVETZ | |
: | Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9445461v1 e, se solicitado, do código CRC C072DEB. | |
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