| D.E. Publicado em 28/05/2015 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2008.70.07.000428-7/PR
RELATORA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | EUCLIDES MANFREDI |
ADVOGADO | : | Mateus Ferreira Leite e outros |
: | Maria Aparecida de Paula Lima Rech | |
: | Alice Joana dos Santos | |
REMETENTE | : | JUÍZO SUBSTITUTO DA 2A VF DE FRANCISCO BELTRÃO |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO RURAL. SEGURADO ESPECIAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. ATIVIDADE RURAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS. AVERBAÇÃO.
1. Comprovado o exercício de atividade rural, na qualidade de segurado especial, mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea.
2. No caso dos autos, a parte autora não tem direito à aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, porquanto não implementados os requisitos para sua concessão.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial para reformar a sentença no tocante à concessão do benefício, condenando o INSS tão somente a averbar o tempo de serviço rural, no período de 09/09/1972 a 08/09/1974, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de maio de 2015.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7473866v4 e, se solicitado, do código CRC DAFD2312. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Vânia Hack de Almeida |
| Data e Hora: | 21/05/2015 11:38 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2008.70.07.000428-7/PR
RELATORA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | EUCLIDES MANFREDI |
ADVOGADO | : | Mateus Ferreira Leite e outros |
: | Maria Aparecida de Paula Lima Rech | |
: | Alice Joana dos Santos | |
REMETENTE | : | JUÍZO SUBSTITUTO DA 2A VF DE FRANCISCO BELTRÃO |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação e reexame necessário contra sentença em que o magistrado a quo julgou procedente o pedido formulado pela parte autora, para reconhecer o labor rural desempenhado pela parte autora no período de 09/09/1972 a 08/09/1974, determinando ao INSS a expedição de certidão ou a anotação na CTPS do autor, e a concessão ao autor do benefício de aposentadoria por tempo de serviço ou contribuição. Honorários advocatícios fixados em 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação, com base no art. 20, §4º, do CPC.
Em suas razões de apelação, a Autarquia Previdenciária sustentou, em síntese: (a) que não é devido o cômputo do período rural de 09/09/1974 a 31/01/1980, porquanto a Turma Recursal do Paraná reformou a sentença de 1º grau que havia reconhecido o exercício de atividade rural no referido período, sob o argumento de que o autor não havia acostado aos autos quaisquer documentos que evidenciassem o exercício de atividade rural naquele período; (b) pleiteia a condenação do autor e de seu patrono nas penas de litigância de má-fé; (c) quanto à comprovação do período rural de 09/09/1972 a 08/09/1974, alega a inexistência de prova material e prévia análise pelo poder judiciário, uma vez que o autor já havia intentado a declaração judicial de sua atividade rural, nos autos do processo nº 2005.70.95.010137-0 (Recurso de Sentença Cível), com base nos mesmos documentos (fls. 62/64); (d) subsidiariamente, pugna pela reforma da sentença quanto ao cálculo da RMI.
Foram oportunizadas contrarrazões. Vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Remessa oficial
Consoante decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR, em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso, conheço da remessa oficial.
Interesse de Agir e Prévio Requerimento Administrativo
O Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, assentou entendimento sobre a matéria, nos autos do RE 631240/MG, no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, ressaltando ser prescindível o exaurimento daquela esfera.
O Relator do RE 631240, Ministro Luís Roberto Barroso, dividiu as ações previdenciárias em dois grupos, quais sejam:
(i) demandas que pretendem obter uma prestação ou vantagem inteiramente nova ao patrimônio jurídico do autor (concessão de benefício, averbação de tempo de serviço e respectiva certidão, etc.); e
(ii) ações que visam ao melhoramento ou à proteção de vantagem já concedida ao demandante (pedidos de revisão, conversão de benefício em modalidades mais vantajosa, restabelecimento, manutenção, etc.).
E concluiu o Ministro afirmando que: "no primeiro grupo, como regra, exige-se a demonstração de que o interessado já levou sua pretensão ao conhecimento da Autarquia e não obteve a resposta desejada", sendo que a falta de prévio requerimento administrativo de concessão deve implicar na extinção do processo judicial sem resolução de mérito, por ausência de interesse de agir; "no segundo grupo, precisamente porque já houve a inauguração da relação entre o beneficiário e a Previdência, não se faz necessário, de forma geral, que o autor provoque novamente o INSS para ingressar em juízo." Importante menção fez ainda o Relator aos casos em que o entendimento da Autarquia for notoriamente contrário à pretensão do interessado, salientando não ser exigível o prévio requerimento administrativo, todavia assegurou não se enquadrar aqui os casos em que se pretende obter benefício para trabalhador informal.
Considerando a existência de inúmeros processos judiciais em que o INSS é demandado, o STF fixou uma fórmula de transição a ser aplicável a todas as ações ajuizadas até a data do julgamento da repercussão geral, que consiste em:
a) nas ações ajuizadas no âmbito de Juizado Itinerante, a falta do prévio requerimento administrativo não implicará na extinção do feito sem julgamento de mérito;
b) nas ações em que o INSS tiver apresentado contestação de mérito, estará caracterizado o interesse de agir pela resistência à pretensão, implicando na possibilidade de julgamento do mérito, independentemente do prévio requerimento administrativo;
c) nas demais ações em que ausente o requerimento administrativo, o feito será baixado em diligência ao Juízo de primeiro grau, onde permanecerá sobrestado, a fim de intimar o autor a dar entrada no pedido administrativo em até 30 (trinta) dias, sob pena de extinção do processo por falta de interesse de agir. Comprovada a postulação administrativa, o Juiz intimará o INSS para se manifestar acerca do pedido em até 90 (noventa) dias. Nos casos do item 'C', se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente (ex: não comparecimento à perícia ou à entrevista), extingue-se a ação. Por outro lado, se negado o pedido, estará caracterizado o interesse de agir e o feito deverá prosseguir. Em qualquer caso, a análise quanto à subsistência da necessidade do provimento jurisdicional deverá ser feita pelo Juiz.
No precedente, restou definido, por fim, que "tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data da entrada do requerimento, para todos os efeitos legais."
No caso dos autos, em que a autarquia apresentou contestação de mérito, não há que se falar em ausência de interesse de agir, devendo, portanto, ser analisado o mérito da ação.
Do Tempo Rural
No presente feito, requer a parte autora a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, com o cômputo de períodos de atividade rural. Em sua inicial a parte autora requer o reconhecimento do labor rural exercido no período compreendido entre 09/09/1972 a 08/09/1974, e informa que o labor rural exercido no período de 09/09/1974 a 31/01/1980 já fora reconhecido judicialmente no processo nº 2004.70.07.000945-0 (Procedimento Comum do Juizado Especial Cível).
Do exame dos autos, verifica-se que o processo nº 2004.70.07.000945-0 tramitou junto à Vara Federal Previdenciária de Francisco Beltrão com Juizado Especial Previdenciário Adjunto, sendo que, naqueles autos, o magistrado a quo ao julgar a demanda reconheceu como de efetivo trabalho rural o período de 09/09/1974 a 31/01/1980.
No entanto, essa decisão reformada pela Primeira Turma Recursal da Seção Judiciária do Paraná no voto de fls. 62/64, nos seguintes termos no que interessa à controvérsia dos autos, verbis:
"Pretendendo a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição mediante o reconhecimento do exercício de atividade rural no período de 09/09/74 a 31/01/80 e a conversão para comum dos períodos laborados em atividade especial entre 19/11/82 a 31/08/85; 01/09/85 a 31/01/91 e 15/05/92 até a presente data, julgou a sentença parcialmente procedente o pedido para reconhecer a totalidade do período rural e o período de atividade especial entre 06/03/97 e 28/05/98, deixando de apreciar os períodos de 19/11/82 a 31/08/85; 01/09/85 a 31/01/91 e 15/05/92 a 05/03/97 porque já reconhecidos na via administrativa, condenando o INSS a proceder à respectiva averbação/conversão. Inconformadas, recorrem ambas as partes. O INSS alega, no que se refere à atividade rural, ausência de prova material. Quanto à atividade especial, argumenta que o autor não logrou êxito em comprovar a exposição a condições especiais que prejudicassem sua saúde ou integridade física. A parte autora alega, em preliminar, a revelia do INSS, e argumenta que se encontra suficientemente comprovado o exercício de atividade insalubre após a data de 28/05/98. Com contra-razões apenas do INSS, subiram os autos. II- Razões de voto: 1. Atividade Rural: Assiste razão ao INSS. O autor não acostou aos autos quaisquer documentos que evidenciem o exercício de atividade rural no período pleiteado nestes autos. Registro que os documentos em nome de seu genitor (certidão do INCRA, atestando que o pai do autor foi titulado no imóvel rural n° 55, da Gleba n° 35-DV, em Dois Vizinhos/ PR, com 8,5 ha, com posse iniciada em 1953 e cópia da matrícula do referido imóvel - fls. 10 e 54) poderiam ser considerados se o autor houvesse comprovado também a sua condição pessoal de trabalhador rural, o que não ocorreu no presente caso. Assim, não sendo admitida a prova exclusivamente testemunhal para a comprovação do exercício da atividade em comento, nos termos da Súmula 149 do STJ, entendo que não há elementos probatórios favoráveis ao autor, não sendo possível o reconhecimento de atividade rural. (...) 3. Tempo de Serviço: Tendo em vista as considerações anteriormente efetuadas, constata-se que na data da EC n° 20/98, o autor contava com 24 anos e 19 dias de tempo de serviço, o que é insuficiente para sua aposentação. Na DER somava 30 anos, 11 meses e 05 dias e possuía 43 anos de idade, o que também não lhe confere direito à concessão do benefício pleiteado por não preencher as regras de transição trazidas pela referida EC em seu artigo 9°, le§1°l. Do exposto, meu voto é no sentido DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS RECURSOS, para reformar em parte a sentença, para tão-somente determinar ao INSS a averbação do período compreendido entre 06/03/97 a 13/11/03 como exercido pelo autor em atividade especial, nos termos da fundamentação.
(...)"
Verifica-se, portanto, que ocorreu a reforma da sentença em sede recursal, afastando o reconhecimento do tempo de serviço rural no período de 09/09/1974 a 31/01/1980.
Dessa forma, não há como ser acolhida a pretensão da parte autora no tocante ao cômputo do tempo de serviço rural, no período de 09/09/1974 a 31/01/1980. Portanto, reformo a sentença nesse ponto.
Em razões de apelação, aduz o INSS que o autor, ao omitir a posterior desconsideração da atividade rural pela Turma Recursal, infringiu o dever de dizer a verdade contido no art. 14, I, do Código de Processo Civil. Por consequência, sustenta ser aplicável a pena de litigância de má-fé.
Razão não assiste à Autarquia.
Para a caracterização da litigância de má-fé, capaz de ensejar a imposição de multa nos termos do art. 17 do CPC, necessário o elemento subjetivo, qual seja, a intenção dolosa. O reconhecimento da litigância de má-fé pressupõe que a conduta da parte seja realizada na intenção de prejudicar, o que não ocorreu no caso dos autos, em que os procuradores das duas ações não são os mesmos.
Não há elemento de convicção vigoroso o suficiente para ensejar a aplicação da penalidade e nem se pode embasar tal punição com base apenas em circunstância objetiva, sem investigação e/ou demonstração do elemento psicológico da conduta indevida.
Ademais, este Tribunal tem jurisprudência consolidada no sentido de que a boa-fé processual é presumida, devendo a má-fé ser comprovada através do dolo do litigante que age de maneira desleal, temerária ou procrastinadora, conforme os acórdãos a seguir transcritos:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INOCORRÊNCIA.
A imposição da pena por litigância de má-fé, dada a gravidade da medida, somente é possível quando não houver dúvida acerca da conduta desleal, procrastinadora ou temerária. Com efeito, a caracterização da litigância de má-fé não decorre automaticamente da prática de determinado ato processual; depende da análise de elemento subjetivo e da constatação do dolo ou culpa grave, necessários para afastar a presunção de boa-fé que norteia o comportamento das partes no desenvolvimento da relação processual. No caso dos autos, se observa que a exequente incorreu em equívoco, mas não agiu de forma maliciosa. (TRF4; AI nº 5008017-97.2014.404.0000; Rel. Des. Federal JORGE ANTÔNIO MAURIQUE; D.E. 01/07/2014)
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. CONTRADIÇÃO. OBSCURIDADE. INEXISTÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. NÃO OCORRÊNCIA.
(...).
3. A caracterização da litigância de má-fé depende da análise de elemento subjetivo e da constatação do dolo ou culpa grave, necessários para afastar a presunção de boa-fé que norteia o comportamento das partes no desenvolvimento da relação processual, situação esta que não se verifica na hipótese dos autos.
4. Embargos de declaração acolhidos tão somente para fins de prequestionamento. (TRF4; EDAPELRE nº 5000942-47.2010.404.7016; Rel. Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA; D.E. 19/12/2012)
Do trabalho rural no período de 09/09/1972 a 08/09/1974.
O trabalho rural como segurado especial dá-se em regime individual (produtor usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais) ou de economia familiar, este quando o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (art. 11, VII e § 1º da Lei nº 8.213/91).
Desde logo ressalto que somente excluirá a condição de segurado especial a presença ordinária de assalariados - insuficiente a tanto o mero registro em ITR ou a qualificação como empregador rural (II b) - art. 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71. Já o trabalho urbano do cônjuge ou familiar, relevante e duradouro, não afasta a condição de regime de economia familiar quando excluído do grupo de trabalho rural. Finalmente, a constitucional idade mínima de dezesseis anos para o trabalho, como norma protetiva, deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas ou previdenciários quando tenham efetivamente desenvolvido a atividade laboral.
Quanto ao início de prova material, necessário a todo reconhecimento de tempo de serviço (§ 3º do art. 56 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149/STJ), por ser apenas inicial, tem sua exigência suprida pela indicação contemporânea em documentos do trabalho exercido, embora não necessariamente ano a ano, mesmo fora do exemplificativo rol legal (art. 106 da Lei nº 8.213/91), ou em nome de integrantes do grupo familiar (Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental -Súmula 73 do TRF 4ª Região).
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de bóia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao bóia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente registra suas relações de emprego.
Da idade mínima para reconhecimento do labor rural
A idade mínima a ser considerada, no caso de segurado especial, em princípio, dependeria da data da prestação da atividade, conforme a legislação então vigente (nesse sentido: EREsp 329.269/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2002, DJ 23/09/2002, p. 221). Não obstante, cumpre destacar que a limitação constitucional ao trabalho de menor é norma protetiva da infância, não podendo conduzir ao resultado de que, uma vez verificada a prestação laboral, a incidência do preceito legal/constitucional resulte em sua nova espoliação (desta feita, dos direitos decorrentes do exercício do trabalho).
Assim, é de ser admitida a prestação laboral, como regra, a partir dos 12 anos, pois, já com menos responsabilidade escolar e com inegável maior potência física, os menores passam efetivamente a contribuir na força de trabalho do núcleo familiar, motivo pelo qual tanto a doutrina quanto a jurisprudência aceitam esta idade como termo inicial para o cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial (nesse sentido: TRF4, EIAC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, julgado na sessão de 12-03-2003; STF, AI n.º 529694/RS, Relator Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, decisão publicada no DJU de 11-03-05).
Como início de prova material juntou a parte autora os seguintes documentos:
a) Certidão de casamento datada de 22/08/1985, em que o autor é qualificado como servente (fl. 13);
b) Histórico Escolar - Ensino Fundamental no qual consta que o autor frequentou o Grupo Escolar Duque de Caxias, situado no município de Dois Vizinhos/PR, datado de 25/11/2003 (fl.19);
c) Matrícula de imóvel dando conta de que o genitor do autor possuía um lote de terra rural, no ano de 1976 (fl. 25);
d) Certidão emitida pelo INCRA - Superintendência Regional do Paraná informando que o genitor do autor era proprietário de um lote de terras, com área de 8,50 hectares, localizado no município de Dois Vizinhos, Estado do Paraná, desde o ano de 1953 (fl. 26);
e) Cópia de guia de Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural, exercício ano de 1974 e 1975, em nome do genitor do autor (fls. 27/28);
Os documentos acima elencados correspondem ao início de prova material exigido para o reconhecimento do labor rural.
Em sede de audiência de instrução foi tomado o depoimento pessoal do autor e ouvidas 02 testemunhas, constando, em síntese, o seguinte (transcrição de fls. 122/124):
Euclides Manfredi, autor, afirmou: "que trabalhou na lavoura a partir de 05 anos, aproximadamente. Acha que aos 08/09 anos já trabalhava, quase que com força de adulto. A área pertencia a seu pai e tinha entre 05 e 06 alqueires. Parte era de pastagem e parte de reserva. Cultivavam arroz, milho, mandioca, cana. Trabalhavam ali o autor, seus pais e onze filhos (06 homens e 06 mulheres). Todos se dedicavam exclusivamente à atividade agrícola. Não tinham empregados, a família era grande. Não utilizavam maquinário. Vendiam o excedente da produção. O autor estudou, na Escola Duque de Caxias, que ficava há l .000 metros da propriedade. Estudava no período da manhã. Antes mesmo de ir à escola, iam carpir. Trabalhou na lavoura até 18/19 anos de idade, quando foi trabalhar em uma serraria."
Valmor Perin afirmou: "que conhece o autor desde que ele tinha 08/09 anos. O declarante tinha 15/17 anos nessa época. Moravam há uma distância de 05 km. Via o autor trabalhando na lavoura. Seus pais costumavam levar os filhos para a lavoura. Via o autor trabalhando com enxada e foice. Via o autor trabalhando quando "passava" pela propriedade, a cada 15 dias ou mesmo 60. A terra era de cinco ou seis alqueires. Cultivavam arroz, feijão, mandioca e um pouco de soja. Vendiam o excedente da produção. O trabalho era manual, sobrava pouco. Todos na família trabalhavam na agricultura. Deixou a lavoura aos 18/19 anos de idade. De início, sabe que ele foi trabalhar em uma serraria. Depois acha que foi para ítaipu e Sadia."
José Setembrino Silva Britto afirmou: "que conhece o autor desde que ele tinha 08/10 anos de idade. Eram vizinhos (2 ou 3 km). Via o autor trabalhando na lavoura. O declarante passava "de vez em quando" pelo terreno do autor, às vezes uma vez por semana. Conheceu a área da família. Acha que tinha aproximadamente 06 alqueires. Cultivavam em torno de 04 alqueires. Plantavam feijão, milho, mandioca. Não sabe se vendiam. Não tinham empregados. Ninguém na família exercia outra atividade. Trabalhava apenas a família. Não sabe quando o autor deixou a atividade agrícola. Não sabe em que o autor passou a trabalhar depois."
A prova material juntada aos autos foi devidamente corroborada pela prova testemunhal. Assim, presente início de prova material, complementada por direta prova oral, no período controverso, devida é a admissão da condição da parte autora como segurado especial no período requerido, no período de 09/09/1972 a 08/09/1974. Portanto, no ponto, mantenho a sentença.
Sustenta, ainda, o INSS a impossibilidade de reconhecimento do período de 09/09/1972 a 08/09/1974, porquanto o requerente já obteve provimento judicial a respeito da matéria nos autos do processo nº 2005.70.95.010137-0 (Recurso de Sentença Cível), com base em documentos idênticos.
Verifico pela sentença e certidão (fls. 43/50 e 61) que o pedido do autor de reconhecimento do período 09/09/1972 a 08/09/1974, como de efetivo labor rurícola em regime de economia familiar, não integrou o objeto da ação n. 2004.70.07.000945-0/PR, que tramitou na Vara Federal Previdenciária de Francisco Beltrão/PR.
Destarte, quanto ao referido período, não há coisa julgada, uma vez que não integrou o objeto do feito anterior. O fato de a sentença daquela ação ter limitado a possibilidade de reconhecimento do tempo rural a 09/09/1974 a 31/01/1980 não gera coisa julgada em relação ao período que não integrou o pedido. Com efeito, a coisa julgada nos termos do disposto no art. 474 do CPC, não atinge o direito da parte autora que não foi objeto da demanda.
Portanto, não colhem as alegações da Autarquia, por consequência, mantenho a sentença no ponto.
Conclusão
Analiso, pois, a possibilidade de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Considerando-se o tempo de labor reconhecido e tendo-se em vista a data do protocolo do requerimento administrativo, resta analisar o preenchimento dos requisitos para a concessão da aposentadoria pleiteada frente às regras dispostas pela Emenda Constitucional nº 20, em vigor desde 16-12-1998.
Tem-se, pois, as seguintes possibilidades:
(a) concessão de aposentadoria por tempo de serviço proporcional ou integral, com o cômputo do tempo de serviço até a data da Emenda Constitucional nº 20, de 16-12-1998, cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei nº 8.213/91: exige-se o implemento da carência (art. 142 da Lei nº 8.213/91) e do tempo de serviço mínimo de 25 anos para a segurada e 30 anos para o segurado (art. 52 da Lei de Benefícios), que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 6% (seis por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que corresponderá à inativação integral (art. 53, I e II da LBPS);
(b) concessão de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional ou integral, com o cômputo do tempo de contribuição até 28-11-1999, dia anterior à edição da Lei que instituiu o fator previdenciário, cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei nº 8.213/91: exige-se o implemento da carência (art. 142 da Lei nº 8.213/91) e do tempo de contribuição mínimo de 25 anos para a segurada e 30 anos para o segurado, e a idade mínima de 48 anos para a mulher e 53 anos para o homem, além, se for o caso, do pedágio de 40% do tempo que, em 16-12-1998, faltava para atingir aquele mínimo necessário à outorga do benefício (art. 9.º, § 1.º, I, "a" e "b", da Emenda Constitucional nº 20, de 1998), que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 5% (cinco por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que corresponderá à inativação integral (inciso II da norma legal antes citada); contudo, se o segurado obtiver tempo suficiente para a concessão do benefício de forma integral até 28-11-1999, ou seja, 35 anos para homem e 30 anos para mulher, o requisito etário e o pedágio não lhe podem ser exigidos;
(c) concessão de aposentadoria por tempo de contribuição integral, com o cômputo do tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo, quando posterior às datas dispostas nas alíneas acima referidas: exige-se o implemento da carência (art. 142 da Lei nº 8.213/91) e do tempo de serviço mínimo de 30 anos para a segurada e 35 anos para o segurado (art. 201, § 7.º, I, da Constituição Federal de 1988), que corresponderá a 100% do salário de benefício, a ser calculado nos termos do inciso I do art. 29 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.876/99.
De acordo com o Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição (fl. 112), o autor contabiliza 28 anos, 03 meses e 0 dia de tempo de contribuição. Portanto a carência de 180 contribuições necessária para a obtenção do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição restou cumprida (art. 142 da Lei nº 8.213/91).
No caso concreto, o resultado da soma do tempo de serviço/contribuição reconhecido pela administração previdenciária, com o tempo de serviço/contribuição reconhecido judicialmente demonstra que:
(a) Em 16-12-1998 a parte autora possuía 25 anos, 04 meses e 03 dias, não tendo direito à aposentadoria por tempo de serviço integral/proporcional.
(b) Em 28-11-1999 a parte autora possuía 26 anos, 03 meses e 15 dias, não tendo direito à aposentadoria por tempo de contribuição integral/proporcional.
(c) Em 08/09/2009 (data do ajuizamento da ação), a parte autora possuía 30 anos, 03 meses e 0 dias, não tendo direito à aposentadoria por tempo de contribuição integral/proporcional.
Portanto, tenho que a autora não faz jus ao benefício postulado, devendo, pois, ser reformada a sentença recorrida.
Consectários
Considerando a reforma do julgado, com a sucumbência de maior monta da parte autora, condeno-a ao pagamento de custas e honorários advocatícios, que fixo em R$ 788,00 (setecentos e oitenta e oito reais), suspensa a exigibilidade em razão do benefício da AJG.
Prequestionamento
Quanto ao prequestionamento, não há necessidade de o julgador mencionar os dispositivos legais e constitucionais em que fundamentam sua decisão, tampouco os citados pelas partes, pois o enfrentamento da matéria através do julgamento feito pelo Tribunal justifica o conhecimento de eventual recurso pelos Tribunais Superiores (STJ, EREsp nº 155.621-SP, Corte Especial, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 13-09-99).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial para reformar a sentença no tocante à concessão do benefício, condenando o INSS tão somente a averbar o tempo de serviço rural, no período de 09/09/1972 a 08/09/1974.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/05/2015
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2008.70.07.000428-7/PR
ORIGEM: PR 200870070004287
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Fábio Kurtz Lorenzoni |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | EUCLIDES MANFREDI |
ADVOGADO | : | Mateus Ferreira Leite e outros |
: | Maria Aparecida de Paula Lima Rech | |
: | Alice Joana dos Santos | |
REMETENTE | : | JUÍZO SUBSTITUTO DA 2A VF DE FRANCISCO BELTRÃO |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/05/2015, na seqüência 217, disponibilizada no DE de 06/05/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL PARA REFORMAR A SENTENÇA NO TOCANTE À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO, CONDENANDO O INSS TÃO SOMENTE A AVERBAR O TEMPO DE SERVIÇO RURAL, NO PERÍODO DE 09/09/1972 A 08/09/1974.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal CELSO KIPPER |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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