Apelação Cível Nº 5073730-88.2016.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)
APELADO: LUIZ FERNANDO FERREIRA DA SILVA (AUTOR)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face de sentença que julgou procedente o pedido para: a) declarar o direito do autor à tributação de valores percebidos de forma acumulada, a título de complementação de proventos, recebidos no processo nº 0107800-09.2009.5.04.0011, na forma do artigo 12-A, da Lei nº 7.713/88, com redação dada pela Lei nº 12.350/10; b) condenar a UNIÃO na restituição dos valores indevidamente recolhidos (ressalvada, obviamente, a hipótese de ter ocorrido a restituição administrativa), corrigidos monetariamente, desde a data do indevido recolhimento, observada a variação da SELIC, nos termos do artigo 39, § 4º, da Lei nº 9.250, de 1995. Na hipótese de extinção da SELIC, a correção monetária deverá observar índice que preserve o valor real do crédito e passarão a correr juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 167, parágrafo único, combinado com 161, parágrafo único, do Código Tributário Nacional. Com base no art. 85 do CPC, a União foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios sobre o valor da condenação, cujo percentual será fixado oportunamente, quando liquidado o julgado (art. 85, § 4º, II, CPC). Feito isento de custas (art. 4º, I e II, da Lei n.º 9.289/1996).
Em suas razões de apelação, a União sustenta, em síntese, que inexiste previsão legal para aplicar o regime previsto no art. 12-A da Lei 7.713/88 aos benefícios de previdência complementar privada recebidos antes da Lei 13.149/2015.
Apresentadas contrarrazões, vieram os autos conclusos.
É o relatório.
VOTO
Juízo de Admissibilidade do Recurso
Recebo o recurso de apelação interposto pela União - Fazenda Nacional, visto que adequado e tempestivo. Registro, ademais, ser isenta de preparo a parte apelante.
Do IR sobre verbas recebidas acumuladamente. Previdência complementar
Controverte-se nos autos se à apuração do imposto de renda incidente sobre os rendimentos de aposentadoria complementar recebidos acumuladamente antes de 2015, provenientes da reclamatória trabalhista n.º 0115900-84.2004.5.04.0024 é aplicável o art. 12-A da Lei n.º 7.713/88, uma vez que o caput do referido dispositivo, antes da alteração pela MP 670, de 10/03/2015, fazia menção tão-somente a verbas recebidas de forma acumulada, provenientes de aposentadoria pagas pela Previdência Social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Embora já tenha votado no sentido de que o art. 12-A da Lei n.º 7.713/1988, mesmo antes da MP n.º 670/2015, deveria ser aplicado também aos valores pagos por entidades de previdência complementar a título de complementação de aposentadoria (TRF4, AC 5004376-39.2017.4.04.7003, PRIMEIRA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 11/07/2018; AC 5067174-07.2015.4.04.7100, PRIMEIRA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 21/02/2018), na linha de inúmeros julgados das Turmas Tributárias desta Corte, recentemente revi meu entendimento, conforme voto-vista proferido no processo n.º 5071630-97.2015.4.04.7100/RS.
Isso porque não há respaldo legal para tanto.
De fato, antes da edição da MP n.º 670/2015, a aplicação do art. 12-A da Lei n.º 7.713/1988 era restrita aos "rendimentos do trabalho e os provenientes de aposentadoria, pensão, transferência para a reserva remunerada ou reforma, pagos pela Previdência Social da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios", de modo que tal sistemática não poderia ser aplicada aos valores pagos a título de complementação de aposentadoria. Nessa linha, não há qualquer ilegalidade no § 3º do art. 2º da IN 1.127/11 ou no § 3º do art. 36 da IN 1.500/14, que se ativeram ao comando legal.
Assim vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça, de que é exemplo o REsp n.º 1.590.478/RS, de seguinte ementa:
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO NA ÉGIDE DO CPC/1973.
ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 2 DO STJ. IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE. RENDIMENTOS PAGOS ACUMULADAMENTE POR ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR. INAPLICABILIDADE DO ART. 12-A DA LEI Nº 7.713/1988, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 12.350/2010. LEGALIDADE DA IN SRF Nº 1.127/2011, COM REDAÇÃO DADA PELA IN SRF Nº 1.261/2012.
1. Discute-se nos autos a aplicabilidade do art. 12-A da Lei nº 7.713/1988, com redação dada pela Lei nº 12.350/2010, para fins de apuração do imposto de renda incidente na fonte quando do recebimento acumulado de diferenças de complementação de aposentadoria decorrentes de reclamatória trabalhista em meados de 2010.
2. O art. 12-A da Lei nº 7.713/1988, com redação dada pela Lei nº 12.350/2010, dispõe que a tributação do Imposto de Renda, sobre verbas relativas a anos-calendários anteriores, será exclusiva na fonte e em separado dos demais rendimentos nos casos de: (i) rendimentos do trabalho; e (ii) rendimentos provenientes de aposentadoria, pensão, transferência para a reserva remunerada ou reforma, pagos pela Previdência Social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
3. Os rendimentos pagos pelas entidades de previdência complementar não estão enquadrados nos rendimentos do trabalho ou nos rendimentos provenientes de aposentadoria, pensão, transferência para a reserva remunerada ou reforma, uma vez que, em relação a estes últimos rendimentos, a lei elegeu o regime de tributação do Imposto de Renda exclusiva na fonte e em separado das demais verbas, somente quando pagos pela Previdência Social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Mesmo antes da edição da Instrução Normativa da Secretaria da Receita Federal do Brasil nº 1.127/2011 (com a redação dada pela IN RFB nº 1.261, de 20/03/2012), os rendimentos pagos acumuladamente por entidade de previdência complementar não estariam sujeitos à incidência do art. 12-A da Lei nº 7.713/1988, com redação dada pela Lei nº 12.350/2010. A referida instrução normativa somente explicitou essa orientação.
4. A Medida Provisória nº 670/2015, posteriormente convertida na Lei nº 13.149/2015, alterou a redação do art. 12-A da Lei nº 7.713/1988 para determinar a tributação de Imposto de Renda exclusiva na fonte e em separado das demais verbas em relação aos rendimentos recebidos acumuladamente sem a restrição anteriormente existente de aplicação somente em caso de rendimento do trabalho ou daqueles outros rendimentos quando pagos pela Previdência Social da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios. Assim, no cálculo do imposto de renda retido na fonte incidente sobre as verbas pagas acumuladamente por entidades de previdência complementar, cujo fato gerador tenha ocorrido antes da alteração do art. 12-A da Lei nº 7.713/1988 promovida pela Medida Provisória nº 670/2015, posteriormente convertida na Lei nº 13.149/2015, devem ser observadas as tabelas e alíquotas vigentes à época em que deveriam ter sido pagos, seguindo a sistemática do regime de competência, conforme entendimento adotado por esta Corte em sede de recurso especial repetitivo, na sistemática do art. 543-C, do CPC/1973 (REsp 1.118.429/SP, de relatoria do Ministro Herman Benjamin, DJe 14/05/2010). Não se tratando de tributação exclusiva, os rendimentos em questão estarão sujeitos ao ajuste anual do Imposto de Renda.
5. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 1590478/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/06/2016, DJe 21/06/2016)
Esse entendimento também passou a ser aplicado pela Segunda Turma desta Corte, como evidenciam os seguintes julgados:
IMPOSTO DE RENDA. PESSOA FÍSICA. VALORES RECEBIDOS ACUMULADAMENTE, POR ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. INAPLICABILIDADE DO ART. 12-A DA LEI 7.713/88, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 12.350/2010. REGIME DE COMPETÊNCIA. 1. Mesmo antes da edição da Instrução Normativa da Secretaria da Receita Federal do Brasil nº 1.127/2011 (com a redação dada pela IN RFB nº 1.261, de 20/03/2012), os rendimentos pagos acumuladamente por entidade de previdência complementar não estariam sujeitos à incidência do art. 12-A da Lei nº 7.713/1988, com redação dada pela Lei nº 12.350/2010. Conclui-se, pois, que a referida instrução normativa somente explicitou essa orientação. Precedentes do STJ 2. As verbas pagas acumuladamente por entidades de previdência complementar, antes da alteração do art. 12-A da Lei nº 7.713/1988 promovida pela Medida Provisória nº 670/2015 - posteriormente convertida na Lei nº 13.149/2015-, estão sujeitas ao ajuste anual do Imposto de Renda, não se tratando de tributação exclusiva. (TRF4, AC 5052198-58.2016.4.04.7100, SEGUNDA TURMA, Relatora LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH, juntado aos autos em 20/08/2018)
IIMPOSTO DE RENDA. PESSOA FÍSICA. VALORES RECEBIDOS ACUMULADAMENTE. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA PRIVADA. SISTEMÁTICA DE CÁLCULO PREVISTA NO ART. 12-A, DA LEI Nº 7.713, DE 1988. INAPLICABILIDADADE. REGIME DE COMPETÊNCIA. JUROS DE MORA. 1. É indevida a incidência do imposto de renda pessoa física sobre juros moratórios legais recebidos pelo atraso no pagamento de verbas remuneratórias, salariais ou previdenciárias, em razão da sua natureza indenizatória, conforme entendimento assentado pela Corte Especial deste Tribunal na Argüição de Inconstitucionalidade nº 5020732-11.2013.404.0000. 2. Em se tratando de proventos de aposentadoria complementar, de natureza privada, percebidos em 2011 (antes, portanto, da alteração promovida pela Lei 13.149, de 2015), não se aplica a sistemática de tributação prevista no art. 12-A da lei 7.713, de 1988, o qual, à época, aplicava-se apenas aos proventos de aposentadoria pagos pela Previdência Social da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, tendo o contribuinte, no entanto, direito ao cálculo do imposto de renda pelo regime de competência. (TRF4, AC 5019478-04.2017.4.04.7100, SEGUNDA TURMA, Relator RÔMULO PIZZOLATTI, juntado aos autos em 07/08/2018)
A não aplicação do art. 12-A ao caso, porém, não leva à improcedência da ação. Isso porque, se assim procedesse, seria adotado o regime de caixa, de longa data já afastado pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp n.º 1.118.429/SP, submetido ao rito dos recursos repetitivos, que consagrou o regime de competência. Veja-se:
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. AÇÃO REVISIONAL DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PARCELAS ATRASADAS RECEBIDAS DE FORMA ACUMULADA.
1. O Imposto de Renda incidente sobre os benefícios pagos acumuladamente deve ser calculado de acordo com as tabelas e alíquotas vigentes à época em que os valores deveriam ter sido adimplidos, observando a renda auferida mês a mês pelo segurado. Não é legítima a cobrança de IR com parâmetro no montante global pago extemporaneamente. Precedentes do STJ.
2. Recurso Especial não provido. Acórdão sujeito ao regime do art.
543-C do CPC e do art. 8º da Resolução STJ 8/2008.
(REsp 1118429/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/03/2010, DJe 14/05/2010)
Dessa forma, ainda que se entenda corretamente inaplicável o art. 12-A da Lei n.º 7.713/1988 aos valores recebidos a título de previdência complementar enquanto ausente previsão legal, cumpre reconhecer que deve ser aplicado ao caso o regime de competência, e não o regime de caixa.
Nessa linha, já decidiu o STJ que "no cálculo do imposto de renda retido na fonte incidente sobre as verbas pagas acumuladamente por entidades de previdência complementar, cujo fato gerador tenha ocorrido antes da alteração doart. 12-A da Lei nº 7.713/1988 promovida pela Medida Provisória nº 670/2015, posteriormente convertida na Lei nº 13.149/2015, devem ser observadas as tabelas e alíquotas vigentes à época em que deveriam ter sido pagos, seguindo a sistemática do regime de competência, conforme entendimento adotado por esta Corte em sede de recurso especial repetitivo" (STJ, AgInt no AgInt no AgInt no REsp 1641365/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/11/2017, DJe 14/11/2017).
Deve-se analisar, portanto, se, nos limites em que proposta a demanda, é possível determinar a aplicação do regime de competência, consagrado pela jurisprudência antes da edição do art. 12-A.
A leitura da petição inicial permite concluir que, embora o pedido tenha sido de aplicação do art. 12-A, a parte autora pretende evitar a tributação pelo regime de caixa.
Parece-me claro, portanto, que a parte autora pretende evitar a aplicação do regime de caixa, adotando o regime de competência, que, no seu entender, se dá a partir da aplicação do art. 12-A da Lei n.º 7.713/1988.
Por mais que a sistemática do art. 12-A não seja exatamente a mesma da apuração pelo regime de competência (em que são refeitas as DAA dos anos em que os valores deveriam ter sido recebidos, para se apurar o montante que seria pago de IRPF se o contribuinte tivesse recebido na época devida), é sabido que foi criada justamente para contornar o problema existente, mediante tributação realizada exclusivamente na fonte, em separado dos demais rendimentos recebidos no ano-calendário.
Daí que é comum a associação entre regime de competência e art. 12-A, pois este foi criado justamente para evitar a aplicação do regime de caixa, o que judicialmente vinha ocorrendo mediante a determinação de aplicação do regime de competência.
Considerando que, no momento anterior ao art. 12-A, o contribuinte não tinha alternativa senão incluir os rendimentos no montante global recebido de pessoa jurídica pelo titular no ano-calendário para depois pleitear judicialmente a aplicação do regime de competência, não há sentido em imaginar que a parte autora pretende a aplicação pura e simples do art. 12-A, que, se desacolhida, importará na manutenção do regime de caixa.
Com efeito, o art. 12-A tem a finalidade de evitar a anti-isonômica adoção do regime de caixa, não sendo um fim em si mesmo.
Dessa forma, deve ser afastada a aplicação do regime de caixa, adotando-se o regime de competência puro.
É verdade que tal não pode se dar mediante a aplicação do art. 12-A; todavia, isso não pode levar à improcedência da ação no ponto, mas sim à determinação de aplicação do "regime de competência puro", nos moldes do decidido pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp n.º 1.118.429/SP, de relatoria do Ministro Herman Benjamin, DJe14/05/2010, até para não se exigir do contribuinte o ajuizamento de nova ação, para afastar a aplicação do regime de caixa.
Observo, inclusive, que muitos juízes, ao cumprirem sentenças que determinam a aplicação do regime de competência, determinam a retificação da DAA mediante a aplicação do art. 12-A, o que bem evidencia a comum confusão entre os dispositivos.
Considero, portanto, que é possível, neste processo, determinar a aplicação do regime de competência em relação aos valores recebidos a título de previdência complementar (em relação aos quais é inaplicável o art. 12-A da Lei n.º 7.713/1988).
A essa mesma conclusão chegou a 2ª Turma na mencionada AC 5019478-04.2017.4.04.7100, em que o e. Relator, Des. Federal Rômulo Pizzolatti, assentou:
"É, pois, de ser rejeitada a pretensão da parte autora de aplicação do art. 12-A da Lei 7.713, de 1988, aos valores percebidos acumuladamente em 2011.
Por outro lado, é certo que é descabida a aplicação de regime de caixa, em se tratando de valores percebidos acumuladamente, como, aliás, reconheceu a própria Receita Federal em parecer do Sefis. Confira-se (evento 14, PROCADM2, fl. 100):
Considerando a impossibilidade de aplicar o Art. 12 da Lei nº 7.713, de 1988 (regime de caixa), por ser este declarado inconstitucional pelo STF e da impossibilidade também de aplicar o Art. 12-A da mesma Lei (regime especial pela tributação exclusiva), por haver vedação expressa ao RRA de aposentadoria complementar e com base na Nota PGFN/CRJ nº 981/2015, a apuração do imposto de renda sobre valores de RRA deve ser calculada com base nas tabelas e alíquotas vigentes à época em que os valores deveriam ter sido adimplidos, juntamente com os demais rendimentos levantados mês a mês, aplicando-se assim, o regime de competência na apuração do imposto devido sobre os rendimentos recebidos acumuladamente do presente caso, utilizando a sistemática das tabelas próprias.
Com efeito, a jurisprudência federal tem garantido ao contribuinte o direito de que, em se tratando de verbas percebidas acumuladamente, antes de 2010 (antes, portanto, da introdução do art.12-A da Lei 7.713, de 1988), o imposto de renda seja recalculado conforme as alíquotas e tabelas vigentes nos períodos em que as parcelas, não pagas na época própria, eram realmente devidas (ou seja, pelo "regime de competência"), e não conforme a alíquota e tabela vigentes à época do pagamento acumulado (REsp 704.845/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe 16/09/2008).
Adequação do débito
Considerando que o tributo deve incidir pelo regime de competência, e não pelo regime de caixa, e que é inexigível imposto de renda sobre juros de mora, deve o Fisco proceder à adequação do débito consubstanciado na CDA 00115002330-69."
Sistematizo as conclusões deste voto:
a) antes da inclusão do art. 12-A na Lei n.º 7.713/1988 pela MP n.º 497/2010 deve ser aplicado o "regime de competência puro", conforme decidido pelo STJ no REsp n.º 1.118.429/SP, no lugar do regime de caixa;
b) a partir da MP n.º 497/2010, deve ser aplicado o art. 12-A (tributação exclusiva na fonte, no mês do recebimento ou crédito, em separado dos demais rendimentos do mês, ressalvada a opção irretratável a que se refere o § 5º) exclusivamente para os rendimentos do trabalho e os provenientes de aposentadoria, pensão, transferência para a reserva remunerada ou reforma, pagos pela Previdência Social da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. Quanto aos demais rendimentos recebidos acumuladamente (tais como previdência complementar paga por entidades privadas), mantém-se a aplicação do "regime de competência puro", conforme decidido pelo STJ no REsp n.º 1.118.429/SP, no lugar do regime de caixa;
c) a partir da MP n.º 670/2015, deve ser aplicado o art. 12-A a todos os rendimentos recebidos acumuladamente (ressalvada a opção irretratável a que se refere o § 5º), não mais se aplicando o "regime de competência puro" de que trata o REsp n.º 1.118.429/SP;
d) mesmo que se postule a aplicação do art. 12-A da Lei n.º 7.713/1988 a casos não previstos (antes da MP n.º 497/2010 para quaisquer rendimentos e antes da MP n.º 497/2010 para rendimentos que não sejam do trabalho e provenientes de aposentadoria, pensão, transferência para a reserva remunerada ou reforma, pagos pela Previdência Pública), é possível acolher a pretensão de aplicação do "regime de competência puro", quando ficar claro que se quer afastar o regime de caixa.
Considerando que os valores foram recebidos em 2014, não se aplica o art. 12-A, mas deve ser aplicado o regime de competência puro, o que conduz à parcial procedência da ação.
Merece, pois, parcial provimento a apelação da União para reformar a sentença e julgar parcialmente procedente o pedido da inicial, ainda que por fundamento parcialmente diverso, declarando o direito da parte autora de apurar o imposto de renda incidente sobre os rendimentos recebidos acumuladamente em 2014, provenientes da reclamatória trabalhista n.º 0107800-09.2009.5.04.0011, de acordo com a sistemática de tributação regime de competência, condenando a União à repetição dos valores indevidamente recolhidos.
Na apuração do regime de competência deverão ser observadas, ainda, as diretrizes do REsp n.º REsp 1470720/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/12/2014, DJe 18/12/2014.
Inaplicabilidade da Súmula 584 do STF
Na dicção do STF, "os precedentes que deram origem à Súmula 584/STFse referiam à tributação de rendimentos de magistrados, pessoas físicas, nos termos do DL 62/1996 (RE 80.620 e RE 74.594). Por seu turno, tais precedentes se reportam ao RE 65.621(RTJ 53/666) e ao RMS 18.112-Antigo (RTJ 48/285), que versaram sobre a instituição de subscrição compulsória de letras imobiliárias do Banco Nacional de Habitação, em valor calculado com base na renda auferida da cobrança de aluguéis. À época, a Corte fez distinção entre exercício (ano em que devido o tributo) e ano base (em que ocorridos os fatos relevantes para cálculo) para entender pela inexistência de retroatividade. Sem me comprometer de pronto com a atual adequação constitucional da Súmula 584/STF, observo que os precedentes que definem os contornos do entendimento sumulado levaram em consideração a tributação (i) de pessoas físicas (ii) no contexto das regras de apuração vigentes entre 1967 e 1968. Não há nas razões de agravo regimental indicação de que os modelos de tributação e de apuração permaneceram inalterados, de modo a justificar a aplicação do enunciado sumular. Em sentido semelhante, não há indicação sequer da proximidade dos regimes de tributação e de apuração relativos às pessoas físicas e às pessoas jurídicas que justificasse o mesmo tratamento. [RE 244.003 AgR, rel. min. Joaquim Barbosa, 2ª T, j. 20-4-2010, DJE 96 de 28-5-2010.].
Vale dizer, a S. 584 tem âmbito de aplicação muito restrito (quadro normativo vigente para apuração do tributo entre 1967 e 1968), quadro normativo muito específico e diverso da discussão sobre a incidência de IR sobre rendimentos recebidos acumuladamente.
Repetição do indébito
Reconhecida a ocorrência de indébito tributário, faz jus a parte autora à restituição e/ou compensação dos tributos recolhidos a maior, condicionada ao trânsito em julgado da presente decisão judicial (art. 170-A do CTN), nos termos do art. 74 da Lei n.º 9.4330/1996. A compensação de indébitos tributários em geral deverá ocorrer (a) por iniciativa do contribuinte, (b) entre quaisquer tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal, (c) mediante entrega de declaração contendo as informações sobre os créditos e débitos utilizados, cujo efeito é o de extinguir o crédito tributário, sob condição resolutória de sua ulterior homologação.
No que toca à compensação das contribuições previdenciárias, contribuições instituídas a título de substituição de contribuição previdenciária e contribuições sociais devidas a terceiros, devem ser observadas as restrições do art. 26-A da Lei n.º 11.457/2002, incluído pela Lei n.º 13.670/2018, conforme regulamentação da Secretaria da Receita Federal do Brasil (§ 2º).
Registre-se, por fim, que "a lei que regula a compensação tributária é a vigente à data do encontro de contas entre os recíprocos débito e crédito da Fazenda e do contribuinte" (STJ, REsp 1164452/MG, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/08/2010, DJe 02/09/2010).
Da atualização monetária.
A atualização monetária do indébito, relativamente a tributos em geral, deve dar-se pela SELIC, que engloba juros e correção monetária, nos termos do art. 39, § 4º da Lei n.º 9.250/95. Tratando-se, porém, das contribuições previdenciárias mencionadas no caput do artigo 89 da Lei n.º 8.212/91, a atualização monetária deve observar §4º do referido artigo.
Dos ônus sucumbenciais
Havendo sucumbência mínima da parte autora, mantenho a sucumbência fixada na sentença, condenando a União ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador da parte adversa, postergada a definição do percentual à fase de liquidação de sentença, nos moldes do art. 85, § 4º, II do CPC.
A União é isenta do pagamento das custas judiciais. Deve, entretanto, reembolsar as despesas judiciais adiantadas pela parte autora (art. 4º, § único da Lei 9.289/96).
Honorários Recursais
Nos termos do art. 85, §11, do CPC/2015, "o tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2o a 6o, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2o e 3o para a fase de conhecimento".
Trata-se de inovação do Código de Processo Civil que tem por objetivo, não só remunerar o advogado pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, como também desestimular a interposição de recursos pela parte vencida, já que verá aumentada a verba sucumbencial.
Cabe esclarecer, porém, que não será toda a atuação do advogado em grau recursal que ensejará a aplicação do referido dispositivo. Isso porque, ao mencionar "honorários fixados anteriormente", a regra em questão pressupõe que a parte vencedora em grau recursal já tenha honorários advocatícios fixados em favor de seu advogado na sentença.
Assim, por exemplo, a parte que teve seu pedido julgado improcedente em primeira instância, ao ter provida a sua apelação, não fará jus à majoração prevista no §11, mas apenas à fixação da verba honorária decorrente da procedência do pedido. O mesmo se diga em relação a sentenças de parcial procedência, quando reformadas no Tribunal quanto ao pedido julgado inicialmente improcedente, pois, quanto a ele, haverá tão-somente a primeira fixação de honorários. Da mesma forma, ao reformar integralmente uma sentença, o Tribunal apenas inverterá a sucumbência, sem fixação de honorários recursais.
Registre-se, ainda, que se deve levar em consideração o êxito recursal quanto ao mérito, de modo que eventual provimento parcial do recurso apenas quanto a aspectos acessórios não impedirá a aplicação do §11. Ressalvada, evidentemente, a hipótese de que o recurso verse exclusivamente acerca de questões acessórias e seja provido, caso em que não haverá a fixação de honorários recursais, dado que o recorrente teve acolhida integralmente sua pretensão recursal.
No caso, portanto, não tem aplicação o art. 85, § 11, do CPC, uma vez que o apelo da União foi parcialmente provido.
Conclusão
Apelação parcialmente provida para reformar a sentença e julgar parcialmente procedente o pedido da inicial, declarando o direito da parte autora de apurar o imposto de renda incidente sobre os rendimentos recebidos acumuladamente em 2014, da reclamatória trabalhista n.º 0107800-09.2009.5.04.0011, de acordo com a sistemática de tributação regime de competência, condenando a União à repetição dos valores indevidamente recolhidos e ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador da parte autora.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5073730-88.2016.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)
APELADO: LUIZ FERNANDO FERREIRA DA SILVA (AUTOR)
EMENTA
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. PERCEPÇÃO ACUMULADA DE RENDIMENTOS. complementação de aposentadoria. APLICAÇÃO DA TRIBUTAÇÃO NOS MOLDES DO ART. 12-a DA LEI 7.713/88 antes da mp 670/2015. impossibilidade. adoção do regime de competência. pedido parcialmente procedente.
1. Antes da edição da MP n.º 670/2015, a aplicação do art. 12-A da Lei n.º 7.713/1988 era restrita aos "rendimentos do trabalho e os provenientes de aposentadoria, pensão, transferência para a reserva remunerada ou reforma, pagos pela Previdência Social da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios", de modo que tal sistemática não podia ser aplicada aos valores pagos a título de complementação de aposentadoria. Nessa linha, não há qualquer ilegalidade no § 3º do art. 2º da IN 1.127/11 ou no § 3º do art. 36 da IN 1.500/14, que se ativeram ao comando legal.
2. No entanto, deve ser afastado o regime de caixa, observando-se as tabelas e alíquotas vigentes à época em que deveriam ter sido pagos, seguindo a sistemática do regime de competência, conforme entendimento do STJ em recurso repetitivo.
3. É verdade que tal não pode se dar mediante a aplicação do art. 12-A; todavia, isso não pode levar à improcedência da ação no ponto, mas sim à determinação de aplicação do "regime de competência puro", nos moldes do decidido pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp n.º 1.118.429/SP, de relatoria do Ministro Herman Benjamin, DJe14/05/2010, até para não se exigir do contribuinte o ajuizamento de nova ação, para afastar a aplicação do regime de caixa.
4. Apelação parcialmente provida, determinando-se a aplicação do regime de competência.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de novembro de 2018.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 21/11/2018
Apelação Cível Nº 5073730-88.2016.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
PROCURADOR(A): JUAREZ MERCANTE
SUSTENTAÇÃO ORAL: BRUNO ALVES NUNES por LUIZ FERNANDO FERREIRA DA SILVA
APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)
APELADO: LUIZ FERNANDO FERREIRA DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO: ANDRÉ LUÍS SOARES ABREU
ADVOGADO: BRUNO ALVES NUNES
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 21/11/2018, na sequência 529, disponibilizada no DE de 06/11/2018.
Certifico que a 1ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 1ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO. DETERMINADA A JUNTADA DA TRANSCRIÇÃO DAS NOTAS DO JULGAMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Juiz Federal ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA
Votante: Juiz Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA
Secretária
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