
D.E. Publicado em 22/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar e julgar improcedente a ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0028651-71.2010.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Trata-se de ação rescisória ajuizada por Zenaide Vali de Pauli, com fundamento no artigo 485, incisos VII e IX (documento novo e erro de fato), do Código de Processo Civil de 1973, visando desconstituir acórdão proferido pela 7ª Turma desta Corte que, ao dar provimento à apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade a trabalhadora rural.
Alega a parte autora que, posteriormente ao trânsito em julgado do acórdão em questão, foi obtido documento novo, que demonstra sua qualidade de trabalhadora rural. Assim, conjugando-se tal documento às provas material e testemunhal produzidas no feito subjacente, estaria demonstrado o exercício de atividade rural pelo período equivalente à carência. Aduz, ainda, que ao deixar de considerar a documentação apresentada como início de prova material, o acórdão em questão incorreu em erro de fato. Afirma, assim, haver preenchido os requisitos legais à concessão do benefício postulado. A inicial veio acompanhada de documentos (fls. 12/315).
Os benefícios da justiça gratuita foram concedidos (fl. 318).
Regularmente citada (fl. 323), a autarquia-ré apresentou contestação, alegando, preliminarmente, carência de ação, uma vez que pretende a parte autora utilizar-se da ação rescisória como sucedâneo de recurso. No mérito, em síntese, aduz que os documentos apresentados como novos não configuram início de prova material suficiente a garantir um pronunciamento judicial favorável. Afirma, ainda, que o marido da autora era trabalhador urbano, de maneira que tampouco há falar em erro de fato. Assim, pugna pela improcedência do pedido rescisório (fls. 325/331). Apresentou documentos (fls. 332/338).
Réplica da parte autora (fls. 342/343) aduzindo que os documentos carreados aos autos suficientes a comprovar suas alegações.
Alegações finais apresentadas apenas pela parte autora (fls. 347/359), nas quais reitera as teses até então sustentadas.
O representante do Ministério Público Federal opinou pela procedência do pedido para rescindir o acórdão e, em juízo rescisório, pela procedência do pedido de concessão do benefício (fls. 361/366).
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Registro que a presente ação rescisória foi ajuizada sob a égide do Código de Processo Civil de 1973. Impõe-se observar que, publicada a r. decisão rescindenda e interposta a presente ação rescisória em data anterior a 18.03.2016, a partir de quando se torna eficaz o Novo Código de Processo Civil, as regras de interposição da presente ação a serem observadas em sua apreciação são aquelas próprias ao CPC/1973. Inteligência do art. 14 do NCPC.
Verifico que foi obedecido o prazo de dois anos estabelecido pelo artigo 495 do CPC/1973, considerando a certidão de fl. 297.
A matéria preliminar aduzida pelo INSS confunde-se com o mérito da demanda e com ele será examinada.
Pretende a autora a rescisão de acórdão proferido nos autos da ação Ordinária nº 2004.61.24.000962-4, de lavra da Desembargadora Federal Eva Regina, tendo por base a alegação de obtenção de documento novo e ocorrência de erro de fato, nos termos do artigo 485, incisos VII e IX, do Código de Processo Civil de 1973.
Para que ocorra a rescisão respaldada no inciso IX do art. 485 do CPC/1973, atualizado para o art. 966, inciso VIII, do CPC/2015, deve ser demonstrada a conjugação dos seguintes fatores, a saber: a) o erro de fato deve ser determinante para a sentença; b) sobre o erro de fato suscitado não pode ter havido controvérsia entre as partes; c) sobre o erro de fato não pode ter havido pronunciamento judicial, d) o erro de fato deve ser apurável mediante simples exame das peças do processo originário.
Ocorre que o aresto rescindendo apreciou todos os elementos probatórios trazidos a juízo, nos seguintes termos (fls. 260/265):
"(...)
Na hipótese, a parte autora nascida em 13 de agosto de 1948, por ocasião do ajuizamento da ação (24.06.2004), já contava 55 anos de idade.
Há início de prova documental: Certidão de Casamento, realizado em 27.09.1975, Certidão de Nascimento dos filhos, ocorridos em 23.08.1976, 25.06.1978, Título Eleitoral, emitido em 1967, os quais declinam a profissão de lavrador do cônjuge, carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jales datada em 1976, guias de recolhimento de contribuição sindical rural, exercícios 1977 a 1989, notas fiscais do produtor e de entrada, emitidas, em períodos descontínuos entre os anos de 1977 a 1997, autorização de impressão de documentos fiscais e autorização para inscrição de produtor, ambos datados em 1976, declaração do produtor rural, em 1981, pedido de talonário de produtor em 1993, declaração cadastral - produtor, em 1991 e contratos particulares de parceria agrícola firmados nos anos de 1960, 1980, 1983, 1990 e 1979, todos documentos emitidos em nome do marido da requerente.
Conquanto possa inferir que o cônjuge explorava atividade rural, não se pode concluir o desenvolvimento dessa atividade no período pendente de prova, conforme o disposto no artigo 142 da Lei 8.213/91 que, no caso dos autos são 132 meses anteriores ao ano em que completou a idade necessária para obtenção do benefício.
Observe, que as pesquisas realizadas no Cadastro Nacional de Informações - CNIS, demonstram que seu marido possui registros urbanos a partir de 1998 até 2004.
De conseguinte, após 1998, quando o cônjuge passou a exercer atividades urbanas, não veio aos autos qualquer outro documento apto a indicar a profissão rurícola que a requerente alega ter exercido.
As testemunhas ouvidas em juízo sob o crivo do contraditório, e cientes das penas por falso testemunho, contradizem o que foi constatado na pesquisa CNIS, pois afirmam que marido da parte autora sempre exerceu atividade rural, enquanto que, pelos registros, verifica-se que, na realidade, desde 1998 ele exerce o labor urbano .
Assim, o conjunto probatório foi insuficientemente circunstanciado e não se revestiu de força o bastante para comprovar e atestar soberanamente a pretensão deduzida nestes autos, não fazendo jus, portanto, ao benefício pleiteado.
Por conseqüência, casso a tutela antecipada concedida.
Diante do exposto, dou provimento à apelação da autarquia para julgar improcedente o pedido e, conseqüentemente, casso a tutela antecipada concedida. Recurso adesivo da parte autora prejudicado. Deixo de condenar a parte autora nas verbas da sucumbência por ser beneficiária da justiça gratuita.(...)"
Verifica-se que o pedido de concessão do benefício foi julgado improcedente por se entender que não restou comprovado, nos autos subjacentes, que a parte autora tenha exercido atividade rural por todo o período alegado, diante da análise das provas documental e testemunhal ali produzidas.
Assim, da transcrição acima, conclui-se que o v. acórdão analisou as provas trazidas aos autos pela autora, mencionando-as expressamente, todavia consideraram-nas ilididas pelas informações constantes no CNIS, que demonstraram a atividade urbana de seu marido.
Atente-se que o marido da autora, cuja prova se busca estender, possui registros urbanos a partir de 1998, tendo recebido auxílio-doença entre 2005 e 2016 e tendo sido aposentado por invalidez na qualidade de comerciário em 2016.
Ressalto, inclusive, que o entendimento adotado no julgado rescindendo se alinha com a tese posteriormente firmada no REsp 1.304.479/SP, submetido ao procedimento dos recursos repetitivos, cuja questão submetida a julgamento foi a repercussão de atividade urbana do cônjuge na pretensão de configuração jurídica de trabalhador rural previsto no art. 143 da Lei nº 8.213/91, tendo sido firmada a seguinte tese: "Em exceção à regra geral (...), a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana" (Tema repetitivo nº 533 . STJ. REsp 1.304.479/SP. Relator Min. Herman Benjamin. Data de afetação 21/03/2012. Julgado em 10/10/2012. Acórdão publicado em 19/12/2012. Trânsito em julgado em 05/03/2013).
Não se configura, desta forma, a hipótese prevista no artigo 485, inciso IX, e §§ 1º e 2º, do Código de Processo Civil de 1973, já que para a verificação do "erro de fato", a ensejar a rescisão do julgado, é necessário que este tenha admitido fato inexistente ou considerado inexistente fato efetivamente ocorrido, bem como não tenha ocorrido controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato.
Ressalte-se que não se presta a rescisória ao rejulgamento do feito, como ocorre na apreciação dos recursos. Para se desconstituir a coisa julgada com fundamento em erro de fato é necessária a verificação de sua efetiva ocorrência, no conceito estabelecido pelo próprio legislador, o que não ocorreu no presente feito, sendo certo que o acórdão que se pretende rescindir considerou todos os elementos probatórios carreados aos autos. A propósito, segue recente julgado dessa 3ª Seção:
Destarte, não resta configurada a hipótese de "erro de fato" no julgado em questão.
Outrossim, para que o documento seja considerado novo, para fins de rescisão do julgado com fundamento no artigo 485, inciso VII, do Código de Processo Civil de 1973, é necessário que ele já exista quando da prolação da sentença, mas sua existência era ignorada pelo autor da ação rescisória, ou que dele não pôde fazer uso. O documento deve ser de tal ordem que, por si só, seja capaz de alterar o resultado da decisão rescindenda e assegurar pronunciamento favorável.
Imprescindível, ainda, a inexistência de desídia ou negligência da parte na não utilização de documento preexistente, por ocasião da demanda originária.
Nas palavras do eminente processualista Vicente Grecco Filho: "O documento novo não quer dizer produzido após a sentença, mas documento até então desconhecido ou de utilização impossível. A impossibilidade de utilização deve ser causada por circunstâncias alheias à vontade do autor da rescisória. A negligência não justifica o seu não-uso na ação anterior. Aliás, esta última situação é de ocorrência comum. A parte (ou o advogado) negligencia na pesquisa de documentos, que muitas vezes estão à sua disposição em repartições públicas ou cartórios. Essa omissão não propicia a rescisão, mesmo que a culpa seja do advogado e não da parte. A esta cabe ação de perdas e danos, eventualmente. Como no inciso anterior, o documento novo deve ser suficiente para alterar o julgamento, ao menos em parte, senão a sentença se mantém." (Direito Processual Civil Brasileiro. 2º v., São Paulo: Saraiva, 1996, p. 426).
No caso dos autos, a parte autora aponta, como documentos novos, relatório de munícipe cadastrado, indicando como endereço da autora uma chácara, localizada em bairro rural; nota fiscal de saída de mercadorias, emitida em 23/11/2009, referente à compra, pela autora, de uma 50kg de milho ensacado, indicando como endereço imóvel rural, e notas fiscais de compras de móveis, emitidas em 18/10/2007 e 02/02/2009, constando o endereço da autora imóvel rural (fls. 306/309).
Contudo, os documentos ora apresentados não são aptos os documentos em questão não configuram "documentação nova", na acepção jurídica do termo.
Ainda que assim não fosse, mesmo que tivessem sido juntados ao feito subjacente, os referidos documentos não seriam capazes, por si sós, de garantir um pronunciamento judicial favorável.
Isso porque a nota fiscal de aquisição de produto agrícola, em nome da autora, foi emitida posteriormente à data do trânsito em julgado do acórdão rescindendo, portanto não existia à época do julgamento da demanda subjacente. Além disso, essa nota (fl. 307) e os documentos de fls. 306 e 308/309 apenas informam que a autora residia em zona rural. Cabe esclarecer que o fato de a autora residir, por algum período, na zona rural, por si só, não caracteriza início de prova material da suposta atividade rural. Destaque-se que a profissão declarada no relatório de munícipe foi "doméstica" (fl. 306).
Saliente-se, uma vez mais, que não se presta a rescisória ao rejulgamento do feito, como ocorre na apreciação dos recursos, ou uma nova oportunidade para a complementação das provas.
Sobre o tema, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça nos seguintes termos:
No mesmo sentido, precedentes da Terceira Seção desta Corte Regional:
Diante do exposto, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR E JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO formulado na presente ação rescisória, nos termos da fundamentação acima.
Condeno a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Novo Código de Processo Civil/2015, observando-se a suspensão de exigibilidade prevista no § 3º do art. 98 do mesmo diploma legal.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
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Data e Hora: | 14/08/2018 14:46:23 |