D.E. Publicado em 22/01/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida, e, no mérito, negar provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017384-97.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 16/01/2017 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 07-15).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 16).
Citação, em 18/11/2017 (fl. 26).
Laudo socioeconômico (fls. 60-65)
Laudo médico pericial (fls. 75-85).
A r. sentença, prolatada em 15/01/2018, julgou procedente o pedido. Antecipados os efeitos da tutela. Determinado o pagamento do benefício desde a data do pedido administrativo, 17/03/2016 (fls. 103-107).
Apelação do INSS. Preliminarmente, requer o processamento do recurso com efeito suspensivo, nos termos do art. 1.012, §§ 3º e 4º do CPC. No mérito, pugnou, em suma, pela reforma integral do julgado, em razão do não atendimento dos requisitos relativos à miserabilidade e à incapacidade para o labor. Para o caso de manutenção do decisum, requer que o termo inicial do benefício seja fixado na data da prolação da sentença (fls. 111-119).
Com contrarrazões (fls. 124-127), subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017384-97.2018.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte ré contra sentença que julgou procedente pedido de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência.
No tocante à preliminar arguida pelo réu, a doutrina não destoa, ao esclarecer a possibilidade de concessão de tutela antecipada no bojo da sentença, sendo a apelação o recurso cabível da decisão, recebida somente no efeito devolutivo:
No mesmo sentido posiciona-se a jurisprudência pátria:
Não obstante, in casu, vislumbro o preenchimento de todos os requisitos legais para a manutenção da medida, conforme razões que, a seguir, explicitarei na fundamentação desta decisão.
Superada a preliminar em questão, passo à análise do mérito da apelação da autarquia federal.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não-superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Quanto à alegada incapacidade, depreende-se do laudo médico pericial, relativo a perícia médica realizada em 06/06/2017 (fls. 75-85), que o expert concluiu que o demandante é "PORTADOR DE ALTERAÇÃO OFTALMOLÓGICA COM PERDA DA VISÃO DO OLHO DIREITO E DIMINUIÇÃO DA VISÃO DO OLHO ESQUERDO, DEVIDO A CICATRIZ POR CORIORETINITE EM TRATAMENTO;(...)", sendo que a referida patologia prejudica de forma total e temporária a capacidade laboral da parte autora.
Por sua vez, estudo social elaborado em 17/06/2017 (fls. 62-65) revela que o núcleo familiar era constituído por três pessoas: pelo próprio autor, com 29 anos de idade, por seu cônjuge, Renata da Silva, 20 anos de idade, cozinheira, e pelo filho do casal, Miguel Henrique Silva Massari, de 02 anos de idade.
O núcleo familiar residia em casa cedida pelo genitor do requerente, construída em alvenaria, constituída por um quarto, sala, cozinha e banheiro.
A assistente social foi informada de que a renda familiar era constituída pelo salário percebido pelo cônjuge do autor, no valor R$ 400,00 por mês, e pelo valor de R$ 124,00 por mês, proveniente do programa federal de transferência de renda denominado Bolsa-Família.
Esclareço que, por expressa disposição legal (art. 4º, § 2º, II, do Decreto nº 6.214/07), o valor de R$ 240,00 - supracitado, proveniente de programa de transferência de renda não pode ser considerado para fins de apuração da renda per capita.
De outro lado, a despesa mensal fixa do núcleo familiar compreendia gastos com água e energia elétrica (R$ 100,00), totalizando R$ 100,00 ao mês. Ressalte-se que o autor informou que a alimentação do núcleo familiar era fornecida por seus genitores, e que não está fazendo uso de medicamentos.
Sendo assim, há elementos o bastante para se afirmar que se trata de família que vive em estado de miserabilidade. Os recursos obtidos pela família da parte requerente são insuficientes para cobrir os gastos ordinários, bem como tratamentos médicos e cuidados especiais que lhe são imprescindíveis.
E nessas condições, não é possível à parte autora ter vida digna ou, consoante assevera a Constituição Federal, permitir-lhe a necessária dignidade da pessoa humana ou o respeito à cidadania, que são, às expressas, tidos por princípios fundamentais do almejado Estado Democrático de Direito.
O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do pedido administrativo, protocolado em 17/03/2016, constante da carta de "Comunicação de Decisão" (fl. 07), ex vi do artigo 49, da Lei 8.213/91, que considera esse o momento em que o benefício tornou-se exigível.
Resta deixar consignado que eventuais pagamentos do benefício já realizados pela autarquia na esfera administrativa deverão ser deduzidos na fase da execução do julgado.
Isso posto, rejeito a preliminar arguida, e, no mérito, nego provimento à apelação autárquica.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 10/12/2018 18:30:55 |