APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005471-55.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OSVALDO DE PAULA
Advogado do(a) APELADO: CASSIA MARTUCCI MELILLO BERTOZO - SP211735-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005471-55.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OSVALDO DE PAULA
Advogado do(a) APELADO: CASSIA MARTUCCI MELILLO BERTOZO - SP211735-N
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez e/ou auxílio doença.
A sentença, prolatada em 22/09/2016, julgou procedente o pedido condenando a autarquia a conceder o benefício de auxílio doença em favor da autora, a partir da citação. As parcelas em atraso serão acrescidas de juros de mora, no percentual de 0,5% ao mês até 11.01.2003, após juros de 1% ao mês até 30/06/2009, e a partir de então, juros moratórios calculados com base no índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança. Correção monetária pelo INPC, a partir de 11.08.2006 até 30.6.2009, após com base no índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança (TR) até 25.03.2015; quando então passará a incidir o IPCA-E, de acordo com decisão do Supremo Tribunal Federal em questão de ordem nas ADI5 4357 e 4425. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor das parcelas vencidas até a sentença. Dispensado o reexame necessário.
Apela a autarquia argui, preliminarmente, a submissão da sentença ao reexame necessário. No mérito, sustenta, em síntese, que a parte autora não preenche os requisitos para concessão do benefício, no tocante à qualidade de segurado. Alega que o período em que houve recebimento de benefício, por decisão judicial posteriormente revogada, não mantém a qualidade de segurado.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005471-55.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OSVALDO DE PAULA
Advogado do(a) APELADO: CASSIA MARTUCCI MELILLO BERTOZO - SP211735-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (15/03/2012), seu valor aproximado e a data da sentença (22/09/2016), que o valor total a condenação será inferior à importância de 1.000 (mil) salários mínimos estabelecida no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil de 2015.
Afinal, o valor que superaria a remessa oficial é equivalente a 14 anos de benefícios calculados no valor máximo, o que certamente não será o caso dos autos.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária, razão pela qual rejeito a preliminar arguida pelo INSS
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Também é considerado segurado aquele que trabalhava, mas ficou impossibilitado de recolher contribuições previdenciárias em razão de doença incapacitante.
Nesse passo, acresça-se que no que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
Quanto à carência, exige-se o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, conforme prescreve a Lei n.º 8.213/91, em seu artigo 25, inciso I, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;".
Por fim, não será devido o auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão (art. 42, § 2º e 59, § 1º da Lei 8213/91).
No caso concreto.
A parte autora, ajudante geral, com 62 anos de idade no momento da perícia médica, afirma que é portadora de doenças ortopédicas, condição que a torna incapaz para o trabalho.
O laudo médico pericial elaborado em 30/07/2014 (ID89628100), complementado em 22/01/2016 (ID 89628105) revela que a parte autora é portadora de dorsalgia não especificada (CID M54.9). Ao exame físico apresenta-se em bom estado geral, consciente e contactuante. Na inspeção geral a postura é normal, a simetria corporal está comprometida por uma cifoescoliose de convexidade esquerda, a capacidade de movimentação está também comprometida pela rigidez de movimentos. A coluna cervical tem todos os movimentos preservados (flexão, extensão, rotação direita e esquerda, inclinação lateral direita e esquerda), a coluna torácica não apresenta alterações e a coluna lombar apresenta limitação de sua flexão, extensão, inclinação lateral direita e esquerda e rotação direita e esquerda. Conclui pela incapacidade total e permanente para as atividades habituais. Estabelece como data do início da doença (DID) 25/10/2010, primeira radiografia apresentada e data do início da incapacidade (DII) é incerta, pois não se tem meios de definir o momento em que o estado clínico detectado no momento da perícia se instalou.
O restante do conjunto probatório trazido aos autos corrobora a conclusão da perícia médica judicial no sentido da existência de incapacidade da parte autora.
O extrato do sistema CNIS (fls.279) indica a existência de vínculos empregatícios mantidos pela parte autora, de forma descontínua, no período de 01/08/1977 a 01/09/2005; o que a priori lhe garantiria a qualidade de segurado até 15/11/2006, nos termos do art. 15, II, e § 4°, da Lei n° 8.213/91.
Por outro lado, verifica-se que o autor recebeu auxílio-doença no período de 28/03/2006 a 22/09/2010 (NB 5164415603).
Depreende-se do conjunto probatório que o benefício de auxílio-doença (NB 5164415603) foi concedido em razão de decisão judicial proferida pela 1ª Vara de Ibitinga (Proc. nº 23601.20007.0026725) posteriormente revogada.
Nesse passo, nota-se que o art. 15, I da Lei 8.213/91 preceitua que mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições, sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício.
Vê-se que a lei não faz discriminação sobre o tipo de benefício, ou se decorrente de concessão administrativa ou judicial, pois o legislador não trouxe ressalvas, e tratando-se de direitos sociais constitucionalmente previstos, não cabe ao intérprete criá-las.
Nesse sentido:
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO REGIONAL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. GOZO DE BENEFÍCIO. TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. ART. 15, I, DA LEI 8.213/91. APLICABILIDADE. RECURSO IMPROVIDO.
1. Uniformizada a tese de no sentido de que 'a previsão legal de manutenção da qualidade de segurado, contida no art. 15, I, da Lei 8.213/91, inclui os benefícios deferidos em caráter provisório, inclusive os implantados por força de tutela antecipada'.
2. Pedido de Uniformização improvido."
(TRF4, Incidente de Uniformização nº 5019682-24.2012.4.04.7100, Relator Henrique Luiz Hartmann, julgado em 25.06.2015)
Cumpre salientar que, em sessão realizada em 22/02/2018, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais fixou tese, em sede de pedido de uniformização de jurisprudência, no sentido de que "o período de percepção de benefício previdenciário, concedido por força de tutela provisória, pode ser utilizado para efeitos de manutenção da qualidade de segurado" (PEDILEF 50029073520164047215, Rel. Juiz Fed. Fábio César dos Santos Oliveira, DJe 23/03/2018).
Assim, por ter permanecido em gozo de benefício de auxílio-doença até 22/09/2010, concedido por decisão judicial, ainda que posteriormente revogada, o autor manteve a qualidade de segurado até 15/11/2011. Considerando o pedido administrativo formulado em 05/01/2011, resta demonstrado a qualidade de segurado e carência.
No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Assim, tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no REsp 1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial.
Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Diante do exposto, rejeito a preliminar de reexame necessário, nego provimento ao apelo do INSS e, de oficio, corrijo a sentença para fixar os critérios de atualização do débito, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL TOTAL E PERMANENTE. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. GOZO DE BENEFÍCIO. TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.
1.Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio doença previdenciário.
2. O valor total a condenação será inferior à importância de 1.000 (mil) salários mínimos estabelecida no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil de 2015. Preliminar de reexame necessário rejeitada.
3.Laudo médico pericial indica a existência de incapacidade laboral total e permanente para as atividades habituais que enseja a concessão do auxílio-doença.
4.Qualidade de segurado e carência cumprida. O conjunto probatório indica que a incapacidade apurada teve início enquanto a parte autora mantinha a qualidade de segurado.
5. Benefício concedido por decisão judicial, posteriormente revogada. Mantida a qualidade de segurado.
6. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR - Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux, observado quanto a este o termo inicial a ser fixado pela Suprema Corte no julgamento dos embargos de declaração. Correção de ofício.
7. Considerando o não provimento do recurso do INSS, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%.
8. Preliminar rejeitada. Apelação não provida. Sentença corrigida de ofício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar de reexame necessário, negar provimento ao apelo do INSS e, de oficio, corrigir a sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.