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PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88. LEI N. 8. 742/93 E 12. 435/2011. ...

Data da publicação: 12/07/2020, 00:18:29

PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88. LEI N. 8.742/93 E 12.435/2011. NÃO COMPROVADAS A DEFICIÊNCIA E A MISERABILIDADE. BENEFÍCIO INDEVIDO. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Não há falar-se em ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa pela não realização da prova testemunhal, na medida em que a questão fática controvertida nos presentes autos é eminentemente técnica. Preliminar rejeitada. 2. No mérito, discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011. 3. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família. 4. No caso vertente, a parte autora requereu o benefício assistencial por ser deficiente. Segundo prova emprestada, consubstanciada em laudo pericial retirado dos autos da ação de aposentadoria por invalidez com pedido subsidiário de auxílio-doença (27/7/2011), o autor é portador de sequela neurológica grave pós Prostatectomia por via alta- incontinência urinária grave (uso constante de fralda geriátrica), irreversível, o que lhe acarreta incapacidade total e permanente para as atividades laborativas. 5. O perito judicial constatou ser ela portadora de males que a incapacitam de forma total e permanente para o trabalho, mas não foi propriamente cumprido o requisito do inciso II do § 2º da Lei nº 8.742/93. 6. Sua limitação precípua, no caso, segundo a perícia, encontra-se no campo do trabalho, não nas interações sociais. 7. Parece-me que, no caso presente, a parte autora não possui o grau necessário de impedimento, pois não há incapacidade, ainda que parcial, para a vida independente. 8. Enfim, trata-se de doença, geradora de invalidez para o trabalho, risco social coberto pela previdência social, cuja cobertura depende do pagamento de contribuições, na forma dos artigos 201, caput e inciso I, da Constituição Federal. 9. Quanto à hipossuficiência econômica, o estudo social (25/9/2014) revela que a parte autora reside com sua esposa, 54 anos, e filho, 18 anos. 10. A família sobrevive do trabalho do casal na coleta de reciclados, e do trabalho formal do filho. 11. O autor ajuda sua esposa, dentro de suas possibilidades, já que não pode fazer esforço físico, na coleta dos reciclados, pelo que auferem uma renda de R$ 480,00 (quatrocentos e oitenta) reais. 12. O filho trabalha como repositor de mercadorias, no Supermercado Bia Vista, pelo que recebe o salário de R$ 905,00. 13. O grupo familiar recebe, ainda, uma renda de R$ 80,00 (oitenta) reais, relativas ao programa Renda Cidadã. 14. Destaco, por oportuno, que, para o cômputo da renda familiar, devem ser considerados apenas os rendimentos estáveis, porquanto se provenientes de fontes volúveis, sujeitos a bruscas variações, não se pode inferir com certeza se tal grupo continuaria a percebê-los ou se o seu montante seria reduzido. 15. Noutro passo, a ajuda financeira, advinda do programa governamental de combate à pobreza, não pode ser computada para fins de cálculo da renda per capita, seja pela sua instabilidade, seja por conta da orientação contida no item 16.7 da OI INSS/DIRBEN n. 81, de 15 de janeiro de 2003. Assim como, a renda advinda da coleta de material reciclado. 16. De todo modo, a renda auferida pelo filho, atualmente estimada em R$ 1.463,34- julho/2016, faz com que as circunstâncias fáticas não impliquem situação de miserabilidade. 17. Com efeito, trata-se de renda mensal per capita incompatível com o critério de miserabilidade jurídica estabelecida no artigo 20, § 3º, da LOAS. 18. Cumpre salientar que o benefício de prestação continuada foi previsto, na impossibilidade de atender a um público maior, para socorrer os desamparados (artigo 6º, caput, da CF), ou seja, àquelas pessoas que sequer teriam possibilidade de equacionar um orçamento doméstico, pelo fato de não terem renda ou de ser essa insignificante. Mas o presente caso, a situação é diversa. 19. Apelação da parte autora desprovida. 20. Fica mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados pelo MMº Juízo a quo, mas suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita. Considerando que a apelação foi interposta antes da vigência do Novo CPC, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, § 1º, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal. (TRF 3ª Região, NONA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2114408 - 0041736-27.2015.4.03.9999, Rel. JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS, julgado em 12/09/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/09/2016 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 27/09/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0041736-27.2015.4.03.9999/SP
2015.03.99.041736-1/SP
RELATOR:Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias
APELANTE:SEBASTIAO RIBEIRO DE PAES
ADVOGADO:SP278866 VERONICA GRECCO
APELADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO:SP252435 MARIA CAMILA COSTA DE PAIVA
:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
No. ORIG.:14.00.00001-8 1 Vr MONTE ALTO/SP

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88. LEI N. 8.742/93 E 12.435/2011. NÃO COMPROVADAS A DEFICIÊNCIA E A MISERABILIDADE. BENEFÍCIO INDEVIDO. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Não há falar-se em ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa pela não realização da prova testemunhal, na medida em que a questão fática controvertida nos presentes autos é eminentemente técnica. Preliminar rejeitada.
2. No mérito, discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
3. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
4. No caso vertente, a parte autora requereu o benefício assistencial por ser deficiente. Segundo prova emprestada, consubstanciada em laudo pericial retirado dos autos da ação de aposentadoria por invalidez com pedido subsidiário de auxílio-doença (27/7/2011), o autor é portador de sequela neurológica grave pós Prostatectomia por via alta- incontinência urinária grave (uso constante de fralda geriátrica), irreversível, o que lhe acarreta incapacidade total e permanente para as atividades laborativas.
5. O perito judicial constatou ser ela portadora de males que a incapacitam de forma total e permanente para o trabalho, mas não foi propriamente cumprido o requisito do inciso II do § 2º da Lei nº 8.742/93.
6. Sua limitação precípua, no caso, segundo a perícia, encontra-se no campo do trabalho, não nas interações sociais.
7. Parece-me que, no caso presente, a parte autora não possui o grau necessário de impedimento, pois não há incapacidade, ainda que parcial, para a vida independente.
8. Enfim, trata-se de doença, geradora de invalidez para o trabalho, risco social coberto pela previdência social, cuja cobertura depende do pagamento de contribuições, na forma dos artigos 201, caput e inciso I, da Constituição Federal.
9. Quanto à hipossuficiência econômica, o estudo social (25/9/2014) revela que a parte autora reside com sua esposa, 54 anos, e filho, 18 anos.
10. A família sobrevive do trabalho do casal na coleta de reciclados, e do trabalho formal do filho.
11. O autor ajuda sua esposa, dentro de suas possibilidades, já que não pode fazer esforço físico, na coleta dos reciclados, pelo que auferem uma renda de R$ 480,00 (quatrocentos e oitenta) reais.
12. O filho trabalha como repositor de mercadorias, no Supermercado Bia Vista, pelo que recebe o salário de R$ 905,00.
13. O grupo familiar recebe, ainda, uma renda de R$ 80,00 (oitenta) reais, relativas ao programa Renda Cidadã.
14. Destaco, por oportuno, que, para o cômputo da renda familiar, devem ser considerados apenas os rendimentos estáveis, porquanto se provenientes de fontes volúveis, sujeitos a bruscas variações, não se pode inferir com certeza se tal grupo continuaria a percebê-los ou se o seu montante seria reduzido.
15. Noutro passo, a ajuda financeira, advinda do programa governamental de combate à pobreza, não pode ser computada para fins de cálculo da renda per capita, seja pela sua instabilidade, seja por conta da orientação contida no item 16.7 da OI INSS/DIRBEN n. 81, de 15 de janeiro de 2003. Assim como, a renda advinda da coleta de material reciclado.
16. De todo modo, a renda auferida pelo filho, atualmente estimada em R$ 1.463,34- julho/2016, faz com que as circunstâncias fáticas não impliquem situação de miserabilidade.
17. Com efeito, trata-se de renda mensal per capita incompatível com o critério de miserabilidade jurídica estabelecida no artigo 20, § 3º, da LOAS.
18. Cumpre salientar que o benefício de prestação continuada foi previsto, na impossibilidade de atender a um público maior, para socorrer os desamparados (artigo 6º, caput, da CF), ou seja, àquelas pessoas que sequer teriam possibilidade de equacionar um orçamento doméstico, pelo fato de não terem renda ou de ser essa insignificante. Mas o presente caso, a situação é diversa.
19. Apelação da parte autora desprovida.
20. Fica mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados pelo MMº Juízo a quo, mas suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita. Considerando que a apelação foi interposta antes da vigência do Novo CPC, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, § 1º, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 12 de setembro de 2016.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0041736-27.2015.4.03.9999/SP
2015.03.99.041736-1/SP
RELATOR:Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias
APELANTE:SEBASTIAO RIBEIRO DE PAES
ADVOGADO:SP278866 VERONICA GRECCO
APELADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO:SP252435 MARIA CAMILA COSTA DE PAIVA
:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
No. ORIG.:14.00.00001-8 1 Vr MONTE ALTO/SP

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Cuida-se de apelação interposta por Sebastião Ribeiro de Paes em face de sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício assistencial de amparo social.

Alega, em síntese, preliminar de cerceamento de defesa, porquanto não lhe fora dada oportunidade de produção da prova oral requerida. No mérito, sustenta que preenche todos os requisitos necessários à concessão do benefício.

O INSS não apresentou contrarrazões.

O DD. Órgão do Ministério Público Federal sugere o provimento do recurso de apelação.

VOTO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.

Preliminarmente, não merece prosperar a alegação de cerceamento de defesa.

Não há falar-se em ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa pela não realização da prova testemunhal, na medida em que a questão fática controvertida nos presentes autos é eminentemente técnica.

Deste modo, mostrando-se a prova pericial suficiente para aferir o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício, o juiz pode indeferir outros meios de prova que julgar desnecessários para o deslinde da causa.

Assim determina o artigo 130 do Código de Processo Civil/73 (parágrafo único do artigo 370 do NCPC), bem como os fundamentos do princípio da economia processual.

Passo, então, ao exame do mérito.

Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.

Essa lei deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

Na hipótese de postulante idoso, a idade mínima de 70 (setenta) anos foi reduzida para 67 (sessenta e sete) anos pela Lei n. 9.720/98, a partir de 1º de janeiro de 1998, e, mais recentemente, para 65 (sessenta e cinco) anos, com a entrada em vigor do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03).

O artigo 20 da Lei n. 8.742/93 estabelecia, ainda, para efeitos da concessão do benefício, os conceitos de família (conjunto de pessoas do art. 16 da Lei n. 8.213/91, desde que vivendo sob o mesmo teto - § 1º), de pessoa portadora de deficiência (aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho - § 2º) e de família incapacitada de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa (aquela com renda mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - § 3º).

A Lei n. 12.435, vigente desde 7/7/2011, alterou os §§ 1º e 2º do artigo 20 da Lei n. 8.742/93, estabelecendo que a família, para fins de concessão do benefício assistencial, deve ser aquela composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

No que se refere ao conceito de pessoa portadora de deficiência - previsto no § 2º da Lei n. 8.742/93 -, passou a ser considerada aquela com impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, possam obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Assim, ratificou-se o entendimento consolidado nesta Corte de que o rol previsto no artigo 4º do Decreto n. 3.298/99 (regulamentar da Lei n. 7.853/89, que dispõe sobre a Política Nacional da Pessoa Portadora de Deficiência) não era exaustivo; portanto, constatado que os males sofridos pelo postulante impedem sua inserção social, restará preenchido um dos requisitos exigidos para a percepção do benefício.

Já o critério do § 3º do artigo 20 da Lei n. 8.742/93 não impede o julgador de levar em conta outros dados, a fim de identificar a situação de vida do idoso ou do deficiente, principalmente quando estiverem presentes peculiaridades, a exemplo de necessidades especiais com medicamentos ou com educação. Deve-se verificar, na questão in concreto, a ocorrência de situação de pobreza - entendida como a de falta de recursos e de acesso ao mínimo existencial -, a fim de se concluir por devida a prestação pecuniária da assistência social constitucionalmente prevista.

Logo, a presunção objetiva absoluta de miserabilidade, da qual fala a Lei, não afasta a possibilidade de comprovação da condição de miserabilidade por outros meios de prova, conforme precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça (REsp n. 435.871, 5ª Turma Rel. Min. Felix Fischer, j. 19/9/2002, DJ 21/10/2002, p. 61, REsp n. 222.764, STJ, 5ªT., Rel. Min. Gilson Dipp, j. 13/2/2001, DJ 12/3/2001, p. 512; REsp n. 223.603/SP, STJ, 5ª T., Rel. Min. Edson Vidigal, DJU 21/2/2000, p. 163).

O próprio Supremo Tribunal Federal recentemente reviu seu posicionamento ao reconhecer que o requisito do artigo 20, §3º, da Lei n. 8.742/93 não pode ser considerado taxativo (STF, RE n. 580963, Tribunal Pleno, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe n. 225, 14/11/2013).

A decisão concluiu que a mera interpretação gramatical do preceito, por si só, pode resultar no indeferimento da prestação assistencial em casos que, embora o limite legal de renda per capita seja ultrapassado, evidenciam um quadro de notória hipossuficiência econômica.

Essa insuficiência da regra decorre não só das modificações fáticas (políticas, econômicas e sociais), mas principalmente das alterações legislativas que ocorreram no País desde a edição da Lei Orgânica da Assistência Social, em 1993.

A legislação federal recente, por exemplo, reiterada pela adoção de vários programas assistenciais voltados a famílias carentes, considera pobres aqueles com renda mensal per capita de até meio salário-mínimo (nesse sentido, a Lei n. 9.533, de 10/12/97 - regulamentada pelos Decretos n. 2.609/98 e 2.728/99; as Portarias n. 458 e 879, de 3/12/2001, da Secretaria da Assistência Social; o Decreto n. 4.102/2002; a Lei n. 10.689/2003, criadora do Programa Nacional de Acesso à Alimentação).

Em conclusão, não há como considerar o critério previsto no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 como absoluto e único para a aferição da situação de miserabilidade, até porque o próprio Estado Brasileiro elegeu outros parâmetros, como os defluentes da legislação acima citada.

No caso vertente, a parte autora requereu o benefício assistencial por ser deficiente. Segundo prova emprestada, consubstanciada em laudo pericial retirado dos autos da ação de aposentadoria por invalidez com pedido subsidiário de auxílio-doença (27/7/2011), o autor é portador de sequela neurológica grave pós Prostatectomia por via alta- incontinência urinária grave (uso constante de fralda geriátrica), irreversível, o que lhe acarreta incapacidade total e permanente para as atividades laborativas.

Contudo, eis o teor do artigo 20, § 2º, da LOAS, com a redação vigente na data do requerimento e da propositura desta ação.

"§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se: (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

I - pessoa com deficiência: aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas; (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)"

O perito judicial constatou ser ela portadora de males que a incapacitam de forma total e permanente para o trabalho, mas não foi propriamente cumprido o requisito do inciso II do § 2º da Lei nº 8.742/93.

Sua limitação precípua, no caso, segundo a perícia, encontra-se no campo do trabalho, não nas interações sociais.

Parece-me que, no caso presente, a parte autora não possui o grau necessário de impedimento, pois não há incapacidade, ainda que parcial, para a vida independente.

Enfim, trata-se de doença, geradora de invalidez para o trabalho, risco social coberto pela previdência social, cuja cobertura depende do pagamento de contribuições, na forma dos artigos 201, caput e inciso I, da Constituição Federal.

Outrossim, quanto à hipossuficiência econômica, o estudo social (25/9/2014) revela que a parte autora reside com sua esposa, 54 anos, e filho, 18 anos.

A família sobrevive do trabalho do casal na coleta de reciclados, e do trabalho formal do filho.

O autor ajuda sua esposa, dentro de suas possibilidades, já que não pode fazer esforço físico, na coleta dos reciclados, pelo que auferem uma renda de R$ 480,00 (quatrocentos e oitenta) reais.

O filho trabalha como repositor de mercadorias, no Supermercado Bia Vista, pelo que recebe o salário de R$ 905,00.

O grupo familiar recebe, ainda, uma renda de R$ 80,00 (oitenta) reais, relativas ao programa Renda Cidadã.

Destaco, por oportuno, que, para o cômputo da renda familiar, devem ser considerados apenas os rendimentos estáveis, porquanto se provenientes de fontes volúveis, sujeitos a bruscas variações, não se pode inferir com certeza se tal grupo continuaria a percebê-los ou se o seu montante seria reduzido.

Noutro passo, a ajuda financeira, advinda do programa governamental de combate à pobreza, não pode ser computada para fins de cálculo da renda per capita, seja pela sua instabilidade, seja por conta da orientação contida no item 16.7 da OI INSS/DIRBEN n. 81, de 15 de janeiro de 2003. Assim como, a renda advinda da coleta de material reciclado.

De todo modo, a renda auferida pelo filho, atualmente estimada em R$ 1.463,34- julho/2016, faz com que as circunstâncias fáticas não impliquem situação de miserabilidade.

Com efeito, trata-se de renda mensal per capita incompatível com o critério de miserabilidade jurídica estabelecida no artigo 20, § 3º, da LOAS.

Cumpre salientar que o benefício de prestação continuada foi previsto, na impossibilidade de atender a um público maior, para socorrer os desamparados (artigo 6º, caput, da CF), ou seja, àquelas pessoas que sequer teriam possibilidade de equacionar um orçamento doméstico, pelo fato de não terem renda ou de ser essa insignificante. Mas o presente caso, a situação é diversa.

Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, nego provimento à apelação.

Fica mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados pelo MMº Juízo a quo, mas suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita. Considerando que a apelação foi interposta antes da vigência do Novo CPC, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, § 1º, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.

Dê-se ciência desta decisão ao DD. Órgão do Ministério Público Federal.

É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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