D.E. Publicado em 22/08/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial tida por ocorrida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | PAULO SERGIO DOMINGUES:10112 |
Nº de Série do Certificado: | 27A84D87EA8F9678AFDE5F2DF87B8996 |
Data e Hora: | 09/08/2016 14:51:10 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017359-55.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de deficiência ou incapacitada para o trabalho.
A sentença julgou procedente o pedido, para condenar o INSS a pagar o benefício pleiteado desde a data do indeferimento administrativo (08.01.2002 - fls. 23), observada a prescrição quinquenal. Determinou que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas com juros e correção monetária, constados do vencimento de cada parcela em atraso, nos termos da Lei 8.213/91. Juros moratórios no valor de 0,5% ao mês nos termos da Lei 11.960/09, devidos a partir da citação, nos termos da Súmula 204 do STJ, de forma englobada até a mesma, e, de modo decrescente, mês a mês. A partir de então, de acordo com os índices oficiais de remuneração básica aplicados à caderneta de poupança, nos termos da Lei 11.90/09, observado o estabelecido no art. 41 da Lei 8.213/91. Os valores em atraso serão atualizados nos termos do art. 41-A da Lei 8.213/91 e posteriores, aplicando-se a Lei 11.960/09 até a inscrição do precatório e, a partir de então, IPCA-e, nos termos do art. 27 da Lei 13.080/2015. Aplica-se o IPCA-E a partir de 26/03/2015 para correção dos créditos em precatório por decisão do STF na modulação dos efeitos da EC 62/09 (ADIns 4357 e 4425).
Apela o INSS requerendo a reforma do julgado, alegando para tanto que a parte autora não logrou êxito em comprovar seu estado de miserabilidade. Subsidiariamente, caso mantida a procedência do pedido, pugna pela reforma da sentença no tocante ao termo inicial do benefício.
Contrarrazões pela parte autora.
O Ministério Público opinou pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, considerando que a sentença foi proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, passo ao exame da admissibilidade da remessa oficial prevista no seu artigo 475.
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (08.01.2002 - fls. 23), seu valor aproximado e a data da sentença (26.06.2015 - fls. 119), que o valor total da condenação alcançará a importância de 60 (sessenta) salários mínimos estabelecida no § 2º.
Assim, tenho por ocorrida a remessa oficial.
Passo ao exame do mérito.
A questão vertida nos presentes autos diz respeito à exigência de comprovação dos requisitos legais para a obtenção do benefício assistencial previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
Verifico que conforme cópia do documento de identidade de fls. 13, tendo a parte autora nascido em 10 de maio de 1973, conta atualmente com 43 anos de idade, e assim, o pleito baseia-se em suposta deficiência ou incapacidade da postulante, que restou incontroversa ante a falta de impugnação no apelo.
Assim, restando atendido um dos critérios fixados no caput do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011 c/c o art. 34 da Lei nº 10.741/2003, necessário averiguar-se o preenchimento do requisito da miserabilidade, uma vez que a lei exige a concomitância de ambos para que o benefício assistencial possa ser concedido.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
Com relação ao cálculo da renda per capita, a Lei 10.741/03 assim preceitua:
"Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - Loas. (Vide Decreto nº 6.214, de 2007)
Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas."
Entretanto, a Suprema Corte, no RE 580.963/PR, sob regime de repercussão geral, declarou a inconstitucionalidade parcial, por omissão, sem pronúncia de nulidade da norma em comento, ante a inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em, relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo.
E nesse sentido, assim o Colendo Superior Tribunal de Justiça decidiu em sede de julgamento de recurso repetitivo: "(...) 2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93." RECURSO REPETITIVO (Tema: 640) REsp 1355052 / SP RECURSO ESPECIAL 2012/0247239-5 Relator(a) Ministro BENEDITO GONÇALVES (1142)Órgão Julgador S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data do Julgamento 25/02/2015, Data da Publicação/Fonte DJe 05/11/2015)
Indo mais além, a constitucionalidade do próprio § 3º, artigo 20 da Lei 8742/93, também foi questionada na ADI 1.232-1/DF, que, todavia, foi julgada improcedente.
Embora reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelece situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impede o exame de situações específicas do caso concreto, a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Ou seja, a verificação da renda per capita familiar seria uma das formas de aferição de miserabilidade, mas não a única.
Neste sentido decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.112.557-MG:
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade e o entendimento firmado no julgamento da ADI 1.232-DF levou a Corte Suprema a enfrentar novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993. O julgado reconheceu a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
O reconhecimento da inconstitucionalidade parcial sem nulidade do § 3º, art. 20 da Lei 8742/93 indica que a norma só é inconstitucional naquilo em que não disciplinou, não tendo sido reconhecido a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência.
Cabe ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial, e suprimir a inconstitucionalidade apontada.
Dessa forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
Tecidas tais considerações, no caso concreto o estudo social de fls. 75/80 revela que a parte autora reside com sua mãe, uma irmã e uma sobrinha, em casa própria, de alvenaria, com quarto, sala, cozinha e banheiro, guarnecida com móveis e utensílios suficientes. A região é servida de todos os melhoramentos públicos, tais como água, esgoto, energia elétrica, iluminação pública, linhas de ônibus, etc.
A renda da família advém da aposentadoria da mãe da autora no valor de R$ 1.000,00 (fls. 16), somado ao salário da irmã da requerente no valor de R$ 724,00, totalizando R$ 1.724,00.
Relataram despesas no importe de R$ 559,00.
Em que pese a ausência de rendimentos verifica-se que a autora está amparada pela família.
Consta do relatório social que a autora recebe medicamentos da rede pública de saúde, e exceção feita à requerente, não há outros membros da família acometidos de doenças graves ou com deficiência.
A autora frequenta a APAE e nota-se que que embora a família viva de forma humilde, não há noticia de que as suas necessidades básicas não estejam sendo supridas, e nesse sentido, importante ressaltar que o benefício assistencial não se presta à complementação de renda.
Desta forma, diante do conjunto probatório que se apresenta nos presentes autos, verifico que não restou preenchido o requisito de miserabilidade necessário à concessão do benefício assistencial pleiteado.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado que ora fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, de acordo com o §4º do artigo 20 do Código de Processo Civil/1973, considerando que o recurso foi interposto na sua vigência, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no artigo 12 da Lei nº 1.060/50.
Diante do exposto DOU PROVIMENTO à apelação da autarquia e à remessa oficial, tida por ocorrida, para julgar improcedente o pedido da parte autora.
É o voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | PAULO SERGIO DOMINGUES:10112 |
Nº de Série do Certificado: | 27A84D87EA8F9678AFDE5F2DF87B8996 |
Data e Hora: | 09/08/2016 14:51:14 |