D.E. Publicado em 12/12/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial, tida por ocorrida, bem como ao recurso de apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004240-03.2011.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de período trabalhado em no labor rural e seu cômputo aos demais períodos urbanos.
A sentença julgou procedente o pedido, reconhecendo como laborado em atividade rural todo o período indicado na exordial, condenando o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a conceder ao autor aposentadoria por tempo de contribuição integral, desde 04.09.2009 (data da citação), corrigidas as parcelas atrasadas mediante os critérios da Tabela Prática do Tribunal de Justiça de São Paulo, acrescidas de juros moratórios fixados em 1% ao mês, respeitada a prescrição quinquenal. Condenou o réu a pagar honorários de advogado, fixados em 10% sobre o valor da condenação, nos termos da Súmula 111 do STJ.
Sentença não foi submetida à remessa oficial.
O INSS recorre, alegando que a parte autora não comprovou períodos de atividade rural indicados na exordial, não fazendo jus à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
Com as contrarrazões, vieram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação da parte autora.
Tendo em vista que a sentença, proferida anteriormente à Lei nº 13.105/2015, tem cunho declaratório e, no caso concreto, é impossível aferir ou definir o valor econômico dela decorrente, entendo inaplicável ao caso o disposto no §2º do art. 475 do Código de Processo Civil de 1973, que dispensa o reexame necessário apenas na hipótese de a condenação, ou o direito controvertido, ser de valor certo e não exceder 60 (sessenta) salários mínimos (cf. STJ, Corte Especial, EResp 600596, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. 04/11/2009, v.u., DJE 23/11/2009).
Assim, tenho por ocorrida a remessa oficial.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição - requisitos
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço (25 anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher e 35 anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do ordenamento anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por tempo de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu art. 9º, caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Atualmente, são requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30 anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda Constitucional 20/98.
Tempo de serviço rural anterior e posterior à Lei de Benefícios
A aposentadoria do trabalhador rural apresenta algumas especificidades, em razão sobretudo da deficiência dos programas de seguridade voltados a essa categoria de trabalhadores no período anterior à Constituição Federal de 1988 e do descumprimento da legislação trabalhista no campo. Assim é que, no seu art. 55, §2º, a Lei 8.213/91 estabeleceu ser desnecessário o recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural, exceto para efeito de carência. Neste sentido, já decidiu esta E. Corte: SÉTIMA TURMA, APELREEX 0005026-42.2014.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 21/07/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:31/07/2014 e TERCEIRA SEÇÃO, AR 0037095-93.2010.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELSON BERNARDES, julgado em 28/11/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2013.)
Já em relação ao tempo de serviço rural trabalhado a partir da competência de novembro de 1991 (art. 55, §2º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 60, X, do Decreto 3.048/99), ausente o recolhimento das contribuições, somente poderá ser aproveitado pelo segurado especial para obtenção dos benefícios previstos no art. 39, I, da Lei 8.213/91.
A prova do exercício de atividade rural
Muito se discutiu acerca da previsão contida no art. 55, §3º, da Lei de Benefícios, segundo a qual a comprovação do tempo de serviço exige início de prova material. O que a Lei nº 8.213/91 exige é apenas o início de prova material e é esse igualmente o teor da Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça.
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Exigir documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se quer reconhecer equivaleria a erigir a prova documental como a única válida na espécie, com desconsideração da prova testemunhal produzida, ultrapassando-se, em desfavor do segurado, a exigência legal. Neste sentido, o C. STJ: AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014.
Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira, bem como da filha solteira residente na casa paterna. (REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ de 14/3/2005)
Idade mínima para o trabalho rural
Não se olvida que há jurisprudência no sentido de admitir-se o labor rural a partir dos 12 (doze) anos de idade, por ser realidade comum no campo, segundo as regras ordinárias de experiência, mormente se a prova testemunhal é robusta e reforçada por documentos que indicam a condição de lavradores dos pais do segurado.
O raciocínio invocado em tais decisões é o de que a norma constitucional que veda o trabalho ao menor de 16 anos visa à sua proteção, não podendo ser invocada para, ao contrário, negar-lhe direitos. (RESP 200200855336, Min. Jorge Scartezzini, STJ - Quinta Turma, DJ 02/08/2004, p. 484.).
Tal ponderação não é isenta de questionamentos. De fato, emprestar efeitos jurídicos para situação que envolve desrespeito a uma norma constitucional, ainda que para salvaguardar direitos imediatos, não nos parece a solução mais adequada à proposta do constituinte - que visava dar ampla e geral proteção às crianças e adolescentes, adotando a doutrina da proteção integral, negando a possibilidade do trabalho infantil.
Não se trata, assim, de restringir direitos ao menor que trabalha, mas sim, de evitar que se empreste efeitos jurídicos, para fins previdenciários, de trabalho realizado em desacordo com a Constituição. Considero, desta forma, o ordenamento jurídico vigente à época em que o(a) autor(a) alega ter iniciado o labor rural para admiti-lo ou não na contagem geral do tempo de serviço, para o que faço as seguintes observações:
As Constituições Brasileiras de 1824 e 1891 não se referiram expressamente à criança e adolescente tampouco ao trabalho infantil.
A Constituição de 1934 foi a primeira a tratar expressamente da proteção à infância e à juventude e em seu artigo 121 consagrou, além de outros direitos mais favoráveis aos trabalhadores, a proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores de 16 anos; e de trabalho em indústrias insalubres para menores de 18 anos.
Por sua vez, a Constituição de 1937, repetiu a fórmula da proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores de 16 anos e de trabalho em indústrias insalubres para menores de 18 anos.
A Constituição de 1946 elevou a idade mínima para a execução de trabalho noturno de 16 para 18 anos, mantendo as demais proibições de qualquer trabalho para menores de 14 anos e em indústrias insalubres para menores de 18 anos, além de proibir a diferença de salário para o mesmo trabalho por motivo de idade.
A Constituição de 1967, embora tivesse mantido a proibição para o trabalho noturno e insalubre para menores de 18 anos, reduziu de 14 para 12 anos a idade mínima para qualquer trabalho.
Por fim, a Constituição da República de 1988, proíbe o trabalho noturno, perigoso e insalubre para os menores de 18 anos; e, inicialmente, de qualquer trabalho para menores de 14 anos, como constava nas Constituições de 1934, 1937 e 1946. Todavia, com a Emenda Constitucional 20, de 1998, a idade mínima foi elevada para 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir de 14 anos.
Entretanto, em atenção ao entendimento consolidado nesta E. 7ª Turma, no sentido de considerar as peculiaridades de um Brasil com elevado contingente populacional no meio rural antes da década de 70, admito, para o cômputo geral do tempo de serviço, o trabalho rural desenvolvido antes da Constituição de 1967, a partir dos 12 anos de idade. A partir da Constituição Federal de 1988, todavia, prevalece as idade nela estabelecida.
Caso concreto - elementos probatórios
Atividade rural
A parte autora, nascida em 19.10.1956, trouxe aos autos, para comprovar o exercício de atividade rural:
- Declaração do Sindicato Rural de Junqueirópolis/SP, comprovando a filiação de seu irmão, onde ela é indicada como beneficiária (fls. 12/13);
- Declaração do Sindicato Rural de Junqueirópolis, da própria autora, indicando sua atividade rural (fls. 14/15);
- Escritura de Imóvel Rural de terceiros (fl. 17);
- Escritura de Imóvel Rural de propriedade de sua família (fl. 20), adquirido em 1983;
- Título Eleitoral, expedido em 1976, que aponta sua qualificação como doméstica (fl. 19);
- Notas Fiscais de produção agrícola, comercializadas por seu pai, nos anos de 1988, 1985 e de 1987 a 1989 (fls. 22/23).
As testemunhas, ouvidas às fls. 65/66, confirmaram o trabalho rural desenvolvido pela parte autora, vez que eram vizinhos, o qual se dava na lavoura de café e se iniciou aproximadamente no ano de 1970, perdurando por cerca de 13 anos, até 1983, quando sua família adquiriu uma propriedade rural e passou a trabalhar em regime de economia familiar, sem auxílio de empregados.
A sentença reconheceu todo o tempo de trabalho rural alegado pela autora em sua exordial, qual seja de outubro de 1968 (quando completou 12 anos) a 31.03.1978 (data anterior ao primeiro vínculo urbano com registro em CTPS).
A prova documental e também testemunhal são bastante frágeis.
As Declarações prestadas pelo Sindicato Rural de Junqueirópolis/SP são unilaterais e, portanto, equivalem a prova testemunhal.
A Escritura de Imóvel Rural de terceiros não comprova a atividade rural desenvolvida pela autora, mas tão somente o direito de propriedade de outrem.
Convém à parte autora a Escritura de Imóvel Rural de propriedade de sua família (fl. 20), adquirido em 1983, bem como a prova consubstanciada nas Notas Fiscais de produção agrícola, comercializada por seu pai, nos anos de 1988, 1985 e de 1987 a 1989, elementos probatórios que são corroborados pela prova testemunhal, acima referenciada.
Por outro lado, há que se constatar que o Título Eleitoral da parte autora, expedido em 1976, qualifica-a como doméstica, o que obsta seja considerado como de atividade rural todo o longo período pretendido na exordial, qual seja de 1968 a 1989.
Desta forma, deve ser reformada a sentença, para reconhecer o tempo de trabalho rural exercido informalmente pela parte autora apenas no período de 01.01.1983 a 31.03.1989, exceto para efeitos de carência.
Assim, o período anotado na CTPS acrescido do tempo rural aqui declarado, não perfaz o tempo suficiente, nem a carência necessária à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço proporcional e tampouco a integral, motivo pelo qual deve ser julgado parcialmente procedente o pedido, para apenas reconhecer a atividade rural exercida no período de 01.01.1983 a 31.03.1989.
Com relação aos honorários de advogado, estes devem ser mantidos na forma como fixados na sentença, considerando que o recurso foi interposto na vigência do Código de Processo Civil /1973, não se aplicando as normas dos §§ 1º a 11º do artigo 85 do CPC/2015, inclusive no que pertine à sucumbência recursal, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal (Enunciado Administrativo nº 7/STJ).
No mais, em sede de remessa oficial, mantenho a sentença recorrida.
Ante o exposto, dou parcial provimento à remessa oficial, tida por ocorrida, bem como ao recurso de apelação do INSS, para reconhecer o tempo de trabalho rural exercido informalmente pela parte autora apenas no período de 01.01.1983 a 31.03.1989, mantendo no restante a sentença recorrida.
É o voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | PAULO SERGIO DOMINGUES:10078 |
Nº de Série do Certificado: | 112317020459EA07 |
Data e Hora: | 28/11/2017 16:17:27 |