D.E. Publicado em 30/03/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e fixar, de ofício, os consectários legais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001677-86.2009.4.03.6125/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de pedido de aposentadoria especial, ajuizado por Salvador Dejano em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Contestação do INSS às fls. 90/92, na qual sustenta o não enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como sendo de natureza especial, requerendo, ao final, a improcedência total do pedido.
Réplica da parte autora às fls. 105/106.
Sentença às fls. 190/199, pela improcedência do pedido.
Apelação da parte autora às fls. 203/211, pelo integral acolhimento do pedido formulado na exordial.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 10.11.1955, o reconhecimento do exercício de atividades especiais nos períodos de 02.12.1974 a 09.01.1975, 05.05.1976 a 01.01.1977, 01.02.1977 a 02.05.1977, 01.09.1977 a 30.11.1977, 03.10.1978 a 27.10.1978, 01.12.1978 a 30.07.1979, 01.09.1979 a 05.10.1979, 01.01.1980 a 27.09.1980, 06.03.1981 a 31.01.1985, 01.02.1985 a 05.03.1987, 09.03.1987 a 06.04.1987, 08.05.1987 a 18.03.1988, 01.04.1988 a 08.06.1988, 12.07.1988 a 16.05.1989, 22.05.1989 a 30.03.1991, 19.04.1991 a 11.09.1997, 01.10.1997 a 09.02.1998, 10.02.1998 a 30.06.2002, 01.07.2002 a 30.04.2004, 01.05.2004 a 06.08.2004, 03.01.2005 a 30.03.2005 e 27.04.2005 a 01.07.2005, e a concessão do benefício de aposentadoria especial, a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 16.06.2008).
Para elucidação da controvérsia, cumpre distinguir a aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo diploma legal, pois a primeira pressupõe o exercício de atividade laboral considerada especial, pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, sendo que, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da EC 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, nem submissão ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição pode haver tanto o exercício de atividades especiais como o exercício de atividades comuns, sendo que os períodos de atividade especial sofrem conversão em atividade comum, aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da EC 20/98.
Da atividade especial.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que "(...) A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...)". Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96, tal dispositivo legal teve sua redação alterada, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação foi definida apenas com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV). Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal disposição somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual a apresentação de laudo técnico só pode ser exigida a partir dessa última data. Nesse sentido é o entendimento majoritário do E. STJ:
Assim, em tese, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030 (exceto para o agente nocivo ruído, por depender de prova técnica).
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à saúde. Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao C. Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do Código de Processo Civil (Recurso Especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, na forma que segue:
Dessa forma, deve-se considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a nível de ruído superior a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, superior a 90 decibéis e, a partir de então, superior a 85 decibéis.
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente porque a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica tende a propiciar condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas: i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
NO CASO DOS AUTOS, não foi juntado o cálculo do tempo de contribuição efetuado na via administrativa. Portanto, a controvérsia engloba o reconhecimento da natureza especial das atividades exercidas nos períodos de 02.12.1974 a 09.01.1975, 05.05.1976 a 01.01.1977, 01.02.1977 a 02.05.1977, 01.09.1977 a 30.11.1977, 03.10.1978 a 27.10.1978, 01.12.1978 a 30.07.1979, 01.09.1979 a 05.10.1979, 01.01.1980 a 27.09.1980, 06.03.1981 a 31.01.1985, 01.02.1985 a 05.03.1987, 09.03.1987 a 06.04.1987, 08.05.1987 a 18.03.1988, 01.04.1988 a 08.06.1988, 12.07.1988 a 16.05.1989, 22.05.1989 a 30.03.1991, 19.04.1991 a 11.09.1997, 01.10.1997 a 09.02.1998, 10.02.1998 a 30.06.2002, 01.07.2002 a 30.04.2004, 01.05.2004 a 06.08.2004, 03.01.2005 a 30.03.2005 e 27.04.2005 a 01.07.2005.
Ocorre que, nos períodos de 02.12.1974 a 09.01.1975, 01.02.1985 a 05.03.1987, 09.03.1987 a 06.04.1987, 08.05.1987 a 18.03.1988, 01.04.1988 a 08.06.1988, a parte autora, nas atividades de ajudante de caldeiraria, foguista no setor de caldeiras, oficial caldeireiro e encarregado de caldeira, esteve exposta a agentes prejudiciais à saúde e à integridade física (fls. 09, 11/12, 39/41, 46/47 e 173), devendo ser reconhecida a natureza especial das atividades exercidas nesses períodos, conforme código 2.5.3 do Decreto nº 53.831/64 e código 2.5.2 do Decreto nº 83.080/79.
Por sua vez, nos períodos de 01.02.1977 a 02.05.1977, 01.01.1980 a 27.09.1980, 12.07.1988 a 16.05.1989, 10.02.1998 a 30.06.2002, 01.07.2002 a 30.04.2004, 01.05.2004 a 06.08.2004, 03.01.2005 a 30.03.2005 e 27.04.2005 a 01.07.2005, nas atividades de ajudante, montador, instrumentista, mecânico de manutenção, supervisor de produção industrial e líder de processos industriais, esteve exposta a ruídos acima dos limites legalmente admitidos (fls. 30/31, 44, 48, 60/66, 117/124 e 126/170), devendo também ser reconhecida a natureza especial das atividades exercidas nesses períodos, conforme código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, código 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99, neste ponto observado, ainda, o Decreto nº 4.882/03.
Já nos períodos de 01.09.1977 a 30.11.1977, 03.10.1978 a 27.10.1978, 01.12.1978 a 30.07.1979, 01.09.1979 a 05.10.1979 e 06.03.1981 a 31.01.1985, exerceu as atividades de montador, estando exposta a lixadeiras, estilhaços de solda e gases, e de soldador (fls. 10, 42 e 45), enquadrando-se, assim, no código 2.5.2 do Decreto nº 53.831/64.
Por outro lado, nos períodos de 19.04.1991 a 11.09.1997 e 01.10.1997 a 09.02.1998, nas atividades de mecânico de manutenção e mecânico, esteve exposta a graxas, óleo lubrificante, óleo hidráulico, óleo solúvel e óleo diesel (fls. 49/50 e 126/141), devendo ser reconhecida a natureza especial das atividades exercidas nesses períodos, conforme código 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64, código 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79 e código 1.0.3 do Decreto nº 2.172/97.
Ainda, finalizando, os períodos de 05.05.1976 a 01.01.1977 e 22.05.1989 a 30.03.1991, devem ser reconhecidos como tempo de contribuição comum, ante a ausência de comprovação de exposição a quaisquer agentes físicos, químicos ou biológicos (fl. 172).
Sendo assim, somados todos os períodos especiais, totaliza a parte autora 24 (vinte e quatro) anos, 02 (dois) meses e 02 (dois) dias de tempo especial, insuficientes para concessão da aposentadoria especial.
Entretanto, somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a parte autora 38 (trinta e oito) anos, 05 (cinco) meses e 21 (vinte e um) dias de tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo (D.E.R. 16.06.2008), observado o conjunto probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
Restaram cumpridos pela parte autora, ainda, os requisitos da qualidade de segurado (art. 15 e seguintes da Lei nº 8.213/91) e a carência para a concessão do benefício almejado (art. 24 e seguintes da Lei nº 8.213/91).
Destarte, a parte autora faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição, com valor calculado na forma prevista no art. 29, I, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
Na eventualidade do tempo de contribuição ora reconhecido possibilitar a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição segundo as regras da EC nº 20/98, deverá o INSS implantar a melhor hipótese financeira.
A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 15% sobre o valor das parcelas vencidas até a sentença de primeiro grau, nos termos da Súmula 111 do E. STJ.
Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
Caso a parte autora já esteja recebendo benefício previdenciário concedido administrativamente, deverá optar, à época da liquidação de sentença, pelo beneficio que entenda ser mais vantajoso. Se a opção recair no benefício judicial, deverão ser compensadas as parcelas já recebidas em sede administrativa, face à vedação da cumulação de benefícios.
As verbas acessórias e as prestações em atraso também deverão ser calculadas na forma acima estabelecida, em fase de liquidação de sentença.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação, para, fixando, de oficio, os consectários legais, julgar parcialmente procedente o pedido e condenar o réu a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 01.09.2008), observada eventual prescrição quinquenal, tudo na forma acima explicitada.
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, instruído com os devidos documentos da parte autora SALVADOR DEJANO, a fim de serem adotadas as providências cabíveis para que seja implantado de imediato o benefício de APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, com D.I.B. em 16.06.2008 e R.M.I. a ser calculada pelo INSS, nos termos da presente decisão, tendo em vista os arts. 497 e seguintes do novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/15).
É como voto.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
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Signatário (a): | NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR:10077 |
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Data e Hora: | 21/03/2017 18:08:23 |