D.E. Publicado em 06/03/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação do réu e negar provimento ao recurso adesivo do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA:10021 |
Nº de Série do Certificado: | 10A516070472901B |
Data e Hora: | 21/02/2017 16:42:10 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0009689-97.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de remessa oficial e apelações em ação de conhecimento objetivando computar os trabalhos em atividade especial de 04/04/1976 a 31/08/1982, 01/11/1983 a 12/12/1985, 16/12/1985 a 31/07/1989, 03/08/1989 a 30/09/1989, 03/10/1989 a 30/06/1991, 01/07/1991 a 01/08/1992, 01/10/1992 a 28/02/1993, 08/03/1993 a 28/06/1994, 01/07/1994 a 25/11/1996, 20/05/1997 a 21/08/2009, cumulado com pedido de aposentadoria especial ou, alternativamente, aposentadoria por tempo de contribuição, desde a DER em 21/08/2009.
O MM. Juízo a quo julgou procedente o pedido e condenou o réu a conceder ao autor, desde 21/08/2009, o benefício de aposentadoria especial, com atualização monetária das prestações vencidas e juros de mora a partir da citação, além dos honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor da condenação até a sentença.
A autarquia apela, pugnando pela reforma da sentença e improcedência do pedido inicial, argumentando, em síntese, que o autor não comprovou o trabalho em atividade especial como exige a legislação específica; que o trabalho de lavrador não é previsto como atividade especial; que o equipamento de proteção individual ou coletiva elimina a nocividade do trabalho; que não houve prévia fonte de custeio para contar o tempo de serviço como atividade especial; e, subsidiariamente, requer a fixação do marco inicial do benefício na data que o autor for afastado da atividade especial.
O autor apela adesivamente, pleiteando o pagamento das parcelas atrasadas com a correção monetária pelo IGPDI até janeiro de 2004 e depois pelo INPS e que os juros moratórios sejam aplicados no percentual de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
Anoto o requerimento administrativo de aposentadoria especial NB 46/144.848.238-8 com a DER em 21/08/2009 (fls. 24), indeferido conforme comunicações de 15/10/2009 e 08/04/2010 (fls. 66 e 133) e acórdão nº 2571/2011 proferido aos 22/03/2011 pela 24ª Junta de Recursos do CRPS (fls. 159/161), e a petição inicial protocolada aos 25/10/2011 (fls. 02).
A questão tratada nos autos diz respeito ao reconhecimento do tempo trabalhado em condições especiais, objetivando a concessão de benefício de aposentadoria especial prevista no Art. 57, da Lei 8.213/91.
Define-se como atividade especial aquela desempenhada sob certas condições peculiares - insalubridade, penosidade ou periculosidade - que, de alguma forma cause prejuízo à saúde ou integridade física do trabalhador.
A contagem do tempo de serviço rege-se pela legislação vigente à época da prestação do serviço.
Até 29/4/95, quando entrou em vigor a Lei 9.032/95, que deu nova redação ao Art. 57, § 3º, da Lei 8.213/91, a comprovação do tempo de serviço laborado em condições especiais era feita mediante o enquadramento da atividade no rol dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79, nos termos do Art. 295 do Decreto 357/91; a partir daquela data até a publicação da Lei 9.528/97, em 10.03.1997, por meio da apresentação de formulário que demonstre a efetiva exposição de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais a saúde ou a integridade física; após 10.03.1997, tal formulário deve estar fundamentado em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, assinado por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho, consoante o Art. 58 da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.528/97. Quanto aos agentes ruído e calor, é de se salientar que o laudo pericial sempre foi exigido.
Nesse sentido:
Atualmente, no que tange à comprovação de atividade especial, dispõe o § 2º, do Art. 68, do Decreto 3.048/99, que:
Assim sendo, não é mais exigido que o segurado apresente o laudo técnico, para fins de comprovação de atividade especial, basta que forneça o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, assinado pela empresa ou seu preposto, o qual reúne, em um só documento, tanto o histórico profissional do trabalhador como os agentes nocivos apontados no laudo ambiental que foi produzido por médico ou engenheiro do trabalho.
Por fim, ressalte-se que o formulário extemporâneo não invalida as informações nele contidas. Seu valor probatório remanesce intacto, haja vista que a lei não impõe seja ele contemporâneo ao exercício das atividades. A empresa detém o conhecimento das condições insalubres a que estão sujeitos seus funcionários e por isso deve emitir os formulários ainda que a qualquer tempo, cabendo ao INSS o ônus probatório de invalidar seus dados.
Em relação ao agente ruído, os Decretos 53.831/64 e 83.080/79 consideravam nociva à saúde a exposição em nível superior a 80 decibéis. Com a alteração introduzida pelo Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, passou-se a considerar prejudicial aquele acima de 90 dB. Posteriormente, com o advento do Decreto 4.882, de 18.11.2003, o nível máximo tolerável foi reduzido para 85 dB (Art. 2º, do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Estabelecido esse contexto, esclareço que, anteriormente, manifestei-me no sentido de admitir como especial a atividade exercida até 05/03/1997, em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80 decibéis, e a partir de tal data, aquela em que o nível de exposição foi superior a 85 decibéis, em face da aplicação do princípio da igualdade.
Contudo, em julgamento recente, a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar a questão submetida ao rito do Art. 543-C do CPC, decidiu que no período compreendido entre 06.03.1997 e 18.11.2003, considera-se especial a atividade com exposição a ruído superior a 90 dB, nos termos do Anexo IV do Decreto 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto 3.048/1999, não sendo possível a aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o nível para 85 dB (REsp 1398260/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Por conseguinte, em consonância com o decidido pelo C. STJ, é de ser admitida como especial a atividade em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80 decibéis até 05/03/1997, e 90 decibéis no período entre 06/03/1997 e 18/11/2003 e, a partir de então até os dias atuais, em nível acima de 85 decibéis.
No que diz respeito ao uso de equipamento de proteção individual, insta observar que este não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. Nesse sentido: TRF3, AMS 2006.61.26.003803-1, Relator Desembargador Federal Sergio Nascimento, 10ª Turma, DJF3 04/03/2009, p. 990; APELREE 2009.61.26.009886-5, Relatora Desembargadora Federal Leide Pólo, 7ª Turma, DJF 29/05/09, p. 391.
Ainda que o laudo consigne a eliminação total dos agentes nocivos, é firme o entendimento desta Corte no sentido da impossibilidade de se garantir que tais equipamentos tenham sido utilizados durante todo o tempo em que executado o serviço, especialmente quando seu uso somente tornou-se obrigatório com a Lei 9732/98.
Igualmente nesse sentido:
Por demais, em recente julgamento proferido pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal, em tema com repercussão geral reconhecido pelo plenário virtual no ARE 664335/SC, restou decidido que o uso do equipamento de proteção individual - EPI, pode ser insuficiente para neutralizar completamente a nocividade a que o trabalhador esteja submetido.
A propósito, transcrevo os seguintes tópicos da ementa:
Cabe ressaltar que a necessidade de comprovação de trabalho "não ocasional nem intermitente, em condições especiais" passou a ser exigida apenas a partir de 29/4/1995, data em que foi publicada a Lei 9.032/95, que alterou a redação do Art. 57, § 3º, da lei 8.213/91, não podendo, portanto, incidir sobre períodos pretéritos. Nesse sentido: TRF3, APELREE 2000.61.02.010393-2, Relator Desembargador Federal Walter do Amaral, 10ª Turma, DJF3 30/6/2010, p. 798 e APELREE 2003.61.83.004945-0, Relator Desembargador Federal Marianina Galante, 8ª Turma, DJF3 22/9/2010, p. 445.
No mesmo sentido colaciono recente julgado do Colendo Superior Tribunal de Justiça:
Tecidas essas considerações gerais a respeito da matéria, passo a análise da documentação do caso em tela.
Assim fazendo, verifico que a parte autora comprovou que exerceu atividade especial nos períodos de:
- 04/07/1976 a 31/08/1982, 01/11/1983 a 12/12/1985 e 01/07/1994 a 28/04/1995, laborado para Paulo Garcia Palma, na fazenda da Invernada, no cargo de serviços gerais/tratorista, exposto a ruído de 90dB(A) e 91,0dB(A), agente nocivo previsto nos itens 1.1.6 do Decreto 53.831/64 e 2.0.1, anexo IV, do Decreto 3.048/99, conforme Perfis Profissiográficos Previdenciários - PPPs de fls. 44/45, 46/47 e 54/55 e Laudo pericial de fls. 229/251;
- 16/12/1985 a 31/07/1989 e 01/10/1992 a 28/02/1993, laborado para Sergio Pedroso, na fazenda Morro Alto, no cargo de tratorista, exposto a ruído de 88,3dB(A), agente nocivo previsto nos itens 1.1.6 do Decreto 53.831/64 e 2.0.1, anexo IV, do Decreto 3.048/99, conforme Formulário de fls. 48 e Laudo pericial de fls. 229/251;
- 03/08/1989 a 30/09/1989 e 03/10/1989 a 30/06/1991, laborado para Dirceu Marinheiro, no sítio São Francisco, no cargo de serviços gerais/tratorista, exposto a ruído de 88,3dB(A), agente nocivo previsto nos itens 1.1.6 do Decreto 53.831/64 e 2.0.1, anexo IV, do Decreto 3.048/99, conforme Formulário de fls. 49 e Laudo pericial de fls. 229/251;
- 01/07/1991 a 01/08/1992, laborado para Constante Bergamini Netto, no sítio São José, no cargo de serviços gerais/tratorista, exposto a ruído de 88,3dB(A), agente nocivo previsto nos itens 1.1.6 do Decreto 53.831/64 e 2.0.1, anexo IV, do Decreto 3.048/99, conforme Formulário DSS-8030 de fls. 50 e Laudo pericial de fls. 229/251;
- 20/05/1997 a 31/05/2006 e 01/06/2006 a 24/09/2007, laborado para a empresa Usina Batatais S/A - Açúcar e Álcool, no cargo de rurícola executando aplicação de defensivo agrícola utilizando-se de aplicador manual e uma bomba costal pressurizado - no primeiro período, e pistolas ligadas na parte traseira dos tratores onde vai andando sempre atrás do trator realizando a aplicação dos herbicidas, exposto a produtos químicos - Roundup, inseticidas e fungicidas, agentes nocivos previstos no item 1.0.12, anexo IV do Decreto 3.048/99, de modo habitual e permanente, não ocasional e nem intermitente, conforme Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP de fls. 56/57 e Laudo pericial de fls. 229/251.
De outro ângulo, os alegados trabalhos no período de 08/03/1993 a 08/06/1994, não permite o reconhecimento em atividade especial, vez que o PPP de fls. 51/52 emitido pelo empregador Eduardo Biagi e outros - Fazenda da Pedra, relata que o autor desempenhou sua função de rurícola em lavoura, sem mencionar qualquer fator de risco; assim como, no período de 29/04/1995 a 25/11/1996, também não permite o reconhecimento em atividade especial, pois o PPP de fls. 54/55 emitido pelo empregador Paulo Garcia Palma - Fazenda Invernada, relata que o autor desempenhava diversas tarefas e não só de tratorista, o que descaracteriza a exposição de forma habitual e permanente ao agente físico ruído.
Dessarte, somados os períodos de trabalho especial ora reconhecidos aos períodos já considerados na esfera administrativa, restaram comprovados mais de 25 anos de atividade especial na data do requerimento administrativo, fazendo jus o autor ao benefício de aposentadoria especial.
Entretanto, ainda que se reconheça o direito do autor ao benefício de aposentadoria especial, nos termos do Art. 57, da Lei 8.213/91, a ressalva contida em seu § 8º ("Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei.") e o disposto no Art. 46 ("O aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno."), do mesmo diploma legal, impossibilita a conversão do benefício do autor em aposentadoria especial, pois, como se vê dos dados constantes do extrato do CNIS, que ora determino seja juntado aos autos, o autor continua em atividade junto à empregadora Usina Batatais S/A - Açúcar e Álcool.
Como cediço, a antecipação da aposentadoria foi concebida como medida protetiva da saúde do trabalhador e, portanto, a permissão da manutenção de atividade insalubre reduziria o direito à aposentadoria especial a mera vantagem econômica, esvaziando o real objetivo da norma.
Destarte, é de se reformar em parte a r. sentença, devendo o réu averbar como tempo especial no cadastro do autor os períodos de 04/07/1976 a 31/08/1982, 01/11/1983 a 12/12/1985 e 01/07/1994 a 28/04/1995, 16/12/1985 a 31/07/1989 e 01/10/1992 a 28/02/1993, 03/08/1989 a 30/09/1989 e 03/10/1989 a 30/06/1991, 01/07/1991 a 01/08/1992, e de 20/05/1997 a 31/05/2006 e 01/06/2006 a 24/09/2007, reconhecendo-se o seu direito ao benefício de aposentadoria especial, cuja implantação deverá observar o disposto no § 8º, do Art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo o réu proceder a revisão do benefício do autor e pagar as diferenças havidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e, no que couber, observando-se o decidido pelo e. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento da questão de ordem nas ADIs 4357 e 4425.
Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme entendimento consolidado na c. 3ª Seção desta Corte (AL em EI nº 0001940-31.2002.4.03.610). A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº 17.
Convém alertar que das prestações vencidas devem ser descontadas aquelas pagas administrativamente ou por força de liminar, e insuscetíveis de cumulação com o benefício concedido, na forma do Art. 124, da Lei nº 8.213/91, assim como eventual período em que o autor tenha exercido atividade insalubre, após a citação ou a implantação do benefício.
Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
Ante o exposto, dou parcial provimento à remessa oficial e à apelação do réu para limitar o reconhecimento os períodos de trabalho em atividade especial e adequar os honorários advocatícios, e nego provimento ao recurso adesivo do autor.
É o voto.
BAPTISTA PEREIRA
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA:10021 |
Nº de Série do Certificado: | 10A516070472901B |
Data e Hora: | 21/02/2017 16:42:13 |