D.E. Publicado em 04/12/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, negar provimento às apelações da parte autora e do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0029305-92.2014.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO:
Trata-se de ação previdenciária ajuizada por Miguel Pereira de Carvalho em face do Instituto Nacional do Seguro Social-INSS, objetivando a revisão da aposentadoria por tempo de contribuição concedida em 24/07/2006 (NB 42/144.695.459-2), mediante o reconhecimento do tempo de serviço especial nos períodos de 20/04/1976 a 17/07/1976, de 06/04/1992 a 02/07/1992 e de 06/03/1997 a 14/03/2000, com o pagamento das diferenças apuradas e integralizadas ao benefício.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido, para condenar o INSS a rever o benefício de aposentadoria por tempo de serviço do autor com o reconhecimento do período de 06/04/1992 a 02/07/1992 como atividade especial, convertendo-o em comum. Em consequência, condenou o réu a alterar o coeficiente do salário de benefício, acrescentando-se às prestações vencidas correção monetária e juros de mora, ressalvada a prescrição quinquenal. Por fim, condenou o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios sucumbenciais arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o montante das prestações vencidas, nos termos da Súmula nº 111 do STJ.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Inconformado, o autor interpôs apelação, requerendo o reconhecimento da especialidade do período de 06/03/1997 a 14/03/2000.
Também irresignado, o INSS apela, alegando, preliminarmente, a ocorrência de coisa julgada material. No mérito, pleiteia a improcedência da ação, em razão do não reconhecimento da especialidade dos períodos pleiteados na inicial, bem como pelo uso de EPI eficaz pelo autor. Subsidiariamente, requer a alteração da DIB para a da citação.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
Às fls. 252, o autor requereu a desistência da ação.
Manifestação do ente autárquico às fls. 257, pleiteando a renúncia expressa do direito do autor.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO:
Inicialmente, rejeito a preliminar de coisa julgada material arguida pelo INSS, visto que, não obstante o autor tenha formulado pedido de reconhecimento como especial dos períodos de 20/04/1976 a 17/07/1976, de 06/04/1992 a 02/07/1992 e de 06/03/1997 a 14/03/2000, em réplica reconheceu a duplicidade do pedido quanto ao intervalo de 20/04/1976 a 17/07/1976 (fls. 33 e 185), o qual foi objeto do feito de nº 2006.63.15.006279-1, que tramitou perante o Juizado Especial de Sorocaba, havendo decisão com trânsito em julgado a respeito (fls. 92/103).
Logo, o prosseguimento do feito se deu apenas em relação aos períodos de 06/04/1992 a 02/07/1992 e de 06/03/1997 a 14/03/2000, conforme decisão de fls. 212.
Passo ao exame do mérito.
Da análise dos autos, verifica-se que o INSS concedeu ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a partir de 24/07/2006 (f. 129).
Ocorre que a parte autora afirma na inicial que o INSS não computou como especial os períodos de 06/04/1992 a 02/07/1992 e de 06/03/1997 a 14/03/2000. Diante disso, o autor requer a revisão de sua atual aposentadoria por tempo de contribuição.
Atividade Especial
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60.
O critério de especificação da categoria profissional com base na penosidade, insalubridade ou periculosidade, definidas por Decreto do Poder Executivo, foi mantido até a edição da Lei nº 8.213/91, ou seja, as atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo seriam consideradas penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico, bastando, assim, a anotação da função em CTPS ou a elaboração do então denominado informativo SB-40.
Foram baixados pelo Poder Executivo os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, relacionando os serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos.
Embora o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 tenha limitado a aposentadoria especial às atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, o critério anterior continuou ainda prevalecendo.
De notar que, da edição da Lei nº 3.807/60 até a última CLPS, que antecedeu à Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço especial foi sempre definido com base nas atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo como penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico.
A própria Lei nº 8.213/91, em suas disposições finais e transitórias, estabeleceu, em seu artigo 152, que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, prevalecendo, até então, a lista constante da legislação em vigor para aposentadoria especial.
Os agentes prejudiciais à saúde foram relacionados no Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (art. 66 e Anexo IV), mas por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.
Destaque-se que o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, deixou de fazer alusão a serviços considerados perigosos, insalubres ou penosos, passando a mencionar apenas atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, sendo que o artigo 58 do mesmo diploma legal, também em sua redação original, estabelecia que a relação dessas atividades seria objeto de lei específica.
A redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 foi alterada pela Lei nº 9.032/95 sem que até então tivesse sido editada lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, não havendo dúvidas até então que continuavam em vigor os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. Nesse sentido, confira-se a jurisprudência: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
É de se ressaltar, quanto ao nível de ruído, que a jurisprudência já reconheceu que o Decreto nº 53.831/64 e o Decreto nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, ou seja, não houve revogação daquela legislação por esta, de forma que, constatando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado (STJ - REsp. n. 412351/RS; 5ª Turma; Rel. Min. Laurita Vaz; julgado em 21.10.2003; DJ 17.11.2003; pág. 355).
O Decreto nº 2.172/97, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 dB(A) como prejudicial à saúde.
Por tais razões, até ser editado o Decreto nº 2.172/97, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB(A) como agente nocivo à saúde.
Todavia, com o Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível voltou a ser de 85 dB(A) (art. 2º do Decreto nº 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Houve, assim, um abrandamento da norma até então vigente, a qual considerava como agente agressivo à saúde a exposição acima de 90 dB(A), razão pela qual vinha adotando o entendimento segundo o qual o nível de ruídos superior a 85 dB(A) a partir de 05/03/1997 caracterizava a atividade como especial.
Ocorre que o C. STJ, no julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do artigo 543-C do CPC, decidiu não ser possível a aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, de modo que no período de 06/03/1997 a 18/11/2003, em consideração ao princípio tempus regit actum, a atividade somente será considerada especial quando o ruído for superior a 90 dB(A).
Nesse sentido, segue a ementa do referido julgado:
"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITE DE 90DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. |
Controvérsia submetida ao rito do art. 543-C do CPC |
1. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC. |
2. O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ. Caso concreto |
3. Na hipótese dos autos, a redução do tempo de serviço decorrente da supressão do acréscimo da especialidade do período controvertido não prejudica a concessão da aposentadoria integral. |
4. Recurso Especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008." |
(STJ, REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 05/12/2014) |
Destaco, ainda, que, de forma diversa do alegado pelo INSS, o uso de equipamento de proteção individual não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal tipo de equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. Nesse sentido, precedentes desta E. Corte (AC nº 2000.03.99.031362-0/SP; 1ª Turma; Rel. Des. Fed. André Nekatschalow; v.u; J. 19.08.2002; DJU 18.11) e do Colendo Superior Tribunal de Justiça: REsp 584.859/ES, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em 18/08/2005, DJ 05/09/2005 p. 458).
No presente caso, da análise dos Perfis Profissiográficos Previdenciários - PPPs juntados aos autos (fls. 23/24 e 194/195), e de acordo com a legislação previdenciária vigente à época, o apelante comprovou o exercício de atividade especial no seguinte período:
- 06/04/1992 a 02/07/1992, vez que trabalhou como ajudante de produção em LOPESCO Ind. de Subprodutos Animais Ltda., exposto de modo habitual e permanente a 'umidade', considerada insalubre em Portaria e NR-15, Anexo nº 10 do INSS, enquadrado no código 1.1.3, Anexo III do Decreto nº 53.831/64. |
Quanto ao período de 06/03/1997 a 14/03/2000, observa-se que o autor estava exposto a pressão sonora de 89 dB (conforme PPP de fls. 23/24), portanto, a ruído inferior ao limite de 90 dB determinado na legislação vigente (no código 2.0.1 do Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e no código 2.0.1 do Anexo IV do Decreto 3.048/99).
Logo, deve ser considerado como especial apenas o período já reconhecido na sentença recorrida, qual seja, de 06/04/1992 a 02/07/1992.
Assim, deve a Autarquia-ré averbar o tempo de serviço acima reconhecido como especial e revisar o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição do autor.
Por fim, as diferenças decorrentes da revisão serão devidas a partir da concessão do benefício (24/07/2006 - f. 102), época em que a parte autora já possuía tal direito.
Nesse sentido:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. REVISÃO DE APOSENTADORIA. EFEITOS FINANCEIROS. DATA DA CONCESSÃO. PRECEDENTES DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. |
1. A questão a ser revisitada em agravo regimental cinge-se à definição do termo inicial dos efeitos financeiros da revisão da RMI do benefício aposentadoria por tempo de contribuição. |
2. O termo inicial dos efeitos financeiros da revisão deve retroagir à data da concessão do benefício, uma vez que o deferimento da ação revisional representa o reconhecimento tardio de um direito já incorporado ao patrimônio jurídico do segurado, não obstante a comprovação posterior do salário de contribuição. |
3. Agravo regimental não provido." |
STJ - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL : AgRg no REsp 1467290 SP 2014/0169079-1 |
Impõe-se, por isso, a manutenção da parcial procedência da pretensão da parte autora, em relação ao período de tempo especial reconhecido acima, com a respectiva revisão do benefício, a partir da concessão do benefício em sede judicial (24/07/2006 - f. 102).
Anote-se, na espécie, a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos à parte autora após o termo inicial assinalado à benesse outorgada, ao mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por Lei.
Ante o exposto, REJEITO A PRELIMINAR ARGUIDA E, NO MÉRITO, NEGO PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES DA PARTE AUTORA E DO INSS, nos termos da fundamentação.
É COMO VOTO.
TORU YAMAMOTO
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 27/11/2017 16:05:17 |