
D.E. Publicado em 29/09/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao reexame necessário e à apelação do INSS e dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0004385-66.2008.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação pugnando pela reforma da decisão recorrida, para que sejam homologados os períodos comuns reconhecidos administrativamente, bem como no tocante à correção monetária, juros de mora e verba honorária.
Por sua vez, a autarquia previdenciária interpôs recurso de apelação pugnando pela revogação da tutela antecipada e, no mérito, pela reforma da sentença, para que seja julgado improcedente o pedido, sustentando a ausência dos requisitos legais para a concessão do benefício.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Quanto ao pedido de revogação da tutela antecipada, formulado no recurso de apelação do INSS, trata-se de questão eminentemente de cunho instrumental, secundária, relativa à garantia do resultado prático e imediato do provimento jurisdicional que concedeu benefício. Em sendo assim, é pertinente examinar primeiro a questão principal, que é aquela relativa à concessão do benefício, para depois se enfrentar a questão secundária, relativa à tutela específica, não constituindo, assim, objeção processual.
No caso concreto, há início de prova documental da condição de rurícola do autor, consistente nas cópias do certificado de isenção do serviço militar (1966), da certidão de casamento (1969) e do título eleitoral (1967), nas quais está qualificado profissionalmente como lavrador (fls. 30/31 e 43). Segundo a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tal documentação, em conjunto com a prova testemunhal colhida no curso da instrução processual, é hábil ao reconhecimento de tempo de serviço trabalhado como rurícola, conforme revelam as seguintes ementas de julgados:
"As anotações em certidões de registro civil, a declaração de produtor rural, a nota fiscal de produtor rural, as guias de recolhimento de contribuição sindical e o contrato individual de trabalho em Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS, todos contemporâneos à época dos fatos alegados, se inserem no conceito de início razoável de prova material." (REsp 280402/SP, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJ 10/09/2001, p. 427).
Assim, não há dúvida de que foi apresentado início de prova material de trabalho rural. Entretanto, o início de prova material não é o bastante para se concluir acerca do exercício de atividade rural pelo período postulado. É indispensável, no caso, a produção de prova testemunhal para que se tenha por revelada a real condição da autora.
Conquanto tenha sido apresentado o documento acima referido, a parte autora afirmou não ser possível trazer as testemunhas (fls. 284/285).
Assim, não tendo sido produzida prova oral para ampliar a eficácia probatória do documento referente à atividade rural por ela exercida, não há como ser reconhecido o período de trabalho rural para fins previdenciários. Esse, também, é o entendimento do egrégio Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o início de prova material que não estiver corroborado por prova testemunhal colhida no curso da instrução processual sob o crivo do contraditório, não se mostra hábil ao reconhecimento de tempo de serviço trabalhado como rurícola, conforme revelam o seguinte julgado:
"A certidão de casamento constante dos autos não está apta a comprovar o exercício da atividade rural visto que não está corroborada por provas testemunhais do alegado trabalho rural do Autor pelo período imediatamente anterior ao requerimento da aposentadoria." (REsp nº 590015/CE, Relatora Ministra LAURITA VAZ, j. 18/12/2003, DJ 16/02/2004, p. 344).
Entretanto, cabe ressaltar que a própria autarquia previdenciária adota orientação segundo a qual a aceitação de um único documento está restrita à prova do ano a que ele se referir, conforme inciso III do artigo 374 da Instrução Normativa nº 118/2005-INSS-DC.
Assim, se, por um lado, não foi produzida a prova testemunhal para comprovar o exercício de atividade rural, por outro lado, a ausência desta prova, não se mostra apta para ilidir a atividade rural documentalmente comprovada.
Vale acrescentar, a esse respeito, o seguinte aresto:
"PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA. EXISTÊNCIA DE PROVA EXCLUSIVAMENTE DOCUMENTAL. POSSIBILIDADE.
1. A comprovação do tempo de serviço rural pode ser feita apenas por documentos escritos; o que a Lei 8.213/91, Art. 55, § 3º, não permite é a prova exclusivamente testemunhal (Súmula 149/STJ).
(...)"
(STJ, RESP 254144, 5ª Turma, Relator Ministro Edson Vidigal, DJ de 14/08/2000, p. 200).
Desse modo, nos termos do artigo 55, § 3.º, da Lei n.º 8.213/91, e em estrita observância à Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, deve ser reconhecido o exercício de trabalho rural, nos períodos de 01/01/1966 a 30/12/1967 e de 01/01/1969 a 30/11/1969.
O trabalho rural no período anterior à vigência da Lei nº 8.213/91 poderá ser computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme disposição expressa do artigo 55, § 2º, do citado diploma legal.
No tocante à homologação do tempo de serviço comum, observo que a autarquia previdenciária, quando da análise do requerimento administrativo NB nº 42/139.895.898-8, reconheceu e computou o tempo de serviço comum, nos períodos de 01/01/1992 a 28/02/1983, de 01/02/1985 a 30/09/1989, de 03/01/1994 a 14/08/1994, de 01/08/1995 a 16/04/1996 e de 01/09/1997 a 03/10/1998, conforme resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição juntado às fls. 224/228, restando incontroversos tais períodos, faltando, portanto, interesse de agir.
No presente caso, a parte autora demonstrou haver laborado em atividade especial no período de 01/12/1969 a 24/09/1981. É o que comprovam o formulário e laudo técnico (fls. 53/54), trazendo a conclusão de que a parte autora desenvolveu sua atividade profissional, com exposição ao agente agressivo ruído. Referido agente agressivo encontra classificação no código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e código 1.1.5 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79, em razão da habitual e permanente exposição aos agentes agressivos ali descritos.
O artigo 58, § 1º, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.732, de 11/12/1998, dispõe que a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será efetuada nos termos da legislação trabalhista.
O art. 194 da CLT aduz que o fornecimento de Equipamento de Proteção Individual pelo empregador, aprovado pelo órgão competente do Poder Executivo, seu uso adequado e a consequente eliminação do agente insalubre são circunstâncias que tornam inexigível o pagamento do adicional correspondente. Portanto, retira o direito ao reconhecimento da atividade como especial para fins previdenciários.
Por sua vez, o art. 195 da CLT estabelece: A caracterização e a classificação da insalubridade e da periculosidade, segundo as normas do Ministério do Trabalho, far-se-ão através de perícia a cargo do Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho, registrado no Ministério do Trabalho.
A respeito do agente físico ruído, a Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sessão de julgamento realizada em 14/05/2014, em sede de recurso representativo da controvérsia (Recurso Especial repetitivo 1.398.260/PR, Rel. Min. Herman Benjamin), firmou orientação no sentido de que o nível de ruído que caracteriza a insalubridade para contagem de tempo de serviço especial deve ser superior a 80 (oitenta) decibéis até a edição do Decreto nº 2.171/1997, de 05/03/1997, superior a 90 (noventa) decibéis entre a vigência do Decreto nº 2.171/1997 e a edição do Decreto nº 4.882/2003, de 18/11/2003, e após a entrada em vigor do Decreto nº 4.882/2003, ou seja, a partir de 19/11/2003, incide o limite de 85 (oitenta e cinco) decibéis, considerando o princípio tempus regit actum.
Ainda com relação à matéria, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar o ARE 664.335/SC, em 04/12/2014, publicado no DJe de 12/02/2015, da relatoria do Ministro LUIZ FUX, reconheceu a repercussão geral da questão constitucional nele suscitada e, no mérito, fixou o entendimento de que a eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria, quando o segurado estiver exposto ao agente nocivo ruído.
De outra parte, não há falar em ausência de prévia fonte de custeio para o reconhecimento da atividade especial e sua conversão em tempo de serviço comum, haja vista que a obrigação do desconto e o recolhimento das contribuições no que tange à figura do empregado são de responsabilidade exclusiva de seu empregador, inclusive no tocante ao recolhimento do Seguro de Acidente do Trabalho, cabendo ao INSS fiscalizar e exigir o cumprimento de tal obrigação.
No presente caso, a parte autora faz jus ao recebimento de aposentadoria por tempo de contribuição, benefício disciplinado pelo artigo 201, § 7º, da Constituição Federal e artigos 52 e seguintes da Lei nº 8.213/91, tendo em vista o preenchimento dos requisitos após a Emenda Constitucional nº 20/98.
Com efeito, computando-se a atividade rural exercida nos períodos de 01/01/1966 a 30/12/1967 e de 01/01/1969 a 30/11/1969, a atividade especial exercida no período de 01/12/1969 a 24/09/1981, com o tempo de serviço comum (fls. 60/79), o somatório do tempo de serviço da parte autora, na data da publicação da EC 20/98, é inferior a 30 (trinta) anos, totalizando 27 (vinte e sete) anos, 05 (cinco) meses e 15 (quinze) dias de tempo de serviço, de maneira que é aplicável ao caso dos autos a regra de transição prevista no artigo 9º da referida Emenda Constitucional, pois a parte autora não possuía direito adquirido ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço na data da sua publicação, em 16/12/1998.
Observo, ainda, que a Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, exige um acréscimo de tempo de serviço, que perfaz 31 (trinta e um) anos, no presente caso.
De outra parte, incluindo-se o tempo de serviço posterior a 15/12/1998, verifica-se que a parte autora cumpriu o acréscimo previsto pela Emenda Constitucional nº 20/98 totalizando, na data do requerimento administrativo, 32 (trinta e dois) anos, 09 (nove) meses e 03 (três) dias.
Assim, a parte autora faz jus à concessão do benefício de aposentadoria proporcional por tempo de serviço, uma vez que cumpriu a regra de transição prevista no art. 9º da referida Emenda Constitucional, porquanto atingiu a idade de 53 (cinquenta e três) anos e comprovou o tempo de serviço exigido, devendo ser observado o disposto nos artigos 53, inciso II, 28 e 29 da Lei nº 8.213/91.
Quanto à correção monetária e juros de mora, no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, foi objeto de declaração de inconstitucionalidade por arrastamento o art. 1º-F da Lei 9.494/97, mas limitado apenas à parte em que o texto legal estava vinculado ao art. 100, § 12, da CF, incluído pela EC 62/2009, o qual se refere tão somente à atualização de valores de requisitórios.
Assim, quanto à atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública até a expedição do requisitório, o art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/09, ainda não foi objeto de pronunciamento expresso pelo colendo Supremo Tribunal Federal, no tocante à constitucionalidade, de sorte que continua em pleno vigor.
Portanto, impõe-se determinar a adoção dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, nos moldes do art. 5º da Lei 11.960/2009, a partir de sua vigência (30/6/2009).
Em virtude da sucumbência, arcará o INSS com os honorários advocatícios, ora arbitrados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento sufragado pela 10ª Turma desta Corte Regional. Ressalte-se que a base de cálculo sobre a qual incidirá mencionado percentual será composta das prestações vencidas entre o termo inicial do benefício e a data da sentença, em consonância com a Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Por fim, no que tange à determinação de implantação do benefício, os seus efeitos devem ser mantidos. Tendo sido, em sede recursal, reconhecido o direito da parte autora de receber o benefício, não haveria qualquer senso, sendo até mesmo contrário aos princípios da razoabilidade e da efetividade do processo, cassar-se a medida e determinar a devolução de valores para que a parte autora, em seguida, obtenha-os de volta mediante precatório. Por tais razões, mantenho os efeitos da tutela específica de que trata o mencionado artigo 497 do novo Código de Processo Civil.
É o voto.
LUCIA URSAIA
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Data e Hora: | 20/09/2016 18:41:11 |