
D.E. Publicado em 30/03/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, NÃO CONHECER DA PRELIMINAR E, NO MÉRITO, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR:10077 |
Nº de Série do Certificado: | 066427B876468A04 |
Data e Hora: | 21/03/2017 17:57:02 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014428-84.2013.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação pelo rito ordinário proposta por ANESIO ANTONIO DA SILVA, em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, em que se objetiva a concessão do benefício assistencial previsto no artigo 203 da Constituição Federal e artigo 20 da Lei 8.742/1993 (Loas).
Estudos Sociais às fls. 48 e 93.
Contestação às fls. 49/73.
O processo foi extinto sem julgamento do mérito em razão do óbito da parte autora.
Os herdeiros do autor interpuseram apelação (fls. 115/118).
Decorrido o prazo para as contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pela nulidade do feito ou, no mérito, pelo desprovimento do pedido (fls. 125/129).
O então relator deu provimento à apelação para anular a sentença (fls. 131/134).
Com a baixa dos autos à Vara de origem, foi homologada a habilitação dos herdeiros à fl. 165.
O pedido foi julgado procedente, condenando-se o INSS a conceder o benefício assistencial a partir da data do requerimento administrativo até a data do óbito, corrigido monetariamente, bem como a arcar com honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor da condenação, observada a Súmula 111 do STJ (fls. 175/178).
Sentença não submetida ao reexame necessário.
O INSS interpôs apelação requerendo, preliminarmente, a extinção do feito sem julgamento do mérito, tendo em vista o óbito da parte autora e, no mérito, alegando ausência de comprovação da hipossuficiência econômica. Subsidiariamente requer a alteração dos consectários legais (fls. 185/196).
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo parcial provimento da apelação apenas quanto aos consectários legais (fls. 209/214).
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Inicialmente não conheço da preliminar arguida pelo INSS, haja vista que a questão foi analisada anteriormente por esta Corte, sem qualquer recurso autárquico à época.
No mais, o benefício assistencial de prestação continuada (ou amparo social) deve ser prestado a quem dele necessitar, independentemente do prévio recolhimento de contribuições.
Encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família:
Até a regulamentação do citado dispositivo constitucional, ocorrida com a edição da Lei 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), a proteção ao deficiente e ao idoso hipossuficientes era objeto da Lei 6.179/1974, a qual instituiu o benefício denominado "amparo previdenciário" destinado a pessoas maiores de 70 (setenta) anos ou inválidas, consistente no pagamento mensal de renda vitalícia equivalente à metade do salário mínimo vigente no país. A partir do advento da Constituição de 1988, o valor do benefício foi elevado para 1 (um) salário mínimo, à vista do disposto no art. 139, § 2º, da Lei 8.213/1991.
Atualmente, a disciplina legal do instituto encontra-se formatada pelas Leis 9.720/1998 12.435/2011, 12.470/2011 e 13.146/2015, as quais promoveram alterações substanciais nos arts. 20 e 21 da Lei Orgânica da Assistência Social.
No tocante aos beneficiários, dispõe o art. 20 da Lei 8.742/1993:
Em relação ao idoso, cumpre registrar que, originariamente, a idade mínima para a concessão do benefício era de 70 (setenta) anos, sendo depois estabelecida uma regra de transição (art. 38 do mesmo estatuto lega)l, pela qual o critério etário deveria ser reduzido gradativamente, passando a 67 (sessenta e sete) anos após 24 (vinte e quatro) meses e 65 (sessenta e cinco) anos após 48 (quarenta e oito) meses, respectivamente. Contudo, a Lei 9.720/1998, objeto de conversão da Medida Provisória 1599-51/1998, fixou a idade limite em 67 (sessenta e sete) anos a partir de 1º de janeiro de 1998.
Com o advento do Estatuto do Idoso (Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003), acabou-se por fixar a idade de 65 (sessenta e cinco) anos como critério etário mínimo para a percepção do benefício assistencial:
Finalmente, a Lei 12.435/2011 promoveu a atualização do art. 20 da Lei 8.742/1993, prevendo a idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos, e, de outro lado, revogou o art. 38, na redação dada pela Lei 9.720/1998.
Assim, a pessoa maior de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, a partir do início da vigência do Estatuto do Idoso, desde que exposta à situação de hipossuficiência material, pode ser amparada pela Seguridade Social por meio do benefício assistencial de prestação continuada.
No que concerne à pessoa com deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social evidenciam tendência evolutiva na consideração da sua conceituação legal. Originariamente, a deficiência encontrava-se relacionada à incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Posteriormente, a Lei 12.435/2011 incluiu no dispositivo em análise a definição contida no art. 1º da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de 30.03.2007, incorporada ao ordenamento jurídico interno pelo Decreto n. 6.949/2009, de acordo com a qual:
Entretanto, ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. Note-se que a jurisprudência já vinha suavizando a interpretação sobre o alcance da aludida incapacidade, como se extrai da seguinte decisão:
A propósito do tema, confira-se ainda o teor da Súmula n. 29 da Turma Nacional de Uniformização - TNU dos Juizados Especiais:
Em compasso com a evolução interpretativa promovida pela jurisprudência, a Lei 12.470/2011 abandonou o parâmetro consubstanciado na incapacidade para a vida independente e para o trabalho, preservando a definição consagrada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa com deficiência:
Ademais, cumpre assinalar que o § 10, do mesmo dispositivo, incluído pela Lei 12.470/2011, considera de longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
No tocante à situação socioeconômica do beneficiário, consta do § 3º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, com a redação dada pela Lei 12.435/2001:
Inicialmente, o dispositivo em referência teve a constitucionalidade afirmada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado na ADIn nº 1.232-1 (Rel. Min. Ilmar Galvão, por redistribuição, DJU, 26 maio 1995, p. 15154). Entretanto, a pretexto da ocorrência de processo de inconstitucionalização oriundo de alterações de ordem fática (políticas, econômicas e sociais) e jurídica (estabelecimento de novos patamares normativos para concessão de benefícios assistenciais em geral), o Supremo Tribunal Federal reviu o anterior posicionamento, declarando a inconstitucionalidade parcial do dispositivo, sem pronúncia de nulidade, em julgado assim ementado:
Consequentemente, foi rechaçada a aferição da miserabilidade unicamente pelo critério objetivo previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, passando-se a admitir o exame das reais condições sociais e econômicas do postulante ao benefício, como denota a seguinte decisão:
É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça já admitia outros meios de prova para aferir a hipossuficiência do postulante ao amparo assistencial, além do montante da renda per capita, reputando a fração estabelecida no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993 como parâmetro abaixo do qual a miserabilidade deve ser presumida de forma absoluta. Nesse sentido, a seguinte decisão prolatada em sede de recurso especial representativo de controvérsia:
No mesmo sentido tem se orientado a jurisprudência desta Corte:
Atualmente encontra-se superada a discussão em torno da renda per capita familiar como único parâmetro de medida do critério socioeconômico, pois, com a inclusão, pela Lei 13.146/2015, do § 11 no art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, passou a existir previsão legal expressa autorizando a utilização de outros elementos probatórios para a verificação da miserabilidade e do contexto de vulnerabilidade do grupo familiar exigidos para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada.
Cumpre, então, examinar o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício pleiteado no caso vertente.
No tocante à demonstração da miserabilidade, o primeiro Estudo Social produzido indica que o núcleo familiar era integrado pela parte postulante, sua esposa, a filha Cristiane, separada, e uma neta, menor de idade. À época (07/2011) foi informado que a renda mensal consistia na renda da esposa, funcionária pública municipal, no valor de R$ 798,86 e, ainda, no trabalho eventual de R$ 35,00 por dia, como auxiliar de cozinha, da filha Cristiane. O imóvel em que residiam era próprio e quitado. Constou, ainda, que as despesas mensais básicas eram, em média, no valor de R$ 451,00.
No Estudo Social realizado em 05/2012 foi informado o óbito do autor, ocorrido em 25.01.2012. Constou que a viúva estava ganhando R$ 988,72 e a filha Cristiane estava trabalhando, em período de experiência, recebendo o valor de R$ 622,00. As despesas mensais foram declaradas como sendo no valor de R$ 1.100,00.
Quando da apresentação da Certidão de óbito e da habilitação de herdeiros foi constatada a existência do filho Gilberto, casado.
Em consulta ao CNIS/PLENUS, na data de hoje, consta que a filha Cristiane, em 12/2010 (mês do requerimento administrativo) recebeu o valor de R$ 686,79; em 07/2011 (mês do primeiro Estudo Social), recebeu R$ 744,54 e em 05/2012 (mês do segundo Estudo Social) recebeu R$ 750,96.
Dessa forma, tem-se que a renda da filha Cristiane, somada à renda de sua mãe, em 07/2011, foi de R$ 1.543,40.
Assim, conquanto a economia doméstica não fosse de fartura, a renda auferida mostrava-se adequada ao suprimento das necessidades essenciais do núcleo familiar, cujas despesas declaradas somavam R$ 451,00.
Anote-se que o direito ao benefício assistencial de prestação continuada está atrelado à situação de sensível carência material enfrentada pelo postulante, não bastando para a sua concessão a alegação de meras dificuldades financeiras, sob pena de desnaturar o objetivo almejado pelo Constituinte, isto é, dar amparo ao deficiente e ao idoso inseridos em contextos de manifesta privação de recursos, e banalizar a utilização do instituto, sobrecarregando, desse modo, o combalido orçamento da Seguridade Social.
Desnecessária a análise do requisito deficiência.
Assim, no caso em apreço, não restaram satisfeitos todos os requisitos necessários à concessão do benefício de prestação continuada contemplado no art. 203, V, do Texto Constitucional, e art. 20, caput, da Lei 8.742/1993.
Diante do exposto, NÃO CONHEÇO DA PRELIMINAR E, NO MÉRITO, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
É o voto.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR:10077 |
Nº de Série do Certificado: | 066427B876468A04 |
Data e Hora: | 21/03/2017 17:57:06 |