
D.E. Publicado em 14/06/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, manter o julgamento que negou provimento à apelação da autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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Data e Hora: | 03/06/2016 13:29:30 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0032572-14.2010.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, para obtenção do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da CF.
O juízo de 1º grau julgou improcedente o pedido e condenou a autora ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 550,00, observando-se os termos dos arts. 11, § 2º, e 12, da Lei 1.060/50.
Em apelação, a autora alega ter preenchido todas as condições para a obtenção do benefício assistencial.
Em julgamento monocrático de fls. 134/138, nos termos do art. 557 do CPC/1973, negou-se seguimento à apelação, mantendo a improcedência do pedido.
A autora interpôs agravo legal, requerendo a reconsideração do decisum.
O acórdão de fls. 151/153, da Nona Turma desta Corte, por unanimidade, negou provimento ao recurso.
A parte autora interpôs Recurso Especial, que, inicialmente, não foi admitido, ensejando a interposição de agravo, com fulcro no art. 544, do CPC/1973.
Remetidos eletronicamente os autos do agravo ao STJ, deu-se a devolução do recurso à origem, para que seja observada a sistemática prevista no art. 543-C, § 7º do CPC/1973.
Em razão do decidido no RESP Nº 1.355.052/SP, vieram-me os autos em obediência à disposição dos arts. 543-B, § 3º, e 543-C, § 7º, II, do CPC/1973.
É o relatório.
VOTO
Apelação interposta pela autora contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da CF.
Após a interposição de recurso especial retornaram-me os autos para o reexame disposto nos arts. 543-B, § 3º, e 543-C, § 7º, II, do CPC/1973 (arts. 1036, 1037, §4º, 1038, caput, I, e §§ 1º e 2º, do CPC/2015).
No caso, às fls. 221/223, negou-se provimento ao agravo interposto contra a decisão monocrática que negou provimento à apelação.
Assim, tendo em vista o advento do julgamento pelo STJ, incide a norma prevista no art. 543-C, §7º, II e §8º, do CPC/1973, com redação dada pela Lei n. 11.672/08:
Verifica-se que o fundamento do improvimento da apelação, deu-se em razão do não preenchimento do requisito da hipossuficiência econômica.
O § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93 estabelece que a renda per capita familiar deve ser inferior a ¼ do salário mínimo. A inconstitucionalidade desse dispositivo da LOAS foi arguida na ADIN nº 1.232-1, julgada improcedente por maioria de votos pelo Plenário do STF.
A questão não restou pacificada na jurisprudência do STJ e do próprio STF, que passaram a adotar o entendimento de que a ADIn nº 1.232-1 não retirou a possibilidade de aferição da necessidade por outros meios de prova que não a renda per capita familiar, mas, sim, que o § 3º do art. 20 estabeleceu uma presunção objetiva e absoluta de miserabilidade. Assim sendo, a família com renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo encontra-se em estado de penúria, configurando tal situação prova incontestável de necessidade do benefício, dispensando outros elementos probatórios. Daí que, caso suplantado tal limite, outros meios de prova poderiam ser utilizados para a demonstração da condição de miserabilidade, expressa na situação de absoluta carência de recursos para a subsistência.
Nesse sentido o entendimento do STJ (REsp 222778/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, j. 04.11.1999, DJU 29.11.1999, p. 190):
A questão foi novamente levada a julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a Repercussão Geral da matéria nos autos do Recurso Extraordinário 567985/MT, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 18/04/2013, publicado em 03.10.2013:
"... O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento" (destaquei).
Continuo mantendo o entendimento anterior porque, a meu ver, a fixação da renda per capita familiar inferior ao salário mínimo é excludente do bem-estar e justiça sociais que o art. 193 da CF elegeu como objetivos da Ordem Social.
A fixação do salário mínimo como garantia do trabalhador e do inativo para fins de garantir sua manutenção e de sua família, com o mínimo necessário à sobrevivência com dignidade, representa um critério quantificador do bem-estar social que a todos deve ser garantido, inclusive aos beneficiários do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição.
Nessa linha de entendimento, o correto seria que a renda per capita familiar, para fins de concessão do BPC, não pudesse ser superior a 1 (um) salário mínimo. Esse critério traria para dentro do sistema de Assistência Social um número bem maior de pessoas idosas e com deficiência. Seria dar a todos, dentro e fora do sistema de Assistência Social, o mesmo grau de dignidade e de bem-estar, reduzindo desigualdades sociais.
A declaração de inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da LOAS, na prática, resulta na inexistência de nenhum critério, abrindo a possibilidade de o intérprete utilizar todos os meios de provas disponíveis para a verificação da situação de miséria que a lei quer remediar.
Cabe à legislação infraconstitucional a definição dos critérios e requisitos para concessão do benefício, conforme prevê o art. 203, V, da CF. Deve, para isso, obedecer aos princípios do art. 194, dentre eles a seletividade e distributividade. Ou seja, cabe ao legislador ordinário selecionar as contingências merecedoras de proteção e distribuí-las de acordo com o número de beneficiários e o orçamento de que dispõe.
A seletividade e a distributividade, contudo, por serem princípios setoriais, estão conformadas ao princípio geral do respeito à isonomia. Não pode a lei eleger como discrimen critério violador da isonomia.
A fixação do critério aferidor da necessidade é atribuição do legislador e não do juiz. Mas, diante do caso concreto, a jurisdição não pode ser negada por falta de critério legal.
A atividade legislativa não é do Poder Judiciário, de modo que não lhe cabe criar critério que substitua o previsto no § 3º do art. 20. Porém, parece razoável estabelecer presunção absoluta de miserabilidade quando a renda per capita familiar for inferior a metade do salário mínimo vigente, para que, em sendo superior, outras provas possam ser consideradas para averiguar a real necessidade de concessão do benefício.
O estudo social feito em 17.02.2010, às fls. 26/27, complementado em 11.05.2010, às fls. 72/73, indica que a autora reside com o marido, em casa própria, contendo seis cômodos. Os móveis e os eletrodomésticos estão em bom estado de conservação. A família tem um veículo, modelo Gol, 1993. As despesas, em maio de 2010, foram: alimentação R$ 315,00; remédios R$ 100,00; água R$ 58,00; energia R$ 98,00; telefone R$ 58,00; IPTU R$ 38,00; gás R$ 38,00. O casal conta com a ajuda dos filhos para arcar com as despesas, vez que a única renda advém da aposentadoria do marido da autora, no valor de R$ 594,00 (quinhentos e noventa e quatro reais) mensais.
A consulta ao CNIS (doc. anexo) indica que o marido da autora era beneficiário de aposentadoria por tempo de contribuição, desde 30.11.1981, cessada em 17.11.2015, que gerou pensão por morte atualmente percebida pela autora, no valor atual de R$ 961,51 (novecentos e sessenta e um reais e cinquenta e um centavos) mensais.
Dessa forma, a renda familiar per capita foi sempre superior à metade do salário mínimo.
Ademais, prevê o art. 229 da Constituição da República o dever de reciprocidade na prestação de assistência entre pais e filhos ao estatuir que "os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade".
O Código Civil também se ocupou do dever recíproco de prestar alimentos entre pais e filhos, dispondo:
A assistência social prestada pelo Estado deve ter cunho subsidiário, não podendo ser substituída pela assistência de familiares que tem reconhecidamente condições de prestá-la.
Dessa forma, a autora não preenche os requisitos necessários para o deferimento do benefício.
Diante do exposto, nos termos do art. 543-C do CPC/1973 (arts. 1036, 1037, §4º, 1038, caput, I, e §§ 1º e 2º, do CPC/2015), adoto como razões de decidir o entendimento acima consignado, sem alteração no resultado do julgamento, anteriormente proferido.
Decorrido o prazo recursal, encaminhem-se os autos à Subsecretaria de Feitos da Vice-Presidência para as providências cabíveis.
É como voto.
MARISA SANTOS
Desembargadora Federal
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Data e Hora: | 03/06/2016 13:29:34 |