D.E. Publicado em 04/11/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012617-84.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o benefício da aposentadoria por idade, devida ao trabalhador rural.
A r. sentença de fls. 173/174 julgou improcedente o pedido e condenou a requerente nos ônus de sucumbência, observados os benefícios da justiça gratuita.
Em razões recursais de fls. 177/185, pugna a parte autora pela reforma da sentença, ao argumento de ter preenchido os requisitos autorizadores à concessão do benefício.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta instância.
É o relatório.
VOTO
A Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural - FUNRURAL, em seu art. 4º, dispunha ser a aposentadoria por velhice devida ao trabalhador rural que completasse 65 (sessenta e cinco) anos. Em 30 de outubro de 1973, foi publicada a Lei Complementar nº 16, que alterou dispositivos da supracitada lei e fixou, no seu art. 5º, que a qualidade de trabalhador rural dependeria da comprovação de sua atividade pelo menos nos últimos três anos anteriores à data do pedido do benefício, ainda que de forma descontínua. A partir da edição da Lei nº 8.213/91, tal dispositivo constitucional foi definitivamente regulamentado e, portanto, a idade para a concessão da aposentadoria do trabalhador rural diminuída para 60 (sessenta anos), se homem e 55 (cinqüenta e cinco), se mulher.
Também o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, que aprovou o Regulamento dos Benefícios da Previdência Social dispunha, litteris:
A Constituição Federal de 1988 trouxe, em sua redação original, o art. 202, I, in verbis:
Enquanto a Lei Complementar nº 16/73 exigia que o beneficiário comprovasse o exercício da atividade rural por pelo menos 3 (três) anos, o período de carência estabelecido pela Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, é aquele a que remete a tabela progressiva constante do seu art. 142.
Também neste sentido preceitua a Lei nº 8.213/91, ao prescrever em seus arts. 39, I, 48, §1º e 143 que o benefício da aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais em regime de economia familiar é devido ao segurado especial, assim considerado pelo art. 11, VII, do diploma legal citado, que completar 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinqüenta e cinco) anos, se mulher e comprovar o exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período equivalente à carência exigida, nos termos dos arts. 26, III, e 142 do referido texto legal.
A lei deu tratamento diferenciado ao rurícola e ao produtor rural em regime de economia familiar, dispensando-os do período de carência, que é o número mínimo de contribuições mensais necessárias para a concessão do benefício, a teor do que preceitua o art. 26, III, c.c. o art. 39, I, ambos da Lei nº 8.213/91, bastando comprovar, tão-somente, o exercício da atividade rural nos termos da tabela progressiva, de caráter transitório, prevista no art. 142 da Lei Previdenciária, que varia de acordo com o ano de implementação das condições legais.
Não é diferente o entendimento da doutrina:
Também neste sentido é o ensinamento contido na página 368 da supracitada obra:
Já no que se refere à comprovação do labor campesino, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que balizam o entendimento deste Relator no que diz com a valoração das provas comumente apresentadas.
Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, por parte do autor, de propriedade rural, só se constituirá em elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor. No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
Tem-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e a sua aceitação.
Aprecio também a questão, insistentemente trazida à discussão pelo Ente Previdenciário, de que a comprovação do exercício da atividade rural deva se referir ao período imediatamente anterior ao requerimento do benefício. Neste ponto, dispõe o art. 143 da Lei de Benefícios, com redação dada pela Lei nº 9.063/95:
Também neste sentido:
Ressalte-se que, nos termos do art. 3º, §1º, da Lei nº 10.666/03, a perda da qualidade de segurado não é levada em conta para a concessão do benefício pleiteado.
Já no que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu serviço compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as contribuições tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, a empregador rural pessoa física ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Ao caso dos autos.
O autor completou o requisito idade mínima em 2011 (fl. 21) e, em observância ao disposto no art. 142 da Lei de Benefícios, deverá demonstrar o efetivo exercício da atividade rural por, no mínimo, 180 meses.
Goza de presunção legal e veracidade juris tantum a atividade rural devidamente registrada em carteira de trabalho e prevalece se provas em contrário não são apresentadas. Ademais, as cópias simples dos registros na CTPS possuem a mesma eficácia probatória do documento particular, conforme preconiza o art. 367 do CPC.
In casu, o vínculo empregatício da autora nos períodos de 01/01/2002 a 15/06/2002, 23/09/2002 a 11/01/2003, 13/09/2004 a 16/11/2004, 25/09/2006 a 23/03/2007 e 01/07/2010 a 19/08/2011, conforme anotação em CTPS de fls. 28/49, constituem prova plena do efetivo exercício de sua atividade rural em tal interregno, nos termos do art. 106, I, da Lei de Benefícios, além de servir como início razoável de prova material da atividade rural nos demais períodos.
Entretanto, a prova testemunhal não corroborou de forma satisfatória. A testemunha Valdemir Aparecido Payliare disse que conhece o autor há 10 anos e que ele trabalhava na cultura de laranja. No entanto, a testemunha disse que não trabalhou com o autor, apenas o via saindo com o caminhão e o trator, indicando que ele era motorista. Conclui-se que a prova é frágil (fl. 172/mídia).
Na mesma senda, também constam na CTPS vínculos empregatícios exercidos em atividade urbana como motorista nos períodos de 01/05/1975 a 20/07/1975, 15/08/1980 a 01/01/1981, 02/04/1983 a 17/07/1983, 01/11/1986 a 01/12/1987, 22/05/1990 a 13/07/1990, 01/03/1994 a 01/09/1994, 17/04/1996 a 22/12/1996, 16/04/1997 a 26/12/1997 e 18/07/2006 a 31/08/2006. Sendo assim, tais fatos ilidem o início de prova material apresentado aos autos quanto à atividade rural alegada pela parte autora.
Como se vê, não restou amplamente comprovado o aspecto temporal da atividade rural em observância ao disposto no art. 142 da Lei de Benefícios, pelo que não faz jus a parte autora ao benefício pleiteado.
De rigor, portanto, a manutenção da improcedência do pedido pleiteado na inicial.
Deixo de condenar a parte autora ao pagamento dos ônus da sucumbência, em razão de ser beneficiária da gratuidade de justiça.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora, para manter a r. sentença, na forma acima fundamentada.
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Desembargador Federal
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