
D.E. Publicado em 10/11/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido da parte autora e dar parcial provimento à sua apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002488-02.2011.4.03.6117/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação de sentença pela qual julgou parcialmente procedente o pedido apenas para averbar o exercício de atividade especial no período de 19.01.2009 a 20.07.2010. Ante a sucumbência recíproca, as partes arcarão com as despesas de seus respectivos patronos, observada a gratuidade judiciária concedida ao autor. Sem custas.
Agravo retido interposto às fls. 353/357.
Em suas razões de inconformismo, pugna o autor pela reforma da r. sentença requerendo, preliminarmente, a apreciação do agravo retido para que os autos retornem ao Juízo de origem, a fim de que seja produzida prova pericial tendente a comprovar o exercício de atividade especial. No mérito, aduz que trabalhou em indústria calçadista nos períodos indicados na inicial, de modo que faz ao reconhecimento de atividade especial, ante a exposição a agentes nocivos à saúde, sobretudo agentes químicos como cola de sapateiro e solvente.
Com a apresentação de contrarrazões pelo INSS pugnando pela manutenção da sentença (fls. 510), vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002488-02.2011.4.03.6117/SP
VOTO
Do agravo retido
Há de ser rejeitado o argumento da parte autora no sentido de que os autos devem retornar ao Juízo de origem para produção de prova pericial.
Com efeito, a decisão monocrática de fls. 279/280 já havia determinado o retorno dos autos para regular instrução do feito, ressaltando que ao autor caberia juntar os documentos necessários ao deslinde da ação, como PPP, formulário DSS-8030 ou laudo técnico emitidos pelos empregadores. Ainda restou claro que a perícia judicial somente se justificaria após a tentativa do demandante em buscar referidos documentos, demonstrando a recusa imotivada das empresas.
Ocorre que, apesar das diversas oportunidades, conforme despachos de fls. 285, 312 e 315, o requerente se manteve inerte e não diligenciou ao menos para comprovar a recusa imotivada das empresas quanto ao fornecimento dos documentos necessários à apreciação de atividade especial.
Desse modo, não pode o autor se valer de sua própria torpeza (inércia quanto ao cumprimento da diligência requisitada) para requerer, novamente, a produção de prova pericial, não havendo que se falar em eventual cerceamento de defesa. Sendo assim, conheço do agravo retido de fls. 353/357, porém, nego-lhe provimento.
Do mérito
Busca o autor, nascido em 15.10.1958, o reconhecimento de atividade especial nos períodos de 08.05.1973 a 03.05.1977, 01.08.1977 a 02.01.1979, 21.03.1979 a 16.07.1979, 07.05.1980 a 20.02.1986, 02.06.1986 a 20.08.1986, 03.11.1986 a 14.01.1987, 01.04.1987 a 30.04.1992, 01.07.1992 a 13.12.1995, 23.09.1996 a 30.08.2002, 02.07.2007 a 29.05.2008 e de 19.01.2009 a 20.07.2010, todos laborados em indústria calçadista. Consequentemente, requer a concessão do benefício de aposentadoria especial, desde a data do requerimento administrativo (13.04.2011), ou, sucessivamente, a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Primeiramente, observo que o exercício de atividade especial do período de 19.01.2009 a 20.07.2010 restou incontroverso, uma vez que não houve impugnação específica do INSS, tendo a sentença se limitado a averbá-lo, não havendo condenação pecuniária em desfavor da Autarquia que justificasse o conhecimento da remessa oficial.
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos 83.080/79 e 53.831/64, até 05.03.1997, e após pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95 como a seguir se verifica.
O artigo 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original:
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96 o dispositivo legal supra transcrito passou a ter a redação abaixo transcrita, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido, confira-se a jurisprudência:
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
Ressalto que os Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
No caso dos autos, os contratos de trabalho anotados em carteira profissional cujas atividades eram correlatas à função de sapateiro (CTPS fls. 37/82) até 10.12.1997 são suficientes à comprovação da exposição a agentes nocivos insalubres, uma vez que a utilização de hidrocarboneto tóxico - derivado do carbono "cola de sapateiro" é inerente a tal atividade, utilizada no processo produtivo em empresas - fábrica de sapatos, localizada na cidade de Franca, conhecido polo industrial de calçados.
De outro turno, nos termos do código 1.2.11 do Decreto 53.831/64 havia presunção legal de que a presença de hidrocarboneto tóxico no processo produtivo era prejudicial ao trabalhador.
Assim, deve ser reconhecido o exercício de atividade especial nos períodos de 08.05.1973 a 03.05.1977 (CTPS; fls. 39), 01.08.1977 a 02.01.1979 (CTPS; fls. 40), 21.03.1979 a 16.07.1979 (CTPS; fls. 41), 07.05.1980 a 20.02.1986 (CTPS; fls. 42), 02.06.1986 a 20.08.1986 (CTPS; fls. 43), 03.11.1986 a 14.01.1987 (CTPS; fls. 43), 01.04.1987 a 30.04.1992 (CTPS; fls. 44), 01.07.1992 a 13.12.1995 (CTPS; fls. 66), 23.09.1996 a 10.12.1997 (CTPS; fls. 67), uma vez que o autor exerceu funções correlatas à atividade de sapateiro.
Esclareço, ainda, que o laudo técnico trazido pela parte autora, emitido pelo sindicato dos Trabalhadores de Jaú, prova emprestada (fls. 108/170), cujo teor é meramente indicativo, não vincula o magistrado.
Nos termos do §2º do art.68 do Decreto 8.123/2013, que deu nova redação do Decreto 3.048/99, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração.
No caso dos autos, os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho.
Por outro lado, não há possibilidade de reconhecer a especialidade dos períodos de 11.12.1997 a 30.08.2002 e de 02.07.2007 a 29.05.2008, ante a ausência de comprovação de exposição a agentes nocivos por meio de Perfil Profssiográfico ou laudo técnico emitido pelo respectivo empregador.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas:
Tese 1 - regra geral: O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial.
Tese 2 - agente nocivo ruído: Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
Contudo, deve ser desconsiderada a informação de utilização do EPI quanto ao reconhecimento de atividade especial dos períodos até a véspera da publicação da Lei 9.732/98 (13.12.1998), conforme o Enunciado nº 21, da Resolução nº 01 de 11.11.1999 e Instrução Normativa do INSS n.07/2000.
Somados apenas os períodos de atividade especial, o autor totaliza 23 anos, 02 meses e 12 dias de atividade exclusivamente especial, conforme primeira planilha anexa, parte integrante da presente decisão, insuficiente à concessão do benefício de aposentadoria especial previsto no artigo 57, caput, da Lei 8.213/1991.
Entretanto, convertendo-os em comuns e somados aos demais, o autor totaliza 32 anos, 03 meses e 21 dias de tempo de serviço até 15.12.1998 e 42 anos e 17 dias de tempo de serviço até 13.04.2011, data do requerimento administrativo, conforme segunda planilha anexa, parte integrante da presente decisão.
Destarte, o autor faz jus à concessão da aposentadoria por tempo de serviço, com renda mensal de 82% do salário-de-benefício, considerando-se o tempo de serviço computado até 15.12.1998, nos termos do art. 53, inc. II e do art.29, caput, em sua redação original, ambos da Lei nº 8.213/91.
Insta ressaltar que o art. 201, §7º, inciso I, da Constituição da República de 1988, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/98, garante o direito à aposentadoria integral, independentemente de idade mínima, àquele que completou 35 anos de tempo de serviço.
Assim, caso seja mais favorável ao autor, fica ressalvada a possibilidade de computar o tempo de serviço, e os correspondentes salários-de-contribuição, até 13.04.2011, data do requerimento administrativo, mas com valor do beneficio calculado na forma do art. 29, inciso I, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.876/99, opção sistematizada no art. 187 e art. 188, A e B, ambos do Decreto 3.048/99, recebendo as diferenças daí decorrentes.
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados de acordo com a lei de regência.
Fixo o termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo (13.04.2011 - fl. 36), conforme entendimento jurisprudencial sedimentado nesse sentido. Não há prestações atingidas pela prescrição quinquenal, tendo em vista que o ajuizamento da ação se deu em 15.12.2011 (fl. 02).
Ante a sucumbência mínima da parte autora, fixo os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ e de acordo com o entendimento firmado por esta 10ª Turma.
Conforme CNIS de fls. 363, verifico que houve concessão administrativa do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB: 42/164.176.292-3 - DIB: 10.09.2013). Desse modo, em liquidação de sentença caberá ao autor optar entre o benefício judicial objeto da presente ação ou o benefício administrativo; se a opção recair sobre o benefício judicial deverão ser compensados os valores recebidos administrativamente.
Diante do exposto, nego provimento ao agravo retido interposto pela parte autora e dou parcial provimento à sua apelação para reconhecer a especialidade dos períodos de 08.05.1973 a 03.05.1977, 01.08.1977 a 02.01.1979, 21.03.1979 a 16.07.1979, 07.05.1980 a 20.02.1986, 02.06.1986 a 20.08.1986, 03.11.1986 a 14.01.1987, 01.04.1987 a 30.04.1992, 01.07.1992 a 13.12.1995, 23.09.1996 a 10.12.1997, totalizando 32 anos, 03 meses e 21 dias de tempo de serviço até 15.12.1998 e 42 anos e 17 dias de tempo de serviço até 13.04.2011. Consequentemente, condeno o réu a conceder ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data requerimento administrativo (13.04.2011), devendo ser observado o cálculo previsto nos artigos 187 e 188, A e B, ambos do Decreto 3.048/1999. Honorários advocatícios fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença. As prestações em atraso serão resolvidas em fase de liquidação de sentença, compensando-se os valores recebidos administrativamente (NB 42/164.176.292-3).
É o voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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