D.E. Publicado em 15/12/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e dar provimento à apelação do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002342-09.2013.4.03.6143/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelações interpostas pelas partes em face de sentença pela qual foi julgado parcialmente procedente o pedido, para condenar o réu ao reconhecimento do tempo de serviço rural no período de 01.01.1976 a 10.05.1978, bem como a especialidade do labor no período de 01.03.2008 a 30.04.2012, julgando improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. Custas, como de lei. Sem honorários, em razão da sucumbência recíproca. Concedida a antecipação da tutela, para a imediata averbação de tais períodos, no prazo de 45 dias, sob pena de aplicação de multa diária no valor de R$ 200,00 (duzentos reais).
Noticiada pelo réu a averbação de tempo de serviço determinada, à fl. 134.
Em suas razões de inconformismo, pugna o autor pelo reconhecimento do desempenho de labor rural, sem anotação em CTPS, do interregno de 25.05.1964 a 31.12.1975, com a consequente concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo (29.10.2012), com cálculo da renda mensal inicial de acordo com o regramento contido nos artigos 188-A e 188-B do Decreto n. 3.048/99.
Por sua vez, o réu, em razões de apelo, alega a impossibilidade de reconhecimento de período rural anterior à Lei n. 8.213/91 para efeito de carência. Aduz, outrossim, que não restou comprovado o exercício de atividade rural em regime de economia familiar, sendo inadmissível a prova exclusivamente testemunhal. Sustenta, ainda, que não foi comprovada a especialidade do labor no período reconhecido pela sentença, tendo em vista que a utilização de equipamento individual neutraliza a insalubridade, bem como em razão da ausência de fonte de custeio. Por fim, requer seja afastada a condenação em multa diária, por ser inaplicável à Fazenda Pública.
Com apresentação de contrarrazões pelo autor (fls. 166/169), vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002342-09.2013.4.03.6143/SP
VOTO
Nos termos do artigo 1.011 do CPC/2015, recebo as apelações interpostas pelo autor (fls. 137/141) e pelo INSS (fls. 144/163).
Na petição inicial, busca o autor, nascido em 25.05.1952, a averbação de atividade rural, sem registro em carteira, do período de 25.05.1964 a 10.05.1978, bem como o reconhecimento da especialidade do intervalo de 01.03.2008 a 30.04.2012. Consequentemente, requer a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data do requerimento administrativo (29.10.2012; fl. 15).
A jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que é insuficiente apenas a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, na forma da Súmula 149 - STJ, in verbis:
No caso em apreço, a parte autora apresentou cópias de certidões de nascimento de irmãos, em 1961 e 1975 (fls. 35/36) , em que seu genitor fora qualificado como lavrador, bem como certidão de casamento contraído em 26.06.1976 (fl. 37) e certidão de nascimento de filha, em 1978 (fl. 39), em que ele próprio fora qualificado como lavrador. Tais documentos constituem início razoável de prova material de sua atividade campesina nos períodos que se pretende comprovar. Nesse sentido, confira-se julgado que porta a seguinte ementa:
Por seu turno, a prova testemunhal colhida em juízo (mídia à fl. 123) foi coerente e unânime a respeito do labor rural exercido pelo autor desde a infância, junto com os pais, na lavoura de café, em propriedades rurais de Getúlio Ferrari, no Estado do Paraná, na condição de arrendatários.
Conforme entendimento desta 10ª Turma é possível a averbação de atividade rural, a partir dos doze anos de idade, uma vez que a Constituição da República de 1967, no artigo 158, inciso X, passou a admitir ter o menor com 12 anos aptidão física para o trabalho braçal.
A orientação colegiada é pacífica no sentido de que razoável início de prova material não se confunde com prova plena, ou seja, constitui indício que deve ser complementado pela prova testemunhal quanto à totalidade do interregno que se pretende ver reconhecido. Portanto, os documentos apresentados, complementados por prova testemunhal idônea, comprovam o labor rural antes das datas neles assinaladas.
Dessa forma, ante o conjunto probatório, deve ser reconhecido o labor do autor na condição de rurícola, sem registro em carteira, no período de 25.05.1964 (momento em que completou 12 anos de idade) a 10.05.1978, devendo ser procedida à contagem de tempo de serviço cumprido no citado interregno, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência, nos termos do art. 55, parágrafo 2º, da Lei 8.213/91.
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos 83.080/79 e 53.831/64, até 05.03.1997, e após pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95 como a seguir se verifica.
O artigo 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original:
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96 o dispositivo legal supra transcrito passou a ter a redação abaixo transcrita, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido, confira-se a jurisprudência:
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
Ressalto que os Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
O Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB como agente nocivo à saúde.
Com o advento do Decreto n. 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso Especial Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, conforme ementa a seguir transcrita:
Conforme acima destacado, está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
Dessa forma, deve ser mantido o reconhecimento da especialidade no período de 01.03.2008 a 30.04.2012, junto à empresa "BL Bittar Indústria de Papel Ltdal" (PPP de fls. 40/41), por exposição a ruídos de 87 dB, agente nocivo previsto nos códigos 1.1.6 do Decreto n. 53.831/64 e 1.1.5 do Decreto n. 83.080/79.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas:
Tese 1 - regra geral: O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial.
Tese 2 - agente nocivo ruído: Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
No caso dos autos, a discussão quanto à utilização do EPI é despicienda, porquanto a parte autora esteve exposta ao agente nocivo ruído, cujos efeitos agressivos não são neutralizados pelos tipos de equipamentos de proteção individual atualmente disponíveis.
Destarte, somados o período de atividade especial com fator conversor, bem como o tempo de atividade rural ora reconhecido, aos demais incontroversos (fls. 21/25), o autor totaliza 33 anos e 07 dias de tempo de serviço até 15.12.1998 e 42 anos, 07 meses e 26 dias de tempo de serviço até 29.10.2012, data do requerimento administrativo, conforme planilha anexa, parte integrante da presente decisão.
Esclareço que o autor conta com recolhimentos previdenciários por mais de 24 anos, restando comprovado o cumprimento da carência.
Destarte, o autor faz jus à concessão da aposentadoria por tempo de serviço, com renda mensal de 88% do salário-de-benefício, considerando-se o tempo de serviço computado até 15.12.1998, nos termos do art. 53, inc. II e do art.29, caput, em sua redação original, ambos da Lei nº 8.213/91.
Insta ressaltar que o art. 201, §7º, inciso I, da Constituição da República de 1988, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/98, garante o direito à aposentadoria integral, independentemente de idade mínima, àquele que completou 35 anos de tempo de serviço.
Assim, caso seja mais favorável ao autor, fica ressalvada a possibilidade de computar o tempo de serviço, e os correspondentes salários-de-contribuição, até 29.10.2012, data do requerimento administrativo, mas com valor do beneficio calculado na forma do art. 29, inciso I, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.876/99, opção sistematizada no art. 187 e art. 188, A e B, ambos do Decreto 3.048/99, recebendo as diferenças daí decorrentes.
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados de acordo com a lei de regência.
Fixo o termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo (29.10.2012 - fls. 15/16), conforme entendimento jurisprudencial sedimentado nesse sentido.
Fixo os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ e de acordo com o entendimento firmado por esta 10ª Turma.
Prejudicada a questão relativa à multa diária, diante da ausência de mora na averbação de tempo de serviço.
Diante do exposto, nego provimento à apelação do réu e dou provimento à apelação do autor para julgar procedente o pedido reconhecendo o desempenho de labor rural no período de 25.05.1964 a 10.05.1978, totalizando 33 anos e 07 dias de tempo de serviço até 15.12.1998 e 42 anos, 07 meses e 26 dias de tempo de serviço até 29.10.2012. Consequentemente, condeno o réu a conceder ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data requerimento administrativo (29.10.2012), devendo ser observado o cálculo previsto nos artigos 187 e 188, A e B, ambos do Decreto 3.048/1999. Honorários advocatícios fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença. As prestações em atraso serão resolvidas em fase de liquidação de sentença.
Independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, instruído com os devidos documentos do autor JOSUÉ BUENO DA SILVA, a fim de serem adotadas as providências cabíveis para que seja o benefício de APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO implantado de imediato, com data de início - DIB em 29.10.2012, e renda mensal inicial - RMI a ser calculada pelo INSS, tendo em vista o caput do artigo 497 do CPC de 2015.
É o voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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Data e Hora: | 06/12/2016 16:55:13 |