
D.E. Publicado em 13/07/2015 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, em juízo de retratação, deu provimento ao agravo legal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0050637-28.2008.4.03.9999/MS
RELATÓRIO
Trata-se de ação ajuizada em face do INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade à trabalhadora rural.
A r. sentença monocrática de fls. 20/22 julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, com fundamento nos arts. 295, I e 267, VI, ambos do Código de Processo Civil.
Em razões recursais de fls. 27/32, pugnou a parte autora pela anulação da sentença e a consequente devolução dos autos ao Juízo de origem para regular processamento.
Em julgamento monocrático de fls. 37/38 foi dado parcial provimento à apelação da autora, para "anular a sentença, determinando a suspensão do processo por 60 (sessenta) dias, para que o apelante possa requerer o benefício ao INSS e, decorridos 45 (quarenta e cinco) dias do requerimento sem manifestação da autoridade administrativa, ou indeferido o benefício, retorne aos autos para prosseguimento perante o Juízo Monocrático".
Retornando os autos ao Juízo de origem, houve a suspensão do feito por 60 dias, tendo sido deferidas duas dilações de prazo. A autora apresentou alegação de que a autarquia negou-se ao protocolo do requerimento administrativo.
O Juízo a quo deu regular prosseguimento ao feito e proferiu nova sentença às fls. 110/112, na qual julgou improcedente o pedido.
A autora apelou, pleiteando a reforma da sentença às fls. 116/131.
Em novo julgamento monocrático de fls. 136/138, consta o seguinte dispositivo: "de ofício, anulo o processo a partir da decisão proferida às fls. 58 e julgo extinto o processo sem análise do mérito, com fulcro no art. 267, VI, do CPC, restando prejudicada a apelação da autora".
A autora interpôs agravo regimental pleiteando a apreciação do mérito da causa às fls. 140/143, o qual foi desprovido pelo colegiado às fls. 145/148.
Interposto Recurso Especial, foram os autos remetidos à E. Vice-Presidência desta Corte e, por decisão proferida às fls. 165/166, devolvidos a este Relator para eventual juízo de retratação previsto no artigo 543-C, §7º, inciso II, do Código de Processo Civil, considerando o paradigma firmado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça acerca da matéria em questão no REsp nº 1.369.834 (Dje 02.12.2014).
É o breve relato.
VOTO
Passo a reapreciar a controvérsia vertida nestes autos, a teor do previsto no artigo 543-C, §7º, II, do CPC:
Por sua vez, a decisão proferida pela E. Vice-Presidência desta Corte determinou o retorno dos autos a esta Turma Julgadora, assim assentando:
Reaprecio a matéria devolvida em sede de agravo.
A presente ação foi distribuída em 18/08/2008, portanto, anterior ao R.E. 631.240/MG, portanto, segundo o posicionamento adotado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de aplicar as regras de modulação previstas no Recurso Extraordinário, o interesse do segurado exsurge, mesmo que não tenha sido formulado o pedido na esfera administrativa, no momento em que a Autarquia Previdenciária oferece contestação, resistindo à pretensão deduzida e, como corolário lógico, caracterizando o conflito de interesses e instaurando-se a lide.
Desse modo, de rigor o provimento do agravo e a análise do mérito da apelação.
A Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural - FUNRURAL, em seu art. 4º, dispunha ser a aposentadoria por velhice devida ao trabalhador rural que completasse 65 (sessenta e cinco) anos. Em 30 de outubro de 1973, foi publicada a Lei Complementar nº 16, que alterou dispositivos da supracitada lei e fixou, no seu art. 5º, que a qualidade de trabalhador rural dependeria da comprovação de sua atividade pelo menos nos últimos três anos anteriores à data do pedido do benefício, ainda que de forma descontínua.
Também o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, que aprovou o Regulamento dos Benefícios da Previdência Social dispunha, litteris:
A Constituição Federal de 1988 trouxe, em sua redação original, o art. 202, I, in verbis:
A partir da edição da Lei nº 8.213/91, tal dispositivo constitucional foi definitivamente regulamentado e, portanto, a idade para a concessão da aposentadoria do trabalhador rural diminuída para 60 (sessenta anos), se homem e 55 (cinqüenta e cinco), se mulher.
Enquanto a Lei Complementar nº 16/73 exigia que o beneficiário comprovasse o exercício da atividade rural por pelo menos 3 (três) anos, o período de carência estabelecido pela Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, é aquele a que remete a tabela progressiva constante do seu art. 142.
Também neste sentido preceitua a Lei nº 8.213/91, ao prescrever em seus arts. 39, I, 48, §1º e 143 que o benefício da aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais em regime de economia familiar é devido ao segurado especial, assim considerado pelo art. 11, VII, do diploma legal citado, que completar 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinqüenta e cinco) anos, se mulher e comprovar o exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período equivalente à carência exigida, nos termos dos arts. 26, III, e 142 do referido texto legal.
A lei deu tratamento diferenciado ao rurícola e ao produtor rural em regime de economia familiar, dispensando-os do período de carência, que é o número mínimo de contribuições mensais necessárias para a concessão do benefício, a teor do que preceitua o art. 26, III, c.c. o art. 39, I, ambos da Lei nº 8.213/91, bastando comprovar, tão-somente, o exercício da atividade rural nos termos da tabela progressiva, de caráter transitório, prevista no art. 142 da Lei Previdenciária, que varia de acordo com o ano de implementação das condições legais.
Não é diferente o entendimento da doutrina:
Também neste sentido é o ensinamento contido na página 368 da supracitada obra:
Já no que se refere à comprovação do labor campesino, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que balizam o entendimento deste Relator no que diz com a valoração das provas comumente apresentadas.
Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, por parte do autor, de propriedade rural, só se constituirá em elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor. No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
Tem-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e a sua aceitação.
Aprecio também a questão, insistentemente trazida à discussão pelo Ente Previdenciário, de que a comprovação do exercício da atividade rural deva se referir ao período imediatamente anterior ao requerimento do benefício. Neste ponto, dispõe o art. 143 da Lei de Benefícios, com redação dada pela Lei nº 9.063/95:
Ressalte-se que, nos termos do art. 3º, §1º, da Lei nº 10.666/03, a perda da qualidade de segurado não é levada em conta para a concessão do benefício pleiteado.
Já no que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu serviço compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as contribuições tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, a empregador rural pessoa física ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Ao caso dos autos.
A autora completou o requisito idade mínima em 2008 (fl. 16) e, em observância ao disposto no art. 142 da Lei de Benefícios, deverá demonstrar o efetivo exercício da atividade rural por, no mínimo, 162 meses.
Dos documentos trazidos aos autos, destaco a cópia da certidão de casamento, ocorrido em 1970, a qual qualifica o marido da autora como lavrador (fl. 17).
Tal documento trazido aos autos constitui início razoável de prova material da atividade rural da autora, conforme entendimento já consagrado pelos tribunais.
No entanto, os extratos de consulta ao CNIS e ao PLENUS de fls. 100/102 informam que a autora possuiu apenas vínculos empregatícios de caráter urbano, no período de 04/03/1986 a 04/08/2008, na Prefeitura Municipal de Euclides da Cunha - SP, e no período de 02/04/2007 a 05/2010, na empresa Chapadão Comércio de Água e Gás Ltda., bem como recebeu o benefício de auxílio-doença, na condição de comerciária, no período de 07/09/2005 a 11/12/2005.
Conclui-se, desta forma, que o início de prova material foi ilidido pelas informações trazidas aos autos, incidindo, à espécie, o enunciado da Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Desta feita, de rigor a manutenção da improcedência da demanda.
Ante o exposto, em juízo de retratação a que alude o artigo 543-C, §7º, II, do Código de Processo Civil, dou provimento ao agravo oposto pela parte autora para apreciar o mérito da causa e, no mérito, nego provimento à apelação, mantendo a r. sentença proferida em 1º grau de jurisdição.
É como voto.
GILBERTO JORDAN
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Data e Hora: | 30/06/2015 15:40:51 |