
D.E. Publicado em 09/02/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer da apelação, rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, dar-lhe provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0034816-66.2017.4.03.9999/MS
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de apelação interposta em face da r. sentença que julgou parcialmente procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade rural, a partir do pedido administrativo, com os consectários legais, dispensado o reexame necessário, confirmando a tutela antecipada.
Em suas razões, o INSS requer, preliminarmente, a nulidade da r. sentença, pelas razões que expõe. No mérito, requer a reforma do julgado, em razão da não comprovação da qualidade de segurada especial. Subsidiariamente requer seja declarada a isenção em relação às custas processuais. Prequestiona a matéria.
Contrarrazões apresentadas.
Subiram os autos a esta egrégia Corte, tendo sido distribuídos a este relator.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço da apelação porque presentes os requisitos de admissibilidade.
Inicialmente, entendo desnecessária a anulação da sentença.
Conforme disposto no Código de Processo Civil, existe litispendência ou coisa julgada quando se verifica a perfeita identidade entre as demandas dos três elementos da ação: partes, causa de pedir e pedido.
No caso, analisando-se o conteúdo de ambas as ações, infere-se que está presente a tríplice identidade, sendo patente a ocorrência de litispendência.
No mais, enquanto a presente ação foi proposta em 26/2/2013 na Comarca de Aquidauana, a outra ação, que tramitou na 1ª Vara Federal de Dourados, foi distribuída em 23/2/2011.
Ocorre que a primeira ação ajuizada foi extinta sem resolução do mérito, na forma do art. 267, VI, última figura, do Código de Processo Civil, vigente à época, uma vez que a aposentadoria já havia sido concedida administrativamente.
Contudo, da análise dos autos, a implantação do benefício se deu em virtude da concessão da antecipação de tutela neste processo, fazendo com que o Desembargador Federal Toru Yamamoto mantivesse a extinção do primeiro processo, sem resolução do mérito, todavia por fundamento diverso, uma vez que entendeu a configuração da figura da litispendência.
Assim, diante do quadro que se instaurou, o juízo a quo revogou a decisão que havia indeferido a inicial quanto ao pedido de aposentadoria por idade rural, sob o argumento de que o referido pleito já estava sendo discutido nos autos que tramitavam na Justiça Federal de Dourados/MS.
Como bem ressaltou o juízo a quo, a decisão de extinção do primeiro processo, sem resolução do mérito, causou um prejuízo irreparável à autora, já que esta ação já havia sido extinta, também por litispendência, quanto ao pedido de aposentadoria por idade rural, exatamente pela existência de ação mais antiga que tramitada na Justiça Federal. Ou seja, a parte autora teve duas ações extintas, o que é inconcebível, porquanto apenas a mais recente resulta na repetição da lide.
Como esta ação ainda tramitava em relação ao pedido de indenização por danos morais e, com fulcro nos princípios da instrumentalidade das formas e da economia processual, a decisão anterior foi revogada, na parte que indeferiu a inicial quanto ao pedido de aposentadoria, determinando o prosseguimento do feito, acarretando em sentença de mérito, ora atacada por este recurso de apelação.
A nulidade da r. sentença neste momento feriria extremamente princípios como o da efetividade processual e o da primazia do mérito, tão desejado pelo Novo Código de Processo Civil. Ela será legítima apenas naqueles excepcionais casos em que se encontre vício verdadeiramente insanável ou que, havendo necessidade de atividade da parte para que seja sanado o vício, esta permaneça inerte e não o corrija, inviabilizando a superação do obstáculo.
No mérito, discute-se nos autos o direito da parte autora a benefício de aposentadoria por idade.
A aposentadoria por idade, rural e urbana, é garantida pela Constituição Federal em seu artigo 201, §7º, inciso II, para os segurados do regime geral de previdência social (RGPS), nos termos da lei e desde que obedecidas as seguintes condições:
Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, a saber: a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento, consoante o disposto na Lei n. 8.213/91.
A questão relativa à comprovação de atividade rural se encontra pacificada no Superior Tribunal de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente testemunhal (Súmula 149 do STJ).
De acordo com o que restou definido quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), aplica-se a súmula acima aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material, corroborada com provas testemunhal, para comprovação de tempo de serviço.
Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por meio de documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois isto importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade a prova testemunhal para demonstração do labor rural.
Contudo, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar, na forma da súmula nº 34 da TNU.
Admite-se, ainda, a extensão da qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro. Para além, segundo a súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de trabalho rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
No mais, segundo o RESP 1.354.908, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), necessária a comprovação do tempo de atividade rural no período imediatamente anterior à aquisição da idade:
Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de ativ idade no meio rural (STJ, REsp 207.425, 5ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei, nos seguintes termos:
Assim, o prazo de 15 (quinze) anos do artigo 143 da Lei 8.213/91 expiraria em 25/07/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 02 (dois) anos, estendendo-se até 25/07/2008, em face do disposto na MP 312/06, convertida na Lei 11.368/06.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 410/07, convertida na Lei 11.718/08, estabeleceu nova prorrogação para o prazo previsto no artigo 143 da Lei 8.213/91, nos seguintes termos:
Observe-se que, nos termos do artigo 2º da Lei nº 11.718/08, o prazo estabelecido no referido artigo 143 da LBPS passou a vigorar até 31/12/2010. Bizarramente, com flagrante antinomia com o artigo 2º, o artigo 3º da Lei nº 11.718/08 acaba por indiretamente estender o prazo até 31/12/2020, além de criar tempo de serviço ficto.
Abstração feita da hipotética ofensa à Constituição Federal, por falta de relevância e urgência da medida provisória, e por possível ofensa ao princípio hospedado no artigo 194, § único, II, do Texto Magno, o fato é que a Lei nº 11.718/08 não contemplou o trabalhador rural que se enquadra na categoria de segurado especial.
No caso do segurado especial, definido no artigo 11, inciso VII, da Lei 8.213/91, remanesce o disposto no artigo 39 desta última lei. Diferentemente dos demais trabalhadores rurais, trata-se de segurado que mantém vínculo com a previdência social mediante contribuição descontada em percentual incidente sobre a receita oriunda da venda de seus produtos, na forma do artigo 25, caput e incisos, da Lei nº 8.212/91. Vale dizer: após 25/07/2006, a pretensão do segurado especial ao recebimento de aposentadoria por idade deverá ser analisada conforme o disposto no artigo 39, inciso I, da Lei 8.213/91.
Ademais, não obstante o "pseudo-exaurimento" da regra transitória insculpida no artigo 143 da Lei n. 8.213/91, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, fato é que a regra permanente do artigo 48 dessa norma continua a exigir, para concessão de aposentadoria por idade a rurícolas, a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante § 1º e § 2º do referido dispositivo.
A questão já foi apreciada, por ora sem muita profundidade, por nossos tribunais, conforme se infere dos seguintes julgados:
No caso em discussão, o requisito etário restou preenchido em 22/8/1996.
A autora alega que sempre trabalhou na roça, em regime de economia familiar, mas não há nos autos um único documento em nome dela.
Como início de prova material, a autora juntou apenas documentos em nome do marido Otávio Aquiles da Silva, tais como cópia da certidão de casamento - celebrado em 21/8/1971 - onde ele foi qualificado como lavrador, e documentos referentes à sua propriedade rural, denominada Chácara Boa Vista, de 12 hectares.
Frise-se que a jurisprudência admite a extensão da condição de lavrador para a esposa (nos casos do trabalho em regime de economia familiar, nos quais é imprescindível sua ajuda para a produção e subsistência da família).
Em exceção à regra geral, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.
Sucede, porém, que o marido exerceu vínculos urbanos por vários anos, nos períodos de 11/2/1980 a 12/3/1980, 1º/5/1980 sem data de saída, 6/3/1981 a 27/3/1985, 1º/12/1983 a 12/1983, 23/2/1987 a 23/5/1987, 1º/3/1989 a 29/5/1989, 10/7/1989 a 5/7/1990, 18/1/1991 a 1º/7/1991, bem como verteu contribuições previdenciárias, na qualidade de contribuinte individual, no intervalo de 6/2003 a 7/2004. Outrossim, recebeu auxílio-doença, na qualidade de comerciário, entre 21/6/2004 e 31/1/2010, e desde então, está aposentado por invalidez (vide CNIS de f. 93).
Vide julgados abaixo:
Ocorre que a existência de diversos vínculos urbanos da pessoa cujas provas pretende beneficiar-se demonstra que o núcleo familiar não tinha como fonte de receita somente o labor rural, mas sim o labor urbano com o qual viveram por anos, e isso porque o esposo recebe benefício de aposentadoria por invalidez, na qualidade de comerciário, desde 2010 (vide f. 91 verso).
Nos termos do artigo 11, § 9º, da Lei nº 8.213/91, com a redação da Lei nº 11.718/2008, não é segurado especial o membro de grupo familiar que possuir outra fonte de rendimento. No caso, o grupo familiar possui outra fonte de rendimento há décadas, consistindo inicialmente no trabalho do marido como urbano, posteriormente na aposentadoria do mesmo.
Por sua vez, os depoimentos das testemunhas, não são suficientes para patentear o efetivo exercício de atividade rural da autora em propriedade rural do marido, sem detalhe algum, não souberam contextualizar temporalmente, nem quantitativamente, seu trabalho rural.
Além disso, não há provas da indispensabilidade do trabalho da autora para o sustento do grupo familiar.
A declaração de sindicato rural constante de f. 13/14 não possui mínima força probatória, porquanto não homologada pelo INSS, produzindo efeitos, tão somente, em relação ao declarante, nos termos da legislação processual passada e atual.
À derradeira, friso que a simples posse de uma propriedade rural não evidencia que tipo de atividade é realizada nela, de forma que não ficou demonstrado o trabalho em regime de economia familiar que se baseia numa produção rudimentar para subsistência.
Em decorrência, concluo pelo não preenchimento dos requisitos exigidos à concessão do benefício pretendido.
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Novo CPC.
Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, conheço da apelação, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou-lhe provimento, para julgar improcedente o pedido.
Comunique-se, via e-mail, para fins de revogação da tutela antecipatória de urgência concedida.
É o voto.
Juiz Federal Convocado
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Data e Hora: | 26/01/2018 20:54:16 |