D.E. Publicado em 10/11/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar às preliminares arguidas pelas partes e, no mérito, negar provimento ao agravo retido interposto pelo autor e dar parcial provimento à remessa oficial tida por interposta e às apelações do autor e do réu, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009581-41.2013.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelações interpostas pelas partes em face de sentença que julgou procedentes os pedidos formulados em ação previdenciária, para reconhecer como atividade especial os períodos de 22.02.1988 a 01.04.2014 e, consequentemente, determinou a concessão de aposentadoria especial, desde 18.01.2013 (DER). Juros e correção monetária seguirão as regras dispostas na Resolução nº 267/2013 do Conselho da Justiça Federal e eventuais atualizações, que aprovou o manual de orientação de procedimentos para cálculos na Justiça Federal. Honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação apurado até a data da sentença. Concedida a antecipação dos efeitos da tutela, determinando-se a implantação imediata do beneficio.
Em suas razões de inconformismo recursal, a parte autora, preliminarmente, requer a apreciação do agravo retido interposto em face de decisão que indeferiu a produção de prova documental. No mérito, pleiteia pela conversão do tempo comum em especial referentes aos períodos de 12.02.1986 a 15.10.1987. Pugna, por fim, pela majoração dos honorários advocatícios, a fim de que sejam fixados em 15% do valor da condenação até a data da prolação da sentença.
Por sua vez, o réu, em sua apelação, aduz, prelimarmente, nulidade da sentença, tendo em vista que a consideração de laudo pericial produzido em reclamatória trabalhista configuraria ato atentatório ao direito de ampla defesa, bem como requer a modificação da data de início do benefício para 01.04.2014, posto que na data de entrada do requerimento, o autor não havia cumprido o tempo mínimo para concessão do benefício de aposentadoria especial.
Com a apresentação de contrarrazões apenas pela parte autora (fls. 247/250), vieram os autos esta Corte.
É o relatório.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009581-41.2013.4.03.6183/SP
VOTO
Da preliminares
Da ofensa à ampla defesa
Deve ser rejeitada a alegação da autarquia previdenciária de nulidade de sentença por ofensa ao seu direito de ampla defesa, em razão da consideração, pelo Juízo "a quo", de laudo pericial elaborado em reclamação trabalhista, da qual o INSS não fez parte.
Com efeito, denota-se do artigo 372 do CPC/2015 que ao juiz é facultado a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, desde que observado o contraditório. Outrossim, é pacífico o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça quanto à legalidade da prova emprestada, quando esta é produzida com respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa (vide: AREsp 763733/BA, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 30.08.2016).
Nesse contexto, consoante se verifica do despacho de fl. 211, o INSS foi devidamente intimado para se manifestar acerca do laudo pericial, não tendo, entretanto, naquela oportunidade, apresentado qualquer resistência (cota de fl. 213). Dessa forma, no caso em apreço, foram observados os princípios da ampla defesa e do contraditório. Portanto, o laudo pericial elaborado na Justiça do Trabalho pode ser utilizado como prova emprestada, especialmente por ter sido realizado no local de trabalho em que o autor exerceu suas funções e atividades. Ademais, ressalto que o perito judicial é profissional legalmente habilitado que detém conhecimento técnico e equidistante das partes.
O requerimento de modificação da data inicial do benefício, arguido em preliminar pelo réu, confunde-se com o mérito e será com ele analisado.
Do agravo retido
Por outro lado, também há de ser rejeitado o argumento da parte autora no sentido de que o indeferimento de produção de prova pericial configurou cerceamento de defesa, uma vez que os documentos constantes nos autos, sobretudo os laudos técnicos e Perfil Profissiográfico Previdenciário, são suficientes à apreciação do exercício de atividade especial que se quer comprovar. Sendo assim, conheço do agravo retido de fls. 167/171, porém, nego-lhe provimento.
Da remessa oficial tida por interposta
Aplica-se ao presente caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe:
Do mérito
Na petição inicial, busca o autor, nascido em 13.08.1966 (fl. 40), o reconhecimento de atividade especial dos períodos de 22.02.1988 a 27.11.2012, bem como a conversão de tempo comum em especial, com aplicação do fator redutor de 0,83%, referente aos intervalos de 12.02.1986 a 15.10.1987. Consequentemente, requer a concessão do benefício de aposentadoria especial, com termo inicial na data do requerimento administrativo (18.01.2013 - fl. 60). Informa, outrossim, que continua vertendo contribuições ao RGPS após o requerimento administrativo, bem como permanece sujeito a condições especiais, requerendo, sucessivamente, a consideração de tal tempo para fins de concessão de aposentadoria especial, no caso de não consideração de preenchimento dos requisitos necessários à data do requerimento administrativo.
Inicialmente, importa anotar que o INSS reconheceu administrativamente o exercício de atividade especial no intervalo de 22.02.1988 a 05.03.1997, conforme informação de fl. 45, restando, pois, incontroverso.
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos 83.080/79 e 53.831/64, até 05.03.1997, e após pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95 como a seguir se verifica.
O artigo 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original:
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96 o dispositivo legal supra transcrito passou a ter a redação abaixo transcrita, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido, confira-se a jurisprudência:
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
Ressalto que os Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
O Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB como agente nocivo à saúde.
Ressalta-se que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Com o advento do Decreto n. 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso Especial Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, conforme ementa a seguir transcrita:
Conforme acima destacado, está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
No caso dos autos, a fim de comprovar a especialidade dos períodos pleiteados, o autor apresentou Perfil Profissiográfico Previdenciário às fls. 54/56, por meio do qual se verifica que laborou junto à Mercedes-Benz do Brasil Ltda. e esteve exposto a ruído nos seguintes patamares: de 22.02.1988 a 31.10.2004: 86 dB(A) e de 01.11.2004 a 27.11.2012: 85,6 dB(A).
Em complemento, foi apresentado laudo pericial elaborado para fins de instrução de reclamação trabalhista proposta pelo próprio autor (fls. 179/209). Segundo o referido documento, além da sujeição ao agente nocivo ruído, o obreiro também esteve em contato dermal com óleos/graxas de origem mineral e cola a base de poliuretanas.
Portanto, deve ser mantido o reconhecimento da especialidade dos períodos de 06.03.1997 a 01.04.2014 laborados junto à Mercedes-Benz do Brasil Ltda. De fato, durante todo o referido interregno, o autor exercia atividades que o mantinha em contato com agentes biológicos previstos no código 1.2.10, Anexo I, do Decreto 83.080/79 e no código 1.0.7, Anexo IV, do Decreto 3.048/99. Ademais, no intervalo de 19.11.2003 a 01.04.2014 esteve exposto a ruído acima do acima do limite de 85 decibéis, fixado no código 2.0.1, Anexo IV, do Decreto 3.048/99.
Ressalto que, quanto à conversão de atividade comum em especial, com utilização do redutor para compor a base de cálculo da aposentadoria especial, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em julgamento ocorrido 26.11.2014, DJe de 02.02.2015, submetido à sistemática de Recurso Especial Repetitivo, REsp.1310034/PR, firmou entendimento pela inaplicabilidade da regra que permitia a conversão de atividade comum em especial , utilizando-se o fator 0,71 para o homem e 0,83 para a mulher, a todos os benefícios requeridos após a vigência da Lei 9.032/95, caso dos autos (DER em 18.01.2013 - fl. 60).
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de EPI, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas:
Tese 1 - regra geral: O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial.
Tese 2 - agente nocivo ruído: Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
No referido julgado o Egrégio Supremo Tribunal Federal expressamente se manifestou no sentido de que caberá ao Judiciário verificar, no caso concreto, se a utilização do EPI descaracterizou (neutralizou) a nocividade da exposição ao alegado agente nocivo (químico, biológico, etc.), ressaltando, inclusive, que havendo divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a decisão deveria ser pelo reconhecimento do direito ao benefício de aposentadoria especial.
Quanto ao agente nocivo ruído, a discussão quanto à utilização do EPI, no caso em apreço, é despicienda, porquanto o autor esteve exposto ao referido agente nocivo em diversos períodos, cujos efeitos agressivos não são neutralizados pelos tipos de equipamentos de proteção individual atualmente disponíveis.
Portanto, com o reconhecimento do período cravado neste acórdão, como de atividade especial, o interessado alcança o total de 26 anos, 01 mês e 10 dias de atividade exclusivamente especial até 01.04.2014, data do último período reconhecido como exercido sob condições especiais, suficiente à concessão de aposentadoria especial nos termos do art. 57 da Lei 8.213/91, conforme planilha acostada à fl. 234.
Destarte, o autor faz jus à aposentadoria especial com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, sendo este último calculado pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
Fixo o termo inicial do benefício na data da citação (24.06.2014 - fl. 132), uma vez que à época do requerimento administrativo (18.01.2013 - fl. 60) o autor não havia implementado todos os requisitos necessários à jubilação.
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados de acordo com a lei de regência.
Fixo os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, eis que em conformidade com a Súmula 111 do STJ e de acordo com o entendimento firmado por esta 10ª Turma.
As autarquias são isentas das custas processuais (artigo 4º, inciso I da Lei 9.289/96), porém devem reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte vencedora (artigo 4º, parágrafo único).
Diante do exposto, rejeito às preliminares arguidas pelas partes e nego provimento ao agravo retido interposto pelo autor. No mérito, dou parcial provimento à remessa oficial tida por interposta e à apelação do réu para alterar a data inicial do benefício para 24.06.2014 (data da citação) e dou parcial provimento à apelação do autor para fixar os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) correspondente às prestações vencidas até a data da sentença. As prestações em atraso serão resolvidas em fase de liquidação de sentença, compensando-se os valores recebidos a título de antecipação de tutela.
Independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, devidamente instruído com cópia do ofício de fls. 238/239, a fim de que sejam adotadas as providências cabíveis para alteração da DIB do benefício de aposentadoria especial do autor, RIVONALDO DANTAS DE ASSIS (NB 46/156.840.118-0), para que o dia 24.06.2014 passe a constar como data inicial do referido benefício, tendo em vista o "caput" do artigo 497 do Novo CPC.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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