
D.E. Publicado em 19/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer em parte da apelação do INSS, e na parte conhecida, negar-lhe provimento, bem como à remessa necessária, e dar parcial provimento à apelação da parte autora, para condenar o INSS na implantação do benefício de aposentadoria especial, a partir da data do requerimento administrativo (28/05/2009), sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, condenando-o, ainda, no pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados no montante de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
Data e Hora: | 11/12/2018 19:06:41 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0004639-20.2010.4.03.6102/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e pela parte autora, em ação previdenciária ajuizada por JOSE BENEDITO ARAUJO DA SILVA, objetivando a concessão de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento do trabalho desenvolvido em condições especiais.
A r. sentença de fls. 296/302 julgou parcialmente procedente o pedido inicial, para reconhecer a especialidade entre 15/01/1981 a 30/09/1989, 02/10/1989 a 15/05/1996, 04/10/1999 a 10/04/2000, 01/08/2000 a 20/06/2001, 03/09/2001 a 30/10/2003, 01/11/2003 a 28/05/2009, e condenou o INSS na implantação da aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data do desligamento do emprego. Condenou-o, ainda, no pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados em R$ 1.000,00. Sentença submetida ao reexame necessário.
Em razões recursais de fls. 306/311, a parte autora pleiteia o reconhecimento da especialidade entre 11/11/1978 a 12/11/1980 ao exercer a profissão de cobrador e, consequentemente, a implantação da aposentadoria especial, a partir da data do requerimento administrativo, alegando que este deve ser o termo inicial para qualquer dos benefícios alternativamente pretendidos. Requer a condenação no pagamento dos honorários advocatícios no montante de 15% sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença.
O INSS, por sua vez, às fls. 314/316, sustenta a prescrição das parcelas vencidas cinco anos antes do ajuizamento, e invoca a reiteração do teor da decisão técnica administrativa que indeferiu a atividade especial. Por fim, aduz que a autarquia é isenta de custas.
Intimadas as partes, não foram apresentadas contrarrazões.
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Em primeiro lugar, não conheço do apelo da autarquia no tocante à prescrição quinquenal, pois a data de início do benefício foi fixada no momento de desligamento do emprego, e o último emprego do requerente (2009) não ultrapassa cinco anos do ajuizamento (2010). Também não conheço do pedido de isenção de custas da autarquia, pois a lei já prevê aludida orientação, acatada pela r. sentença.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifos nossos)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
No tocante à variação de ruído, é certo que, até então, vinha aplicando o entendimento no sentido da impossibilidade de reconhecimento da especialidade da atividade, na hipótese de submissão do empregado a nível de pressão sonora de intensidade variável, em que aquela de menor valor fosse inferior ao limite estabelecido pela legislação vigente.
Ao revisitar os julgados sobre o tema, tormentoso, percebe-se nova reflexão jurisprudencial, a qual adiro, para admitir a possibilidade de se considerar, como especial, o trabalho desempenhado sob sujeição a ruído em sua maior intensidade, na medida em que esta acaba por mascarar a de menor intensidade, militando em favor do segurado a presunção de que uma maior pressão sonora prevalecia sobre as demais existentes no mesmo setor.
Registre-se, a esse respeito, precedente do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual "não sendo possível aferir a média ponderada, deve ser considerado o maior nível de ruído a que estava exposto o segurado, motivo pelo qual deve ser reconhecida a especialidade do labor desenvolvido pelo segurado no período, merecendo reforma, portanto, a decisão agravada que considerou equivocadamente que o labor fora exercido pelo segurado com exposição permanente a ruído abaixo de 90dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003". Esta 7ª Turma, em caso análogo, assim decidiu:
De igual sorte, no caso de "atenuação" do ruído em decorrência do uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI, é certo que a sua utilização não reflete a real sujeição a mencionado agente agressivo e, bem por isso, há que se considerar, por coerência lógica, hipótese em que há atenuação apontada, a qual seria somada ao nível de ruído constante do laudo, para fins de aferição da efetiva potência sonora existente no ambiente laboral.
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Do caso concreto.
Quanto aos períodos trabalhados na empresa "Dedini S/A Equipamentos e Sistemas" entre 15/01/1981 a 30/09/1989 e 02/10/1989 a 15/05/1996, o Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 258/259, com indicação dos responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, juntamente com o laudo pericial de fls. 260/262, este assinado por médico do trabalho, comprovam que o requerente durante todo o período discutido estava exposto a ruído superior a 90dB.
Durante as atividades desenvolvidas na empresa "JWS Serviços S/C Ltda." entre 04/10/1999 a 10/04/2000, 01/08/2000 a 20/06/2001, 03/09/2001 a 30/10/2003 e 01/11/2003 a 28/05/2009, o Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 266/267, com indicação dos responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, juntamente com os laudos periciais de fls. 268/272, 273/277 e 278/282, estes assinados por engenheiro de segurança, demonstram que o autor estava exposto diariamente, nos três primeiros períodos, à pressão sonora entre 78dB e 100dB, e no último, a ruído superior a 90dB.
No que se refere ao interregno laborado entre 11/11/1978 a 12/11/1980 na empresa "Viação São Bento SA", a cópia da CTPS de fl. 33 indica que o requerente exerceu a função de cobrador de ônibus, cabendo ressaltar que a ocupação do requerente encontra previsão no Código 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64, sendo passível de reconhecimento como atividade especial pelo mero enquadramento da categoria profissional.
Cumpre considerar que é assente na jurisprudência que a CTPS constitui prova do período nela anotado, somente afastada a presunção de veracidade mediante apresentação de prova em contrário, conforme assentado no Enunciado nº 12 do Tribunal Superior do Trabalho. Não há qualquer suspeita de fraude registral para afastar aludido período, o que impõe a sua admissão como tempo de serviço especial.
Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrados como especiais os períodos de 11/11/1978 a 12/11/1980, 15/01/1981 a 30/09/1989, 02/10/1989 a 15/05/1996, 04/10/1999 a 10/04/2000, 01/08/2000 a 20/06/2001, 03/09/2001 a 30/10/2003 e 01/11/2003 a 28/05/2009, seja pelo enquadramento profissional como cobrador ou em razão de que em todos os demais casos o maior ruído atestado é superior ao limite de tolerância legal nos respectivos períodos.
Conforme planilha anexa, somando-se a especialidade reconhecida nesta demanda (11/11/1978 a 12/11/1980, 15/01/1981 a 30/09/1989, 02/10/1989 a 15/05/1996, 04/10/1999 a 10/04/2000, 01/08/2000 a 20/06/2001, 03/09/2001 a 30/10/2003 e 01/11/2003 a 28/05/2009), verifica-se que o autor contava com 26 anos, 5 meses e 25 dias de atividade desempenhada em condições especiais no momento do requerimento administrativo (11/03/2009 - fl. 96), o que lhe assegura o direito à aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 da Lei nº. 8.213/1991.
O requisito carência restou também completado.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (28/05/2009 - fl. 247).
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Diante do exposto, conheço em parte da apelação do INSS, e na parte conhecida, nego-lhe provimento, bem como à remessa necessária, e dou parcial provimento à apelação da parte autora, para condenar o INSS na implantação do benefício de aposentadoria especial, a partir da data do requerimento administrativo (28/05/2009), sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, condenando-o, ainda, no pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados no montante de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
Data e Hora: | 11/12/2018 19:06:37 |