D.E. Publicado em 24/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora e dar provimento à remessa necessária, tida por interposta e à apelação do INSS, para afastar o reconhecimento da atividade rural e, por consequência, julgar improcedente o pedido de concessão de aposentadoria, reformando-se a r. sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0039437-53.2010.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e pela parte autora em ação ajuizada por JOSÉ ROBERTO DA CUNHA, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural.
A r. sentença de fls. 78/85 julgou parcialmente procedente o pedido inicial, para reconhecer o tempo de serviço rural, no período de 1973 a 1979. Houve condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrados equitativamente em R$ 500,00 (art. 20, §4º, do CPC). Não houve condenação em custas e despesas processuais, em razão do disposto no art. 6º da Lei Estadual nº 11.608/2003, que afasta a incidência da Súmula nº 178 do STJ. Sentença não submetida à remessa necessária.
A parte autora interpôs apelação (fls. 95/99), requerendo a reforma da r. sentença, uma vez que preenche os requisitos legais para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
Em razões recursais de fls. 110/115, o INSS pugna pela reforma da r. sentença, ao fundamento de que não restou comprovado o labor rural. Assim, diante da insuficiência das provas documental e testemunhal, não faria jus o autor à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição. Ademais, sustenta que, caso seja reconhecido o período rural, fique consignado que não será considerado para efeito de carência ou contagem recíproca.
Devidamente processados os recursos, com as contrarrazões do INSS, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 29/04/2010, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475, § 2º do CPC/73:
No caso, o INSS foi condenado a reconhecer o labor rural no período de 1973 a 1979.
Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
Cumpre ressaltar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
No entanto, não há necessidade de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Impende registrar que é pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Do caso concreto.
Pretende o autor o reconhecimento do labor rural no período de 17/10/1964 a 02/10/2009.
Ressalte-se que o reconhecimento do labor rural somente é possível até 23/07/1991 (data anterior à vigência da Lei nº 8.213/91), considerando que há dispensabilidade de recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da referida Lei.
Assim, passo a analisar in casu o período rural de 17/10/1964 a 23/07/1991, para efeito de reconhecimento de tempo de serviço rural em regime de economia familiar.
Para comprovar o suposto labor rural, foram apresentados os seguintes documentos:
a) Certidão de casamento do autor (fl. 09), realizado em 17/05/1980, em que consta o demandante qualificado como "lavrador";
b) Cópia de escritura de venda e compra de imóvel rural (fls. 11/13), de 28 alqueires paulistas, datada de 26/12/2001, em que o demandante está qualificado como "agropecuarista" e "outorgado comprador".
Além dos documentos trazidos como início de prova material, foram ouvidas duas testemunhas, em 22/02/2010, Jayr Trinca (fls. 67/68) e José Oscar Hildebrand (fls. 69/70).
O depoente Jayr afirmou que conhece o autor há mais ou menos trinta anos da Fazenda de José Oscar, pois o sogro do depoente tinha o sítio vizinho à fazenda. Relatou que o autor mexia com gado, com boi e roça e que ficou trabalhando nesta fazenda até 1993/1994. Por fim, disse ter conhecimento de que depois desta data, o autor comprou uma propriedade, um "sitinho" perto de Fartura, onde trabalha.
Por sua vez, José Oscar Hildebrand afirmou que conheceu o autor desde 1972/1973 e que, na época, o depoente o "importou" de Macedônia, cidadezinha em que o demandante nasceu. Relatou que o autor fazia serviço de fazenda, que era gerente, que "mexia com tudo que tinha" e que foi registrado durante alguns anos, mas não soube precisar quando, bem como em que época não foi registrado.
Por fim, o próprio autor, em depoimento pessoal (fls. 64/66), indagado pelo MM. Juiz a quo sobre o motivo pelo qual realizou contribuições junto ao INSS e qual atividade exercia, respondeu que contribuía como precaução na hipótese de eventual acidente ou invalidez e que pagava como carpinteiro, mas que não exercia essa profissão.
Conforme se depreende, a prova testemunhal revelou-se vaga e imprecisa, não fornecendo elementos concretos (tipo de cultura desenvolvida, tempo de duração dos trabalhos, etc) que permitam ao julgador concluir que o autor tenha laborado no campo desde 1964, como pretende.
Por sua vez, o demandante trouxe aos autos recolhimentos junto ao INSS, em períodos não contínuos, a partir de janeiro de 1979 a junho de 1997 (fls. 14/32) e de abril de 1999 a agosto de 2009 (fls. 33/41).
Assim, considerando que o próprio autor, em depoimento pessoal, reconhece que efetuou recolhimentos a partir de 1979, na qualidade de carpinteiro e que a única prova documental apresentada pelo autor é a certidão de casamento (fl. 09), realizado em 17/05/1980, vale dizer após 1979, reputo insuficientes as provas documental e testemunhal para efeito de comprovação do exercício de atividade rural no período de 17/10/1964 a 02/10/2009.
Ressalte-se que a cópia de escritura de venda e compra de imóvel rural (fls. 11/13), datada de 26/12/2001, não pode ser considerada para efeito de comprovação do labor rural porque posterior a 23/07/1991, conforme razões anteriormente expostas.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
Quanto à aposentadoria proporcional, seus requisitos etário e contributivo estão estabelecidos na EC nº 20/98, em seu art. 9º:
Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
A EC nº 20/98 permitiu, ainda, que o segurado possa aposentar-se com proventos proporcionais ao tempo de contribuição, quando atendidas as seguintes condições:
Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto:
Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis
Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
Conforme planilha e CNIS em anexo, verifica-se que, somando-se os vínculos e recolhimentos constantes no CNIS (fls. 54/56 e 59/61) aos recolhimentos efetuados pelo autor na qualidade de contribuinte individual de fls. 14/41, constata-se que, na data do ajuizamento (02/10/2009 - fl. 02), o autor perfazia 27 anos, 4 meses e 29 dias de serviço/contribuição, tempo insuficiente para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, seja na modalidade integral, seja na modalidade proporcional.
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela Autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa (CPC/73, art. 20, §3º), ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
Diante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora e dou provimento à remessa necessária, tida por interposta e à apelação do INSS, para afastar o reconhecimento da atividade rural e, por consequência, julgar improcedente o pedido de concessão de aposentadoria, reformando-se a r. sentença, na forma da fundamentação.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 14/08/2018 19:50:12 |