
D.E. Publicado em 24/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 14/08/2018 19:50:41 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014399-31.2008.4.03.6112/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em ação ajuizada por RAIMUNDO LUIZ, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural.
A r. sentença de fls. 86/92 julgou procedente o pedido inicial, para reconhecer o tempo de serviço rural, nos períodos de 09/04/1960 a 16/09/1976, 10/06/1988 a 02/01/1989, 01/11/1990 a 09/10/1997, 09/11/1997 a 30/08/2006, 01/03/2007 a 31/03/2007, 01/05/2007 a 28/02/2008, 01/07/2008 a 30/11/2009 e 01/08/2010 a 30/08/2010 e conceder aposentadoria por tempo de serviço integral, desde a citação (05/12/2008 - fl. 35), acrescida de correção monetária e juros de mora incidentes sobre as parcelas vencidas. Houve condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação, nos termos da Súmula nº 111 do STJ. Custas ex lege. Foi concedida tutela antecipada. Sentença não submetida à remessa necessária.
Em razões recursais de fls. 100/104, o INSS requer o reconhecimento da prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação, nos termos do art. 103, § único, da Lei nº 8.213/91. No mais, pugna pela reforma da r. sentença, ao fundamento de que não restou comprovada a carência e o exercício do labor rural no período pleiteado pelo autor na inicial. Assim, diante da insuficiência do conjunto probatório, não faria jus o autor à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição. Subsidiariamente, requer a alteração dos critérios de fixação dos juros de mora e da correção monetária, bem como a fixação dos honorários advocatícios em percentual incidente sobre as diferenças devidas até a data da sentença, consoante Súmula nº 111 do STJ e a isenção de custas processuais.
Devidamente processado o recurso, com as contrarrazões da parte autora, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
De início, destaco o não cabimento da remessa necessária no presente caso.
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 30.09.2011, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475, §2º, do CPC/1973:
No caso, houve condenação do INSS à implantação de aposentadoria por tempo de contribuição integral, desde a data da citação (05/12/2008 - fl. 35).
A r. sentença foi proferida em 30.09.2011 e o benefício foi concedido no valor de R$ 464,94, conforme ofício de fl. 98, emitido pelo INSS, informando a implantação da aposentadoria por tempo de contribuição. Foi concedida tutela antecipada na r. sentença, com início de pagamento em 30/09/2011.
Por sua vez, o salário mínimo em 2011 era R$ 545,00, de modo que 60 salários mínimos totalizava R$ 32.700,00.
Considerando que, desde a data da citação (05/12/2008) até a data da sentença (30/09/2011), transcorreu cerca de 34 meses, vale dizer, 34 prestações no valor (R$ 464,94), temos que a soma perfaz R$ 15.807,96.
Desse modo, referido valor não supera 60 salários mínimos, não sendo caso, portanto, de conhecimento da remessa necessária.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
Cumpre ressaltar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
No entanto, não há necessidade de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Impende registrar que é pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Do caso concreto.
Pretende o autor o reconhecimento do labor rural no período de 1956 a 2008.
Primeiramente, considerando que o autor é nascido em 09/04/1948 (fl. 08), não é possível o reconhecimento do labor rural antes de 09/04/1960, ocasião em que o demandante completou 12 anos de idade, pelas razões anteriormente expostas.
Por sua vez, ressalte-se que o reconhecimento do labor rural somente é possível até 23/07/1991 (data anterior à vigência da Lei nº 8.213/91), considerando que há dispensabilidade de recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da referida Lei.
Assim, passo a analisar in casu o período rural de 09/04/1960 a 23/07/1991, para efeito de reconhecimento de tempo de serviço rural em regime de economia familiar.
Para comprovar o suposto labor rural, foram apresentados os seguintes documentos:
a) Carteira de filiação do autor ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Regente Feijó - SP (fls. 15/16) em 30/01/1976;
b) Mensalidade paga pelo demandante a referido Sindicato em 23/10/1976 (fl. 16);
c) Certidão eleitoral emitida pela 167a Zona Eleitoral de Regente Feijó - SP (fl. 17), na qual consta que, na ocasião da inscrição do autor, em 17/07/1975, constou sua profissão como "lavrador";
d) Certidões de nascimento dos filhos do demandante (fls. 18/19 e 24), ocorridos, respectivamente, em 07/03/1974, 04/11/1971 e 07/09/1970, nas quais consta a qualificação do autor como "lavrador";
e) Certidão de casamento (fl. 23), realizado em 12/11/1971, em que o autor está qualificado como "lavrador".
Ressalte-se que todos os demais documentos juntados aos autos pelo autor (fls. 09/14, 21/22, 26 e 29/31) não podem ser considerados para efeito de comprovação de atividade rural, uma vez que posteriores a 23.07.1991, conforme razões anteriormente expostas.
Por sua vez, consigno que as declarações firmadas por particulares (fls. 20 e 25) não aproveita ao autor, porquanto não contemporâneas aos fatos que quer comprovar e assemelhadas a meros depoimentos reduzidos a termo, de caráter unilateral e sem a devida sujeição ao crivo do contraditório.
Além dos documentos trazidos como início de prova material, foi ouvida um testemunha, em 26/05/2010, José Braz Batistela (fl. 74).
José afirmou que: "(...) conheço o autor há mais de 30 anos, da cidade de Taciba. Pelo que sei, o autor, desde criança, começou a trabalhar na roça, como diarista, tendo trabalhado para diversos proprietários rurais, tais como Aurélio Batistela, Izidoro Damasceno, e outros que não me recordo, no cultivo de café, feijão, milho, arroz, etc. O autor trabalha nessa condição a vida toda, inclusive até o ano retrasado o autor trabalhou para mim, na colheita de café, por produção."
Conforme se depreende, a prova oral reforça o labor no campo e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, tornando possível o reconhecimento do labor rural apenas no período de 09/04/1960 a 16/09/1976, exceto para fins de carência, considerando que, a partir de 17.09.1976, conforme informações fornecidas pelo sistema CNIS - DATAPREV (fls. 51/53), o demandante apresenta vínculos urbanos.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
Quanto à aposentadoria proporcional, seus requisitos etário e contributivo estão estabelecidos na EC nº 20/98, em seu art. 9º:
Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
A EC nº 20/98 permitiu, ainda, que o segurado possa aposentar-se com proventos proporcionais ao tempo de contribuição, quando atendidas as seguintes condições:
Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto:
Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis:
Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
Conforme planilha e CNIS em anexo, após reconhecer o tempo de serviço rural nesta decisão (09.04.1960 a 16.09.1976) e somando-se aos períodos constantes do CNIS (fls. 51/53 e 81), constata-se que o autor, na data da publicação da EC 20/98 (16/12/1998), alcançou 30 anos e 20 dias e, na data do ajuizamento (07/10/2008 - fl. 02), contava com 31 anos, 9 meses e 21 dias.
Tem a parte autora, portanto, direito ao benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, com base na legislação pretérita à Emenda Constitucional nº 20/98 (direito adquirido, art. 3º da citada emenda constitucional).
O requisito carência restou também completado, consoante extrato do CNIS.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação (05.12.2008 - fl. 35).
Assim, não há que se falar em prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação, nos termos do art. 103, § único, da Lei nº 8.213/91, como sustenta o INSS em apelação, uma vez que o termo inicial do benefício foi fixado na data da citação.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Honorários advocatícios mantidos, adequada e moderadamente, em 10% sobre o valor das parcelas devidas até a data de prolação da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do C. STJ, tendo em vista que as condenações da autarquia são suportadas por toda a sociedade.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS, para limitar o reconhecimento do labor rural ao período de 09.04.1960 a 16.09.1976, e conceder a aposentadoria proporcional por tempo de contribuição desde a data da citação (05/12/2008), sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, mantendo quanto ao mais a r. sentença de primeiro grau.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 14/08/2018 19:50:38 |