D.E. Publicado em 19/02/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
Data e Hora: | 08/02/2018 18:48:55 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0010051-12.2009.4.03.6119/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por JOSÉ SILVARES LORENZO, em ação previdenciária pelo rito ordinário, ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento do trabalho rural sem registro em CTPS, na condição de diarista.
A r. sentença de fls. 400/401vº afastou a preliminar de decadência e julgou improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de serviço, ante a ausência de requisitos essenciais. Condenou o autor no pagamento de honorários advocatícios fixados em R$500,00 (quinhentos reais), atualizados até o efetivo pagamento, observado o disposto nos arts. 11 e 12 da Lei 1.060/50.
Nas razões de apelação das fls. 405/410, pugna o autor pela reforma da sentença, ao fundamento de que o conjunto probatório não foi devidamente valorado, sendo robusto o suficiente para comprovar o labor rural no período referido na inicial, tendo sido corroboradas suas alegações pela prova testemunhal. Requer a reforma da sentença com o reconhecimento do labor rural e a concessão do benefício vindicado.
Contrarrazões do INSS nas fls. 414/416.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, com reconhecimento e cômputo de trabalho rural sem registro em CTPS.
Verifico que o pedido formulado pelo autor encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios, e no art. 201, § 7º, inc. I, da CF/88.
A aposentadoria por tempo de serviço/contribuição está prevista nos artigos 52 e 53 da Lei 8.213/91, in verbis:
Após as alterações introduzidas pela Emenda Constitucional nº 20/98, esse direito está consagrado nos termos do art. 201, § 7º, inciso II, in verbis:
O período de carência exigido é de 180 (cento e oitenta) contribuições mensais (art. 25, II, da Lei 8.213/91), observadas as regras de transição previstas no art. 142 da referida Lei.
Ressalto o entendimento firmado pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973, inclusive objeto do enunciado de Súmula n.º 577, no sentido de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior ou posterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, mas desde que tal período venha delineado em prova testemunhal idônea e robusta.
Quanto ao ponto, também restou assentado pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.321.493/SP, em sede de recurso representativo de controvérsia, que é possível o abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural dos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, sendo, para tanto, imprescindível a apresentação de início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Ainda, há remansosa jurisprudência no sentido de ser extensível à mulher a condição de rurícola nos casos em que os documentos apresentados, para fins de comprovação da atividade campesina, indiquem o marido como trabalhador rural (confira-se: STJ, 3ª Seção, EREsp 1171565, relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05.03.2015).
Em complementação ao tema, a 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.304.479/SP, sob o rito do artigo 543-C do CPC/1973, entendeu que o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, sendo que, em exceção a essa regra geral, tem-se que a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.
A efetiva necessidade de comprovação da atividade rural exercida imediatamente antes da implementação do requisito etário ou do requerimento do benefício era questão controversa, que somente foi sedimentada pelo c. Superior Tribunal de Justiça em 09/09/2015, com o julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos repetitivos representativos de controvérsia, verbis:
Com a edição das Leis 8.212/91 e 8.213/91, portanto, as disposições constitucionais sobre os trabalhadores rurais ganharam contornos mais definidos, ficando clara a existência das seguintes categorias: empregado rural, trabalhador avulso, autônomo rural e segurado especial.
O conceito de segurado especial é dado pelo artigo 11, inciso VII, da Lei 8.213/91, como sendo a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, exerça as atividades campesinas elencadas em suas alíneas. A Lei 11.718, de 20 de junho de 2008, estendeu ao seringueiro ou extrativista vegetal (que labore na forma do art. 2º, caput, inciso XII da Lei 9.985/2000), bem como ao pescador artesanal ou a este assemelhado a condição de segurado especial.
O § 1º do artigo 11 da Lei 8.213/91 define o regime de economia familiar. É possível ao segurado especial valer-se de empregados contratados, em épocas de safra, por no máximo 120 (cento e vinte) dias, nos termos do § 7º do artigo acima referido. Por outro laudo, o § 8º descreve determinadas atividades que não descaracterizam a condição de segurado especial, enquanto que os incisos do § 9º trazem um rol dos rendimentos que podem ser auferidos por membro do grupo familiar, sem que este perca sua condição de segurado especial.
Por outro lado, com a edição das Leis 8.212/91 e 8.213/91, o empregado rural, o trabalhador avulso e o autônomo rural, passaram a ser segurados obrigatórios do RGPS, devendo verter contribuições à Previdência Social. Assim, esses trabalhadores rurais têm direito à mesma cobertura devida aos trabalhadores urbanos, nos moldes exigidos pela legislação previdenciária, ou seja, comprovação da carência mínima.
Passo ao exame do labor rural.
No tocante ao labor rural, cumpre ressaltar que o art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, in verbis:
Do caso em análise.
O autor pleiteia a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de tempo de labor rural sem registro na CTPS, na condição de diarista, devendo esse novo benefício substituir o benefício de aposentadoria por idade, que foi concedido em 28/08/2006.
Nasceu em 20 de maio de 1941 (fl. 11), tendo completado 68 (sessenta e oito) anos de idade no ano em que ingressou com o presente feito.
Como se depreende das informações da base de dados do CNIS, que fazem parte da presente decisão, é possível afirmar que o autor estava inscrito na Previdência Social Urbana antes de 24 de julho de 1991, podendo valer-se da regra prevista no art. 142 da Lei 8.213/91.
A fim de comprovar a atividade rural sem registro em CTPS, que alega ter exercido a partir do momento em que imigrou da Espanha para o Brasil, desde 28/06/1959 até 31/05/1974, em propriedade rural localizada na Comarca e Município de Presidente Prudente - SP, denominado 'Anhumas' ou 'Santo Ursino', de propriedade de Felina Pereira de Araújo, o autor coligiu aos autos os seguintes elementos de prova:
a) Cópia da tradução oficial da sua Certidão de Nascimento, ocorrido em 20/05/1941, no município de Froufe, província de Orense, Espanha, na qual constam qualificados seus pais como lavradores, certidão datada de 11/08/1981, traduzida em 28/12/1981 (fls. 15/16);
b) Cópia do Passaporte do autor, emitido por autoridades espanholas no ano de 1959, onde o autor consta qualificado como lavrador (fls. 17/23);
c) Cópia da Declaração feita pelo autor, perante a Promotoria de Justiça de Pirapozinho, em que declara ter exercido atividades rurais, no imóvel rural denominado 'Anhumas' ou 'Santo Ursino', de propriedade de Felina Pereira de Araújo, no período de 28/06/1959 a 31/05/1974 , tendo sido essa declaração igualmente firmada por esta última, perante duas testemunhas, Miguel Pereira da Silva e José Bernardo da Silva (fls. 25/25vº);
d) Cópia da Certidão de Transcrição de escritura de compra e venda relativa ao imóvel rural denominado 'Anhumas' ou 'Santo Ursino', de propriedade de Felina Pereira de Araújo, tendo sido adquirido em 21/07/1955 (fls. 26/26vº);
e) Cópias do documento de identidade e CPF/MF de Felina Pereira de Araújo (fl. 27);
f) Cópia de autorização de impressão de documentos fiscais em nome de Ademar Cunha & Filho Ltda, João Aristides da Silva, residente no Sítio São João - Estrada Alves de Almeida Km 37, Município de Narandiba - SP, datado de 20/01/1972, no qual não há qualquer menção ao nome do autor (fl.28);
g) Cópias do documento de identidade e CPF/MF de José Bernardo da Silva (fl. 27);
h) Cópias da Carteira de Habilitação - CNH e CPF/MF de Miguel Pereira da Silva (fl. 30);
i) Cópia de Notificação/Comprovante de Pagamento de Imposto Sobre a propriedade Territorial Rural - ITR, em nome do autor, relativa ao imóvel rural denominado 'Serrinha', situado no Município de Caçapava - SP, relativo ao exercício de 1993 (fls. 31/32);
j) Cópia da Escritura de Compra e Venda relativa ao imóvel rural denominado 'Serrinha', situado no Município de Caçapava - SP, adquirido pelo autor em 15/09/1982, no qual este consta qualificado como bacharel em direito (fls. 32/38);
Foram coligidos aos autos documentos, dentre eles, a Cópia da Certidão de Casamento do autor, realizado em 16 de março de 1968, onde não consta sua qualificação profissional, porém consta que era residente e domiciliado no subdistrito de Tucuruvi, Município de São Paulo, Capital (fl. 192).
Embora presente início de prova material, não é possível afirmar que seja um conjunto probatório eficaz para a comprovação do exercício do labor rural na condição de diarista, pelo período compreendido entre 28/06/1959 até 31/05/1974.
De outra parte, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que a prova testemunhal possui a capacidade de ampliar o período do labor documentalmente demonstrado.
Em audiência realizada em 14/07/2010, ausente o Procurador do INSS, foram colhidos os depoimentos das testemunhas João Aristides da Silva e José Bernardo da Silva (fls. 161/164).
João Aristides da Silva afirmou que: "Penso que conheci o autor por volta de 1959, todavia eu só o encontrava eventualmente. Não sei se ele é casado ou se tem filhos e nem mesmo no que trabalhou ou trabalha. Eu nunca trabalhei com o requerente. O requerente não trabalhou para mim e nem mesmo arrendou minhas terras. Eu nunca arrendei terras para usinas. A Felina Pereira é minha esposa. É certo que eu tive propriedade no município de Anhumas que depois foi repassado ao município de Narandiba. Às reperguntas do patrono da requerente respondeu: Eu tive empregados como diaristas, mas esses sempre foram registrados em meu nome e nunca em nome da minha esposa. Nada mais. (fl. 163);
João Bernardo da Silva, a seu turno, afirmou que: "Eu trabalhei na Swift por cerca de 25 anos e ingressei por volta de 1956. Após uns dois anos eu conheci o autor, já que eu dirigia o caminhão da empresa e sempre passava próximo ao arrendamento do João Aristides e via o autor trabalhando com ele. O João Aristides tinha um sítio e também arrendava terras na Swift, sendo que o autor trabalhava neste sítio e também no arrendamento. Não sei se ele era casado ou se tinha filhos. Sei que ele ficou por lá algum tempo, mas não sei para onde foi depois disso. Não sei informar se ele era empregado do João Aristides ou qual era a forma de sua contratação. Sem reperguntas do patrono do requerente. Nada mais (fl. 164);
Como se vê, a prova testemunhal é vaga e imprecisa no tocante à testemunha João Bernardo da Silva, não sendo de grande valia enquanto elemento probatório, no sentido de fortalecer o início de prova documental e confirmar as alegações do autor. No tocante à testemunha João Aristides da Silva, marido de Felina Pereira de Araújo, tem-se um total desserviço enquanto elemento probatório, invalidando os únicos documentos referentes ao período que o autor pretende ver reconhecido.
Ou seja, sequer se trata de prova exclusivamente testemunhal, não havendo por que sequer discutir a incidência da ressalva do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, uma vez que o conjunto probatório é ineficiente como um todo.
Extrai-se do conjunto probatório, portanto, que o autor não comprovou ter exercido as lides campesinas no período controvertido, sendo inviável o reconhecimento de sua atividade rural no período que vai de 28/06/1959 até 31/05/1974, não merecendo reparos a sentença recorrida.
Avanço à apreciação do pedido de concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
Conforme planilha anexa, somando-se os períodos incontroversos constantes do CNIS anexo, verifica-se que o autor contava com 8 anos e 5 meses de serviço na data da propositura da ação (15/09/2009), insuficientes à concessão do benefício pleiteado.
Portanto, o autor não faz jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, uma vez que não possui tempo de serviço suficiente.
Logo, não merece reparos a sentença recorrida quanto ao indeferimento do benefício em comento.
Por oportuno, registro que consta nos dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS e Sistema Único de Benefícios/DATAPREV, que o autor recebe o benefício de Aposentadoria por Idade (NB 41/134.450.983-2), desde 27/07/2015.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do autor, mantendo íntegra a r. sentença prolatada em 1º grau de jurisdição.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
Data e Hora: | 08/02/2018 18:48:52 |