
D.E. Publicado em 10/11/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao reexame necessário e à apelação do INSS e dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0005246-91.2004.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
A r. sentença foi submetida ao reexame necessário.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Nos termos do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91 e de acordo com a jurisprudência consubstanciada na Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, é possível a comprovação do trabalho rural mediante a apresentação de início de prova documental, devendo esta ser complementada por prova testemunhal.
Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por intermédio de documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois isso importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade a prova testemunhal para demonstração do labor rural.
Início de prova material, conforme a própria expressão traduz, não indica completude, mas, sim, começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da situação jurídica discutida, desde que associada a outros dados probatórios.
Sobre a extensão significativa da expressão "início de prova material", o Tribunal Regional Federal da Quarta Região bem enfrentou a questão, não limitando o aproveitamento da prova material ao ano ou à data em que foi produzido: AC nº 333.924/RS, Relator Desembargador Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON , j. 12/06/2001, DJ 11/07/2001, p. 454.
No caso concreto, há início de prova documental da condição de rurícola do autor, consistente nas cópias do certificado de alistamento militar, de certidão de casamento e de certidão de nascimento de filho (fls. 25/29), nas quais está qualificado profissionalmente como lavrador. Segundo a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tal documentação, em conjunto com a prova testemunhal colhida no curso da instrução processual, é hábil ao reconhecimento de tempo de serviço trabalhado como rurícola, conforme revelam as seguintes ementas de julgados:
"As anotações em certidões de registro civil, a declaração de produtor rural, a nota fiscal de produtor rural, as guias de recolhimento de contribuição sindical e o contrato individual de trabalho em Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS, todos contemporâneos à época dos fatos alegados, se inserem no conceito de início razoável de prova material." (REsp 280402/SP, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJ 10/09/2001, p. 427).
Por sua vez, as testemunhas ouvidas complementaram plenamente o início de prova documental apresentado ao asseverarem, perante o juízo de primeiro grau, sob o crivo do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, que a parte autora exerceu atividade rural no período de 01/01/1968 a 30/12/1972 (fls. 378/379).
Entretanto, cabe ressaltar que a própria autarquia previdenciária adota orientação segundo a qual a aceitação de um único documento está restrita à prova do ano a que ele se referir, conforme inciso IV do artigo 116 da Instrução Normativa INSS/PRES nº 77/2015.
Em consonância com tal orientação, foram juntadas aos autos cópias da certidão de casamento, ocorrido em 1976, e da certidão de nascimento de filho, ocorrido em 1978 (fls. 28/29), nas quais consta a profissão de lavrador do autor.
Desse modo, nos termos do artigo 55, § 3.º, da Lei n.º 8.213/91, e em estrita observância à Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, deve ser reconhecido o exercício de trabalho rural, em regime de economia familiar, nos períodos de 01/01/1968 a 30/12/1972, de 01/01/1976 a 31/12/1976 e de 01/01/1978 a 30/12/1978.
O trabalho rural no período anterior à vigência da Lei nº 8.213/91 poderá ser computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme disposição expressa do artigo 55, § 2º, do citado diploma legal.
Rejeita-se também a alegação de inexistência de previsão de conversão de atividade especial em comum antes de 1980, eis que, tendo o legislador estabelecido na Lei 3.807/60 critérios diferenciados de contagem de tempo de serviço para a concessão de aposentadoria especial ao obreiro que esteve sujeito às condições prejudiciais de trabalho, feriria o princípio da isonomia negar o mesmo tratamento diferenciado àquele que em algum período de sua vida exerceu atividade classificada prejudicial à saúde.
Nesse sentido, decidiu a PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, em sede de Recurso Repetitivo:
"RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL E COMUM. CONVERSÃO. POSSIBILIDADE. ART. 9º, § 4º, DA LEI 5.890/1973, INTRODUZIDO PELA LEI 6.887/1980. CRITÉRIO. LEIAPLICÁVEL. LEGISLAÇÃO VIGENTE QUANDO PREENCHIDOS OS REQUISITOS DA APOSENTADORIA.
1. Trata-se de Recurso Especial interposto pela autarquia previdenciária com intuito de desconsiderar, para fins de conversão entre tempo especial e comum, o período trabalhado antes da Lei 6.887/1980, que introduziu o citado instituto da conversão no cômputo do tempo de serviço .
2. Como pressupostos para a solução da matéria de fundo, destaca-se que o STJ sedimentou o entendimento de que, em regra; a) a configuração do tempo especial é de acordo com a lei vigente no momento do labor, e b) a lei em vigor quando preenchidas as exigências da aposentadoria é a que define o fator de conversão entre as espécies de tempo de serviço. Nesse sentido: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC.
3. A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço. Na mesma linha: REsp 1.151.652/MG, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe 9.11.2009; REsp 270.551/SP, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJ 18.03.2002; Resp 28.876/SP, Rel. Ministro Assis Toledo, Quinta Turma, DJ 11.09.1995; AgRg nos EDcl no Ag 1.354.799/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 5.10.2011.
4. No caso concreto, o benefício foi requerido em 24.1.2002, quando vigente a redação original do art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991, que previa a possibilidade de conversão de tempo comum em especial.
5. Recurso Especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ." (REsp 1310034-PR, j.24/10/2012, DJe 19.12.2012, Rel. Min. Herman Benjamin).
A respeito da matéria, a Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sessão de julgamento realizada em 14/05/2014, em sede de recurso representativo da controvérsia (Recurso Especial Repetitivo 1.398.260/PR, Rel. Min. Herman Benjamin), firmou orientação no sentido de que o nível de ruído que caracteriza a insalubridade para contagem de tempo de serviço especial deve ser superior a 80 (oitenta) decibéis até a edição do Decreto nº 2.171/1997, de 05/03/1997, superior a 90 (noventa) decibéis entre a vigência do Decreto nº 2.171/1997 e a edição do Decreto nº 4.882/2003, de 18/11/2003, e após a entrada em vigor do Decreto nº 4.882/2003, ou seja, a partir de 19/11/2003, incide o limite de 85 (oitenta e cinco) decibéis, considerando o princípio tempus regit actum.
O Supremo Tribunal Federal, ao analisar o ARE 664.335/SC, em 04/12/2014, publicado no DJe de 12/02/2015, da relatoria do Ministro LUIZ FUX, reconheceu a repercussão geral da questão constitucional nele suscitada e, no mérito, fixou o entendimento de que a eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria, quando o segurado estiver exposto ao agente nocivo ruído.
É aplicável o fator 1,40 ao benefício do autor, nos termos dos Decretos n.º 611/92 e 2.172/97, os quais, em seu artigo 64 estabelece que o tempo de serviço exercido alternadamente em atividade comum e atividade profissional sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou a integridade física será somado, após a respectiva conversão, aplicada a Tabela de Conversão seguinte, para efeito de concessão de qualquer benefício:
ATIVIDADE A CONVERTER
MULTIPLICADORES
______________________________________________________
ANOS DE/PARA 15 20 25 30. 1 35. 2
______________________________________________________
DE 15
DE 25 0,60 0,80 1,00 1,20 1,40
DE 25
______________________________________________________
1. MULHER - 2. HOMEM
No que tange à aplicação do fator de conversão de tempo especial em tempo comum, embora seja garantida a conversão desse tempo conforme as normas vigentes ao tempo da prestação laboral pelo segurado, os seus efeitos serão posteriores ao momento referido, ficando submetida às novas regras advindas de alterações na legislação previdenciária.
Enfrentando a questão, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que "No que tange ao fator de conversão do tempo de serviço especial para tempo comum, o autor, contando com 23 anos, 05 meses e 25 dias de tempo de serviço, requereu seu benefício de aposentadoria em 29/09/97, devendo, portanto ser aplicada a legislação vigente à época, qual seja, o Decreto nº 2.172, de 05 de Março de 1997, que prevê o multiplicador de 1,40." (REsp nº 518139/RS, Relator Ministro Jorge Scartezzini, j. 01/06/2004, DJ 02/08/2004, p. 500).
Ressalte-se que, quando da análise do requerimento administrativo, a autarquia previdenciária reconheceu a atividade comum exercida nos períodos de 01/06/1979 a 30/09/1979, de 01/02/1993 a 30/01/1994, de 24/05/1994 a 21/08/1994, de 01/04/1995 a 05/06/1996 e de 02/01/1997 a 01/09/1999, restando incontroversos tais períodos (fls. 282/283).
No caso em análise, restou comprovado o exercício de trabalho urbano comum, no período de 21/10/1994 a 14/12/1994, de acordo com a exigência legal, tendo sido apresentado cópia da CTPS da parte autora (fl. 46).
A CTPS é documento obrigatório do trabalhador, nos termos do art. 13 da CLT, e gera presunção "juris tantum" de veracidade, constituindo-se em meio de prova do efetivo exercício da atividade profissional, produzindo efeitos previdenciários (art. 62, § 2º, I, do Dec. 3.048/99). Sendo assim, o INSS não se desincumbiu do ônus de provar que as anotações efetuadas na CTPS do autor são inverídicas, de forma que não podem ser desconsideradas.
Ressalte-se que o fato de o Instituto não localizar registro da anotação no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) não transfere ao empregado a obrigação de comprovar os recolhimentos das contribuições do período laborativo anotado na carteira profissional, uma vez que é de responsabilidade exclusiva do empregador a anotação do contrato de trabalho na CTPS, o desconto e o recolhimento das contribuições devidas à Previdência Social, não podendo o segurado ser prejudicado pela conduta negligente cometida por seu empregador, que efetuou as anotações dos vínculos empregatícios, mas não recolheu as contribuições. Precedente do STJ: REsp 566405/MG, Relatora Ministra Laurita Vaz, j.18/11/03, DJ 15/12/03, p 394.
Não é aplicável ao caso dos autos a regra de transição prevista no artigo 9º da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, mas sim a legislação anteriormente vigente, porquanto a parte autora já possuía direito adquirido ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço na data da publicação de referida emenda constitucional (DOU de 16/12/1998).
Computando-se o tempo de atividade rural nos períodos de 01/01/1968 a 30/12/1972, de 01/01/1976 a 31/12/1976 e de 01/01/1978 a 30/12/1978, a atividade especial desenvolvida nos períodos de 15/01/1973 a 23/06/1975, de 22/10/1979 a 17/02/1992 e de 12/12/1994 a 31/03/1995, bem assim o tempo de serviço comum (fls. 45/49), os períodos comuns ora reconhecidos de 21/10/1994 a 14/12/1994, de 18/02/1992 a 28/02/1992, de 01/09/1994 a 30/06/1994 e de 06/06/1996 a 05/07/1996, e o reconhecido administrativamente (fls. 282/283), o somatório do tempo de serviço da parte autora alcança um total de 33 (trinta e três) anos e 01 (um) mês e 27 (vinte e sete) dias, na data da Emenda Constitucional nº 20/98, o que autoriza a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, devendo ser observado o disposto nos artigos 53, inciso II, 28 e 29 da Lei nº 8.213/91.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (15/03/2002), nos termos do artigo 54 c.c artigo 49, inciso II, da Lei n.º 8.213/91.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
Data e Hora: | 25/10/2016 18:20:12 |