D.E. Publicado em 25/08/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003921-66.2013.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em ação de conhecimento, em que se pleiteia a conversão de aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de período de 04.02.81 a 31.12.82, 06.03.97 a 03.11.05 e 29.11.05 a 01.03.11 como laborados sob condições especiais.
O MM. Juízo a quo extinguiu o feito sem julgamento de mérito, nos termos do Art. 267, VI do CPC/73, em relação ao período de 01.01.83 a 05.03.97, e julgou improcedentes os demais pedidos, condenando a parte autora em honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa, isentando-a de custas processuais.
Inconformado, apela o autor, alegando fazer jus ao reconhecimento dos períodos pleiteados e à conversão de sua aposentadoria em especial.
Subiram os autos, sem contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
A questão tratada nos autos diz respeito ao reconhecimento do tempo trabalhado em condições especiais com a conversão em tempo comum.
Define-se como atividade especial aquela desempenhada sob certas condições peculiares - insalubridade, penosidade ou periculosidade - que, de alguma forma cause prejuízo à saúde ou integridade física do trabalhador.
A contagem do tempo de serviço rege-se pela legislação vigente à época da prestação do serviço.
Até 29/04/95, quando entrou em vigor a Lei 9.032/95, que deu nova redação ao Art. 57, § 3º, da Lei 8.213/91, a comprovação do tempo de serviço laborado em condições especiais era feita mediante o enquadramento da atividade no rol dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79, nos termos do Art. 295 do Decreto 357/91; a partir daquela data até a publicação da Lei 9.528/97, em 10/03/1997, por meio da apresentação de formulário que demonstre a efetiva exposição de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais a saúde ou a integridade física; após 10/03/1997, tal formulário deve estar fundamentado em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, assinado por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho, consoante o Art. 58 da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.528/97. Quanto aos agentes ruído e calor, é de se salientar que o laudo pericial sempre foi exigido.
Nesse sentido:
Atualmente, no que tange à comprovação de atividade especial, dispõe o § 2º, do Art. 68, do Decreto 3.048/99, que:
Assim sendo, não é mais exigido que o segurado apresente o laudo técnico, para fins de comprovação de atividade especial, basta que forneça o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, assinado pela empresa ou seu preposto, o qual reúne, em um só documento, tanto o histórico profissional do trabalhador como os agentes nocivos apontados no laudo ambiental que foi produzido por médico ou engenheiro do trabalho.
Por fim, ressalte-se que o formulário extemporâneo não invalida as informações nele contidas. Seu valor probatório remanesce intacto, haja vista que a lei não impõe seja ele contemporâneo ao exercício das atividades. A empresa detém o conhecimento das condições insalubres a que estão sujeitos seus funcionários e por isso deve emitir os formulários ainda que a qualquer tempo, cabendo ao INSS o ônus probatório de invalidar seus dados.
Cabe ressaltar ainda que o Decreto 4.827 de 03/09/03 permitiu a conversão do tempo especial em comum ao serviço laborado em qualquer período, alterando os dispositivos que vedavam tal conversão.
Em relação ao agente ruído, os Decretos 53.831/64 e 83.080/79 consideravam nociva à saúde a exposição em nível superior a 80 decibéis. Com a alteração introduzida pelo Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, passou-se a considerar prejudicial aquele acima de 90 dB. Posteriormente, com o advento do Decreto 4.882, de 18.11.2003, o nível máximo tolerável foi reduzido para 85 dB (Art. 2º, do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Estabelecido esse contexto, esclareço que, anteriormente, manifestei-me no sentido de admitir como especial a atividade exercida até 05/03/1997, em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80 decibéis, e a partir de tal data, aquela em que o nível de exposição foi superior a 85 decibéis, em face da aplicação do princípio da igualdade.
Contudo, em julgamento recente, a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar a questão submetida ao rito do Art. 543-C do CPC, decidiu que no período compreendido entre 06.03.1997 e 18.11.2003, considera-se especial a atividade com exposição a ruído superior a 90 dB, nos termos do Anexo IV do Decreto 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto 3.048/1999, não sendo possível a aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o nível para 85 dB (REsp 1398260/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Por conseguinte, em consonância com o decidido pelo C. STJ, é de ser admitida como especial a atividade em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80 decibéis até 05/03/1997, e 90 decibéis no período entre 06/03/1997 e 18/11/2003 e, a partir de então até os dias atuais, em nível acima de 85 decibéis.
No que diz respeito ao uso de equipamento de proteção individual, insta observar que este não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. Nesse sentido: TRF3, AMS 2006.61.26.003803-1, Relator Desembargador Federal Sergio Nascimento, 10ª Turma, DJF3 04/03/2009, p. 990; APELREE 2009.61.26.009886-5, Relatora Desembargadora Federal Leide Pólo, 7ª Turma, DJF 29/05/09, p. 391.
Ainda que o laudo consigne a eliminação total dos agentes nocivos, é firme o entendimento desta Corte no sentido da impossibilidade de se garantir que tais equipamentos tenham sido utilizados durante todo o tempo em que executado o serviço, especialmente quando seu uso somente tornou-se obrigatório com a Lei 9732/98.
Igualmente nesse sentido:
Por demais, em recente julgamento proferido pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal, em tema com repercussão geral reconhecido pelo plenário virtual no ARE 664335/SC, restou decidido que o uso do equipamento de proteção individual - EPI pode ser insuficiente para neutralizar completamente a nocividade a que o trabalhador esteja submetido.
A propósito, transcrevo os seguintes tópicos da ementa:
Quanto à possibilidade de conversão de atividade especial em comum, após 28/05/98, tem-se que, na conversão da Medida Provisória 1663-15 na Lei 9.711/98 o legislador não revogou o Art. 57, § 5º, da Lei 8213/91, porquanto suprimida sua parte final que fazia alusão à revogação. A exclusão foi intencional, deixando-se claro na Emenda Constitucional n.º 20/98, em seu artigo 15, que devem permanecer inalterados os artigos 57 e 58 da Lei 8.213/91 até que lei complementar defina a matéria.
O E. STJ modificou sua jurisprudência e passou a adotar o posicionamento supra, conforme ementa in verbis:
Na conversão do tempo de atividade especial em tempo comum, para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, deve ser efetuado o fator de 1,4, para o homem, e 1,2, para a mulher (Decreto 611/92), vigente à época do implemento das condições para a aposentadoria.
Importa mencionar que a necessidade de comprovação de trabalho "não ocasional nem intermitente, em condições especiais" passou a ser exigida apenas a partir de 29/04/1995, data em que foi publicada a Lei 9.032/95, que alterou a redação do Art. 57, § 3º, da lei 8.213/91, não podendo, portanto, incidir sobre períodos pretéritos. Nesse sentido: TRF3, APELREE 2000.61.02.010393-2, Relator Desembargador Federal Walter do Amaral, 10ª Turma, DJF3 30/06/2010, p. 798 e APELREE 2003.61.83.004945-0, Relator Desembargador Federal Marianina Galante, 8ª Turma, DJF3 22/9/2010, p. 445.
No mesmo sentido colaciono recente julgado do Colendo Superior Tribunal de Justiça:
O reconhecimento da contagem de tempo especial não destoa do entendimento adotado pela Corte Suprema, pois não determina que o benefício seja calculado de acordo com normas pertencentes a regimes jurídicos diversos, mas, apenas, que é dever do INSS conceder ao segurado o benefício que lhe for mais favorável, efetuando o cálculo da renda mensal inicial, desde que presentes todos os requisitos exigidos, de acordo com a legislação vigente até a data da EC 20/98, até a edição da Lei nº 9876/99 e até a DER (STF, RE 575089/RS, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, publicado em 24/10/2008).
O Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, ao dispor sobre a aposentadoria especial instituída pela Lei 3.807/60, considerou perigosa a atividade profissional sujeita ao agente físico " eletricidade ", em instalações ou equipamentos elétricos com riscos de acidentes, tais como eletricistas, cabistas, montadores e outros, expostos à tensão superior a 250 volts (item 1.18 do anexo).
De seu lado, a Lei nº 7.369, de 20 de setembro de 1985, reconheceu a condição de periculosidade ao trabalhador do setor de energia elétrica, independentemente do cargo, categoria ou ramo da empresa.
A seguir, o Decreto nº 93.412, de 14 de outubro de 1986, regulamentou-a para assegurar o direito à remuneração adicional ao empregado que permanecesse habitualmente na área de risco e em situação de exposição contínua, ou nela ingressasse de modo intermitente e habitual, onde houvesse equipamentos e instalações, de cujo contato físico ou exposição aos efeitos da eletricidade resultassem incapacitação, invalidez permanente ou morte (Arts. 1º e 2º), exceto o ingresso e permanência eventual, tendo referida norma especificado, ainda, as atividades e áreas de risco correspondentes, na forma de seu anexo.
Tem, assim, natureza especial o trabalho sujeito à eletricidade e exercido nas condições acima previstas, consoante os anexos regulamentares, suscetível da conversão em tempo de serviço comum, desde que comprovada a efetiva exposição ao agente físico nos moldes da legislação previdenciária, e, excepcionalmente, à falta de formulários ou laudos eventualmente exigidos, se demonstrado o pagamento da remuneração adicional de periculosidade ao empregado durante tal período. Precedentes: STJ, 5ª Turma, RESP nº 386717, Rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 08/10/2002, DJU 02/12/2002, p. 337; TRF3, 8ª Turma, AC nº 2003.61.83.003814-2, Rel. Des. Fed. Marianina Galante, j. 11/05/2009, DJF3 09/06/2009, p. 642; TRF3, 9ª Turma, AC nº 2001.61.08.007354-7, Rel. Juiz. Fed. Conv. Hong Kou Hen, j. 30/06/2008, DJF3 20/08/2008.
No Brasil, o sistema de alimentação elétrica pode ser monofásico ou trifásico. O sistema monofásico é utilizado em serviços domésticos, comerciais e rurais, enquanto o sistema trifásico em aplicações industriais. As tensões trifásicas mais usadas nas redes industriais são: a) baixa tensão: 220V, 380V e 440V; e b) média tensão : 2300V, 3300V, 4160V, 6600V e 13800V.
Tecidas essas considerações gerais a respeito da matéria, passo à análise da documentação do caso em tela.
Assim fazendo, verifico que o autor comprovou que exerceu atividade especial na empresa Volkswagen do Brasil nos seguintes períodos com habitualidade e permanência, conforme descrito no Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 119/129:
- de 04.02.81 a 31.12.82, na função de aprendiz de mecânico do setor de aprendizagem industrial, exposto ao agente nocivo ruído de intensidade equivalente a 82dB, previsto no quadro anexo ao Decreto 53.831/64, item 1.1.6 e no anexo I do Decreto 83.080/79, item 1.1.5, e
- de 01.11.05 a 01.03.11, na função de eletricista de manutenção III do setor de manutenção de montagem final, exposto ao agente nocivo ruído de intensidade equivalente a 84,6dB, previsto no quadro anexo ao Decreto 53.831/64, item 1.1.6 e no anexo I do Decreto 83.080/79, item 1.1.5.
Como já decidido pela 10ª Turma, há que se levar em conta, para o correto enquadramento do nível de ruído, que o instrumento utilizado para a sua medição (medidor de nível de pressão sonora ou decibelímetro) possui uma margem de erro de 0,7 dB a 1,5 dB, segundo as instituições de padronização, sendo razoável considerar uma margem de erro de 1,0 dB, mais ainda quando não se encontra consignado no laudo se essa margem de erro foi levada em conta quando se sua elaboração.
Para elucidar melhor a questão, cito excerto da r. sentença proferida no autos n. 0109672-89.2014.4.02.5001, da 6ª Vara Cível/SJES:
A alegação de labor especial no período de 06.03.97 a 31.10.05, em que ocupou a função de eletricista de manutenção, não deve prosperar, porquanto esteve submetido ao agente ruído de intensidade inferior ao limite estabelecido, bem como não há menção à intensidade da corrente elétrica a que esteve sujeito.
O período compreendido entre 01.01.83 a 05.03.97 já foi reconhecido administrativamente (fl. 139).
Assim, somados os períodos de atividade especial, o autor totaliza 21 (vinte e um) anos, 05 (cinco) meses e 05 (cinco) dias, tempo insuficiente para a concessão de aposentadoria especial.
Destarte, é de ser reformada em parte a r. sentença, devendo o réu averbar no cadastro do autor os períodos de 04.02.81 a 31.12.82 e de 01.11.05 a 01.03.11 como especiais, proceder à revisão de seu benefício e pagar as diferenças havidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e, no que couber, observando-se o decidido pelo e. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento da questão de ordem nas ADIs 4357 e 4425.
Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme entendimento consolidado na c. 3ª Seção desta Corte (AL em EI nº 0001940-31.2002.4.03.610). A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº 17.
Convém alertar que das prestações vencidas devem ser descontadas aquelas pagas administrativamente ou por força de liminar, e insuscetíveis de cumulação com o benefício concedido, na forma do Art. 124, da Lei nº 8.213/91.
Tendo a autoria decaído de parte do pedido, vez que não reconhecido o direito à aposentadoria especial, é de se aplicar a regra contida no Art. 86, do CPC. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93 e a parte autora, por ser beneficiária da assistência judiciária integral e gratuita, está isenta de custas, emolumentos e despesas processuais.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação.
É o voto.
BAPTISTA PEREIRA
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 16/08/2016 18:03:28 |