Agravo de Instrumento Nº 5039637-20.2020.4.04.0000/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: VALTER DA SILVA FONSECA
ADVOGADO: IVAN SÉRGIO FELONIUK (OAB RS029446)
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento contra decisão em cumprimento de sentença na qual foi rejeitada a impugnação ao cumprimento de sentença oposta pelo INSS, reconhecendocomo correta a RMI do autor e não permitindo o abatimento dos valores pagos a título de benefício inacumulável. Eis o teor da decisão agravada:
"Já não existe mais divergência no tocante aos índices de correção monetária e juros de mora aplicáveis.
A controvérsia reside:
1. no valor da renda mensal inicial (RMI);
2. se o credor recebeu valores a maior, gerando diferenças em favor do INSS.
Em relação ao ponto 1, não existem elementos que levem a crer que os cálculos apresentados pela parte credora apresentem incorreção. As alegações do ente previdenciário não apontam especificamente onde residiram os equívocos.
Já em relação ao ponto 2, não se trata propriamente de benefícios distintos recebidos em duplicidade, mas de valores que supostamente seguiram sendo pagos pelo INSS em valor superior ao efetivamente devido após o término do cálculo que instrui a execução (outubro de 2015).
Ocorre que efetivamente se trata de verba alimentar, recebida a toda evidência de boa-fé pelo credor, sendo vedada a devolução, na forma do julgado que a seguir colaciono:
AÇÃO ACIDENTÁRIA. REPETIÇÃO DOS VALORES. NÃO-CABIMENTO NA ESPÉCIE. - Concessão de aposentadoria ao autor sem lhe cancelar o auxílio suplementar. Recebimento acumulado de ambos os benefícios por determinado período. Impropriedade administrativa do Ente Previdenciário que não pode resultar em prejuízo ao segurado de boa-fé. Precedentes. - “Caso concreto em que as quantias embolsadas a maior pela segurada não são repetíveis por terem origem em equívoco exclusivamente atribuível à Administração Previdenciária. Assim sendo, porque ausente prova de má-fé ou fraude no recebimento das verbas previdenciárias, e considerando a natureza alimentar das importâncias em comento, revela-se descabida a devolução dos valores que a parte autora recebeu indevidamente, sob pena de penalização injusta de segurada que, estando de boa-fé, não concorreu de qualquer forma para a percepção de benefício em excesso. 3.3. Inaplicabilidade, à espécie, da tese sufragada no âmbito do REsp nº 1.401.560/MT, julgado sob a sistemática dos recursos repetitivos, na medida em que as quantias descontadas do benefício da segurada não se originaram de decisão judicial precária posteriormente reformada ou invalidada.”. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA. SENTENÇA ILÍQUIDA. Tratando-se de sentença ilíquida contra a Fazenda Pública, os honorários advocatícios de sucumbência devem ser arbitrados ao tempo da liquidação, a teor do art. 85, § 4º, inc. II, do CPC/2015. CUSTAS PROCESSUAIS. ISENÇÃO DA AUTARQUIA AO PAGAMENTO DA TAXA ÚNICA DE SERVIÇOS JUDICIAIS. LEI ESTADUAL N.º 14.634/2014. CABIMENTO NA ESPÉCIE. Nas ações ajuizadas a partir de 15 de junho de 2015, o INSS está isento de pagar as custas judiciais. Inteligência do art. 5º da Lei Estadual n.º 14.634/2014 e orientação expressa pelo Of.-Circ. n.º 060/2015 - CGJ. DERAM PROVIMENTO EM PARTE À APELAÇÃO. UNÂNIME.(Apelação e Reexame Necessário, Nº 70076842582, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em: 24-05-2018)
Nesse passo, é de ser reconhecido como correto o cálculo da Contadoria Judicial apresentado no evento 61 (R$ 64.094,78, atualizado até 14/05/2020).
Por fim, não vislumbro conduta por parte do INSS que justifique a aplicação de penalidade decorrente de má-fé.
Isso posto, JULGO IMPROCEDENTE a impugnação, declarando devido o valor de R$ 64.094,78 (sessenta e quatro mil, noventa e quatro reais e setenta e oito centavos), atualizado até 14/05/2020.
Deixo de arbitrar honorários de sucumbência face ao julgado no REsp. n.º 1.134.186/RS, submetido ao rito dos recursos repetitivos. Eventuais custas e despesas remanescentes devidas pela parte impugnante.
Publique-se; registre-se; intimem-se.
Com o trânsito em julgado, expeça-se o competente precatório/RPV. "
Sustenta o agravante que é a RMI apresentada pelo mesmo que tem presunção de veracidade, pois calculada pelos sistemas oficiais do INSS, sendo exclusivamente dele a incumbência de fazê-lo, e se o autor discordar, deve arrazoar especificadamente as razões de sua inconformidade, o que deixou de fazer no caso concreto. Sustenta também que tendo ocorrido o pagamento de valores relativos a benefício em montante que não era devido, resta imprescindível a restituição das quantias, quer seja por meio de descontos sobre o benefício do segurado, quer seja por tentativa de cobrança amigável na via administrativa ou por meio forçado em ação judicial.
Liminarmente, foi deferido em parte o pedido de antecipação da tutela recursal.
Intimado, o agravado não apresentou contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
A decisão inaugural foi proferida nos termos que transcrevo:
Da RMI
No caso em exame, o autor ajuizou cumprimento de sentença, mediante o qual informou que apurou a renda mensal inicial conforme critérios da Lei 8.213/91, resultando no valor de R$ 759,30.
O INSS impugnou o cumprimento de sentença, afirmando que a APS-DJ apurou o valor da renda inicial do benefício, conforme dados constantes do CNIS, os quais possuem presunção de veracidade, cujo afastamento não se desimcumbiu o autor.
Conforme o artigo 29-A da Lei n° 8.213/1991, o CNIS é a principal fonte de informações do INSS sobre vínculos e remunerações dos segurados, inclusive para efeitos de cálculo dos benefícios, in verbis:
Art. 29-A. O INSS utilizará as informações constantes no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS sobre os vínculos e as remunerações dos segurados, para fins de cálculo do salário-de-benefício, comprovação de filiação ao Regime Geral de Previdência Social, tempo de contribuição e relação de emprego. (Redação dada pela Lei Complementar nº 128, de 2008)
§ 1° O INSS terá até 180 (cento e oitenta) dias, contados a partir da solicitação do pedido, para fornecer ao segurado as informações previstas no caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 10.403, de 8.1.2002)
§ 2° O segurado poderá solicitar, a qualquer momento, a inclusão, exclusão ou retificação de informações constantes do CNIS, com a apresentação de documentos comprobatórios dos dados divergentes, conforme critérios definidos pelo INSS. (Redação dada pela Lei Complementar nº 128, de 2008)
§ 3° A aceitação de informações relativas a vínculos e remunerações inseridas extemporaneamente no CNIS, inclusive retificações de informações anteriormente inseridas, fica condicionada à comprovação dos dados ou das divergências apontadas, conforme critérios definidos em regulamento. (Incluído pela Lei Complementar nº 128, de 2008)
§ 4° Considera-se extemporânea a inserção de dados decorrentes de documento inicial ou de retificação de dados anteriormente informados, quando o documento ou a retificação, ou a informação retificadora, forem apresentados após os prazos estabelecidos em regulamento. (Incluído pela Lei Complementar nº 128, de 2008)
§ 5° Havendo dúvida sobre a regularidade do vínculo incluído no CNIS e inexistência de informações sobre remunerações e contribuições, o INSS exigirá a apresentação dos documentos que serviram de base à anotação, sob pena de exclusão do período. (Incluído pela Lei Complementar nº 128, de 2008)
Ainda que os vínculos constantes do sistema CNIS gozem de presunção de veracidade, nos termos do art. 29-A da Lei nº 8.213/1991, esta presunção é relativa e admite prova em contrário.
No caso dos autos, no entanto, conforme consignado na decisão agravada, as alegações do ente previdenciário não apontam especificamente onde residiram os equívocos, não havendo elementos que levem a crer que os cálculos apresentados pela parte credora apresentem incorreção.
Assim, deve ser mantida a decisão agravada no ponto.
Da devolução de valores pagos a maior
No caso concreto, sustenta o INSS que teria havido o pagamento de valores a maior ao segurado, sendo devida a restituição das quantias, por meio de descontos sobre o benefício do segurado, por tentativa de cobrança amigável na via administrativa ou por meio forçado em ação judicial.
Asseverou o magistrado de origem na decisão agravada que não se trata propriamente de benefícios distintos recebidos em duplicidade, mas de valores que supostamente seguiram sendo pagos pelo INSS em valor superior ao efetivamente devido após o término do cálculo que instrui a execução (outubro de 2015), e tratando-se de de verba alimentar, recebida a toda evidência de boa-fé pelo credor, vedada a devolução.
Portanto, trata-se de controvérsia que se identifica com questão infraconstitucional em exame no Superior Tribunal de Justiça, sob a sistemática dos recursos repetitivos, com determinação de suspensão nacional de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos (art. 1.037, II, do Código de Processo Civil), conforme decisão no Recurso Especial 1381734/RN, DJe de 16.08.2017:
PREVIDENCIÁRIO. PROPOSTA DE AFETAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. EM RAZÃO DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA, MÁ APLICAÇÃO DA LEI OU ERRO DA ADMINISTRAÇÃO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. 1. Delimitação da controvérsia: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social. 2. Recurso especial afetado ao rito do art. 1.036 e seguintes CPC/2015 e art. 256-I do RISTJ, incluído pela Emenda Regimental 24, de 28/09/2016. (ProAfR no REsp 1381734/RN, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª Seção, j. 09.08.2017)
O tema está cadastrado sob o número 979, no sistema de recursos repetitivos, com a seguinte redação: "Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da administração da Previdência Social."
Nesse contexto, face ao determinado nos autos do REsp nº 1381734, e em observância às disposições do art. 1.037, II, do Código de Processo Civil, não deve haver o pagamento nem cobrança das parcelas sob discussão, até ulterior deliberação do Superior Tribunal de Justiça acerca do Tema 979.
Ante o exposto, defiro em parte a antecipação da tutela recursal, para o fim de suspender o pagamento ou a cobrança dos valores pagos a maior pelo INSS, até posterior decisão do STJ no tema 979.
Após a decisão liminar, sobreveio o julgamento do Tema 979 pelo STJ, com publicação do acórdão paradigma em 23/04/2021, com tese firmada e modulação de efeitos, no seguinte sentido:
Tema 979 - Tese firmada: "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido."
- Modulação dos efeitos: "Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão."
Considerando a modulação de efeitos que determina a aplicação da tese firmada apenas aos processos distribuídos após a publicação do acórdão paradigma, fica afastada a obrigatoriedade de devolução, pelo agravado, da quantia paga a maior, devendo ser desprovido o agravo também nesse aspecto.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo de instrumento.
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Agravo de Instrumento Nº 5039637-20.2020.4.04.0000/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: VALTER DA SILVA FONSECA
ADVOGADO: IVAN SÉRGIO FELONIUK (OAB RS029446)
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. IMPUGNAÇÃO. CÁLCULO. rmi. devolução de valores. tema 979 stj. TESE FIRMADA E MODULAÇÃO DE EFEITOS.
1. Ainda que os vínculos constantes do sistema CNIS gozem de presunção de veracidade, nos termos do art. 29-A da Lei nº 8.213/1991, esta presunção é relativa e admite prova em contrário. Hipótese em que as alegações do ente previdenciário não apontam especificamente onde residiram os equívocos, não havendo elementos que levem a crer que os cálculos apresentados pela parte credora apresentem incorreção.
2. Julgado pelo STJ o Tema 979, a permitir a devolução de valores recebidos a título de benefício previdenciário, por força de erro administrativo, ressalvada a comprovação de boa fé objetiva pelo segurado, e modulado seus efeitos para atingir apenas os processos distribuídos a partir da data de publicação do acórdão paradigma, resta afastada a necessidade de devolução, pelo agravado, dos valores pagos a maior pelo INSS.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 05 de maio de 2021.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002498754v5 e do código CRC 6df46ddb.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 05/05/2021
Agravo de Instrumento Nº 5039637-20.2020.4.04.0000/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): ALEXANDRE AMARAL GAVRONSKI
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: VALTER DA SILVA FONSECA
ADVOGADO: IVAN SÉRGIO FELONIUK (OAB RS029446)
Certifico que este processo foi incluído no 1º Aditamento da Sessão Telepresencial do dia 05/05/2021, na sequência 495, disponibilizada no DE de 26/04/2021.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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