D.E. Publicado em 25/08/2016 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001644-43.2016.4.04.9999/SC
RELATORA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | LUCIA SALETE CHIMOKA |
ADVOGADO | : | Cezar Augusto dos Santos |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO URBANO DE MEMBRO DO GRUPO FAMILIAR. EFEITOS. REQUISITOS NÃO CUMPRIDOS.
1. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea.
2. "O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ)" - RESP n.º 1.304.479.
3. No caso dos autos, os rendimentos do cônjuge eram superiores a 6 (seis) salários mínimos, de modo que os eventuais rendimentos obtidos com a produção agrícola tratavam-se de meros complementos à renda familiar.
4. Qualidade de segurada especial não comprovada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à remessa oficial tida por interposta e ao recurso de apelação do INSS para, em não reconhecendo a qualidade de segurada especial da autora, negar o benefício de aposentadoria por idade rural, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 10 de agosto de 2016.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8424503v3 e, se solicitado, do código CRC F2513A0D. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001644-43.2016.4.04.9999/SC
RELATORA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | LUCIA SALETE CHIMOKA |
ADVOGADO | : | Cezar Augusto dos Santos |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra a sentença das fls. 223/231, publicada na vigência do CPC/73, em que o magistrado a quo julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade rural à parte autora, a contar da data do requerimento administrativo (21/12/12), em razão do exercício do labor rural em regime de economia familiar, condenando o INSS ao pagamento das parcelas vencidas de acordo com o art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, na redação dada pela Lei 11.960/2009, bem como ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre a condenação, conforme Súmula 111 do STJ .
Em suas razões de apelação, a Autarquia Previdenciária sustentou, em síntese: (a) a ausência de comprovação do efetivo exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mesmo que de forma descontínua; (b) que o cônjuge da autora exerceu atividade urbana por quase toda a sua vida, tendo inclusive sido proprietário de empresas em Rondônia e em Curitiba; (c) que a prova material apresentada é insuficiente à comprovação do labor pretendido, sendo vedada a prova exclusivamente testemunhal; (d) que a autora não se enquadra na qualidade de segurada especial e (e) o pré-questionamento dos artigos 55, § 3º, 142 e 143 da lei 8.213/91.
Processado, subiram os autos a esta Corte.
É o sucinto relatório.
VOTO
Do Direito Intertemporal
Considerando que o presente voto está sendo apreciado por essa Turma após o início da vigência da Lei n.º 13.105/15, novo Código de Processo Civil, referente a recurso interposto em face de sentença exarada na vigência da Lei n.º 5.869/73, código processual anterior, necessário se faz a fixação, à luz do direito intertemporal, dos critérios de aplicação dos dispositivos processuais concernentes ao caso em apreço, a fim de evitar eventual conflito aparente de normas.
Para tanto, cabe inicialmente ressaltar que o CPC/2015 procurou estabelecer, em seu CAPÍTULO I, art. 1º que 'o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código'; em seu CAPÍTULO II, art. 14, que 'a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada'; bem como, em suas DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS, art. 1.046, caput, que 'ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973' (grifo nosso).
Neste contexto, percebe-se claramente ter o legislador pátrio adotado o princípio da irretroatividade da norma processual, em consonância com o art. 5º, inc. XXXVI da Constituição Federal, o qual estabelece que 'a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada'.
Desta forma, a fim de dar plena efetividade às referidas disposições normativas, e tendo em vista ser o processo constituído por um conjunto de atos, dirigidos à consecução de uma finalidade, qual seja, a composição do litígio, adoto, como critério de solução de eventual conflito aparente de normas, a Teoria dos Atos Processuais Isolados, segundo a qual cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar a lei que o rege, a qual será, segundo o princípio tempus regit actum, aquela que estava em vigor no momento em que o ato foi praticado.
Por consequência, para deslinde da antinomia aparente supracitada, deve ser aplicada no julgamento a lei vigente:
(a) Na data do ajuizamento da ação, para a verificação dos pressupostos processuais e das condições da ação;
(b) Na data da citação (em razão do surgimento do ônus de defesa), para a determinação do procedimento adequado à resposta do réu, inclusive quanto a seus efeitos;
(c) Na data do despacho que admitir ou determinar a produção probatória, para o procedimento a ser adotado, inclusive no que diz respeito à existência de cerceamento de defesa;
(d) Na data da publicação da sentença (entendida esta como o momento em que é entregue em cartório ou em que é tornado público o resultado do julgamento), para fins de verificação dos requisitos de admissibilidade dos recursos, de seus efeitos, da sujeição da decisão à remessa necessária, da aplicabilidade das disposições relativas aos honorários advocatícios, bem como de sua majoração em grau recursal.
Remessa Oficial
Conforme já referido linhas acima, tratando-se de sentença publicada na vigência do CPC/73, inaplicável o disposto no art. 496 do CPC/2015 quanto à remessa necessária.
Consoante decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso, tenho como interposta a remessa oficial.
Da aposentadoria rural por idade
São requisitos para a aposentadoria por idade rural: a) idade mínima de 60 anos para o homem e de 55 anos para a mulher (artigo 48, § 1º, da Lei nº 8.213/91); b) efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao período correspondente à carência do benefício.
Quando implementadas essas condições, aperfeiçoa-se o direito à aposentação, sendo então observado o período equivalente ao da carência na forma do art. 142 da Lei nº 8.213/91 (ou cinco anos, se momento anterior a 31/08/94, data de publicação da MP nº 598, que modificou o artigo 143 da Lei de Benefícios), considerando-se da data da idade mínima, ou, se então não aperfeiçoado o direito, quando isto ocorrer em momento posterior, especialmente na data do requerimento administrativo, tudo em homenagem ao princípio do direito adquirido, resguardado no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91.
O benefício de aposentadoria por idade rural será, em todo caso, devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, mas caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STJ, REsp nº 544.327-SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, unânime, DJ de 17-11-2003; STJ, REsp. nº 338.435-SP, Rel. Ministro Vicente Leal, Sexta Turma, unânime, DJ de 28-10-2002; STJ, REsp nº 225.719-SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, unânime, DJ de 29-05-2000).
Do trabalho rural como segurado especial
O trabalho rural como segurado especial dá-se em regime individual (produtor usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais) ou de economia familiar, este quando o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (art. 11, VII e § 1º da Lei nº 8.213/91).
A atividade rural de segurado especial deve ser comprovada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ.
Desde logo ressalto que somente excluirá a condição de segurado especial a presença ordinária de assalariados - insuficiente a tanto o mero registro em ITR ou a qualificação como empregador rural (II b) - art. 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71. Já o trabalho urbano do cônjuge ou familiar, relevante e duradouro, não afasta a condição de regime de economia familiar quando excluído do grupo de trabalho rural. Finalmente, a constitucional idade mínima de dezesseis anos para o trabalho, como norma protetiva, deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas ou previdenciários quando tenham efetivamente desenvolvido a atividade laboral.
Quanto ao início de prova material, necessário a todo reconhecimento de tempo de serviço (§ 3º do art. 56 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149/STJ), por ser apenas inicial, tem sua exigência suprida pela indicação contemporânea em documentos do trabalho exercido, embora não necessariamente ano a ano, mesmo fora do exemplificativo rol legal (art. 106 da Lei nº 8.213/91), ou em nome de integrantes do grupo familiar (Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental -Súmula 73 do TRF 4ª Região).
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de boia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao boia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente registra suas relações de emprego.
Da idade para reconhecimento do labor rural
A idade mínima a ser considerada, no caso de segurado especial, em princípio, dependeria da data da prestação da atividade, conforme a legislação então vigente (nesse sentido: EREsp 329.269/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2002, DJ 23/09/2002, p. 221). Não obstante, cumpre destacar que a limitação constitucional ao trabalho de menor é norma protetiva da infância, não podendo conduzir ao resultado de que, uma vez verificada a prestação laboral, a incidência do preceito legal/constitucional resulte em sua nova espoliação (desta feita, dos direitos decorrentes do exercício do trabalho).
Assim, é de ser admitida a prestação laboral, como regra, a partir dos 12 anos, pois, já com menos responsabilidade escolar e com inegável maior potência física, os menores passam efetivamente a contribuir na força de trabalho do núcleo familiar, motivo pelo qual tanto a doutrina quanto a jurisprudência aceitam esta idade como termo inicial para o cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial (nesse sentido: TRF4, EIAC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, julgado na sessão de 12-03-2003; STF, AI n.º 529694/RS, Relator Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, decisão publicada no DJU de 11-03-05).
Do caso concreto
Tendo a parte autora implementado o requisito etário em 10/01/2007 e requerido o benefício em 21/12/2012, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 156 meses ou 180 meses anteriores aos respectivos marcos indicados.
Como início de prova material do labor rural juntou a parte autora os seguintes documentos:
a) certidão de seu casamento contraído em 26/02/72 com Sidenei Chimoka;
b) recibos de entrega de declaração do ITR dos exercícios de 1998 a 2011, relativas à (s) propriedade (s) rural (is) da autora e
c) matrícula nº 4.650 referente ao imóvel rural localizado em Itaiópolis, adquirido pela autora e seu cônjuge em 1981 e doado para Adriana Chimoka em 22/02/2010.
O INSS, com a contestação, juntou documentos comprobatórios de atividade empresarial do cônjuge e da própria autora, em Rondônia e em Curitiba (fls. 71/82, 151/152).
Em audiências de instrução realizadas em 18/11/2014, 05/03/2015, 27/04/2015 e em 27/08/2015 (fls. 160, 166, 171 e 209) foram colhidos os depoimentos da parte autora e de seu esposo, bem como das testemunhas, cujos depoimentos seguem transcritos da sentença
"(...) A autora afirmou em juízo que mora na localidade de São Roque, há cerca de 30 anos. Plantou um pouco de soja, milho e feijão, um pouco de cada. Dos últimos 30 anos, passou dois anos em Curitiba entre 2003 e 2004. Não teve registro em carteira, ficou nesse período em casa. O marido da autora tentou trabalhar com madeira no norte do país. Ele foi sozinho pra lá. Ele trabalhava com mais alguém lá. A autora e suas três filhas continuaram trabalhando na lavoura. Disse que nos últimos 15 anos morou aqui, no sítio, em São Roque [...].Perguntado se nos últimos 15 anos o marido da autora teve algum vínculo rural, alguma empresa ou trabalhou para alguém, não soube informar, disse que não sabe dizer, pois toma muito remédio e está com a memória prejudicada. Contou que antes de casar foi professora durante um ano, quando tinha 18 anos, isso em Curitibanos, o único registro em carteira. Não tem casa na cidade. Perguntada do que sobrevivem atualmente, disse "dali", referindo-se a propriedade, que tem 16 alqueires. Plantam soja, um ano milho, o outro feijão. De maquinário tem um tratorzinho. Não tem empregados, só na época da colheita é pago alguém pra colher. A soja sempre foi plantada com o Sr. Marcelo Valliatti, "meio a meio". Plantava junto, "meio a meio", vendido para Cooper alfa. [...]. Disse que no serviço de lavoura ajudava em tudo "planta, colhe milho". Perguntado como era feito o plantio, disse que era feito com máquina do Valliatti. A colheita era feita com máquina de terceiros. Disse que ajudava. Perguntado de que maneira ajudava, disse que ficava lá, cuidava. A panificadora que tinham em Curitiba funcionou até 2004. De 2003 a 2004. A panificadora faliu. O marido da autora era um dos donos da empresa em Rondônia. Seu marido ficou morando lá, não muito tempo, mais ou menos uns cinco anos. Nessa época era plantado todos os anos. O Valliatti quem trabalhava neste terreno e ele comprava as sementes, vendia, e as notas saíam em nome dele. Ele pagava uma espécie de arrendamento.
O marido da autora disse que é colono. A propriedade era súa e passou para as filhas há pouco tempo, mas ainda plantam. Atualmente é sua única atividade. Nos últimos 15 anos, "teve pro norte", trabalhei várias vezes, porque na colônia a renda épouca lá trabalhei uns oito anos, chegou a ter uma empresa lá. Teve uma panificadora em Curitiba, isso funcionou uns quatro anos, "nem cabei de dar baixa nela ainda por falta de dinheiro, mas tá parada já faz toda a vida que faliu". Está aqui em definitivo há cerca de dez anos. Atualmente a área tem 16 alqueires. Toca sozinho a lavoura. Tem um trator zinho e quando precisa, "paga pra colher, paga pra plantar, paga pra envenenar". Tem aposentadoria por empresa. Conta que suas filhas ajudam na terra. Ficava "pro norte" cerca de 45 dias. Houve umas contribuições por algum tempo. Quando não podia estar aqui em Itaiópolis, pedia para Marcelo ajudar a fazer lavouras. Sempre tiveram umas vaquinhas, umas galinhas, algumas cabeças de gado eram vendidas, algumas pra consumo. Nos anos anteriores, plantava sempre feijão e milho, mas atualmente diz que autora está indo menos na roça porque está doente. Nos últimos 10 anos a produção foi entregue na Cooperalfa. Quem faz o plantio atual da lavoura é o depoente. Na última safra quem ajudou plantar foi Jair Brandes, na localidade de Rio Branco. Quem colhia era Ivo Pitol. Durante uns 04 anos teve panificadora em Curitiba. Ela morou lá dois anos. Depois ela voltou pro sítio porque as coisas ficaram ruim lá. Depois que voltou pra cá ela sempre ajuda, a gente combina o que vai fazer. Ela, referindo-se a autora, antigamente, ajudava, carpia, só não lavrava com parelha de bois porque não tinha força suficiente. Seu pai às vezes ajudava e poucos dias as vezes trocava serviços.
As testemunhas:
Hilário dos Santos, vizinho da autora, disse que a autora e seu marido sobrevivem da lavoura. O marido 'da autora trabalhou fora, acha que em Belém. Acha que em Curitiba tiveram por pouco tempo. Voltaram e estão na lavoura aqui uns 15 anos. Agora plantam soja, antes de tudo, milho e feijão. Perguntado se tem criação de vaca, galinha, ainda tem. A autora sempre ajudou na lavoura, carpir, na época era quebrado milho com a mão. Feijão chega a plantar "pro gasto", acho que sim. Não têm empregados, só a família trabalha. Não têm maquinário próprio grande, colheitadeira, plantadeira. As terras têm entre 10 e 15 alqueires. As criações a dona Lúcia era responsável. O cultivo era um tanto "pro gasto" e um tanto "pra vender".
Valdomiro Valliatti: Disse que seus vizinhos trabalham na lavoura. Mas especialmente a autora. Disse que seu filho ajudava a autora na lavoura. Faz um dez anos que o marido da autora voltou pra cá. Dona Lúcia sempre trabalhou na lavoura, no começo era ele que mantinha as filhas. Agora a autora está doente. Plantam soja, um pouco de milho e feijão. Antigamente, há 30 anos atrás, era só feijão e milho, eles têm um tratorzinho. Não têm maquinários grandes. Galinha sempre tiveram, criação só "pro leite, carneavam um pouco". A maioria era "pro gasto". O terreno da autora era confrontante com o seu terreno.. O Sidenei, marido da autora, vende um pouquinho, as vezes para Cereagrp, as vezes para Cooperalfa. A soja é toda comercializada. O Pittol as vezes colhe, um outro alemãozinho também. Eles não têm empregado.
Vanderlei Waneski: Conhece a autora e seu marido desde criança, eles trabalham na lavoura. Não tem bem lembrança mas acredita que uns 20 anos que o marido da autora voltou para trabalhar na lavoura. Plantavam pra sobreviver. Feijão e milho. Acredita que vendiam para a cerealista da cidade. Acredita que o autor tem terra equivalente a dez alqueires. Tinham um trator zinho. Eles tinham na propriedade umas oito vacas. Alguma coisa vendiam. Outras mais "pro gasto". Ultimamente plantam soja, que vendem para Cerealista da cidade. No inverno "semeiam pastinhos pra vaquinhas". Para colher alugam colheitadeira dos vizinhos mais próximos.
Irineu Antonio Pitol: E vizinho da autora. Sabe que a autora tem umas "vaquinhas de leite". Há 23 anos reside no terreno vizinho ao da autora, sendo que quando chegou a autora e seu esposo já residiam na localidade. Sabe que a autora tinha umas vaquinhas de leite e plantava algumas coisas no terreno. Nunca arrendou terreno da autora para plantar. O esposo da autora trabalhou um época fora da residência, sendo que voltou para casa há uns 10 anos e começou a plantar. Sabe que a autora e seu esposo plantam milho e soja. Não sabe o tamanho da propriedade da autora. Nunca viu empregados na propriedade da autora. Sabe que faziam extração de erva mate na propriedade. Sabe que o esposo da autora trabalhou fora, e não sabe como foi a forma de sustento da família durante esta época.
Ivo João Pittol: Sabe que a autora trabalha na roça e com vacas de leite. Sabe que a autora tem umas galinhas, vacas. Nunca viu empregados na residência da autora. Sempre que viu a autora ela trabalhava na roça. Sabe que era tirada erva mate do terreno onde fica a residência da autora, mas não sabe se era ela quem tirava.
Jair Bernardes: É vizinho da autora, e trabalha na agricultura. Sabe que o esposo da autora trabalhou fora durante um tempo. Sabe que a autora planta soja e milho, e que possuem galinhas, vacas, porcos. Sabe que a. autora ajuda na roça. Sabe que só a família trabalha no terreno. Já viu a autora trabalhando na roça. Sabe que no terreno da autora tem erva mate.
Marcelo João Valiatti: E vizinho da autora. Plantou milho e feijão em parceria com a autora e com seu esposo. Sabe que a autora sempre morou no terreno. Sabe que o esposo da autora trabalhou fora uma época. A autora, no período em que seu esposo trabalhava fora, continuou trabalhando na roça. A autora ajudou na colheita de feijão e que cuidava da criação (vacas, galinhas). Sabe que a autora e seu esposo não têm empregados. Sabe que a autora vendia leite, ovos, galinhas e outros produtos para auxiliar no sustento da casa. Sabe que a autora ajudava no sustento da família durante o período em que seu esposo ficou fora. Sabe que a autora fazia extração de erva mate no terreno. Realizou parcerias de plantações com a autora, desde 1993. Sabe. que a autora ajudava a sustentar a casa com a venda de leite, queijo, ovos e outros produtos.(...)"
Conclusão
Como se vê acima, não se tem pelos documentos juntados aos autos uma convicção plena no sentido de que, de fato, ocorreu o exercício da atividade rurícola, em regime de economia familiar, no período de carência, seja no período de 1994 a 2007, antes da implementação do requisito etário, seja no período anterior à data da entrada do requerimento administrativo - de 1997 a 2012.
Ao escutar os relatos da autora e das testemunhas, conclui-se que o cultivo da propriedade rural da autora era terceirizado, conforme acordo firmado entre o cônjuge - Sidenei Chimoka - e produtores da região, como Marcelo Valiatti. Isto porque por vários anos Sidenei esteve trabalhando no norte do país, retornando à propriedade "a cada três meses" ou "duas vezes aos ano" ou "a cada 45 dias", nesse ponto as testemunhas não foram unânimes.
A seu turno, a autora afirma que se manteve afastada da propriedade rural por apenas 2 (dois) anos, enquanto ela e o esposo foram sócios na "Panificadora do Sidenei Ltda", sediada em Curitiba/PR, instalada em 1994 (fl. 152) e baixada em 2008, conforme consulta aos dados da Receita Federal do Brasil.
Seu cônjuge relatou, em audiência realizada em 2014, que "há dez anos" retornou para a propriedade rural e vem comercializando a produção em seu próprio nome, a qual é entregue para a Cooperalfa; contudo, somente fez juntar aos autos as notas de produtor das fls. 173/176, relativas à comercialização de novilhos e de terneiros, ambas emitidas no ano de 2014.
Entre os anos de 2005 e 2006, o marido da autora laborou como empregado na empresa MFS Transportes Ltda (fl. 69), e, confome consulta ao CNIS, contribuía sobre um salário de contribuição que à época (11/2006) importava em R$ 2.100,00, ou seja, 6 (seis) salários mínimos, considerando que este no mesmo período fora fixado em R$ 350,00.
Resta assentado nesta Corte que o exercício de atividade urbana por integrante do núcleo familiar concomitante ao trabalho rural não tem o condão de descaracterizar, por si só, a condição de segurado especial em regime de economia familiar da parte autora, sempre que o trabalho agrícola for indispensável à sobrevivência dos membros do grupo familiar com um mínimo de dignidade.
No caso concreto, observa-se que os proventos percebidos pelo cônjuge da demandante podiam ser considerados suficientes para a manutenção do grupo familiar, o que descaracteriza sua condição de segurada especial, já que ausente o caráter de essencialidade dos rendimentos porventura auferidos pela postulante com seu trabalho rural, tornando tais rendimentos mero complemento à renda familiar.
Assim, entendo que a autora não comprovou a sua condição de segura especial.
Honorários Advocatícios
Considerando que a sentença recorrida foi publicada antes de 18/03/2016, data da entrada em vigor do NCPC, e tendo em conta as explanações tecidas quando da análise do direito intertemporal, esclareço que as novas disposições acerca da verba honorária são inaplicáveis ao caso em tela, de forma que não se determinará a graduação conforme o valor da condenação (art. 85, §3º, I ao V, do CPC/2015), tampouco se estabelecerá a majoração em razão da interposição de recurso (art. 85, §11º, do CPC/2015).
Assim, considerando a reforma do julgado, condeno a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios, que fixo em R$ 880,00 (oitocentos e oitenta reais), suspensa a exigibilidade em razão do benefício da AJG.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à remessa oficial tida por interposta e ao recurso de apelação do INSS para, em não reconhecendo a qualidade de segurada especial da autora, negar o benefício de aposentadoria por idade rural.
É o voto.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 10/08/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001644-43.2016.4.04.9999/SC
ORIGEM: SC 00006814020148240032
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | LUCIA SALETE CHIMOKA |
ADVOGADO | : | Cezar Augusto dos Santos |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 10/08/2016, na seqüência 91, disponibilizada no DE de 26/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA E AO RECURSO DE APELAÇÃO DO INSS PARA, EM NÃO RECONHECENDO A QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL DA AUTORA, NEGAR O BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR IDADE RURAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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Data e Hora: | 12/08/2016 12:18 |