Apelação Cível Nº 5024868-17.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: PAULO ROBERTO MARTIN
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto pela parte autora (
) contra sentença, publicada em 24/06/2019, que julgou parcialmente procedente o pedido formulado na inicial, nas seguintes letras ( ):DISPOSITIVO Diante de todo o até aqui exposto, resolvo o mérito da presente demanda e, com fundamento no art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil, julgo procedente em parte o pedido formulado por Paulo Roberto Martin, para: a) Afirmar o direito do demandante ao enquadramento como atividade especial aquela exercida no período de 2-2-1988 a 26-4-1989 em razão do enquadramento por atividade (motorista) e, nos períodos de 28/04/1995 a 16/06/1997, 02/01/1998 a 01/10/1998, 01/03/2001 a 08/06/2001, 11/06/2001 a 30/04/2002, 17/03/2003 a 31/03/2003 e de 17/11/2003 a 01/02/2008, em razão da exposição habitual e permanente a agente físico ruído acima dos limites de tolerância; b) Reconhecer o vínculo existente em CTPS no período de 11-6-2001 a 30-4-2002 como de exercício de atividade urbana para a empresa Oito Transportes Ltda ME., que deverá ser considerado como tempo comum, devendo o INSS realizar a averbação desse interstício nos registros do autor; c) Condenar o INSS em obrigação de fazer, consistente no cômputo do tempo de serviço reconhecido como exercido em atividade especial no presente comando judicial, assim como, do tempo comum, e reanalisar o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição requerido em 28-4-2015 (NB 42/166.822.729-8), no prazo de 30 dias contados do trânsito em julgado da sentença; d) Condenar o INSS a efetuar o pagamento de eventuais valores em uma só vez, desde a data de entrada do requerimento administrativo (DER em28-4-2015) excluídas as parcelas atingidas pela prescrição quinquenal, corrigidas monetariamente pelos índices legalmente fixados (listados na fundamentaçãoacima) a partir da data do vencimento de cada parcela devida e acrescidas de juros moratórios (conforme taxas indicadas na fundamentação) a contar da citação. e) Condeno o INSS ao pagamento das despesas processuais pendentes, conforme arts. 86 e 87 do CPC. Todavia, destaco que, a partir da entrada em vigor da LCE nº 729/2018, que deu nova redação ao artigo 33, § 1º da LCE nº 156/1997, as autarquias federais estão isentas das custas processuais (que são uma das modalidades do gênero despesas). Por outro lado, está obrigada a indenizar as despesas adiantadas no curso do processo pelo(s) vencedor(es), conforme art. 82, § 2º, do CPC. f) Condeno ainda a autarquia ao pagamento de honorários advocatícios no importe de 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações vencidas, excluídas as vincendas, nos termos da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça, cujo enunciando restou assim redigido: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença"; g) Ao Cartório, proceda a requisição de pagamento dos honorários periciais devidos ao perito Marcos Lazarotto, observados os termos da decisão de pgs. 189-192. Sentença não sujeita à remessa necessária. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, arquivem-se.
A parte autora busca, preliminarmente, a anulação da sentença de primeira instância, para que os autos sejam baixados a inferior instância e seja realizada perícia quanto às atividades exercidas nos períodos anteriores a 28/04/1995; No mérito requer: a) reconhecer a especialidade, por categoria profissional/sujeição aos agentes nocivos, das atividades desenvolvidas nos períodos de 21/06/1977 a 01/10/1977, de 01/10/1979 a 11/06/1980, 19/08/1980 a 04/05/1981, 07/05/1981 a 01/02/1988, e de 01/08/2008 a 28/04/2015 (DER), para fins de conversão do tempo da atividade especial pelo fator “1,4” (acréscimo de 40% previsto em lei) e consequente integralização do tempo no cálculo da Renda Média Inicial (R.M.I.),; b) determinar ao Apelado a conceder/implantar o benefício de Aposentadoria por Tempo de Contribuição (NB 166.822.729-8), em prazo a ser deferido, independentemente da reanálise do benefício na esfera administrativa; c) condenar expressamente o Apelado a pagar ao Apelante as prestações vencidas a contar do pedido administrativo formulado em 28/04/2015 (NB 166.822.729-8), e vincendas, mensais e sucessivas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora, afastando a expressão “eventuais” constante da parte dispositiva da sentença.
Foram apresentadas contrarrazões (
).É o relatório.
VOTO
Trata-se de recurso interposto pela parte autora contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial.
A parte autora busca, em síntese, sejam produzidas provas adequadas e reconhecida a especialidade dos períodos especiais de 21/06/1977 a 01/10/1977, de 01/10/1979 a 11/06/1980, 19/08/1980 a 04/05/1981, 07/05/1981 a 01/02/1988, e de 01/08/2008 a 28/04/2015 com a consequente concessão do benefício pleiteado.
Do tempo especial no caso concreto
Busca a parte autora o reconhecimento da atividade especial desenvolvida nos períodos de 21/06/1977 a 01/10/1977, de 01/10/1979 a 11/06/1980, 19/08/1980 a 04/05/1981, 07/05/1981 a 01/02/1988, e de 01/08/2008 a 28/04/2015.
a) Períodos anteriores a 28/04/95
No que toca aos períodos de 21/06/1977 a 01/10/1977, 19/08/1980 a 04/05/1981, 07/05/1981 a 01/02/1988, o Magistrado a quo proferiu o seguinte despacho saneador (e.
):No presente caso, considerando que a parte autora pugna pelo reconhecimento de atividade especial de diversos períodos, esclareço que, nos períodos de de 21/06/1977 28/04/1995 (entrada em vigor da Lei nº 9.032/95) é desnecessária a produção de prova pericial quanto a estes porquanto o enquadramento se dá por categoria profissional, observada a legislação de regência;
Contudo, em sede de sentença, entendeu o magistrado que as atividades em tela não se enquadram nas categorias profissionais:
Não há especialidade quanto aos demais vínculos mantidos pelo autor nos períodos de 21-6-1977 a 1º-10-1977 em que trabalhou como servente (pg. 119), (...), de 19-8-1980 a 4-5-1981 em que laborou como servente (pg. 120), e de 7-5-1981 a 1-2-1988 em que foi operário (pg. 120), pois tais atividades não são arroladas como especial pela legislação, o que afasta a incidência da especialidade pretendida.
Nada obstante, para as atividades exercidas até 28/04/1995, véspera da vigência da Lei nº 9.032/95, é possível o reconhecimento do tempo de atividade especial pelo pertencimento a determinada categoria profissional ou pela exposição aos agentes nocivos, nos termos previstos pelos decretos regulamentares. Por outro lado, em razão do caráter protetivo do trabalhador, é de ser reconhecida a natureza qualificada da atividade ainda que as condições que prejudicam sua saúde ou integridade física não se encontrem expressas em determinado regulamento (inteligência da Súmula 198 do extinto TFR).
Na hipótese, não se permitiu a produção de prova que indicasse a quais agentes nocivos o autor estaria submetido.
Examinando as atividades desempenhadas pelo autor, entendo que há fundada dúvida sobre a existência de exposição nociva, considerando outros feitos onde já examinadas atividades de natureza semelhante.
Ou seja, a prova é permeada por diversas lacunas.
Ao lado disso, é consabido que A Constituição Federal (art. 93, IX) e o CPC (art. 458) determinam que as decisões judiciais sejam fundamentadas, com explícita análise das questões de fato e de direito e exposição das razões consideradas para acolher ou rejeitar o pedido. A concisão, que no mais das vezes caracteriza virtude, não pode chegar ao ponto de sonegar às partes o conhecimento dos fundamentos da manifestação judicial. Ausente fundamentação, nula a sentença. (TRF4, APELREEX nº 0022438-56.2014.404.9999, Quinta Turma, Relator Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 25/06/2015).
Trata-se, portanto, de julgamento citra petita, que caracteriza questão de ordem pública, a ser reconhecida de ofício, implicando nulidade da sentença, por vício in procedendo, com a determinação de que outra seja proferida, a teor dos artigos 141, 490 e 492 do NCPC.
Em caso análogo, esta Corte já decidiu que A sentença citra petita é nula e, não estando o feito suficientemente instruído para que se possa cogitar eventual suprimento do vício (por interpretação extensiva do art. 515 do CPC), inclusive ante a constatação de que a instrução resultou incompleta, a solução é decretar-se a anulação da mesma e restituir-se o processo à origem para novo julgamento. Sentença anulada. (TRF4 - Reexame Necessário nº 5019455-97.2013.404.7100, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Jr, juntado aos autos em 27/08/2015).
Idêntica ilação se extrai da jurisprudência do STJ:
PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RECONHECIMENTO PELO TRIBUNAL A QUO DE JULGAMENTO EXTRA PETITA . JULGAMENTO DO MÉRITO. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DO ARTIGO 515, § 3º DO CPC. INAPLICABILIDADE. ERROR IN PROCEDENDO. SUPRESSÃO PELO JUIZ SINGULAR E NÃO PELO TRIBUNAL. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. A sentença proferida citra petita padece de error in procedendo. Se não suprida a falha mediante embargos de declaração, o caso é de anulação pelo tribunal, com devolução ao órgão a quo, para novo pronunciamento. De modo nenhum se pode entender que o art. 515, §3º, autorize o órgão ad quem, no julgamento da apelação, a "completar" a sentença de primeiro grau, acrescentando-lhe novo(s) capítulo(s). In casu, não há que se falar em interpretação extensiva ao artigo 515, § 3º, do CPC, quando nem sequer houve, na sentença, extinção do processo sem julgamento do mérito, requisito este essencial à aplicação do artigo 515, § 3º, da Lei Processual Civil. Recurso provido. (REsp 756844. 5ª Turma. Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca).
RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO CIVIL. JULGAMENTO CITRA PETITA. OCORRÊNCIA. RETORNO DOS AUTOS À CORTE DE ORIGEM. 1. Em caso de julgamento citra petita, devem os autos retornar à Corte local para que decida a lide nos exatos limites em que foi proposta, em atenção ao disposto nos artigos 128 e 460 do Código de Processo Civil. 2. Recurso ordinário provido. (RMS 15.892/ES, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 18/11/2008, DJe 09/12/2008).
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA CITRA PETITA. ANULAÇÃO PELO TRIBUNAL A QUO. POSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A eg. Terceira Seção desta Corte, pelas Turmas que a compõem, firmou entendimento no sentido de que a decretação de nulidade da sentença citra petita pode ser realizada de ofício pelo Tribunal ad quem. Nesse caso, o recurso de apelação não está condicionado à prévia oposição de embargos de declaração. 2. Recurso especial improvido. (STJ, Sexta Turma, REsp. n. 243988/SC, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJ de 22-11-2004).
Ora, se a prova é modesta ou contraditória toca ao julgador, de ofício ou a requerimento das partes, determinar a sua suplementação para a correta elucidação dos fatos, na busca da verdade real, não apenas porque o processo civil cada vez mais tem sido permeado por ela, mas também para que se obtenha um pronunciamento mais equânime e rente à realidade.
Destaque-se que as normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado. Assim (...) deve-se dar prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas (REsp 1.352.721/SP, Corte Especial, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, pub. no DJ em 28/04/2016, p. 118).
Em face do preceito contido no artigo 370 do NCPC (Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito), mostra-se prematura a solução da controvérsia.
É assente que a prova pericial não pode ser desprezada, vez que objetiva demonstrar as reais condições de trabalho do segurado, quais as atividades desempenhadas pelo mesmo e os níveis quantitativos e qualitativos de exposição aos agentes nocivos, requisitos necessários para obter-se um juízo de certeza a respeito da situação fática posta perante o juízo.
Dito isso, outra alternativa não há, senão anular a sentença, por ausência de observância de seus requisitos essenciais e por cerceamento de defesa, considerando-se que a produção das provas testemunhal (atividade rural em regime de economia familiar) e pericial (atividade especial) é essencial ao deslinde do processo.
Deverão os autos retornar à origem, para realização de perícia judicial, a fim de demonstrar exatamente quais as funções o autor exerceu e os agentes nocivos a que estava exposto no desempenho das atividades nos seguintes períodos e empresas:
- 21-6-1977 a 1º-10-1977 em que trabalhou como servente, Metalúrgica Palmitense
- 19-8-1980 a 4-5-1981 em que laborou como servente, Appel Filho Ltda.
- 7-5-1981 a 1-2-1988 em que foi operário, na Secretaria dos negócios do Oeste.
Por oportuno, deve ser proporcionada à parte autora a juntada de toda a documentação que entender necessária para a prova do tempo de serviço especial postulado, bem como a produção de prova testemunhal e pericial a demonstrar se houve sujeição do trabalhador a condições de trabalho insalubres.
b) Período de 01/08/2008 a 28/04/2015
Conforme se infere da leitura do laudo judicial, o perito designado pelo Juízo a quo, com relação ao intervalo em questão, procedeu à análise das condições ambientais única e exclusivamente sob a ótica da sujeição do autor ao agente físico ruído, no caso, aferido abaixo do limite de tolerância de 85 dB(A), exigido pela legislação previdenciária vigente à época da prestação laboral.
Embora o labor prestado em condições periculosas e/ou penosas não tenha sido contemplado no rol de agentes do Decreto nº 2.172/97 (Anexo IV), além das hipóteses de enquadramento dos agentes agressivos conforme previsão nos decretos regulamentares, sempre possível também a verificação da nocividade da atividade no caso concreto, por força da previsão contida na Súmula nº 198 do extinto TFR (Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em regulamento).
A propósito, o egrégio Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo representativo de controvérsia, já decidiu que, à luz da interpretação sistemática, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991). (REsp nº 1.306.113/SC, Relator Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, DJe 07/03/2013).
De fato, a jurisprudência desta Corte se orienta pela possibilidade de enquadramento do tempo de serviço, como especial, em razão da penosidade da atividade de motorista de caminhão, sendo, para tanto, imperiosa a realização de perícia, a fim de verificar se a prestação laboral se dava em condições penosas.
Em recente julgado, proferido em sede de incidente de assunção de competência, ao analisar questão análoga à dos autos, a Terceira Seção concluiu por fixar a seguinte tese jurídica: deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova.
Referida decisão restou assim ementada (grifei):
PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA - IAC. TEMA TRF4 N.° 5. ATIVIDADE ESPECIAL. MOTORISTA OU COBRADOR DE ÔNIBUS. RECONHECIMENTO DA PENOSIDADE APÓS A EXTINÇÃO DA PREVISÃO LEGAL DE ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL PELA LEI 9.032/1995. POSSIBILIDADE. 1. O benefício de aposentadoria especial foi previsto pela primeira vez no ordenamento jurídico nacional em 1960, pela Lei Orgânica da Previdência Social, a Lei 3.087/1960, que instituiu o requisito de prestação de uma quantidade variável (15, 20 ou 25 anos) de tempo de contribuição em exercício de atividades insalubres, perigosas ou penosas. 2. Apesar de contar com previsão no próprio texto constitucional, que garante aos trabalhadores o pagamento do adicional correspondente na seara trabalhista (art. 7º, XXIII, CF/1988), até o presente momento não houve a regulamentação da penosidade, motivo pelo qual torna-se uma tarefa bastante difícil a obtenção de seu conceito. 3. Pela conjugação dos estudos doutrinários, das disposições legais e dos projetos legislativos existentes, é possível delimitar-se o conceito de penosidade como o desgaste à saúde do trabalhador ocorrido na prestação da atividade profissional, em virtude da necessidade de dispêndio de esforço excessivo, da necessidade de concentração permanente e contínua, e/ou da necessidade de manutenção constante de postura. 4. Não há discussões acerca da possibilidade de reconhecimento da penosidade nas situações previstas no Anexo IV do Decreto 53.831/1964, que configuram hipóteses de enquadramento por categoria profissional, admitido até a vigência da Lei 9.032/1995, sendo que as controvérsias ocorrem quanto à possibilidade de reconhecimento da penosidade nos intervalos posteriores a essa data. 5. O requisito exigido para o reconhecimento da especialidade do tempo de contribuição prestado a partir da vigência da Lei 9.032/1995 e até a superveniência da Emenda Constitucional 103/2019 - condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física - não exclui a possibilidade de inclusão de atividades exercidas em situação de periculosidade e penosidade. 6. Essa posição acabou sendo sancionada pelo STJ no julgamento do REsp 1.306.113/SC, admitido como recurso representativo de controvérsia repetitiva sob o Tema n° 534, em que, embora a questão submetida a julgamento fosse a possibilidade de configuração da especialidade do trabalho exposto ao agente perigoso eletricidade, a tese fixada ultrapassa os limites do agente eletricidade, e da própria periculosidade, permitindo o reconhecimento da especialidade do labor prestado sob exposição a outros fatores de periculosidade, à penosidade, e até mesmo a agentes insalubres não previstos em regulamento, desde que com embasamento "na técnica médica e na legislação correlata". 7. Admitida a possibilidade de reconhecimento da penosidade após a vigência da Lei 9.032/1995, esse reconhecimento deve se dar com base em critérios objetivos analisados no caso concreto por meio de perícia técnica, uma vez que extinta a possibilidade de mero enquadramento por categoria profissional. 8. Tratando-se de circunstância que, embora possua previsão constitucional, carece de regulamentação legislativa, sequer é cogitada pelos empregadores na confecção dos formulários habitualmente utilizados para a comprovação de atividade especial, motivo pelo qual é necessário que os órgãos judiciais garantam o direito dos segurados à produção da prova da alegada penosidade. Ademais, considerando que a tese encaminhada por esta Corte vincula o reconhecimento da penosidade à identificação dessa circunstância por perícia técnica, essa constitui, então, o único meio de prova à disposição do segurado. 9. Tese fixada nos seguintes termos: deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova. 10. Cabendo ao órgão colegiado julgar também o recurso que dá origem à assunção de competência admitida, conforme disposto no art. 947, §2º do CPC, no caso concreto deve ser dado provimento à preliminar da parte autora para anular a sentença e determinar o retorno do feito ao Juízo de origem, para que se proceda à reabertura da instrução processual. (TRF4 5033888-90.2018.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 27/11/2020)
Logo, inobservada a previsão contida no art. 473 inciso IV, do CPC, outra alternativa não há, senão anular a sentença também nesse ponto e determinar o retorno dos autos à origem, para que seja reaberta a instrução e complementada a perícia pelo mesmo perito, de modo a exaurir seu objeto, avaliando exaustivamente a alegada condição penosa do labor do autor, quanto ao período em questão.
DISPOSITIVO
Pelo exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso da parte autora para com relação à especialidade das atividades desempenhadas nos períodos de 21/06/1977 a 01/10/1977, 19/08/1980 a 04/05/1981, 07/05/1981 a 01/02/1988, e de 01/08/2008 a 28/04/2015, anular a sentença, por cerceamento de defesa, determinando a remessa dos autos ao juízo de origem, a fim de que seja reaberta a fase instrutória e que sejam analisados, na integralidade, os pedidos formulados na inicial.
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Apelação Cível Nº 5024868-17.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: PAULO ROBERTO MARTIN
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. atividade especial. ausência de provas. SENTENÇA CITRA PETITA. NULIDADE.
1. É nula a sentença que viola os artigos 141, 490 e 492 do NCPC e contém julgamento divorciado da pretensão formulada pela parte ou aquém do pedido. Deve ser declarada a nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, em virtude da ausência da prova pericial, tendo em vista a sua essencialidade para a comprovação das atividades desempenhadas pelo segurado e dos agentes nocivos a que estava exposto o segurado na prestação do labor.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso da parte autora para com relação à especialidade das atividades desempenhadas nos períodos de 21/06/1977 a 01/10/1977, 19/08/1980 a 04/05/1981, 07/05/1981 a 01/02/1988, e de 01/08/2008 a 28/04/2015, anular a sentença, por cerceamento de defesa, determinando a remessa dos autos ao juízo de origem, a fim de que seja reaberta a fase instrutória e que sejam analisados, na integralidade, os pedidos formulados na inicial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de maio de 2022.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/05/2022 A 17/05/2022
Apelação Cível Nº 5024868-17.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: PAULO ROBERTO MARTIN
ADVOGADO: MARLON ALDEBRAND (OAB SC023423)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/05/2022, às 00:00, a 17/05/2022, às 16:00, na sequência 180, disponibilizada no DE de 29/04/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA PARA COM RELAÇÃO À ESPECIALIDADE DAS ATIVIDADES DESEMPENHADAS NOS PERÍODOS DE 21/06/1977 A 01/10/1977, 19/08/1980 A 04/05/1981, 07/05/1981 A 01/02/1988, E DE 01/08/2008 A 28/04/2015, ANULAR A SENTENÇA, POR CERCEAMENTO DE DEFESA, DETERMINANDO A REMESSA DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM, A FIM DE QUE SEJA REABERTA A FASE INSTRUTÓRIA E QUE SEJAM ANALISADOS, NA INTEGRALIDADE, OS PEDIDOS FORMULADOS NA INICIAL.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 27/05/2022 04:17:20.