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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. ATIVIDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR OU TRABALHADOR "BOIA-FRIA". REQUISITOS LEGAIS. INÍCIO DE...

Data da publicação: 14/03/2024, 11:00:59

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. ATIVIDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR OU TRABALHADOR "BOIA-FRIA". REQUISITOS LEGAIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. COMPLEMENTAÇÃO POR PROVA TESTEMUNHAL. NÃO COMPROVAÇÃO. 1. O trabalhador rural que implemente a idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher) e comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida para o benefício, faz jus à concessão do benefício da aposentadoria rural por idade, independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias (artigos 11, VII, 48, § 1º, e 142, da Lei n. 8.213/91). 2. Para fins de comprovação do exercício da atividade rural, não se exige prova robusta, sendo necessário, todavia, que o segurado especial apresente início de prova material (artigo 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal idônea, a teor do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, sendo admitidos, inclusive, documentos em nome de terceiros do mesmo grupo familiar, nos termos da disposição contida no enunciado nº 73 da Súmula do TRF da 4ª Região. 3. Hipótese em que a imprecisão e a inconsistência dos depoimentos, aliadas à escassez de provas materiais, impedem o reconhecimento do direito ao benefício de aposentadoria rural por idade na condição de segurado especial em regime de economia familiar. 4. Verificada a ausência de conteúdo probatório material eficaz a instruir a inicial, conforme estabelece o artigo 320 do Código de Processo Civil, resta configurada a hipótese de carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, o que implica decidir a causa sem resolução do mérito, consoante os termos do artigo 485, IV, do Código de Processo Civil. (TRF4, AC 5000317-94.2024.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 06/03/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000317-94.2024.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: CARMEM FERNANDES DE LIMA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

A parte autora ajuizou ação contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pleiteando a concessão de aposentadoria rural por idade.

Foi proferida sentença, cujo dispositivo ficou assim redigido (evento 46, SENT1):

3. DISPOSITIVO:

Ante o exposto, EXTINGO o feito sem resolução de mérito no tocante ao reconhecimento de atividade rural na condição de segurado especial de 04/06/2006 a 09/08/2019 (DER), por falta de início de prova material contemporânea dos fatos, com fundamento no artigo 485, inciso IV, do Código de Processo Civil; e, quanto ao restante da pretensão, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados pela parte autora CARMEM FERNANDES DE LIMA, resolvendo o mérito nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC.

CONDENOo INSS – INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL a reconhecer e averbar o período entre 01/01/1998 a 03/06/2006 como segurada especial.

Condeno a parte autora ao pagamento de despesas processuais, inclusive eventuais honorários periciais e pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa. Contudo, resta suspensa a exigibilidade das condenações, por força da gratuidade da justiça.

Não há condenação ao pagamento de custas nos termos do artigo 4º, inciso II, da Lei nº 9.289/1996.

O feito não se submete ao reexame necessário.

A parte autora apela sustentando a existência de início de prova documental, corroborada pela prova testemunhal, no período necessário para a concessão do benefício, requerendo a reforma da sentença. Supletivamente, requer a averbação do período rural reconhecido em sentença, e mantida a extinção do feito em relação ao período controvertido, sem resolução do mérito, para fins de oportunizar a produção de outras provas da condição de trabalhadora rural (evento 49, PET1).

Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

Peço dia para julgamento.

VOTO

Aposentadoria Rural por Idade

A concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91), deve observar os seguintes requisitos: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 anos para mulheres); e (b) exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, ainda que de forma descontínua, independentemente do recolhimento de contribuições (art. 48, §§ 1º e 2º, 25, II, 26, III, e 39, I, da Lei nº 8.213/91).

Quanto à carência, o art. 143 da Lei nº 8.213/91, estabeleceu regra de transição para os trabalhadores rurais que passaram a ser enquadrados como segurados obrigatórios, na forma do art. 11, I, "a", IV ou VII, assegurando "aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência no referido benefício".

Já o art. 142 da Lei de Benefícios previu tabela específica de prazos diferenciados de carência, conforme o ano de implementação das condições para a aposentadoria por idade, por tempo de serviço e especial, "para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural".

Na aplicação da tabela do art. 142, o termo inicial para o cômputo do tempo de atividade rural é o ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que já disponha de tempo suficiente para o deferimento do pedido, sendo irrelevante que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal de 1988 e art. 102, § 1º, da Lei nº 8.213/91).

Na hipótese de insuficiência de tempo de exercício de atividade rural ao completar a idade mínima, a verificação do tempo equivalente à carência não poderá mais ser feita com base no ano em que atingida a idade mínima, mas a partir de sua implementação progressiva, nos anos subseqüentes à satisfação do requisito etário, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/91.

Outrossim, nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31.08.1994, data da publicação da Medida Provisória nº 598, por meio da qual foi alterada a redação original do referido art. 143 (posteriormente convertida na Lei nº 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, por um período de 5 anos (60 meses) anterior ao requerimento administrativo, não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/91.

A disposição contida no art. 143 da Lei nº 8.213/91, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser relativizada em função do disposto no art. 102, § 1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido.

Em qualquer dos casos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo; ou, inexistente este, da data do ajuizamento da ação (STF, RE 631240, Rel. Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, j. 3.9.2014).

O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, quando necessária ao preenchimento de lacunas - não sendo esta admitida, exclusivamente, nos termos do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, bem como da Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça (STJ, REsp 1.321.493, Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª S., j. 10.10.2012).

Ainda, quanto à questão da prova, cabe ressaltar os seguintes aspectos: (a) o rol de documentos constantes no artigo 106 da Lei n. 8.213, de 1991, os quais seriam aptos à comprovação do exercício da atividade rural, é apenas exemplificativo; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do Imposto TR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido (STJ, AgRg no AREsp 327.119, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho,1ª T., j. 2.6.2015); (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (STJ, Tema 554, REsp n.º 1.321.493, Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª S., j. 10.10.2012); e (d) É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório (Súmula 577 do STJ).

A declaração de sindicato de trabalhadores rurais, sem a respectiva homologação do INSS e isoladamente considerada, não se consubstancia em início de prova material, uma vez que constitui mera manifestação unilateral, não sujeita ao crivo do contraditório. (TRF4, EINF 2006.71.99.000415-1, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 19.09.2008).

É admitido, como início de prova material, nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, documentos de terceiros, membros do grupo parental. De fato, o artigo 11, § 1 º, da Lei n. 8.213, de 1991, define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família exercem em condições de mútua dependência e colaboração. Nesse contexto, os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta exercida, normalmente, no caso dos trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino.

O fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não serve para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do artigo 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 16 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. Ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também desimportar se o cônjuge recebe alguma remuneração que complemente a renda familiar, mas que não retire a natureza de subsistência da renda advinda da atividade rural, ou seja que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.

Nos casos dos trabalhadores rurais conhecidos como "boias-frias", diaristas ou volantes, considerando a informalidade com que é prestado o trabalho no meio rural, que dificulta a comprovação documental da atividade, o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça é de que o tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material referente ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, quando necessária ao preenchimento de lacunas, não sendo admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto quando demonstrada a ocorrência de caso fortuito ou força maior, os termos do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, bem como da Súmula nº 149 do STJ e do REsp nº 1.321.493/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 10.10.2012, recurso representativo da controvérsia).

Quanto às contribuições do trabalhador rural "boia-fria" em casos como o presente, que não trata de aposentadoria por tempo de contribuição, aplica-se o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no sentido de sua inexigibilidade:

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENQUADRAMENTO DO TRABALHADOR BÓIA-FRIA. EQUIPARAÇÃO AO SEGURADO ESPECIAL. ART. 11, VII DA LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Esta Corte consolidou a orientação de que o Trabalhador Rural, na condição de bóia-fria, equipara-se ao Segurado Especial de que trata o inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, no que tange aos requisitos necessários para a obtenção de benefícios previdenciários. 2. Exigindo-se, tão somente, a apresentação de prova material, ainda que diminuta, desta que corroborada por robusta prova testemunhal, não havendo que se falar em necessidade de comprovação de recolhimentos previdenciários para fins de concessão de aposentadoria rural (REsp. 1.321.493/PR, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 19.12.2012). 3. É inegável que o trabalhador bóia-fria exerce sua atividade em flagrante desproteção, sem qualquer formalização e com o recebimento de valores ínfimos, o que demonstra a total falta de razoabilidade em se exigir que deveriam recolher contribuições previdenciárias. 4. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento. (REsp 1762211/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª T. DJe 07.12.2018)

A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do artigo 11, VII da Lei nº 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação "empregador II-b" nos respectivos recibos de Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) não implica a condição de empregador rural . Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar (artigo 1º, II, b, do Decreto-Lei nº 1166, de 15.4.1971).

Cumpre salientar também que muitas vezes a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Quanto a isso deve ser dito que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e aquelas trazidas em juízo, reconhece-se o melhor valor probatório destas últimas, que são produzidas com as cautelas legais, garantido o contraditório. Não se trata aqui de imputar inverídicas as informações tomadas no processo administrativo, mas de prestigiar a imparcialidade que caracteriza a prova produzida no curso do processo judicial. Dispondo de elementos que possam obstaculizar a pretensão da parte autora, cabe ao INSS judicializar a prova administrativa, de forma a emprestar-lhe maior valor probante.

Caso Concreto

A parte autora implementou o requisito etário (55 anos) em 26.12.2017, pois nascida em 26.12.1962 (evento 1, OUT2) e requereu o benefício administrativamente em 09.08.2019 (evento 1, OUT6). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividades rurais nos 180 meses anteriores ao implemento da idade mínima ou nos 180 meses anteriores ao requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável, mesmo que de forma descontínua.

Como início de prova material do labor rurícola, constam dos autos os seguintes documentos, assim arrolados na sentença:

a)Certidões de nascimento dos filhos da autora. Datadas de 06/06/1989 e 26/02/1999, constando a profissão dos genitores como lavradores. (Movs. 1.6, fls. 03 e 04; 1.8, fl. 01);

b)Notas fiscais de produtor rural em nome da autora e seu cônjuge. Datadas de 1998 a 2006. (Mov. 1.7, fls. 01 a 10);

c)Comunicação de acidente de trabalho do cônjuge da autora, constando que o mesmo sofreu queda de uma carroça, enquanto retornava da lavoura. Datada de 09/06/2006. (Mov. 1.9, fl. 01);

d)Certidão de óbito do cônjuge da autora, constando a união consensual entre ambos há cerca de 24 anos. Datada de 12/03/2017. (Mov. 1.10, fl. 01).

Na audiência de instrução e julgamento foram inquiridas testemunhas, que informaram o exercício de atividades rurais pela parte autora, no período de carência. Em linhas gerais, contaram que a parte autora trabalhou em Guampara juntamente com o marido, em regime de economia familiar, e depois depois foram para Cantagalo e lá trabalhou como diarista rural, como consignado nas razões de apelação da parte autora:

Em seu depoimento pessoal, a Apelante, disse: “quando morava no Guampara, município de Marquinho, trabalhava na roça; que tinha um terreno de comodato de 1 alqueire; que na época plantava milho, feijão, arroz; que o plantio era manual; que trabalhava ela e o esposo; que não tiveram outro empregado, viviam só da agricultura; que depois veio para o Cantagalo trabalhar como boia-fria; que como boia-fria, carpe, roça, arranca feijão; que ela trabalhou para dona Nemora, Gilson de Lima; que eles pagam por dia o serviço”.

A testemunha Jose Teles, disse: “que conhece a Autora faz uns 30 anos; que ela trabalhava na roça em 1 alqueire, na localidade do Guampara, Município de Marquinho; que ela plantava arroz, feijão, milho; que trabalhava a autora e o marido dela; que a autora já saiu de lá; que depois que saiu veio para Cantagalo, faz uns 15 anos; que saíram meio junto do Guampara e vieram pro Cantagalo; que no Cantagalo, a Autora trabalha como diarista, plantando, colhendo; que viu ela trabalhando para Dr Fabiano, para o Pedro Josef, trabalhou para ele também; que a autora trabalhou a vida inteira como agricultora”.

Por fim a testemunha IVANILDA LUCAS, disse: que conhece a autora faz uns 15 anos do Cantagalo; que a autora trabalha de boia-fria; que sabe porque trabalharam juntas como boia-fria; que colhiam batata, quebrando milho, arrancando feijão; que tinha um ponto de encontro nos pontos de ônibus para irem trabalhar; que recebiam por quinzena, dependia do serviço; que a autora não teve outro trabalho, sempre trabalha, agora trabalha menos; que a autora sempre foi boia-fria.

A sentença julgou improcedente o pedido entendendo que a parte autora não provou a atividade rural alegada por todo o período de carência, em especial com relação ao período de 04.06.2006 a 09.08.2019, sendo possível o reconhecimento apenas entre 01.01.1998 e 03.06.2006.

Analisando o conjunto probatório como um todo, não é possível concluir que a parte autora efetivamente exerceu atividades rurais durante o período postulado, verificando-se a insuficiência da prova material apresentada, pois os documentos apresentados são insuficientes para amparar a pretensão da parte autora.

Nesse ponto, reitera-se que o Superior Tribunal de Justiça fixou o entendimento de que deve haver início de prova material, ainda que parcial, não se admitindo prova exclusivamente testemunhal, ou firmada exclusivamente em autodeclaração, inclusive para os trabalhadores "boias-frias":

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DESNECESSIDADE DE CORRESPONDER A TODO PERÍODO EQUIVALENTE À CARÊNCIA. NECESSIDADE, ENTRETANTO, DE SER AO MENOS PARCIALMENTE CONTEMPORÂNEO AO PERÍODO EQUIVALENTE À CARÊNCIA. (...). I - Na aposentadoria rural por idade, o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural por tempo equivalente ao período de carência, nos termos do art. 143 da Lei n. 8.213/91. II - A comprovação da atividade rural deve ocorrer mediante a apresentação de início de prova material, a qual pode ser corroborada por prova testemunhal que lhe amplie a eficácia. III - O início de prova material não precisa abranger todo o período de carência, de forma a ser comprovado ano a ano, entretanto, deve ser produzido, ao menos parcialmente, dentro do período equivalente à carência. Precedentes: Pet 7.475/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 9/11/2016, DJe 29/11/2016; AR 3.994/SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, julgado em 23/9/2015, DJe 1º/10/2015. IV - O referido entendimento é aplicável inclusive em relação aos boias-frias, conforme já se decidiu no REsp 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19/12/2012, submetido ao rito do art. 543-C. V - In casu, sendo o início de prova material apresentado totalmente extemporâneo ao período equivalente à carência, deve o recurso da autarquia ser provido para indeferir o pedido de aposentadoria rural por idade. (...) (REsp 1466842/PR, Rel. Min. Francisco Falcão,2ª T., DJe 27.03.2018)

Ainda que relatado pelas testemunhas ou afirmado em autodeclaração o exercício de atividades campesinas pela autora, não se admite prova exclusivamente testemunhal para comprovação da atividade rurícola, para efeitos de obtenção de benefício previdenciário (Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça).

Nesse contexto, não restou comprovado o exercício de atividade rural da parte autora no período controvertido.

Em casos como o da presente demanda, de impossibilidade da concessão do benefício de aposentadoria rural por idade em face da ausência de conteúdo probatório válido, notadamente pela insuficiência da prova material acostada com a inicial, firmou-se o seguinte entendimento:

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO. 1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários. 2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado. 3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas. 4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela via da assistência social. 5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa. 6. Recurso Especial do INSS desprovido. (STJ, RESp nº 1.352.721/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ-e de 28.04.2016)

Nessa linha, portanto, verificada a ausência de conteúdo probatório válido para instruir a inicial, conforme estabelece o artigo 320 do Código de Processo Civil, resta configurada a hipótese de carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, o que implica decidir a causa sem resolução do mérito, consoante os termos do artigo 485, IV, do Código de Processo Civil.

Decorrentemente, resta oportunizado à parte autora a formulação de novo requerimento na via administrativa e, se necessário, o ajuizamento de nova ação, caso obtenha outras provas do trabalho agrícola alegado, que não teve possibilidade de utilizar na instrução do requerimento objeto desta demanda.

No que tange ao pedido subsidiário de reconhecimento e a declaração do período do trabalho rural relativos ao período de 01.01.1998 a 03.06.3006 como segurada especial, na condição de segurado especial, a sentença julgou parcialmente procedente o pedido reconhecer e averbar o aludido interregno.

Como já exposto nas premissas deste voto, o período de labor rural posterior a 31.10.1991 só pode ser computado para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição após a indenização das respectivas contribuições.

Na espécie, a autora não postulou a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, nem no âmbito administrativo, nem em Juízo.

Desse modo, tem-se que as razões recursais, apesar de encontrar respaldo no entendimento desta Corte sobre o tema, não tem aplicação imediata ao caso concreto.

Entretanto, tendo em vista que, na espécie, se cuida de pedido de averbação de tempo de serviço para fins de futura concessão de benefício, deve ser mantida a sentença intacta, consignando-se que, embora comprovado período de trabalho rural como segurado especial, o cômputo dos interregnos posteriores a 31.10.1991, para fins de obtenção de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, somente será admissível após efetuados os respectivos recolhimentos.

Ante o exposto, nego provimento ao apelo, nos termos da fundamentação.

Honorários Advocatícios

Em grau recursal, consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, a majoração é cabível quando se trata de "recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente" (STJ, AgInt. nos EREsp. 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 2ª S., DJe 19.10.2017), o que foi reafirmado no Tema 1.059/STJ:

A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento e limitada a consectários da condenação.

Improvido o apelo, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade fica suspensa em face do benefício da justiça gratuita.

Custas

Inexigibilidade temporária também das custas, em face do benefício da assistência judiciária gratuita em favor da parte autora.

Prequestionamento

Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.

Conclusão

- apelação improvida.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004322998v12 e do código CRC 77719383.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000317-94.2024.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: CARMEM FERNANDES DE LIMA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. ATIVIDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR OU TRABALHADOR "BOIA-FRIA". REQUISITOS LEGAIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. COMPLEMENTAÇÃO POR PROVA TESTEMUNHAL. NÃO COMPROVAÇÃO.

1. O trabalhador rural que implemente a idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher) e comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida para o benefício, faz jus à concessão do benefício da aposentadoria rural por idade, independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias (artigos 11, VII, 48, § 1º, e 142, da Lei n. 8.213/91).

2. Para fins de comprovação do exercício da atividade rural, não se exige prova robusta, sendo necessário, todavia, que o segurado especial apresente início de prova material (artigo 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal idônea, a teor do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, sendo admitidos, inclusive, documentos em nome de terceiros do mesmo grupo familiar, nos termos da disposição contida no enunciado nº 73 da Súmula do TRF da 4ª Região.

3. Hipótese em que a imprecisão e a inconsistência dos depoimentos, aliadas à escassez de provas materiais, impedem o reconhecimento do direito ao benefício de aposentadoria rural por idade na condição de segurado especial em regime de economia familiar.

4. Verificada a ausência de conteúdo probatório material eficaz a instruir a inicial, conforme estabelece o artigo 320 do Código de Processo Civil, resta configurada a hipótese de carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, o que implica decidir a causa sem resolução do mérito, consoante os termos do artigo 485, IV, do Código de Processo Civil.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 05 de março de 2024.



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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 27/02/2024 A 05/03/2024

Apelação Cível Nº 5000317-94.2024.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A): CAROLINA DA SILVEIRA MEDEIROS

APELANTE: CARMEM FERNANDES DE LIMA

ADVOGADO(A): GISELE APARECIDA SPANCERSKI (OAB PR048364)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 27/02/2024, às 00:00, a 05/03/2024, às 16:00, na sequência 760, disponibilizada no DE de 16/02/2024.

Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

SUZANA ROESSING

Secretária



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