APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002970-16.2017.4.04.9999/PR
RELATOR | : | GISELE LEMKE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOSE FELICIANO DA SILVA |
ADVOGADO | : | MICHELI DE LIMA RODRIGUES |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. BOIA-FRIA/DIARISTA. REFORMA DA SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.
1. Defere-se aposentadoria rural por idade ao segurado que cumpre os requisitos previstos no inciso VII do artigo 11, no parágrafo 1º do artigo 48, e no artigo 142, tudo da Lei 8.213/1991;
2. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material;
3. Reforma da sentença de procedência.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 28 de novembro de 2017.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Gisele Lemke, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9221046v7 e, se solicitado, do código CRC 19A7EE0B. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002970-16.2017.4.04.9999/PR
RELATORA | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOSE FELICIANO DA SILVA |
ADVOGADO | : | MICHELI DE LIMA RODRIGUES |
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária proposta na Justiça Estadual por JOSE FELICIANO DA SILVA (nascido em 01/07/1947) contra o INSS em 04/11/2011, pretendendo concessão de benefício de aposentadoria por idade rural. Com pedido de antecipação de tutela, esta restou indeferida em sentença.
A sentença (EVENTO 1 - OUT16), proferida em 13/11/2012, julgou procedente o pedido inicial, condenando o INSS a conceder ao autor o benefício de aposentadoria por idade rural a partir da DER (19/10/2010). Entendeu o magistrado que as declarações juntadas pelo autor e a prova testemunhal produzida nos autos, comprovaram a condição de segurado especial deste. Sobre os consectários, determinou a atualização, sem definir índices, e juros de mora fixados a partir da citação, em 12% ao ano. Condenou ainda o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios em 10% das parcelas vencidas e ao pagamento das custas judiciais. A ação não foi submetida ao reexame necessário.
Apelou o INSS (EVENTO 1 - OUT18), defendendo que as provas documentais apresentadas aos autos não podem ser consideradas como aptas para comprovar a atividade rural exercida pelo autor. Pelo princípio da eventualidade, requereu a reforma dos consectários, aplicando-se o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com alteração da Lei nº 11.960/2009. Requereu a reforma integral da sentença impugnada e suscitou o presquestionamento dos dispositivos legais para os devidos fins recursas.
Com contrarrazões (EVENTO 1 - OUT19), vieram os autos a este Tribunal.
VOTO
DO REEXAME NECESSÁRIO
A presente ação não foi submetida ao reexame necessário.
DA APOSENTADORIA RURAL POR IDADE - BOIA-FRIA
CONSIDERAÇÕES GERAIS
O trabalhador rural qualificado como boia-fria, diarista, ou volante tem difícil enquadramento no Regime Geral de Previdência estabelecido pela Lei 8.213/1991. Esta Corte já se inclinou por indicar tratar-se de segurado empregado, nos termos da al. a do inc. I do art. 11 da L 8.213/1991:
[...] 1- É inadequado classificar-se o "bóia-fria" como prestador de serviços eventuais e, assim, incluí-lo entre os contribuintes individuais, uma vez que, sabidamente, seu trabalho insere-se nas atividades-fins da empresa agrícola. A instituição do "bóia-fria" nada mais é que um arranjo para burlar os direitos trabalhistas e previdenciários das massas de trabalhadores rurais, e seu surgimento coincide, significativamente, com a implantação do "Estatuto do Trabalhador Rural".
2- O Egrégio Superior Tribunal de Justiça reconhece ao bóia-fria a condição de trabalhador rural assalariado, na medida em que lhe confere o direito à aposentadoria sem exigência do recolhimento de contribuições, além de admitir até mesmo a prova exclusivamente testemunhal dessa condição. [...]
(TRF4, Quinta Turma, AC 2000.04.01.136558-4, rel. Antonio Albino Ramos de Oliveira, DJ 28maio2003)
Essa orientação foi registrada doutrinariamente:
Consentâneos à teoria dos fins do empreendimento, alguns julgados dos Tribunais vêm reconhecendo aos assalariados rurais que prestam serviços em atividades de curta duração a condição de empregados e não como trabalhadores eventuais ou autônomos.
(MORELLO, Evandro José. Os trabalhadores rurais na previdência social: tipificação e desafios à maior efetividade do direito. VAZ, Paulo Afonso Brum; SAVARIS, José Antonio (org.). Direito da previdência e assistência social: elementos para uma compreensão interdisciplinar. Florianópolis:Conceito Editorial, 2009, p. 217)
A evolução da jurisprudência desta Corte, todavia, passou a equiparar o boia-fria, diarista, ou volante ao segurado especial de que trata o inc. VII do art. 11 da L 8.213/1991, dispensando-o da prova dos recolhimentos previdenciários para obtenção de benefícios:
[...] o trabalhador rural que atua como boia-fria, diarista ou volante, deve ser equiparado, para os fins da aposentadoria rural por idade, ao segurado especial, aplicando-se-lhe, em consequência, o disposto no art. 39, I, da Lei 8.213/91, sem as limitações temporais previstas no art. 143 da mesma lei. Com efeito, não há o que justifique tratamento diferenciado, especialmente se considerada a maior vulnerabilidade social a que está sujeito o trabalhador rural sem vínculo empregatício e desprovido dos meios para, por conta própria, retirar seu sustento e de sua família do trabalho na terra. Em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei n.º 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições. [...]
Tratando-se, porém, de segurado especial/boia fria (trabalhador equiparado a segurado especial), não se lhe aplica o limite temporal a que se refere o art. 143, com as alterações promovidas pela Lei 11.718/2008, destinadas, exclusivamente, aos trabalhadores rurais não enquadrados ou equiparados a segurados especiais. A estes últimos, aplica-se o disposto no art. 39, I. [...]
(TRF4, Quinta Turma, APELREEX 0019895-80.2014.404.9999, rel. Taís Schilling Ferraz, D.E. 5maio2015)
[...] 3) O trabalhador rural volante/diarista/bóia-fria é equiparado ao segurado especial quanto aos requisitos necessários para a obtenção dos benefícios previdenciários. [...]
(TRF4, Quinta Turma, AC 0006917-42.2012.404.9999, rel. Candido Alfredo Silva Leal Junior, D.E. 19jul.2012)
[...] 2. O trabalhador rural boia-fria deve ser equiparado ao segurado especial de que trata o art. 11, VII, da Lei de Benefícios, sendo-lhe dispensado, portanto, o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário.
(TRF4, Sexta Turma, AC 0016711-58.2010.404.9999, rel. Celso Kipper, D.E. 12/05/2011)
[...] 4. Embora o trabalhador rural denominado bóia-fria, volante ou diarista não esteja enquadrado no rol de segurados especiais referidos no inc. VII do art. 11 da Lei de Benefícios, a estes se equipara para fins de concessão de aposentadoria rural por idade ou instituição de pensão, consoante pacífica jurisprudência.
5. Equiparado ao segurado especial, será, portanto, dispensado ao trabalhador rural boia-fria o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário.
(TRF4, AC 0015908-41.2011.404.9999, Quinta Turma, Relatora Cláudia Cristina Cristofani, D.E. 09/12/2011)
Ressalvo entendimento divergente, informado pela verificação de que manter a interpretação acima descrita resulta em estímulo contínuo à informalidade que o estabelecimento de uma condescendente rede de suporte previdenciário desprovida de fonte de custeio e de controle de concessão enseja.
A qualidade de segurado desses trabalhadores rurais não é dependente de demonstração do recolhimento de contribuições:
Na hipótese dos autos, a parte autora implementou a idade/tempo de serviço rural após 31 de dezembro de 2010. Tratando-se, porém, de segurado especial/boia fria (trabalhador equiparado a segurado especial), não se lhe aplica o limite temporal a que se refere o art. 143, com as alteraçoes promovidas pela Lei 11.718/2008, destinadas, exclusivamente, aos trabalhadores rurais não enquadrados ou equiparados a segurados especiais. A estes últimos, aplica-se o disposto no art. 39, I. [...]
(TRF4, Quinta Turma, AC 0016652-31.2014.404.9999, rel. Taís Schilling Ferraz, D.E. 4fev.2015)
Basta comprovar o exercício de atividade rural pelo tempo legalmente previsto, ainda que de forma intermitente, além da implementação da idade mínima, que o benefício, informado pelo disposto nos §§ 1º e 2º do art. 48, no inc. II do art. 25, no inc. III do art. 26, e no inc. I do art. 39, tudo da L 8.213/1991, deve ser concedido.
Em suma, são requisitos para obter o benefício:
1) implementação da idade mínima (cinquenta e cinco anos para mulheres, e sessenta anos para homens);
2) exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondente à carência exigida, ainda que a atividade seja descontínua, e observada a regra de transição registrada na tabela do art. 142 da L 8.213/1991.
O ano de referência de aplicação da tabela do art. 142 da L 8.213/1991 será o em que o segurado completou a idade mínima para haver o benefício, desde que, até então, já disponha de tempo rural correspondente aos prazos previstos. É irrelevante que o requerimento de benefício seja apresentado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, preservado o direito adquirido quando preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos (§ 1º do art. 102 da L 8.213/1991).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima mas não tenha o tempo de atividade rural exigido, observada a tabela do art. 142 da L 8.213/1991. Nesse caso, a verificação do tempo de atividade rural necessária ao cumprimento da carência equivalente para obter o benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, mas sim nos anos subsequentes, de acordo com a tabela mencionada, com exigências progressivas.
Ressalvam-se os casos em que o requerimento administrativo e a implementação da idade mínima tenham ocorrido antes de 31ago.1994 (vigência da MP 598/1994, convertida na L 9.063/1995, que alterou o art. 143 da L 8.213/1991), nos quais o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural anterior ao requerimento por um período de cinco anos (sessenta meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da L 8.213/1991.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo (STF, Plenário, RE 631240/MG, rel. Roberto Barroso, j. 3set.2014).
O tempo de trabalho rural deve ser demonstrado com, pelo menos, um início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea. Não é admitida a prova exclusivamente testemunhal, a teor do § 3º do art. 55 da L 8.213/1991, preceito jurisprudencialmente ratificado pelo STJ na Súmula 149 e no julgamento do REsp nº 1.321.493/PR (STJ, 1ª Seção, rel. Herman Benjamin, j. 10out.2012, em regime de "recursos repetitivos" do art. 543-C do CPC1973). Embora o art. 106 da L 8.213/1991 relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo (STJ, Quinta Turma, REsp 612.222/PB, rel. Laurita Vaz, j. 28abr.2004, DJ 7jun.2004, p. 277).
Não se exige, por outro lado, prova documental contínua da atividade rural, ou em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, quaisquer registros em cadastros diversos) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar:
[...] considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ [...]
(STJ, Primeira Seção, REsp 1321493/PR, rel. Herman Benjamin, j. 10out.2012, DJe 19dez.2012)
Quanto à questão da contemporaneidade da prova documental com o período relevante para apuração de carência, já decidiu esta Corte: A contemporaneidade entre a prova documental e o período de labor rural equivalente à carência não é exigência legal, de forma que podem ser aceitos documentos que não correspondam precisamente ao intervalo necessário a comprovar. Precedentes do STJ (TRF4, Sexta Turma, REOAC 0017943-66.2014.404.9999, rel. João Batista Pinto Silveira, D.E. 14ago.2015).
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do trabalho rural, conforme já consolidado na jurisprudência do STJ: "A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da admissibilidade de documentos em nome de terceiros como início de prova material para comprovação da atividade rural" (STJ, Quinta Turma, REsp 501.009/SC, rel. Arnaldo Esteves Lima, j. 20nov.2006, DJ 11dez.2006, p. 407).
O INSS alega com frequência que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade rural no período de carência. As conclusões adotadas pelo INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pela prova produzida em Juízo. Em conflito as provas colhidas na via administrativa e as tomadas em juízo, deve-se ficar com estas últimas, pois produzidas sob o contraditório e com intenso controle sobre o ônus de produzi-las: "A prova judicial, produzida com maior rigorismo, perante a autoridade judicial e os advogados das partes, de forma imparcial, prevalece sobre a justificação administrativa" (TRF4, Quinta Turma, APELREEX 0024057-21.2014.404.9999, rel. Taís Schilling Ferraz, D.E. 25jun.2015). Dispondo de elementos que impeçam a pretensão da parte autora, cabe ao INSS produzir em Juízo a prova adequada, cumprindo o ônus processual descrito no inc. II do art. 373 do CPC2015.
DO CASO CONCRETO
O requisito etário, sessenta anos, cumpriu-se em 01/07/2007(nascimento em 01/07/1947, EVENTO 1 - OUT3, fl.3). O requerimento administrativo é datado de 19/10/2010. Deve-se comprovar o exercício de atividade rural nos 156 meses imediatamente anteriores à implementação do requisito etário, ou nos 174 meses imediamente anteriores ao requerimento administrativo, o que for mais benéfico para o autor.
Em sua petição inicial (EVENTO 1 - INIC2), afirma o autor que trabalha na lavoura desde muito jovem, sendo que nunca exerceu outra atividade. Declarou que sempre exerceu a atividade de boia-fria, e que detém os requisitos necessários para a concessão do benefício pleiteado.
Em prova do exercício de atividade rural, o processo foi instruído com os seguintes documentos:
1. Declaração do Sr. Benedito Duarte, onde afirma que o autor trabalhou em sua propriedade nos períodos de 1993 até 1996 e nos meses de maio de 2007 e setembro de 2008 (EVENTO 1 - OUT3, fl.13);
2. Declaração do Sr. Issásio Barranco, onde afirma que o autor trabalhou em sua propriedade no período de 1978 a 1989 (EVENTO 1 - OUT3, fl. 14);
3. Cópia de documento do registro de imóveis, em nome do Sr. Issássio Barranco, que descreve propriedade rural pertencente a este (EVENTO 1 - OUT3, fl.16).
Em relação às provas orais, colheu-se o depoimento do autor e das testemunhas arroladas por este (EVENTO 1 - OUT12, com mídia digital juntada no mesmo evento). Audiência de instrução foi realizada em 23/07/2012.
Em seus relatos, as testemunhas João Batista de Paula e Ordalio Jose dos Santos declararam: a) que conhecem o autor há mais de 12 anos; b) que o autor sempre trabalhou na roça; c) que algumas das atividades eram carpir, colher laranja e madioca, mas que hoje o autor tem problemas de saúde, não conseguindo trabalhar como antigamente; d) que algumas propriedades em que viram o autor trabalhar foram do Sr. Hélio Pimenta, do Sr. Dirceu Pinga e Sr. Duarte e e) que nunca viram o autor exercer atividade urbana.
Em seu depoimento pessoal, o autor declarou que trabalha desde os sete anos de idade na roça, e que nunca estudou. Que trabalha como diarista, carpindo, e que também lida com plantações de mandioca e colheita de laranja. Afirmou que ultimanente não têm aguentado o trabalho, porém continua trabalhando como pode. Que o último trabalho que havia realizado teria sido na semana anterior, na propriedade do Sr. Paulo Pinga, colhendo laranja. Disse que sobrevive com a ajuda de terceiros, e que o filho também o auxilia, não possuindo outra fonte de renda além do trabalho. Declarou que nunca exerceu atividade urbana.
Em sua contestação (EVENTO 1 - OUT6), o INSS alegou que o autor não trouxe aos autos documentos hábeis a servir como início de prova material, não comprovando o cumprimento da carência necessária para o deferimento do benefício.
A sentença (EVENTO 1 - OUT16), proferida em 13/11/2012, julgou procedente o pedido inicial, condenando o INSS a conceder ao autor o benefício de aposentadoria por idade rural a partir da DER (19/10/2010). Entendeu o magistrado que as declarações juntadas pelo autor e a prova testemunhal produzida nos autos, comprovaram a condição de segurado especial deste.
Apelou o INSS (EVENTO 1 - OUT18), defendendo que as provas documentais apresentadas aos autos não podem ser consideradas como aptas para comprovar a atividade rural exercida pelo autor. Pelo princípio da eventualidade, requereu a reforma dos consectários, aplicando-se o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com alteração da Lei nº 11.960/2009. Requereu a reforma integral da sentença impugnada e suscitou o presquestionamento dos dispositivos legais para os devidos fins recursais.
Este Regional, ao receber os autos, converteu o julgamento em diligência por questão de ordem (EVENTO 1 - OUT22), determinando o retorno dos autos para o juízo de origem para que fosse realizada complementação da instrução, oportunizando ao autor a juntada de prova material. Não foram juntados novos documentos, e os autos retornaram conclusos para julgamento.
Antes de adentrar no mérito do caso em apreço, é necessário destacar que a respeito do "boia-fria", o Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Resp n. 1.321.493-PR, recebido pela Corte como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (grifo nosso)
Portanto, a exclusiva prova testemunhal não pode ser considerada para deferimento do benefício. Deve haver um início de prova material hábil, ainda que mitigada, que indique o exercício da atividade laborativa de boia-fria exercida pela parte.
No caso concreto, o autor preencheu o requisito etário - 60 anos - em 2007. Assim, necessária seria a comprovação da atividade rural em um período de 13 anos (conforme tabela prevista no art. 142 da Lei nº 8.213/91, com redação dada pela Lei nº 9.032/95), o qual compreenderia o período de 1994 até 2007, ainda que descontínuo. Foram juntados como prova material a fim de comprovar a atividade rural exercida pelo autor neste período a) declaração do Sr. Benedito Duarte, onde afirma que o autor trabalhou em sua propriedade nos períodos de 1993 até 1996 e nos meses de maio de 2007 e setembro de 2008 (EVENTO 1 - OUT3, fl.13); b) declaração do Sr. Issásio Barranco, onde afirma que o autor trabalhou em sua propriedade no período de 1978 a 1989 (EVENTO 1 - OUT3, fl. 14) e c) cópia de documento do registro de imóveis, em nome do Sr. Issássio Barranco, que descreve propriedade rural pertencente a este (EVENTO 1 - OUT3, fl.16).
As declarações juntadas aos autos não podem ser consideradas como indício de prova material, uma vez que são consideradas pela jurisprudência dominante como prova testemunhal, e não documental:
PROCESSUAL CIVIL - RECURSO ESPECIAL - APOSENTADORIA RURAL POR IDADE - INÍCIO DE PROVA MATERIAL - REEXAME DE PROVAS: SÚMULA 7/STJ.
1. É inadmissível o recurso especial se a análise da pretensão do recorrente demanda o reexame de provas. Súmula 7/STJ.
2. Hipótese em que o autor apresentou, a título de início de prova material, declarações de ex-empregadores, as quais, nos termos do entendimento sedimentado nesta Corte, representariam mera prova testemunhal reduzida a termo, não colhida em juízo.
3. Recurso especial não conhecido.
(REsp 1310873/MT, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/05/2013, DJe 15/05/2013) (grifo nosso)
Foi oportunizida a parte juntada de documentos hábeis para constituir início de prova material (EVENTO 1 - OUT22), porém, não houve qualquer manifestação desta, apesar de devidamente intimada (EVENTO 1 - OUT24).
Assim, entendo que não foi juntado aos autos documento apto a servir como início de prova material, a fim de comprovar a atividade laborativa exercida pelo autor. A prova testemunhal produzida não pode, por si só, legitimar o direito ao benefício pleiteado.
Com base na fundamentação acima entendo que deve ser dado provimento ao recurso do INSS.
Assim, deve ser reformada a sentença que julgou procedente o pedido de concessão de benefício de aposentadoria rural por idade ao autor desde a data do requerimento administrativo (19/10/2010).
Anoto, porém, que do quanto se extrai dos autos o autor parece fazer jus ao benefício assistencial.
DOS CONSECTÁRIOS
Tendo em vista que foi dado provimento ao apelo do INSS, resta invertida a sucumbência, devendo o autor arcar com os honorários advocatícios, que devem ser fixados em 10% do valor da causa, e com as custas e despesas processuais.
Entretanto, é suspensa a exigibilidade dos consectários, uma vez que o autor é beneficiário da Assistência Judiciária Gratuita (EVENTO 1 - OUT5).
DO PREQUESTIONAMENTO
Em suas razões de apelação, o INSS suscitou o prequestionamento dos dispositivos legais levantados. Assim, com a finalidade específica de possibilitar o acesso às instâncias superiores, explicito que o presente acórdão, ao equacionar a lide como o fez, não violou nem negou a vigência dos dispositivos constitucionais e/ou legais mencionados no recurso, os quais dou por prequestionados.
CONCLUSÃO
Em conformidade com a fundamentação acima, a sentença deve ser reformada em sua integralidade, dando-se provimento ao recurso, tendo em vista que as provas dos autos não demonstram a condição de segurado especial do autor.
DISPOSITIVO
Pelo exposto, voto por dar provimento à apelação do INSS, nos termos da fundamentação.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Gisele Lemke, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9221045v28 e, se solicitado, do código CRC 968C502E. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 28/11/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002970-16.2017.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00024829820118160070
RELATOR | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr. Fábio Nesi Venzon |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOSE FELICIANO DA SILVA |
ADVOGADO | : | MICHELI DE LIMA RODRIGUES |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 28/11/2017, na seqüência 508, disponibilizada no DE de 13/11/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI | |
: | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9259913v1 e, se solicitado, do código CRC 4C32B764. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
Data e Hora: | 29/11/2017 13:42 |