D.E. Publicado em 06/04/2016 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015149-72.2014.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | LUCIA SEFFRIN HERTER |
ADVOGADO | : | Mauro Antonio Volkmer e outro |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. NÃO CARACTERIZADO. REQUISITOS LEGAIS. NÃO COMPROVADOS.
. Fixada pelo STJ a obrigatoriedade do reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, Estados, Distrito Federal e Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público na REsp 1101727/PR, a previsão do art. 475 do CPC torna-se regra, admitido o seu afastamento somente nos casos em que o valor da condenação seja certo e não exceda a sessenta salários mínimos.
. Satisfeitos os requisitos legais de idade mínima e prova do exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência, é devida a aposentadoria rural por idade.
. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal.
. Para a caracterização do regime de economia familiar é imprescindível que a atividade rural seja indispensável à subsistência do grupo familiar.
. Não havendo exercício de atividade rural em regime de economia familiar, é inviável a concessão do benefício postulado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação e à remessa oficial e cassar a antecipação de tutela, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de março de 2016.
Juiz Federal LUIZ ANTÔNIO BONAT
Relator
Documento eletrônico assinado por Juiz Federal LUIZ ANTÔNIO BONAT, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8130222v5 e, se solicitado, do código CRC 2E6D13A1. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Luiz Antônio Bonat |
Data e Hora: | 29/03/2016 17:29 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015149-72.2014.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | LUCIA SEFFRIN HERTER |
ADVOGADO | : | Mauro Antonio Volkmer e outro |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação contra sentença que julgou procedente o pedido para conceder aposentadoria por idade rural à parte autora, desde a data do requerimento administrativo, condenando o INSS a pagar as parcelas devidas a partir do vencimento de cada uma, corrigidas pelo IGP-M/FGV e acrescidas de juros de mora de 12% ao ano, a partir da citação. Arcará a autarquia, também, com o pagamento das custas processuais por metade, nos termos do artigo 11, "a", da Lei nº 13.471/10, e honorários advocatícios, de 10% do valor das prestações vencidas até a data da prolação da sentença. Foi deferida a antecipação de tutela, a fim de que a autarquia implantasse de imediato o benefício de aposentadoria por idade rural.
Em suas razões, sustenta a entidade previdenciária que não foi provada a atividade rural no período de carência por meio de início de prova material, não sendo admitida a prova exclusivamente testemunhal. Alega que, além da autora e seu esposo possuírem mais de 100 hectares de terras, dispõem de alta renda familiar, em razão da ocupação do marido como Prefeito de Caibaté.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Da remessa oficial
O Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ), seguindo a sistemática dos recursos repetitivos, regulada pelo art. 543-C, do CPC, decidiu que é obrigatório o reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, Estados, Distrito Federal e Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público. (REsp 1101727/PR, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, CORTE ESPECIAL, julgado em 04/11/2009, DJe 03/12/2009).
Assim, o reexame necessário, previsto no art. 475 do CPC, é regra, admitindo-se o seu afastamento somente nos casos em que o valor da condenação seja certo e não exceda a sessenta salários mínimos.
Como o caso dos autos não se insere nas causas de dispensa do reexame, conheço da remessa oficial.
Da aposentadoria rural por idade
A concessão de aposentadoria rural por idade, no valor de um salário mínimo, a trabalhador qualificado como segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91, pressupõe a satisfação da idade mínima (60 anos para homens e 55 para mulheres) e a demonstração do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao da carência de 180 meses (arts. 39, I, 48, §§1º e 2º, e 25, II da Lei nº 8.213/91), independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias.
Para o trabalhador rural que passou a ser enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social (art. 11, I, "a", IV ou VII), foram estabelecidas regras de transição, quais sejam: a) o art. 143 da Lei de Benefícios assegurou a possibilidade de ser requerida "aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência no referido benefício"; b) o art. 142 previu tabela específica de prazos diferenciados de carência, conforme o ano de implementação das condições para a aposentadoria por idade, por tempo de serviço e especial, "para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural". Assim, àqueles filiados à Previdência quando da edição da Lei nº 8.213/91 que implementarem o requisito idade até quinze anos após a vigência desse dispositivo legal (24-7-2006), não se lhes aplica o disposto no art. 25, II, mas a regra de transição antes referida.
No cômputo do tempo de atividade rural, com a aplicação da tabela do art. 142, deverá ser considerado como termo inicial o ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que já disponha de tempo suficiente para o deferimento do pedido, sendo irrelevante que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da CF/88 e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima, mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei. Nesse caso, a verificação do tempo equivalente à carência não poderá mais ser feita com base no ano em que atingida a idade mínima, mas a partir de sua implementação progressiva, nos anos subseqüentes à satisfação do requisito etário, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.
Nas hipóteses em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-8-1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que alterou a redação original do art. 143 referido, posteriormente convertida na Lei nº 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n° 8.213/91.
A disposição contida no art. 143 da Lei 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado; ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
O benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo; ou, inexistente este, da data do ajuizamento da ação, conforme modulação contida no julgamento do RE 631.240.
Da comprovação do tempo de atividade rural
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do disposto no art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, e na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).
Cabe salientar que, embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo; ademais, não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas um documento que, juntamente com a prova oral, criando um liame com a circunstância fática que se quer demonstrar, possibilite um juízo de valor seguro.
Observa-se que as certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
Da contemporaneidade da prova material
A Lei de Benefícios não exige que o início de prova material seja contemporâneo à época dos fatos cuja comprovação é pretendida, conforme se vê da transcrição do § 3º, do art. 55 da Lei 8.213, que segue:
A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.
Não há justificativa legal, portanto, para que se exija prova material contemporânea ao período de carência, nos termos reiteradamente defendidos pela Autarquia Previdenciária; tal exigência administrativa implica a introdução indevida de requisito, impondo limites que não foram estabelecidos pelo legislador. As certidões da vida civil, documentos admitidos de modo uníssono pela jurisprudência como início probatório de atividade rural, no mais das vezes, registram fatos muito anteriores à implementação da idade de 55 ou 60 anos, e fora dos prazos constantes do art. 142 da Lei 8.213/91. O período de carência, em se tratando de aposentadoria por idade rural, correspondente a estágio da vida do trabalhador em que os atos da vida passíveis de registro cartorário, tais como casar, ter filhos, prestar serviço militar, ou inscrever-se como eleitor, foram praticados muito antes do início do marco para a contagem da carência prevista para tal benefício.
Além disso, a juntada de tais certidões é fixada expressamente como orientação pelo eminente Ministro Herman Benjamin, Relator do REsp 1.321.493-PR, submetido ao procedimento dos recurso repetitivos e julgado pela egrégia 3ª Seção do STJ em 10/10/2012. No recurso especial em comento, a decisão majoritária concluiu pela imprescindibilidade de prova material para fins previdenciários, ainda que o labor tenha sido exercido à margem da formalidade, relegando às instâncias ordinárias a verificação da condição de trabalhador:
"E, nesse aspecto, por mais que o trabalho seja informal, é assente na jurisprudência desta Corte que há incontáveis possibilidades probatórias de natureza material. Por exemplo, ainda que o trabalho tenha sido informal, constatando-se que o segurado tem filhos ou é casado, devem ser juntadas certidões de casamento e de nascimento, o que deve ser averiguado pelas instâncias ordinárias."
Consequentemente, consideradas as notórias e por vezes insuperáveis dificuldades probatórias do segurado especial, é dispensável a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por prova testemunhal, nada impedindo que sejam contemplados os documentos extemporâneos ou emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.
Da prova da atividade rural prestada como boia-fria
No caso de exercício de trabalho rural caracterizado por sua notória informalidade, comprometendo a prova da atividade e, por conseguinte, a obtenção do benefício previdenciário, a jurisprudência pacificada por esta Corte era no sentido de abrandar a exigência relativa ao início de prova material, admitindo, até mesmo, em situações extremas, a comprovação da atividade exclusivamente por meio de prova testemunhal.
Todavia, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento, em 10-10-2012, do Resp nº 1.321.493/PR, representativo de controvérsia, firmou o entendimento de que se aplica também aos trabalhadores boias-frias a Súmula 149 daquela Corte. Sobressai do julgado que o rigor na análise do início de prova material para a comprovação do labor rural do boia-fria, diarista ou volante, deve ser mitigado, de sorte que o fato de a reduzida prova documental não abranger todo o período postulado não significa que a prova seja exclusivamente testemunhal quanto aos períodos faltantes. Assim, devem ser consideradas as dificuldades probatórias do segurado especial, sendo prescindível a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por robusta prova testemunhal.
Cumpre salientar, também, que, muitas vezes, a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Quanto a isso, deve ser dito que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e em juízo, deve-se optar pelas últimas, produzidas que são com todas as cautelas legais, garantido o contraditório.
Registra-se, por fim, que, em se tratando de aposentadoria por idade rural, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições. Quanto à Carteira de Identificação e Contribuição, prevista no art. 106 da Lei 8.213/91 como necessária à comprovação do exercício de atividade rural a partir de 16.04.94, trata-se de documento voltado principalmente à esfera administrativa, sendo instrumento que visa a facilitar futura concessão de benefício ou reconhecimento de tempo de serviço e cuja expedição, via de regra, ocorre após a comprovação junto à entidade pública das alegadas atividades agrícolas. Uma vez expedida, é instrumento hábil, por si só, àquela comprovação. Todavia, a inexistência do referido documento não obsta ao segurado demonstrar sua condição de segurado especial por outros meios, mormente no âmbito judicial. Se a parte autora tivesse CIC expedida em seu nome não necessitaria postular o benefício em juízo, pois com base nesse documento é de supor-se que o próprio INSS já o concederia administrativamente, porque assim prevê a Lei de Benefícios.
Da prova da atividade em regime de economia familiar
O §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII da Lei 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural. Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71.
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" para descaracterizar a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também que irrelevante a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
Do caso concreto
A parte autora, nascida em 14/04/1956 (fls. 16), implementou o requisito etário em 14/04/2011 e requereu o benefício na via administrativa em 12/05/2011 (fls. 14). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural nos 180 meses anteriores à implementação da idade (14/04/1996 -14/04/2011) ou nos 180 meses que antecederam o requerimento administrativo (12/05/1996 - 12/05/2011); ou, ainda, em períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.
Para a comprovação do trabalho rural, foram apresentados os seguintes documentos:
- Certidão de casamento, em que o marido da autora é qualificado como agricultor, datada de 11/09/1976 (fls. 17);
- Notas fiscais da comercialização de soja, feijão, suínos, bois, vacas, novilho, leite, trigo, girassol e milho, em que consta o nome do esposo da requerente, datadas de 1989/1992, 1994/1997, 1999/2005 e 2008/2010 (fls. 21/28, 30/32, 34/37, 41/43, 45/46, 48, 50, 52, 54, 58, 60 e 62);
- Notas fiscais da comercialização de vacas, trigo e girassol, em que constam os nomes da demandante e de seu cônjuge, datadas de 2003, 2006, 2007 e 2009/2010 (fls. 47, 53, 55, 59 e 61).
A prova testemunhal corrobora a pretensão exposta na inicial, uma vez que as testemunhas foram uníssonas em confirmar que a parte autora trabalhava nas lides rurais, verbis:
Testemunhas da Autora:
1. Inácia Neli Corrêa. Aos costumes nada disse. Advertida e compromissada.
Juíza: Seu nome completo?
Testemunha: É Inácia Neli Corrêa.
Juíza: Dona Inácia, a senhora tem alguma relação de parentesco ou amizade íntima com a dona Lúcia Seffrin Herter?
Testemunha: A gente conhece ela de lá, moro lá, desde 79, eu casei e vim morar no Rincão dos Corrêa.
Juíza: A senhora é conhecida dela, a senhora se considera mais conhecida ou amiga da pessoa dela?
Testemunha: É, a gente conhece, amiga, amiga assim não, é que a gente mora lá e ...
Juíza: A senhora presta compromisso então de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado. Certo?
Testemunha: Sim.
Juíza: A senhora qual é o tipo de atividade que a dona Lúcia desenvolve ou desenvolveu?
Testemunha: Sim, desenvolve e desenvolveu, desde que eu conheço ela, sim, lógico que ela morava antes de mim no local, daí quando eu vim morar ali fiquei conhecendo ela, primeira coisa é tirar leite né, o trabalho dela, só tirar leite, tirava leite, nem sei a quantia de vaca, mas era o trabalho dela, além dos outros a fazeres do interior, de lavoura, não sei se ela ajuda, mas no leite era o trabalho dela como agricultora, como servidora rural.
Juíza: Era em propriedade própria ou arrendada de terceiros?
Testemunha: É deles eu acho, é deles sim.
Juíza: A extensão dessa propriedade?
Testemunha: Trinta, trinta e duas hectares que eu sei.
Juíza: Até os dias atuais então ela tem essa atividade?
Testemunha: Sim, Não vou dizer que ela ... ela teve problema de coluna, problema dum braço, por que tirar leite se sacrifica bastante.
Juíza: A senhora sabe se ela ou o esposo exercem atividade urbana?
Testemunha: Ele sim, ele é o Prefeito na cidade lá de Caibaté, mas ela permanece vindo ... não vou dizer que venha todos os dias, por que eu moro uns quilômetros pra lá um pouquinho, então eu não vejo, mas sei que ela vem, até lida lá, passa lá, a medida que ela adoeceu um pouco, daí o filho dela assumiu o trabalho dela, mas ela vem lá, acompanha, até que ela sare, que ela tá em tratamento da coluna.
Juíza: A senhora poderia assim, me dizer se a família sobrevive ou sobreviveu dessa atividade como fonte principal de renda?
Testemunha: Sim, eu acho que sim, porque ele como Prefeito não é permanente né, ele segue trabalhando com ela lá no interior.
Juíza: A parte autora.
Procurador da Autora: Da localidade, da casa da dona Lúcia até a localidade assim, se ela sabe precisar mais ou menos qual é a distância?
Testemunha: Uns doze quilômetros da cidade, da ... do interior, é, até lá o local é doze quilômetros.
Procurador da Autora: E a dona Lúcia conta com o auxílio de empregados na lavoura?
Testemunha: Não, sempre foi ela sozinha que fazia tudo o serviço, no caso lá, ele é diferente, o homem, mas o trabalho dela era sozinha sempre, e ela que lidava com as vacas e tudo, era ela que tirava leite manual, agora já tem mais instrumentos que ajudam, mas sempre foi manual no início que ela começou a trabalhar, e hoje tem mais tecnologia e ajuda também, mas ela que permanece trabalhando, tem o filho que dá uma mão né, que agora que ela adoeceu ele ajuda ela.
Procurador da Autora: O ganha pão dela é só da atividade rural?
Testemunha: O dela é sim, é o trabalho dela, no interior, no meio rural.
Procurador da Autora: Doutora, eu só queria perguntar pra ela assim, tem ... já que quando o INSS fez uma entrevista lá fora, a respeito dum senhor aqui, como é que é o nome, que eles colocaram que seria empregado. Mirandinha, a senhora conhece?
Testemunha: Sim, é o rapaz que eles tem lá, o guri que arrumou, o Daniel, que é o filho dela né, como parceria, eles trabalham como parceria, ele ajuda, (...), mas o guri, ela não, o guri dela.
Procurador da Autora: Mas esse Mirandinha nunca foi empregado ...
Testemunha: Não, ele trabalha em parceria, ganha porcentagem, sei lá como é que eles fazem, porcentagem que ganha, ajuda.
Juíza: O INSS ausente. Nada mais.
2. Elemar Corrêa. Aos costumes nada disse. Advertido e compromissado.
Juíza: Seu nome completo é Elemar Corrêa?
Testemunha: Elemar Corrêa.
Juíza: Seu Elemar, o senhor é parente ou amigo íntimo da dona Lúcia Seffrin Herter?
Testemunha: Não sou nada disso.
Juíza: O senhor conhece ela?
Testemunha: Eu conheço a Lúcia.
Juíza: O senhor presta compromisso então de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado.
Testemunha: Certo.
Juíza: O senhor tem conhecimento de qual tipo de atividade a dona Lúcia desenvolveu ao longo da vida?
Testemunha: É agricultura, trabalha na agricultura.
Juíza: Ela tem uma propriedade rural?
Testemunha: Sim, eles tem né.
Juíza: De quantas hectares mais ou menos?
Testemunha: Bom, isso a terra eu não sei né.
Juíza: O senhor mora perto?
Testemunha: Eu moro perto sim.
Juíza: Há quantos anos o senhor conhece eles?
Testemunha: A Lúcia eu conheço desde que nasceu praticamente, e depois ela se criou com o pai dela, casou e foram morar perto de mim lá e são meus vizinhos até hoje.
Juíza: O senhor sabe se a dona Lúcia, e a família dela assim, o núcleo familiar dela, sobrevivem da atividade rural, se tem outra fonte de renda?
Testemunha: Não, é atividade rural.
Juíza: A dona Lúcia nunca exerceu atividade urbana?
Testemunha: Que eu saiba não.
Juíza: Tem empregados?
Testemunha: Não tem.
Juíza: Não?
Testemunha: Não tem.
Juíza: O senhor sabe o que ela produz, ou se ela cria animais?
Testemunha: Bom, é a parte da agricultura é meio tudo parelho né, que eles produzem.
Juíza: Pra subsistência ou pra comércio?
Testemunha: Mas olha, o que sobra é claro que de certo vendem né, mas (...) pra subsistência, pra comércio.
Juíza: O esposo dela é o seu Evandro?
Testemunha: É o Evandro Herter.
Juíza: Pela parte autora.
Procurador da Autora: Da residência dela até a localidade, se ele sabe mais ou menos a distância?
Testemunha: Da cidade lá? É doze quilômetros.
Procurador da Autora: E ela vai diariamente?
Testemunha: Mas ela vai diariamente, eu enxergo lá de casa, sempre cuido e enxergo ali né.
Procurador da Autora: (...)?
Juíza: É tudo gravado.
Procurador da Autora: Mas ele falou da existência de...
Juíza: Não, ele não falou.
Procurador da Autora: Se ele sabe se ela conta com o auxílio do filho pra trabalhar na lavoura?
Testemunha: Olha, é, eles ... ele trabalha na lavoura, o guri, ele faz muito serviço também né, e ela também ajuda.
Procurador da Autora: Nada mais.
Juíza: O INSS ausente. Nada mais.
Este termo foi degravado por Gabriel Moraes de Avila em 18 de dezembro de 2012.
OBS: Conforme consta no Manual de Degravação, oriundo do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, página 43, deve-se usar, quando a expressão for inaudível, reticências entre parênteses. É possível, também, que se encontre no conteúdo da degravação alguma palavra entre parênteses e itálico, o que significa que houve dúvida, por parte do degravador, em compreender com precisão a expressão pronunciada no ato da solenidade.
Não obstante o Juízo a quo tenha decidido pela procedência da demanda por considerar que a autora seguiu exercendo atividades rurais em regime de economia familiar, apesar do cargo de seu marido e dos bens do casal, a decisão não merece prosperar. Ainda que se considere que a demandante tenha desempenhado atividades rurais por longa data, e laborado na roça durante o período correspondente à carência, como sustentado na retro sentença, não se pode admitir que o trabalho fosse exercido em regime de economia familiar.
O regime de economia familiar, conforme o § 1º, do artigo 11, da Lei 8213/91, caracteriza-se quando a atividade rural é indispensável à própria subsistência do grupo familiar, o que não se observa no caso em tela. No caso em comento, verifica-se nas declarações de imposto de renda requeridas pela autarquia (fls. 169/206), que o marido da autora é proprietário de diversas áreas rurais e urbanas, além de possuir um carro comprado pelo valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais). Ora, não é crível que uma família que possua esta abundância de bens, cuja evolução patrimonial, constante nas declarações de imposto de renda do esposo, chega ao montante de R$ 278.458,94 (fls. 206), possua como principal fonte de renda a agricultura. Assim sendo, não logrou a requerente demonstrar a condição de imprescindibilidade de seu labor campesino para a subsistência do grupo familiar, razão pela qual não faz jus ao benefício postulado.
Da análise do conjunto probatório, conclui-se que os documentos e a prova testemunhal não indicam que a atividade rural fosse exercida em regime de economia familiar, razão porque a sentença deve ser reformada pela Turma.
Dos ônus sucumbenciais
Em face da sucumbência, condeno a parte autora a pagar as custas e os honorários advocatícios, estes no percentual de 10% sobre o valor da causa, cuja execução resta suspensa, nos termos do art. 12 da lei 1.060/50.
Da tutela antecipada
Os valores recebidos em antecipação da tutela não serão restituídos, porque decorrentes de decisão judicial, e, ante a inexistência de má-fé não se aplica o disposto no artigo 115 da Lei 8.213/91.
Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de dar provimento à apelação e à remessa oficial e cassar a antecipação de tutela.
É o voto.
Juiz Federal LUIZ ANTÔNIO BONAT
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/03/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015149-72.2014.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00073509220118210034
RELATOR | : | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Sérgio Cruz Arenhart |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | LUCIA SEFFRIN HERTER |
ADVOGADO | : | Mauro Antonio Volkmer e outro |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/03/2016, na seqüência 12, disponibilizada no DE de 08/03/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL E CASSAR A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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