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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ASPECTO SOCIOECONÔMICO. NÃO DEMONSTRADO. INDEFERIMENTO. VALORES RECEBIDOS. IRREPETIBILIDADE. TRF4. 5000560-7...

Data da publicação: 01/03/2024, 11:00:59

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ASPECTO SOCIOECONÔMICO. NÃO DEMONSTRADO. INDEFERIMENTO. VALORES RECEBIDOS. IRREPETIBILIDADE. 1. O benefício assistencial é devido à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Não comprovado o preenchimento do requisito econômico, é indevido o benefício assistencial. 3. Uma vez constatada a regularidade da concessão do benefício, não há de se cogitar da devolução dos valores recebidos. (TRF4, AC 5000560-73.2023.4.04.7121, SEXTA TURMA, Relatora ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA, juntado aos autos em 22/02/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000560-73.2023.4.04.7121/RS

RELATORA: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA

REPRESENTANTE LEGAL DO APELANTE: ARLENE JANAINA DA SILVA VALENCIO (Cônjuge, pai, mãe, tutor, curador ou herdeiro necessário) (AUTOR)

ADVOGADO(A): TEODORO MATOS TOMAZ

APELANTE: MAUREA DA SILVA VALENCIO (Civilmente Incapaz - Art. 110, 8.213/91) (AUTOR)

ADVOGADO(A): TEODORO MATOS TOMAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta em face de sentença em que julgado parcialmente procedente o pedido, com dispositivo de seguinte teor:

Ante o exposto, rejeito a(s) preliminar(es) suscitadas e, no mérito JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pedido inicial, encerrando a fase de conhecimento com resolução de mérito (art. 487, I, do CPC), para DECLARAR a inexigibilidade do débito referente ao NB 517.999.810-3, no valor de R$ 77.539,35 (setenta e sete mil quinhentos e trinta e nove reais e trinta e cinco centavos), relativo ao período de 09/01/2017 a 30/11/2022.

Sucumbente em maior parte, c​​​​ondeno a parte autora ao ressarcimento à Direção do Foro do Rio Grande Sul dos valores pagos a título de honorários periciais (se for o caso); e ao pagamento das custas, despesas processuais, honorários periciais (se for o caso) e dos honorários advocatícios. Nos termos do artigo 85, § 3º, do CPC, observando-se ainda o grau de zelo, a natureza e a importância da causa, a duração do processo e a dilação probatória, fixo-os em 10% sobre o valor atualizado da causa.

De acordo com o art. 98, § 2º, do CPC/2015, "a concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência". A exigibilidade fica sob condição suspensiva pelo prazo de 5 anos, durante o qual o credor pode promover a execução, caso demonstre a suficiência de recursos do devedor (art. 98, § 3º, do CPC).

O INSS é isento de custas processuais.

Sentença não sujeita a reexame necessário (inciso I do § 3º do art. 496 do CPC).

A parte autora em seu apelo defende a reforma da sentença, pois demonstrada a situação de vulnerabilidade social do grupo familiar mediante perícia socioeconômica. Assim, requer o provimento do recurso visando ao restabelecimento do benefício a partir de 01/05/2021.

O INSS, por seu turno, requer a restituição dos valores pagos indevidamente ao segurado. Assevera que o benefício foi cessado corretamente visto que a renda per capita familiar superava 1/4 do salário mínimo. Postula o provimento do recurso, com a reforma da sentença.

Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.

O MPF ofertou parecer pelo desprovimento das apelações.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.

Benefício assistencial à pessoa com deficiência

Os critérios de concessão do benefício assistencial estão previstos na Lei nº 8.742/1993, que assim dispõe:

Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

§ 3º Observados os demais critérios de elegibilidade definidos nesta Lei, terão direito ao benefício financeiro de que trata o caput deste artigo a pessoa com deficiência ou a pessoa idosa com renda familiar mensal per capita igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.

§ 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória, bem como as transferências de renda de que tratam o parágrafo único do art. 6º e o inciso VI do caput do art. 203 da Constituição Federal e o caput e o § 1º do art. 1º da Lei nº 10.835, de 8 de janeiro de 2004.(Redação dada pela Lei nº 14.601, de 2023)

§ 5o A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada.

§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS.

§ 6º-A. O INSS poderá celebrar parcerias para a realização da avaliação social, sob a supervisão do serviço social da autarquia.

§ 7o Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura.

§ 8o A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.

§ 9o Os rendimentos decorrentes de estágio supervisionado e de aprendizagem não serão computados para os fins de cálculo da renda familiar per capita a que se refere o § 3o deste artigo.

§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.

§ 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento.

§ 11-A. O regulamento de que trata o § 11 deste artigo poderá ampliar o limite de renda mensal familiar per capita previsto no § 3º deste artigo para até 1/2 (meio) salário-mínimo, observado o disposto no art. 20-B desta Lei.

§ 12. São requisitos para a concessão, a manutenção e a revisão do benefício as inscrições no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal - Cadastro Único, conforme previsto em regulamento.

(...)

§ 14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)

§ 15. O benefício de prestação continuada será devido a mais de um membro da mesma família enquanto atendidos os requisitos exigidos nesta Lei. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)

(...)

Art. 20-B. Na avaliação de outros elementos probatórios da condição de miserabilidade e da situação de vulnerabilidade de que trata o § 11 do art. 20 desta Lei, serão considerados os seguintes aspectos para ampliação do critério de aferição da renda familiar mensal per capita de que trata o § 11-A do referido artigo:.

I – o grau da deficiência;.

II – a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária; e.

III – o comprometimento do orçamento do núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20 desta Lei exclusivamente com gastos médicos, com tratamentos de saúde, com fraldas, com alimentos especiais e com medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo SUS, ou com serviços não prestados pelo Suas, desde que comprovadamente necessários à preservação da saúde e da vida..

§ 1º A ampliação de que trata o caput deste artigo ocorrerá na forma de escalas graduais, definidas em regulamento..

§ 2º Aplicam-se à pessoa com deficiência os elementos constantes dos incisos I e III do caput deste artigo, e à pessoa idosa os constantes dos incisos II e III do caput deste artigo..

§ 3º O grau da deficiência de que trata o inciso I do caput deste artigo será aferido por meio de instrumento de avaliação biopsicossocial, observados os termos dos§§ 1º e 2º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), e do § 6º do art. 20 e do art. 40-B desta Lei..

§ 4º O valor referente ao comprometimento do orçamento do núcleo familiar com gastos de que trata o inciso III do caput deste artigo será definido em ato conjunto do Ministério da Cidadania, da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia e do INSS, a partir de valores médios dos gastos realizados pelas famílias exclusivamente com essas finalidades, facultada ao interessado a possibilidade de comprovação, conforme critérios definidos em regulamento, de que os gastos efetivos ultrapassam os valores médios.

Consoante se depreende da leitura desses dispositivos legais, a avaliação atinente ao impedimento de longo prazo da pessoa com deficiência deve ser feita considerando mais do que as condições médico-biológicas do requerente.

Incorporando o significado de pessoa com deficiência já previsto na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (promulgada pelo Decreto 6.949, de 25 de agosto de 2009), a nova redação dada ao artigo 20, §2º da LOAS pela Lei 12.470/2011 passou a associar o conceito de incapacidade a "impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas", do que se infere que a análise dos requisitos ao benefício deve alcançar fatores sociais, ambientais e familiares cuja influência seja tão negativa no desempenho da pessoa a ponto de impedir sua inserção na sociedade em igualdade de condições com os demais.

Há que se ponderar sobre a história de vida do requerente, seu contexto social e familiar, estabelecendo-se como premissa um conceito ampliado de impedimento de longo prazo, que traduza a situação capaz de comprometer a funcionalidade do indivíduo na tentativa de prover o próprio sustento, quando não há também a possibilidade de tê-lo provido pelos seus familiares.

A nova legislação não tratou separadamente os requisitos da incapacidade e socioeconômico, mas tomando-os como aspectos integrantes e correlacionados de um mesmo pressuposto para a concessão do benefício de prestação continuada.

Do aspecto socioeconômico

O art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, estabelecia que se considerava hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo.

O Supremo Tribunal Federal, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993 - LOAS, assim como do parágrafo único do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso.

No primeiro caso, o STF identificou a ocorrência de um processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro), assentando, assim, que o critério econômico presente na LOAS não pode ser tomado como absoluto, cabendo a análise da situação de necessidade à luz das circunstâncias em concreto.

Reconhecida a inconstitucionalidade do critério objetivo para aferição do requisito econômico do benefício assistencial, em regime de repercussão geral, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, avaliar os aspectos socioeconômicos que cercam a subsistência da parte autora e de sua família.

Quanto ao parágrafo único do art. 34, que estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", entendeu a Suprema Corte que violou o princípio da isonomia. Isso porque abriu exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos, mas não permitiu a percepção conjunta de benefício de idoso com o de pessoa com deficiência ou de qualquer outro previdenciário. Em consequência, o STF afastou a restrição, com o que, qualquer benefício previdenciário ou assistencial, de até um salário mínimo, não deve ser considerado na renda familiar per capita.

Do caso concreto

A questão cinge-se à existência do pressuposto vulnerabilidade social do respectivo grupo familiar.

A perita social registra que o núcleo familiar da parte autora é composto pelos genitores e três imãos, Lucas da Silva Valêncio, nascido em 22/10/2007, Mariane da Silva Valêncio, em 08/11/1996, e Gabriel E. Silva, nascido em 20/01/2004. A renda mensal auferida pelo grupo familiar é proveniente da aposentadoria por invalidez recebida pelo pai da autora, no valor líquido de R$ 4.234,90. Mariane está desempregada e Gabriel está com salário em atraso. A mãe da demandante, Arlene, exerce atividade do lar e não aufere renda. A família reside em casa de alvenaria, alugada, desde setembro de 2022, afastada do centro, com pouca oferta de comércio, serviço e transporte. Os móveis e eletrodomésticos estão em bom estado de conservação. O mobiliário da cozinha pertence a proprietária do imóvel. Possuem um Honda Civic, ano 2009. As despesas mensais com aluguel, alimentação e higiene, medicação, gás, internet, transporte, energia elétrica e cuidadora extrapolam a renda mensal do grupo familiar.

A perita social informa que A casa é grande, com bom acabamento. O material é a alvenaria, piso de cerâmica, forro de PVC. Possui cozinha, duas salas, três dormitórios, dois banheiros, garagem. Os móveis, eletrodomésticos e utensílios estão em bom estado de conservação e suprem adequadamente as necessidades da família.

Conclui a perita

Considera-se, portanto, que as condições socioeconômicas da parte autora situam-se em situação de vulnerabilidade social, e que a concessão do Benefício Assistencial poderá suprir necessidades básicas diárias, garantir a manutenção do seu acompanhamento de saúde e demais despesas eventuais, visando autonomia, proporcionando maior qualidade de vida e autoestima no processo de envelhecimento e garantindo os direitos fundamentais da pessoa idosa. Considera-se favorável o deferimento do Benefício de Prestação Continuada.

No caso, o grupo familiar é composto por seis pessoas, entretanto, os filhos, Mariane e Gabriel, devem ser excluídos do cálculo da renda per capita, porquanto maiores de idade. Por consequência, considerando o autor, seus pais e o irmão, Lucas, a renda per capita fica no valor aproximado de um salário mínimo.

Nessa senda, embora a perita social seja favorável ao deferimento do Benefício de Prestação Continuada, concluo que o grupo familiar não está em situação de vulnerabilidade social. Ademais, residem em imóvel amplo e em boas condições de habitabilidade, conforme de depreende do registro fotográfico (​evento 63, FOTO2​).

Assim, não há elementos nos autos que demonstrem a situação de vulnerabilidade social.

Dessa forma, deve ser mantida a sentença que julgou improcedente o pedido formulado pela parte autora no ponto.

Da declaração de inexigibilidade do débito

A r. sentença proferida pela Juíza Federal Mariane Camargo Contessa (evento 77, SENT1 ) bem analisou as questões controvertidas, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razões de decidir, in verbis:

No que diz respeito ao pedido de declaração da inexigibilidade do débito relativo ao benefício assistencial, no valor de R$ 77.539,35 (setenta e sete mil quinhentos e trinta e nove reais e trinta e cinco centavos), relativo ao período de 09/01/2017 a 30/11/2022, entendo que merece ser acolhido.

A jurisprudência firmou-se no sentido da impossibilidade de a Administração Pública reaver verbas alimentares pagas de forma incorreta e recebidas de boa-fé pelo administrado. Isso porque deve prevalecer, na espécie, o princípio da irrepetibilidade dos alimentos. Esse entendimento, cabe frisar, não se aplica tão somente nos casos de interpretação errônea ou de má aplicação da lei pela Administração, mas também nos casos de mero erro material.

O conflito de direitos em questão impõe que outra não seja a medida a ser adotada. Com efeito, se, de um lado, há a obrigação da Administração de atuar de forma escorreita e, em caso de erro, proceder às devidas correções, inclusive para evitar odioso enriquecimento indevido, de outro lado encontra-se o direito fundamental do administrado de receber os valores de caráter alimentar a que faz jus e com os quais conta para a sua manutenção.

Assim, não há como negar que, se o administrado agiu de boa-fé (que deve sempre ser presumida), não pode ser punido com a devolução de valores recebidos a mais pelo erro exclusivo da fonte pagadora. Não se olvida que a exigência do retorno dos valores ao erário visa à promoção do interesse público, já que as verbas públicas são originárias de contribuições gerais e destinam-se ao patrocínio do bem público. Entretanto, reconhecendo a sua relevância para a concretização dos valores maiores da dignidade da pessoa humana, a própria constituição alçou as verbas de caráter alimentar a patamar destacado dentro do ordenamento, garantindo, inclusive, a precedência de tais valores sobre os demais débitos das Fazendas Públicas (art. 100, caput, e §§, da CF).

Nesse sentido é a pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional da 4ª Região:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. VPNI. RUBRICA. PARCELA RECEBIDAS DE BOA-FÉ. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. DESCABIMENTO. Verbas de caráter alimentar pagas a maior em face de conduta errônea da Administração não devem ser devolvidas quando recebidas de boa-fé pelo beneficiário. Precedentes. (TRF4, AC 5000516-80.2011.404.7216, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão João Pedro Gebran Neto, D.E. 03/10/2012)

ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. DIFERENÇA DE 3,17% DEVIDA AOS SERVIDORES. REESTRUTURAÇÃO DA CARREIRA. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. CONSECTÁRIOS. 1. Havendo reorganização ou reestruturação de cargos e carreiras, o art. 10 da MP 2.225-45, limita o termo final da incidência dos 3,17% à data da reorganização ou reestruturação. Precedentes do STJ. 2.Verbas de caráter alimentar pagas a maior em face de conduta errônea da Administração não devem ser devolvidas quando recebidas de boa-fé pelo beneficiário. 3. O art. 23 da Lei 8.906/94 não tem força revogatória sobre o art. 21 do CPC, no que autoriza a compensação das verbas patronais na hipótese de sucumbência recíproca ou proporcional. (TRF4, AC 5002322-41.2010.404.7102, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão João Pedro Gebran Neto, D.E. 03/10/2012) (grifei)

Dessa forma, pela impossibilidade de devolução dos valores recebidos de boa-fé pela parte autora, merece acolhimento o pedido para a declaração da inexigibilidade dos valores cobrados pelo INSS.

Ademais, não há evidência de intuito fraudulento da parte autora, embora a conclusão do procedimento administrativo tenha sido pelo recebimento indevido do benefício no período entre 09/01/2017 a 30/11/2022 em razão do vínculo empregatício da titular e dos genitores, culminando na modificação da renda mensal per capita. Como se observa, as informações acerca da atividade remunerada e contribuições sociais vertidas estavam à disposição do INSS que tinha condições de proceder a revisão do benefício assistencial em tela.

Além disso, não basta a superação do critério objetivo para afastar situação de vulnerabilidade social, devendo ser demonstrado que as condições materiais afastavam o direito ao benefício no intervalo em questão.

Dessa forma, deve ser confirmada, no ponto, a sentença que declarou a inexigibilidade dos valores recebidos pela parte autora.

Honorários advocatícios

Negado provimento aos recursos da parte autora e do INSS, deve ser observada, em cumprimento de sentença, a majoração de 50% da verba honorária fixada na origem, pela incidência do §11 do artigo 85 do CPC. Todavia fica suspensa a exigibilidade da verba sucumbencial fixada em desfavor da parte autora em face da gratuidade de justiça.

Conclusão

Honorários advocatícios majorados nos termos do §11 do artigo 85 do CPC. Suspensa a exigibilidade da verba sucumbencial fixada em desvaor da parte autora em face da gratuidade de justiça.

Nos demais pontos, mantida a sentença.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por negar provimento às apelações do INSS e da parte autora.



Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004299872v40 e do código CRC 8f9b9d93.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA
Data e Hora: 22/2/2024, às 17:29:54


5000560-73.2023.4.04.7121
40004299872.V40


Conferência de autenticidade emitida em 01/03/2024 08:00:58.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000560-73.2023.4.04.7121/RS

RELATORA: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA

REPRESENTANTE LEGAL DO APELANTE: ARLENE JANAINA DA SILVA VALENCIO (Cônjuge, pai, mãe, tutor, curador ou herdeiro necessário) (AUTOR)

ADVOGADO(A): TEODORO MATOS TOMAZ

APELANTE: MAUREA DA SILVA VALENCIO (Civilmente Incapaz - Art. 110, 8.213/91) (AUTOR)

ADVOGADO(A): TEODORO MATOS TOMAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ASPECTO SOCIOECONÔMICO. não demonstrado. INDEFERIMENTO. VALORES RECEBIDOS. IRREPETIBILIDADE.

1. O benefício assistencial é devido à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.

2. Não comprovado o preenchimento do requisito econômico, é indevido o benefício assistencial.

3. Uma vez constatada a regularidade da concessão do benefício, não há de se cogitar da devolução dos valores recebidos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento às apelações do INSS e da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 21 de fevereiro de 2024.



Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004299873v4 e do código CRC 3618735f.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA
Data e Hora: 22/2/2024, às 17:22:27


5000560-73.2023.4.04.7121
40004299873 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 01/03/2024 08:00:58.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 14/02/2024 A 21/02/2024

Apelação Cível Nº 5000560-73.2023.4.04.7121/RS

RELATORA: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

PROCURADOR(A): FLÁVIO AUGUSTO DE ANDRADE STRAPASON

REPRESENTANTE LEGAL DO APELANTE: ARLENE JANAINA DA SILVA VALENCIO (Cônjuge, pai, mãe, tutor, curador ou herdeiro necessário) (AUTOR)

ADVOGADO(A): TEODORO MATOS TOMAZ

APELANTE: MAUREA DA SILVA VALENCIO (Civilmente Incapaz - Art. 110, 8.213/91) (AUTOR)

ADVOGADO(A): TEODORO MATOS TOMAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 14/02/2024, às 00:00, a 21/02/2024, às 16:00, na sequência 304, disponibilizada no DE de 31/01/2024.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES DO INSS E DA PARTE AUTORA.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA

Votante: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA

Votante: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

LIDICE PENA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 01/03/2024 08:00:58.

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