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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AUXÍLIO-ACIDENTE. ESMAGAMENTO DE MEMBRO. DOENÇA VASCULAR. LAUDO PERICIAL INSUFICIENTE. SENTENÇA ANULADA....

Data da publicação: 01/03/2024, 11:01:07

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AUXÍLIO-ACIDENTE. ESMAGAMENTO DE MEMBRO. DOENÇA VASCULAR. LAUDO PERICIAL INSUFICIENTE. SENTENÇA ANULADA. REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA COM MÉDICO ESPECIALIZADO. 1. A medicina atual encontra-se superespecializada. Se para um simples diagnóstico ninguém mais abre mão da consulta ao especialista, sendo a perícia um plus, porquanto além do diagnóstico precisa projetar ao futuro a eventual incapacidade, não se pode admitir que seja feita de modo precário e por profissional não especialista na patologia do segurado. 2. Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela é produzida, na verdade, de maneira a furtar do magistrado o poder de decisão. 3. Hipótese em que deve ser anulada a sentença e reaberta a instrução com a realização de perícia judicial por cirurgião vascular ou angiologista, para avaliar, exaustivamente, a alegada redução de capacidade laboral da parte autora, acometida de sequelas por esmagamento da perna esquerda. (TRF4, AC 5000820-86.2022.4.04.9999, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 22/02/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000820-86.2022.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: ANTONIO DA CRUZ

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença, publicada em 12-04-2021 (evento 71, OUT1), que julgou improcedente o pedido de AUXÍLIO-ACIDENTE.

Sustenta, em síntese, que preenche os requisitos necessários a sua concessão (evento 77, APELAÇÃO1).

Com as contrarrazões (evento 81, CONTRAZ1), subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Na presente ação, ajuizada em 10-07-2019, a parte autora narra que sofreu acidente de qualquer natureza, do qual resultou a concessão do benefício n.º 550.437.135-6, que foi cessado em 02-05-2012.

Alega, no entanto, que ficou com sequelas que reduzem a sua capacidade para o trabalho, fazendo jus ao benefício de auxílio-acidente previdenciário desde a cessação do auxílio-doença.

No que pertine à verificação da redução da capacidade laboral da parte autora, foi realizada perícia, por Bruno Spritze Guollo (CRM/SC 15619), especialista em Ortopedia e Traumatologia, que constatou que o autor é portador de edema na região do joelho até tornozelo da perna esquerda, varizes de médio e grosso calibre, dor e pulso pedioso com redução de amplitude, em razão de esmagamento da perna esquerda ocorrido há aproximadamente treze anos. Todavia, pela carência de documentação clínica, concluiu o perito que o autor deve ser avaliado por cirurgião vascular (evento 45, OUT1).

Por conseguinte, o juízo de origem concedeu prazo de 90 dias para o autor providenciar consulta com expert especialista em Cirurgia Vascular (evento 48, TERMOAUD1):

Aberta a audiência, presentes as pessoas acima nominadas, verificou-se a ausência do senhor Procurador Federal, apesar de intimado, restando prejudicada, por consequência, a conciliação. Na sequência, pelo "expert" designado, Dr. Bruno Spritze Guollo, foi realizado exame pericial (em sala própria, neste juízo) e, na sequência, de forma verbal, apresentado o laudo pericial respectivo, consoante o registro de áudio em anexo, o qual restou inconclusivo, sendo necessário realização de uma consulta com cirurgião vascular para que o perito judicial possa analisar (O que foi feito? Como foi feito? E quando foi feito?) e, caso o cirurgião entenda necessário, a parte autora deverá realizar novos exames complementares. Sendo assim, em razão do exposto, concedo o prazo de 90 dias, para parte autora providenciar uma consulta com expert especialista em Cirurgia Vascular e, caso necessário, apresentar novos exames complementares. Após, voltem os autos conclusos para designação de nova perícia médica com o Dr. Bruno Spritze Guollo, posto que este, considera-se totalmente apto para realizar a perícia novamente, desde que, observados as exigências por ele requeridas. Isto posto, requisitem-se os honorários do perito no sistema da Justiça Federal de Santa Catarina. Intimação e publicação em audiência. Registre-se. E, para constar, foi determinada a lavratura do presente termo. Eu, Geovana Gomes Da Silva, o digitei, e eu, Ariane Mattei Nunes, Chefe de Cartório, o conferi e subscrevi. Nada mais.

Processado o feito, o autor trouxe aos autos prontuário de internação referente ao período de 28-10-2008 a 09-11-2008 (evento 56), por ferimento em joelho esquerdo, em decorrência de acidente doméstico (​evento 56, OUT4​ - fl. 6), ocasião em que fora submetido a cirurgia de desbridamento em joelho esquerdo.

Em laudo complementar (evento 59, OUT1), o perito ortopedista afirma que o autor sofreu esmagamento da perna esquerda há aproximadamente treze anos; deu entrada no hospital com celulite intensa em todo o membro inferior esquerdo; foi submetido a cirurgia para drenagem de abcesso; identificado durante internação staphylococcus aureus muito sensível; realizou tratamento com antibioticoterapia; teve alta hospitalar. Por fim, concluiu que o segurado não apresenta sequelas e está apto ao trabalho.

Pois bem. Como se pode ver, a controvérsia reside na apuração da alegada incapacidade de natureza vascular do demandante. Entrementes, o perito ortopedista se limitou a apresentar um laudo absolutamente lacônico e contraditório, deixando de esclarecer questões importantes sobre o delicado quadro clínico do segurado.

Diante da contradição do jusperito quanto a existência ou não de lesões e limitações funcionais e, sobretudo, da afirmação categórica de que há necessidade de um laudo de cirurgião vascular para atestar a incapacidade (evento 45, OUT1), é de rigor a realização de perícia por especialista em cirurgia vascular ou angiologia, a fim de evitar cerceamento de defesa à parte autora.

Saliente-se, por oportuno, que o perito que atua com zelo não é aquele que sempre encontra ou nega doenças, mas aquele que explica a efetiva repercussão da enfermidade sobre a aptidão laboral do periciado, observando os critérios preconizados pelo artigo 2º, da Resolução 2.183/2019, do Conselho Federal de Medicina:

Art. 2º Para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de saúde e as atividades do trabalhador, além da anamnese, do exame clínico (físico e mental), de relatórios e dos exames complementares, é dever do médico considerar:

I - a história clínica e ocupacional atual e pregressa, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal;

II - o estudo do local de trabalho;

III - o estudo da organização do trabalho;

IV - os dados epidemiológicos;

V - a literatura científica;

VI - a ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhadores expostos a riscos semelhantes;

VII - a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes e outros;

VIII - o depoimento e a experiência dos trabalhadores;

IX - os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da área da saúde.

De fato, inexiste liberdade absoluta na elaboração da prova pericial por parte do expert, que deve se empenhar em elucidar ao juízo e às partes todos os elementos necessários à verificação do real estado de saúde do segurado que objetiva a concessão de benefício por incapacidade. A propósito do tema, leciona o eminente Juiz Federal José Antonio Savaris (Curso sobre perícia judicial previdenciária. Curitiba: Alteridade Editora, 2014, p. 32-33):

Com efeito, o médico perito nomeado pelo Juízo, nada obstante - formalmente - atue como perito de confiança em processo judicial, tem o dever inderrogável de prestar todos os esclarecimentos de forma racional, de molde a permitir real debate sobre a prova que é crucial para os processos previdenciários por incapacidade.

O perito não é um senhor absoluto erigido acima de todos os postulados processo-constitucionais. Não pode ser tido tampouco como um ser mítico que acessa o impenetrável e revela a verdade oculta e que somente por ele pode ser obtida. A prova técnica, como qualquer outra etapa processual, não pode ser arbitrária e assim será toda vez que não se mostrar devidamente justificada ou, tanto quanto possível, fundamentada em dados técnicos objetivos ou que possam ser obtidos por sua experiência profissional (não se pretende excluir aqui, evidentemente, o elemento subjetivo do exame pericial).

Não se exigirá do perito, qualquer que seja sua especialidade, que realize diagnóstico para prescrição do tratamento, faça prognóstico da evolução clínica, oriente ou acompanhe o periciando (o que seria ideal numa perspectiva de atendimento não fracionado à pessoa), mas é atribuição do perito determinar, com a necessária fundamentação, a aptidão laboral para fins do benefício por incapacidade.

O laudo técnico pericial, reconhecidamente a mais relevante prova nas ações previdenciárias por incapacidade, deve conter, pelo menos: as queixas do periciando; a história ocupacional do trabalhador; a história clínica e exame clínico (registrando dados observados nos diversos aparelhos, órgãos e segmentos examinados, sinais, sintomas e resultados de testes realizados); os principais resultados e provas diagnósticas (registrar exames realizados com as respectivas datas e resultados); o provável diagnóstico (com referência à natureza e localização da lesão); o significado dos exames complementares em que apoiou suas convicções; as consequências do desempenho de atividade profissional à saúde do periciando.

Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela é produzida, na verdade, de maneira a furtar do magistrado o poder de decisão, porque respostas periciais categóricas, porém sem qualquer fundamentação, revestem um elemento autoritário que contribui para o que se chama decisionismo processual. Em face da ausência de referências fáticas determinadas, a solução judicial se traduziria em uma subjetividade desvinculada aos fatos, resultando mais de valorações e suspeitas subjetivas do que de circunstâncias de fato (FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: RT, 2002. p. 36).

Por conseguinte, deve ser anulada a sentença e reaberta a instrução com a realização de perícia judicial por cirurgião vascular ou angiologista, para avaliar, exaustivamente, a redução de capacidade laboral da parte autora.

Ante o exposto, voto por, de ofício, anular a sentença e determinar a reabertura da instrução a partir da prova pericial, que deverá ser refeita por especialista, prejudicado o exame da apelação.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004316611v17 e do código CRC a09ea37e.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 22/2/2024, às 18:15:51


5000820-86.2022.4.04.9999
40004316611.V17


Conferência de autenticidade emitida em 01/03/2024 08:01:07.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000820-86.2022.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: ANTONIO DA CRUZ

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. benefício por incapacidade. AUXÍLIO-ACIDENTE. ESMAGAMENTO DE MEMBRO. DOENÇA VASCULAR. LAUDO PERICIAL INSUFICIENTE. SENTENÇA ANULADA. REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA COM MÉDICO ESPECIALIZADO.

1. A medicina atual encontra-se superespecializada. Se para um simples diagnóstico ninguém mais abre mão da consulta ao especialista, sendo a perícia um plus, porquanto além do diagnóstico precisa projetar ao futuro a eventual incapacidade, não se pode admitir que seja feita de modo precário e por profissional não especialista na patologia do segurado.

2. Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela é produzida, na verdade, de maneira a furtar do magistrado o poder de decisão.

3. Hipótese em que deve ser anulada a sentença e reaberta a instrução com a realização de perícia judicial por cirurgião vascular ou angiologista, para avaliar, exaustivamente, a alegada redução de capacidade laboral da parte autora, acometida de sequelas por esmagamento da perna esquerda.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, de ofício, anular a sentença e determinar a reabertura da instrução a partir da prova pericial, que deverá ser refeita por especialista, prejudicado o exame da apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 21 de fevereiro de 2024.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004316612v4 e do código CRC a1373488.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 22/2/2024, às 18:15:51


5000820-86.2022.4.04.9999
40004316612 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 01/03/2024 08:01:07.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 14/02/2024 A 21/02/2024

Apelação Cível Nº 5000820-86.2022.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PROCURADOR(A): DANIELE CARDOSO ESCOBAR

APELANTE: ANTONIO DA CRUZ

ADVOGADO(A): DEYVID WILLIAM PHILIPPI NAZARIO (OAB SC028863)

ADVOGADO(A): ADRIANI NUNES OLIVEIRA (OAB SC012687)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 14/02/2024, às 00:00, a 21/02/2024, às 16:00, na sequência 327, disponibilizada no DE de 31/01/2024.

Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DE OFÍCIO, ANULAR A SENTENÇA E DETERMINAR A REABERTURA DA INSTRUÇÃO A PARTIR DA PROVA PERICIAL, QUE DEVERÁ SER REFEITA POR ESPECIALISTA, PREJUDICADO O EXAME DA APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 01/03/2024 08:01:07.

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