D.E. Publicado em 26/08/2016 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000022-26.2016.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | MALGORI INEZ CARLOS DEUS |
ADVOGADO | : | Marco Antonio Ramos Grazziotin e outro |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. NÃO-COMPARECIMENTO À PERÍCIA DESIGNADA. CERCEAMENTO DE DEFESA. AUSÊNCIA JUSTIFICADA. PERÍCIA MÉDICA E OITIVA DE TESTEMUNHAS. IMPRESCINDIBILIDADE. SENTENÇA ANULADA.
1. Inexistindo elementos de prova aptos à formação da convicção do juízo acerca da alegada incapacidade laboral, seu início e qualidade de segurado especial, e caracterizado o cerceamento de defesa, pois não consideradas a justificativa apresentada e as peculiaridades de difícil acesso e indisponibilidade de transporte até a área urbana, tem-se como justificado o não-comparecimento da parte autora às perícias designadas, impondo-se a anulação da sentença, a fim de que seja reaberta a instrução e realizada a perícia médica judicial, levando-se em conta as peculiaridades do caso.
2. É imprescindível a prova testemunhal para comprovação de atividade rural em regime de economia familiar ou individualmente, nos casos de concessão do benefício de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, pois, de regra, a prova documental é meramente indiciária, exigindo complementação por prova testemunhal idônea.
3. Sentença anulada, a fim de ser reaberta a instrução e regularmente processado e julgado o feito, com a realização de prova pericial e oitiva de testemunhas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso para anular a sentença, a fim de ser regularmente processado e julgado o feito, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 10 de agosto de 2016.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8413766v3 e, se solicitado, do código CRC 3F039DAC. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000022-26.2016.4.04.9999/RS
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RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária objetivando a concessão de auxílio-doença desde a DER (14/03/2013).
Determinada a realização de perícia médica (fl. 27), foi informado que a autora não compareceu na data aprazada (fl. 35).
Pela petição da fl. 36, manifestou-se a parte autora informando que "não compareceu à perícia designada por não ter conseguido quem a transportasse a Porto Alegre, cidade na qual o perito nomeado exerce sua atividade".
Sobreveio sentença extinguindo o feito, sem julgamento do mérito, com base no art. 267, VI, do CPC, "por falta de interesse de agir superveniente", tendo em vista que "a parte interessada não compareceu ao ato pericial agendado, e tampouco justificou sua ausência." Sem custas e honorários.
Apelou a parte autora, alegando que a incapacidade é incontroversa; que não compareceu à perícia por residir em local de difícil acesso, no interior do Município de Três Cachoeiras, e depender de transporte para chegar até a cidade onde será realizada a perícia, já que é pessoa muito humilde, desprovida de recursos, que não tem automóvel ou qualquer meio de transporte que a leve até Porto Alegre, onde será realizada a perícia judicial; e que justificou seu não-comparecimento, requerendo nova designação, o que, no entanto, não foi considerado na sentença. Requer a anulação da sentença, a fim de ser regularmente processado o feito, com a realização da prova pericial.
Foram oportunizadas as contrarrazões.
É O RELATÓRIO.
VOTO
Do Direito Intertemporal
Considerando que o presente voto está sendo apreciado por essa Turma após o início da vigência da Lei n.º 13.105/15, novo Código de Processo Civil, referente ao apelo em face de sentença exarada na vigência da Lei n.º 5.869/73, código processual anterior, necessária se faz a fixação, à luz do direito intertemporal, dos critérios de aplicação dos dispositivos processuais concernentes ao caso em apreço, a fim de evitar eventual conflito aparente de normas.
Para tanto, cabe inicialmente ressaltar que o CPC/2015 procurou estabelecer, em seu CAPÍTULO I, art. 1º que "o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código"; em seu CAPÍTULO II, art. 14, que "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada"; e em suas DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS, art. 1.046, caput, que "ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973." (sublinhei)
Nesse contexto, percebe-se claramente ter o legislador pátrio adotado o princípio da irretroatividade da norma processual, em consonância com o art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, o qual estabelece que "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada".
Desta forma, a fim de dar plena efetividade às referidas disposições normativas, e tendo em vista que o processo é constituído por um conjunto de atos dirigidos à consecução de uma finalidade, qual seja, a composição do litígio, adoto, como critério de solução de eventual conflito aparente de normas, a Teoria dos Atos Processuais Isolados, segundo a qual cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar a lei que o rege, que, por sua vez, será aquela que estava em vigor no momento em que o ato foi praticado, de acordo com o princípio tempus regit actum.
Por conseqüência, para deslinde da antinomia aparente supracitada, deve ser aplicada no julgamento a lei vigente:
(a) na data do ajuizamento da ação, para a verificação dos pressupostos processuais e das condições da ação;
(b) na data da citação (em razão do surgimento do ônus de defesa), para a determinação do procedimento adequado à resposta do réu, inclusive quanto a seus efeitos;
(c) na data do despacho que admitir ou determinar a produção probatória, para o procedimento a ser adotado, inclusive no que diz respeito à existência de cerceamento de defesa;
(d) na data da publicação da sentença (entendida esta como o momento em que é entregue em cartório ou em que é tornado público o resultado do julgamento), para fins de verificação dos requisitos de admissibilidade dos recursos, de seus efeitos, da sujeição da decisão à remessa necessária, da aplicabilidade das disposições relativas aos honorários advocatícios, bem como de sua majoração em grau recursal.
Feitos esses esclarecimentos, passo ao exame do recurso.
Mérito
Trata-se de ação objetivando benefício por incapacidade, negado na via administrativa por decisão médica contrária, extinta sem julgamento do mérito pelo não-comparecimento da autora à perícia médica designada.
O entendimento dominante nesta Corte é no sentido de que em ações objetivando benefícios por incapacidade o julgador firma seu convencimento, em regra, na prova pericial produzida em juízo.
No caso dos autos, verifica-se que foi designada data para a perícia, a ser realizada em Porto Alegre/RS, e imediatamente após o não-comparecimento da autora, seu procurador justificou a ausência no fato de a segurada residir em local de difícil acesso e depender de meios de transporte para locomoção, já que se trata de pessoa muito humilde e sem recursos próprios para providenciar seu deslocamento.
Sem examinar a petição da fl. 36, o magistrado extinguiu o feito sem julgamento do mérito, fundamentando sua decisão na "ausência de justificação", sem observar a justificativa que já se encontrava nos autos.
Além disso, é plausível a justificativa apresentada, já que a autora reside em local de difícil acesso no interior de Três Cachoeiras e permanece sem condições de arcar com a despesa ou prever a disponibilidade de deslocamento, dependendo da ajuda de terceiros - transporte público ou privado - para deslocamento até a cidade de Porto Alegre, onde o perito nomeado exerce suas atividades profissionais.
Ao abreviar a fase instrutória sem considerar as causas do não-comparecimento tempestiva e espontaneamente oferecidas, não há dúvidas de que o magistrado cerceou, de fato, seu direito de defesa e produção de provas.
Sendo evidente, portanto, o cerceamento de defesa, a impossibilitar o direito probatório da parte autora, impõe-se a anulação da sentença e a reabertura da instrução, a fim de ser produzida a prova pericial considerando as peculiaridades de difícil acesso e indisponibilidade de transporte já referidas.
Consigno, por fim, que tratando-se de segurada agricultora, indispensável, também, é a realização de audiência para oitiva de testemunhas, a fim de comprovar a atividade rural e eventual qualidade de segurada especial.
É entendimento desta Corte a imprescindibilidade da prova testemunhal para comprovação de atividade rural em regime de economia familiar ou individualmente, nos casos de concessão do benefício de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez. Isso porque, de regra, a prova documental é meramente indiciária, exigindo complementação por prova testemunhal idônea.
Deste modo, inexistindo elementos de prova aptos à formação da convicção do juízo acerca da incapacidade laboral, de seu início, e da qualidade de segurada especial, e caracterizado o cerceamento de defesa, impõe-se a anulação da sentença e o retorno dos autos à origem a fim de ser regularmente processada e julgada a ação, com realização de perícia judicial e audiência para oitiva de testemunhas.
ANTE O EXPOSTO, voto por dar provimento ao recurso para anular a sentença, a fim de ser regularmente processado e julgado o feito.
É O VOTO.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 10/08/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000022-26.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00081633420138210072
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | MALGORI INEZ CARLOS DEUS |
ADVOGADO | : | Marco Antonio Ramos Grazziotin e outro |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 10/08/2016, na seqüência 407, disponibilizada no DE de 26/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO AO RECURSO PARA ANULAR A SENTENÇA, A FIM DE SER REGULARMENTE PROCESSADO E JULGADO O FEITO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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