
Apelação Cível Nº 5038165-19.2023.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
APELANTE: MANUELA PACHECO DA SILVEIRA (AUTOR)
APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação de procedimento comum ajuizada por MANUELA PACHECO DA SILVEIRA em face da UNIÃO FEDERAL, objetivando a tríplice cumulação de benefícios.
Processado o feito, foi exarada sentença, cujo dispositivo tem o seguinte teor, verbis (ev. 48, origin):
Ante o exposto, julgo improcedente o pedido.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, atualizado pelo IPCA-E desde a data de ajuizamento da ação.
Suspendo a exigibilidade das verbas sucumbenciais em face do benefício da gratuidade da justiça concedido à parte autora.
Publique-se e registre-se.
Havendo recurso tempestivo, intime(m)-se a(s) parte(s) contrária(s) para apresentação de contrarrazões, no prazo legal. Juntados os recursos e as respectivas respostas, remetam-se os autos ao TRF da 4ª Região.
Transitada em julgado esta sentença, e nada sendo requerido, dê-se baixa nos autos.
A parte autora apela, sustentando, em síntese, a decadência do direito da União em revisar o ato concessivo da pensão militar.
Refere que ao presente caso, deve haver aplicação do Tema 627 e não o Tema 921, ambos do STF. (ev. , origin).
A União Federal apela, sustentando, em síntese (ev. , origin).
Com contrarrazões (ev. 59, origin), vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
DA DECADÊNCIA
É cediço que, no exercício do poder/dever de auto-tutela, os órgãos da Administração Pública estão sujeitos ao prazo decadencial de cinco anos para anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos destinatários, nos termos do art. 54 da Lei n.º 9.784/99, assim como às regras relativas à tramitação do processo administrativo, inclusive as relativas à preclusão e à coisa julgada administrativa, quando a questão não envolver ilegalidade do ato.
Todavia, no presente caso, tenho que não há falar em decadência, porquanto o ato ilegal não gera direito adquirido à autora, já que, em se tratando de relação de trato continuado e sucessivo, a cada pagamento o prazo é renovado periodicamente (TRF4 5046996-60.2016.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 26/06/2017).
Nesse sentido, precedentes desta Turma, verbis:
ADMINISTRATIVO. MILITAR. PENSÃO. TRÍPLICE CUMULAÇÃO DE RENDIMENTOS. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. REVISÃO. POSSIBILIDADE. Não há falar em decadência eis que o ato ilegal não gera direito adquirido e em se tratando de relação de trato continuado e sucessivo, a cada pagamento o prazo é renovado periodicamente (TRF4 5046996-60.2016.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 26/06/2017). A despeito de o artigo 29 da Lei 3.765/60 prever a possibilidade da cumulação de uma pensão militar com proventos de disponibilidade, reforma, vencimentos ou aposentadoria, ou, ainda, com a de outro regime, em nenhum momento expressa existir a possibilidade da tríplice acumulação de rendimentos. (TRF4, AC 5000326-04.2021.4.04.7205, TERCEIRA TURMA, Relatora MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 24/08/2021)
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MILITAR. TRÍPLICE CUMULAÇÃO DE PROVENTOS. ILEGALIDADE. DECADÊNCIA. INOCORÊNCIA. PERCEPÇÃO DE PENSÃO MILITAR E PENSÃO POR MORTE DE EX-COMBATENTE. CUMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A aplicação de prazo decadencial para revisão de ato administrativo (artigo 54 da Lei n.º 9.784/1999), em situações de omissão da Administração Pública, é questionável, especialmente diante de flagrante inconstitucionalidade, uma vez que (a) o ato ilegal/inconstitucional não gera direito subjetivo ao destinatário, e (b) em se tratando de relação jurídica de trato sucessivo (e, portanto, de omissão persistente), eventual prazo (assim como a própria ilicitude) é renovado periodicamente (TRF4, 4ª Turma, Agravo Legal em TAA 5046996-60.2016.4.04.0000, Relatora Des. Federal Vivian Josete Pantaleão Caminha, j. em 21/06/2017). 2. Já se manifestou o eg. Supremo Tribunal Federal, ao assentar que: (a) o artigo 11 da Emenda Constitucional n.º 20/1998 deve ser interpretado restritivamente, dada sua natureza excepcional; (b) é possível a acumulação, apenas, de um provento de aposentadoria com a remuneração de um cargo na ativa, no qual se tenha ingressado por concurso público antes da edição da referida emenda, ainda que inacumuláveis os cargos, e (c) Em qualquer hipótese, é vedada a acumulação tríplice de remunerações sejam proventos, sejam vencimentos (STF, ARE 848.993 RG). 3. O artigo 29 , incisos I e II, da Lei n.º 3.765/1960, em sua versão original ou com a redação dada pela Medida Provisória n.º 2.215-10/2001, não respalda a tríplice ou múltipla acumulação de benefícios pagos com recursos públicos. 4. O entendimento já pacificado do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que são inacumuláveis a pensão por morte de ex-combatente e os proventos de pensão militar decorrentes de oficial que seguiu carreira nas Forças Armadas até ser transferido para a reserva remunerada. (TRF4, AC 5007821-39.2020.4.04.7107, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 01/10/2021)
Ademais, compulsando os autos, observa-se que a pensão militar foi concedida com base em falsa informação prestada pela autora quando da habilitação à pensão militar, ao passo que consta do procedimento administrativo que nada auferia dos cofres públicos (ev. 43, OFIC2, fl. 16 origin), quando na verdade já era beneficiária de aposentadoria por tempo de contribuição e de pensão por morte (ev. 17, HISTCRE2, origin).
Aliás, registro que o ato de prestar informações falsas, quando da averiguação do direito à percepção da pensão militar afasta a boa fé objetiva da pensionista, gerando direito à restituição do montante recebido, desde sua concessão.
Nesse sentido, verbis:
MILITAR. PESÃO. TRÍPLICE CUMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RESSARCIMENTO DE VALORES RECEBIDOS ILEGALMENTE. INFORMAÇÕES FALSAS. BOA-FÉ AFASTADA. 1. O artigo 29 da Lei 3.765/60 prever a possibilidade da cumulação de uma pensão militar com proventos de disponibilidade, reforma, vencimentos ou aposentadoria, ou, ainda, com a de outro regime, em nenhum momento expressa existir a possibilidade da tríplice acumulação de rendimentos. 2. Apesar da manifesta natureza alimentar do benefício previdenciário, havendo má fé por parte do recebedor dos valores, consubstanciada na falsa alegação de não auferir outra renda oriunda dos cofres púbicos, levando à tríplice cumulação ilegal, deve ser restituído o montante, desde quando cumulado ilegalmente. 3. No que tange aos honorários advocatícios, a imposição dos ônus processuais pauta-se pelo princípio da sucumbência, norteado pelo princípio da causalidade, segundo o qual aquele que deu causa à instauração do processo deve arcar com as despesas dele decorrentes. No caso, a instauração da lide somente se deu por causa das informações inverídicas prestadas pela autora, quando da reversão da pensão militar. (TRF4, AC 5036561-57.2022.4.04.7100, TERCEIRA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 16/11/2023)
Todavia, no presente caso, o ponto controverso é distinto, ao passo que apenas se analisa eventual direito à tríplice cumulação.
Do exposto, não há falar em decadência da União em revisar o recebimento ilegal de benefício concedido a título de pensão.
A autora é beneficiária de aposentadoria por tempo de contribuição junto ao INSS, desde 25/08/1992; de pensão por morte previdenciária, concedida em 04/06/1988 e de pensão militar, desde 14/09/08.
A legislação pertinente ao caso assim prevê:
Lei n. 3.765/1960
Art. 29. É permitida a acumulação:
I - de uma pensão militar com proventos de disponibilidade, reforma, vencimentos ou aposentadoria;
II - de uma pensão militar com a de outro regime, observado o disposto no art. 37, inciso XI, da Constituição Federal.
Veja que a Lei 3.765/60 não prevê a tríplice cumulação de benefícios, somente permitiu a dupla cumulação nos termos acima transcritos.
Da mesma forma, o STF, ao resolver o Tema 921, reconheceu a incompatibilidade de tríplice cumulação de benefícios com os preceitos constitucionais, emanando a seguinte tese:
É vedada a cumulação tríplice de vencimentos e/ou proventos, ainda que a investidura nos cargos públicos tenha ocorrido anteriormente à EC 20/1998.
É nesse sentido, que tem decidido esta Turma, verbis:
ADMINISTRATIVO. MILITAR. PENSÃO. TRÍPLICE CUMULAÇÃO DE RENDIMENTOS. IMPOSSIBILIDADE. Não há falar em decadência eis que o ato ilegal não gera direito adquirido e em se tratando de relação de trato continuado e sucessivo, a cada pagamento o prazo é renovado periodicamente. A despeito de o artigo 29 da Lei 3.765/60 prever a possibilidade da cumulação de uma pensão militar com proventos de disponibilidade, reforma, vencimentos ou aposentadoria, ou, ainda, com a de outro regime, em nenhum momento expressa existir a possibilidade da tríplice acumulação de rendimentos. (TRF4, AC 5020031-03.2021.4.04.7200, TERCEIRA TURMA, Relatora MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 23/03/2022)
Dessa forma, do exposto, deve ser negado provimento à apelação da parte autora.
Honorários Advocatícios
O atual CPC inovou de forma significativa com relação aos honorários advocatícios, buscando valorizar a atuação profissional dos advogados, especialmente pela caracterização como verba de natureza alimentar (§ 14, art. 85, CPC) e do caráter remuneratório aos profissionais da advocacia.
Cabe ainda destacar que o atual diploma processual estabeleceu critérios objetivos para fixar a verba honorária que buscam valorizara advocacia, evitando o arbitramento de honorários em percentual ou valor aviltante que, ao final, poderia acarretar verdadeiro desrespeito à profissão. Ao mesmo tempo, objetiva desestimular os recursos protelatórios pela incidência de majoração da verba em cada instância recursal.
A partir dessas considerações, tenho que os honorários advocatícios devidos à taxa de 10% sobre o valor da causa foram adequadamente fixados, pois conforme previsto no art. 85 do novo CPC.
Assim sendo, em atenção ao disposto no art. 85, § 2º c/c § 11, do novo CPC, majoro a verba honorária para o patamar de 12% incidentes sobre o mesmo valor, permanecendo a exigibilidade suspensa em vista da AJG concedida.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- apelação improvida;
- honorários advocatícios majorados na instância recursal.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004312006v6 e do código CRC eb10e7fc.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5038165-19.2023.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
APELANTE: MANUELA PACHECO DA SILVEIRA (AUTOR)
APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)
EMENTA
militar. pesão. tríplice cumulação. impossibilidade. decadência. não ocorrência.
1. Não há falar em decadência eis que o ato ilegal não gera direito adquirido e em se tratando de relação de trato continuado e sucessivo, a cada pagamento o prazo é renovado periodicamente.
2. Não há falar em decadência do direito da administração em revisar a concessão de pensão militar, quando a beneficiária presta informações falsas no momento da habilitação à pensão.
3. O artigo 29 da Lei 3.765/60 prever a possibilidade da cumulação de uma pensão militar com proventos de disponibilidade, reforma, vencimentos ou aposentadoria, ou, ainda, com a de outro regime, em nenhum momento expressa existir a possibilidade da tríplice acumulação de rendimentos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de fevereiro de 2024.
Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004312007v4 e do código CRC 2990a897.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 09/02/2024 A 20/02/2024
Apelação Cível Nº 5038165-19.2023.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
PROCURADOR(A): CARMEM ELISA HESSEL
APELANTE: MANUELA PACHECO DA SILVEIRA (AUTOR)
ADVOGADO(A): Juliana Barcellos Sixel (OAB RS075400)
ADVOGADO(A): SANDRA ELOISA PEREIRA BARCELLOS (OAB RS032571)
APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 09/02/2024, às 00:00, a 20/02/2024, às 16:00, na sequência 360, disponibilizada no DE de 30/01/2024.
Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
Votante: Juiz Federal GERSON GODINHO DA COSTA
GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO
Secretário
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