APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5024299-95.2010.404.7100/RS
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | AGECI GUTERRES DA ROSA |
ADVOGADO | : | FERNANDO SOARES WITT |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. DESCONTO DAS DIFERENÇAS PAGAS DESDE A HABILITAÇÃO ATÉ A DIVISÃO DO BENEFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE.
1. A posterior habilitação de outros eventuais beneficiários de pensão por morte não pode vir a prejudicar a parte autora, eis que as prestações alimentícias, nestas incluídos os benefícios previdenciários, se percebidas de boa-fé, não estão sujeitas à repetição.
2. A decisão do STJ em sede de recurso repetitivo (REsp nº 1.401.560), que tratou da repetibilidade de valores recebidos por antecipação da tutela posteriormente revogada (tendo em vista o caráter precário da decisão antecipatória e a reversibilidade da medida), não se aplica à hipótese em que a beneficiária da pensão não contribuiu para a tardia habilitação da outra dependente, pois nesse caso está presente a boa-fé objetiva do segurado, que recebeu os valores pagos pela autarquia na presunção da definitividade do pagamento.
3. Levando em conta o caráter alimentar dos benefícios, e ausente comprovação de eventual má-fé do segurado, devem ser relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8213/91 e 154, § 3º, do Decreto nº 3048/99.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 22 de abril de 2015.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7399980v4 e, se solicitado, do código CRC 4DC9B4EE. | |
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5024299-95.2010.404.7100/RS
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RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária proposta contra o INSS, objetivando suspender os descontos realizados em seu benefício de pensão por morte, declarando-se a inexistência de débito junto ao INSS, bem como a devolução do montante já descontado.
Aduz, em síntese, que o INSS desconta, indevidamente, 30% do valor de seu benefício em razão de ter ocorrido habilitação tardia da ex-esposa do de cujus.
Sentenciando, o MM. Juiz assim decidiu:
ANTE O EXPOSTO, JULGO PROCEDENTE a presente Ação, para o fim de determinar ao INSS que se abstenha de proceder a quaisquer descontos no benefício de pensão por morte (131.007.993-2) percebido pela autora a título de ressarcimento/reposição ao Erário decorrente da habilitação e concessão do benefício nº 131.059.462-4 em favor de Dora Kroeff Wiltgen. Por conseguinte, deverá a autarquia, ainda, ressarcir à autora eventuais descontos que tenham sido levados a efeito por força daquele desmembramento da pensão.
Condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência, que fixo em 10% (dez por cento) do valor atribuído à causa, monetariamente atualizado desde o ajuizamento, em conformidade com o disposto no artigo 20, parágrafo 3º, "c", do CPC e com a Súmula 14 do STJ.
Irresignado, o INSS apelou alegando, em síntese, que existe expressa autorização legal para o desconto dos valores recebidos indevidamente, independentemente da boa-fé do beneficiário.
É o relatório.
VOTO
Remessa Oficial
Consoante decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso, conheço da remessa oficial.
Da Devolução dos Valores Percebidos de Boa-Fé
A questão controvertida no caso em análise diz respeito ao direito da parte autora de não ter descontados de sua cota-parte do benefício de pensão por morte valores recebidos a maior.
De acordo com o que se depreende dos autos, a parte autora percebeu o benefício de pensão por morte decorrente do falecimento de seu ex-companheiro, na sua integralidade, de 25/10/2003 a 26/08/2007, quando passou a perceber no percentual de 50%, em razão do desdobramento do benefício face à habilitação da ex-esposa (separada judicialmente) do falecido. Neste momento, o INSS passou a proceder ao desconto, no percentual de 30%, na cota-parte do benefício da autora, referente aos valores recebidos a maior desde a data do óbito.
Portanto, até então, a parte autora recebeu os valores integralmente, porquanto única habilitada ao recebimento do benefício em questão, o que se afigura como legítimo perante a previsão do artigo 76 da Lei n. 8.213/91, verbis:
"A concessão da pensão por morte não será protelada pela falta de habilitação de outro possível dependente, e qualquer inscrição ou habilitação posterior que importe em exclusão ou inclusão de dependente só produzirá efeito a contar da data da inscrição ou habilitação."
A Lei n. 8.213/1991, na hipótese de descontos de valores indevidamente pagos, incidentes sobre a renda mensal do benefício, estabelece o seguinte:
Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:
(...)
II - pagamento de benefício além do devido;
(...)
§ 1º Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o regulamento, salvo má-fé. (Renumerado pela Lei nº 10.820, de 17.12.2003)
(...)
Por sua vez, o Regulamento da Previdência - Decreto n. 3.048/1999 reza que:
Art. 154. O Instituto Nacional do Seguro Social pode descontar da renda mensal do benefício:
(...)
II - pagamentos de benefícios além do devido, observado o disposto nos §§ 2º ao 5º;
(...)
§ 2º A restituição de importância recebida indevidamente por beneficiário da previdência social, nos casos comprovados de dolo, fraude ou má-fé, deverá ser atualizada nos moldes do art. 175, e feita de uma só vez ou mediante acordo de parcelamento na forma do art. 244, independentemente de outras penalidades legais. (Redação dada pelo Decreto nº 5.699, de 2006)
§ 3º Caso o débito seja originário de erro da previdência social, o segurado, usufruindo de benefício regularmente concedido, poderá devolver o valor de forma parcelada, atualizado nos moldes do art. 175, devendo cada parcela corresponder, no máximo, a trinta por cento do valor do benefício em manutenção, e ser descontado em número de meses necessários à liquidação do débito. (grifei)
§ 4º Se o débito for originário de erro da previdência social e o segurado não usufruir de benefício, o valor deverá ser devolvido, com a correção de que trata o parágrafo anterior, da seguinte forma:
I - no caso de empregado, com a observância do disposto no art. 365; e
II - no caso dos demais beneficiários, será observado:
a) se superior a cinco vezes o valor do benefício suspenso ou cessado, no prazo de sessenta dias, contados da notificação para fazê-lo, sob pena de inscrição em Dívida Ativa; e
b) se inferior a cinco vezes o valor do benefício suspenso ou cessado, no prazo de trinta dias, contados da notificação para fazê-lo, sob pena de inscrição em Dívida Ativa. (...)
Com relação à devolução de valores recebidos a maior por força de antecipação de tutela posteriormente revogada, a matéria se encontrava consolidada nesta Corte, na linha de precedentes do STJ, no sentido de ser indevida a restituição sempre que verificada a boa-fé do segurado.
Nesse sentido, o entendimento firmado pela Seção Previdenciária desta Corte, como se vê a seguir:
AGRAVO. PREVIDENCIÁRIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REQUISITOS. ACUMULAÇÃO INDEVIDA DE BENEFÍCIOS. PARCELAS RECEBIDAS DE BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE.
1. A Terceira Seção desta Corte sedimentou o entendimento de serem irrepetíveis as parcelas indevidas de benefícios previdenciários recebidas de boa-fé, em face do seu caráter eminentemente alimentar, razão pela qual se entende presente a verossimilhança das alegações, pois, em sede de cognição sumária, não se identificam indícios de má-fé do segurado. O risco de dano irreparável consubstancia-se no fato de que o benefício de aposentadoria por invalidez de trabalhador rural titulado pelo demandante, que atualmente conta 75 anos de idade, é de valor mínimo, sendo qualquer desconto prejudicial à manutenção de suas necessidades básicas.
2. Cabível, portanto, a antecipação dos efeitos da tutela, estando a parte autora dispensada da devolução dos valores percebidos em decorrência do benefício previdenciário suspenso.
(AGRAVO DE INSTRUMENTO nº 5010815-02.2012.404.0000, 6ªT., Rel. Des. Federal Celso Kipper. Dec. un. em 27/09/2012)
Não se desconhece que, no tocante à tutela antecipada, a matéria foi revista em sede de Recurso Repetitivo, no julgamento do REsp nº 1.401.560, ainda pendente de publicação, passando o STJ a adotar posicionamento no sentido de ser repetível a verba recebida por força de antecipação da tutela, em cumprimento ao art. 115, II, da Lei nº 8.213/91, tendo em vista o caráter precário da decisão antecipatória e a reversibilidade da medida.
Esse entendimento, contudo, não se aplica à hipótese dos autos, em que a autora não contribuiu para a tardia habilitação da outra dependente, pois nesse caso está presente a boa-fé objetiva do segurado, que recebeu os valores pagos pela autarquia na presunção da definitividade do pagamento.
Com efeito, o benefício de pensão por morte é devido desde a habilitação da dependente (requerimento administrativo), ocasião em que o INSS tomou conhecimento de sua existência. Assim, não tendo a autarquia reconhecido o direito da ex-esposa à época, mas apenas quase quatro anos após seu pedido de habilitação, descabe qualquer desconto sobre os valores percebidos pela parte autora, porquanto não deu causa à demora na concessão do benefício à outra dependente, não podendo ser prejudicada por ato exclusivo do INSS.
Nessa esteira, levando em conta o caráter alimentar das prestações previdenciárias, e ausente comprovação de eventual má-fé da segurada - que não deu causa à irregularidade administrativa, nem praticou qualquer ato no sentido de burlar a fiscalização previdenciária -, devem ser relativizadas as normas do art. 115, II, da Lei 8.213/91 e 154, § 3º, do Decreto 3.048/99, e prestigiada a jurisprudência já firmada por esta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. DESCONTOS ADMINISTRATIVOS. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ.
1. A posterior habilitação de outros eventuais beneficiários de pensão por morte não pode vir a prejudicar a parte autora, eis que as prestações alimentícias, nestas incluídos os benefícios previdenciários, se percebidas de boa-fé, não estão sujeitas à repetição.
2. Esta Corte vem se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99.
3. Hipótese em que, diante do princípio da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos, deve ser afastada a cobrança dos valores determinada pela autarquia.
(APELAÇÃO CÍVEL Nº 2009.71.99.000755-4/RS, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Rogerio Favreto, DE 27/01/2012)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. DIVISÃO EM PARTES IGUAIS ENTRE OS DEPENDENTES. DESCONTOS SOBRE COTA DO BENEFÍCIO DECORRENTE DA HABILITAÇÃO POSTERIOR DO INCAPAZ. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ADESIVO NÃO-CONHECIMENTO. 1. Os dependentes do segurado devem dividir o benefício de pensão por morte em partes iguais, a teor da cristalina redação do artigo 77, caput, da Lei 8.213/91. 2. Descabe ao Instituto Previdenciário efetuar descontos sobre a cota da pensão pertencente à ora impetrante, a qual deve corresponder a 1/3 do benefício, a partir da habilitação do terceiro dependente, uma vez que a impetrante nada contribuiu para a tardia habilitação do incapaz. 3. É defeso ao defensor dativo, nomeado após a prolação da sentença, postular, em sede de recurso adesivo, a reforma do julgado que evidentemente não se manifestou sobre a fixação de honorários decorrentes da defensoria dativa, ante a ausência de interesse recursal e sob pena de supressão de instância, dado que tal pedido jamais foi formulado ao juízo monocrático.
(AMS 200371000448545, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Celso Kipper, DJ 17/05/2006, P. 903)
Assim, deve ser mantida a sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos.
Prequestionamento
Quanto ao prequestionamento, não há necessidade de o julgador mencionar os dispositivos legais e constitucionais em que fundamentam sua decisão, tampouco os citados pelas partes, pois o enfrentamento da matéria através do julgamento feito pelo Tribunal justifica o conhecimento de eventual recurso pelos Tribunais Superiores (STJ, EREsp nº 155.621-SP, Corte Especial, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 13-09-99).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso e à remessa oficial.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 22/04/2015
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5024299-95.2010.404.7100/RS
ORIGEM: RS 50242999520104047100
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Marcus Vinicius de Aguiar Macedo |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | AGECI GUTERRES DA ROSA |
ADVOGADO | : | FERNANDO SOARES WITT |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 22/04/2015, na seqüência 337, disponibilizada no DE de 07/04/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Juiz Federal MARCELO MALUCELLI |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7500090v1 e, se solicitado, do código CRC C4D79E66. | |
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