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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO DO FALECIDO. TRABALHADOR RURAL. PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL...

Data da publicação: 14/03/2024, 11:01:43

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO DO FALECIDO. TRABALHADOR RURAL. PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. COMPROVAÇÃO. FIXAÇÃO DA MULTA DIÁRIA PARA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. POSSIBILIDADE. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito. O benefício independe de carência e é regido pela legislação vigente à época do óbito. 2. A qualidade de segurado especial da de cujus deve ser comprovada por início de prova material, corroborada por prova testemunhal, no caso de exercer atividade agrícola como volante ou boia-fria ou mesmo como trabalhador rural em regime de economia familiar. 3. A fixação de multa diária objetiva garantir o cumprimento da decisão que determinou a implantação do benefício, bastando que a Autarquia Previdenciária cumpra a decisão no prazo indicado para que nenhuma sanção lhe seja imposta. 4. Razoável a fixação da multa em R$ 100,00 (cem reais) por dia, visto que a 3ª Seção desta Corte passou a entender que o arbitramento de multa diária cominatória neste montante se afigura suficiente e adequado para garantir o cumprimento da obrigação (AC nº 0021976-70.2012.404.9999/PR, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DE 18-9-2013). (TRF4, AC 5010177-56.2023.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 06/03/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

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Apelação Cível Nº 5010177-56.2023.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: IZALTINO DE SOUZA

RELATÓRIO

Trata-se de ação previdenciária ajuizada por IZALTINO DE SOUZA visando à concessão de pensão por morte de sua companheira, Rosa de Jesus Bento de Souza, ocorrida em 02/02/2019, sob o fundamento de que preenche as condições de dependente para o recebimento do benefício.

Sentenciando, o juízo a quo julgou procedente o pedido, tendo em vista o preenchimento dos requisitos legais para a concessão do benefício postulado, determinando-se a implantação imediata da pensão em favor do autor. Condenou ainda o INSS a pagar honorários advocatícios ao requerente, no montante de 10% por cento sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença.

O INSS apresentou recurso requerendo a reforma da sentença, tendo em vista que não houve comprovação documental da qualidade de segurado especial da instituidora. Assevera que os documentos e indícios materiais em nome dos demais membros do conjunto familiar só podem ser usados se o interessado ainda pertencer ao conjunto familiar em questão e se houver indícios materiais suficientes do exercício da atividade de pequeno produtor rural em regime de economia familiar. Requer a anulação da multa imposta. Subsidiariamente, requer seja reduzido o valor da multa e o prazo para implantação do benefício alterado para 45 (quarenta e cinco) dias.

Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

VOTO

DA PENSÃO POR MORTE

A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito.

Além disso, conforme o disposto no art. 26, I, da Lei nº 8.213/1991, referido benefício independe de carência, regendo-se pela legislação vigente à época do falecimento.

Sobre a condição de dependência para fins previdenciário, o art. 16 da Lei 8.213/91 assim dispõe:

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave (redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015);

II - os pais;

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave (redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015);

§1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.

§2º O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.

§3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o §3º do art. 226 da Constituição Federal.

§4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.

§ 5º As provas de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, produzido em período não superior a 24 (vinte e quatro) meses anterior à data do óbito ou do recolhimento à prisão do segurado, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)

§ 6º Na hipótese da alínea c do inciso V do § 2º do art. 77 desta Lei, a par da exigência do § 5º deste artigo, deverá ser apresentado, ainda, início de prova material que comprove união estável por pelo menos 2 (dois) anos antes do óbito do segurado. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)

§ 7º Será excluído definitivamente da condição de dependente quem tiver sido condenado criminalmente por sentença com trânsito em julgado, como autor, coautor ou partícipe de homicídio doloso, ou de tentativa desse crime, cometido contra a pessoa do segurado, ressalvados os absolutamente incapazes e os inimputáveis. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)

Qualidade de Segurado Especial - Trabalhador rural/boia-fria

O segurado especial, condição prevista no art. 11, VII, da Lei n° 8.213/91, inclui-se entre os segurados obrigatórios da Previdência Social, sendo-lhe dispensado o recolhimento das contribuições para fazer jus ao benefício previdenciário.

Saliente-se que, embora o trabalhador rural denominado boia-fria, volante ou diarista não esteja enquadrado no rol de segurados especiais referidos no inc. VII do art. 11 da Lei de Benefícios, a estes se equipara para fins de concessão de aposentadoria rural por idade ou instituição de pensão, consoante pacífica jurisprudência. Neste sentido:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REDUÇÃO DA SENTENÇA AOS LIMITES DO PEDIDO. SALÁRIO-MATERNIDADE. SEGURADA ESPECIAL. BOIA-FRIA. CONTRIBUIÇÕES. 1. A sentença deve ser reduzida aos limites da exordial, tendo em vista não constar dela pedido de condenação da Autarquia ao pagamento de abono anual, nem decorrer este, por força de lei, do benefício postulado, tendo em vista que, em que pese o art. 120 do Dec. n. 3.048/99, em sua redação atual, preveja o abono no caso em tela, o Regulamento extrapolou a Lei de Benefícios, que não contém dita previsão (vide art. 40, que lista expressamente os casos em que há abono anual). 2. O trabalhador rural boia-fria deve ser equiparado ao segurado especial de que trata o art. 11, VII, da Lei de Benefícios, sendo-lhe dispensado, portanto, o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário. (TRF4, AC 0016869-16.2010.404.9999, Sexta Turma, Relatora Eliana Paggiarin Marinho, D.E. 03/02/2011)

O exercício de atividade rural ou de pescador artesanal deve ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91 e da Súmula 149 do Eg. STJ, à exceção dos trabalhadores rurais boias-frias. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de alternância das provas ali referidas.

Não se exige prova plena da atividade rural ou pesqueira de toda a vida do de cujus, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro de que o labor fosse exercido contemporaneamente à época do óbito ou que essa atividade tenha cessado em decorrência do acometimento de alguma enfermidade.

Importa, ainda, salientar os seguintes aspectos: (a) o rol de documentos constantes no art. 106 da Lei de Benefícios, os quais seriam aptos à comprovação do exercício da atividade rural, é apenas exemplificativo; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido (AREsp 327.119/PB, j. em 02/06/2015, DJe 18/06/2015); (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos); (d) É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório (Súmula 577/STJ (DJe 27/06/2016); (e) a prova material juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do documento, desde que corroborado por prova testemunhal (AgRg no AREsp 320558/MT, j. em 21/03/2017, DJe 30/03/2017); e (f) é admitido, como início de prova material, nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, documentos de terceiros, membros do grupo parental.

CASO CONCRETO

O óbito de Rosa de Jesus Bento de Souza ocorreu em 02/02/2019, conforme certidão de óbito juntada com a inicial.

A sentença julgou procedente o pedido, ante a comprovação da qualidade de segurada especial da de cujus e de dependente econômico do autor.

A fim de evitar tautologia transcrevo parte da sentença, adotando os seus fundamentos como razões de decidir:

"...

2.2. Qualidade de segurado

No que toca ao requisito qualidade de segurado, é onde reside a controvérsia da demanda uma vez que a Autarquia ré indeferiu o pedido administrativo da autora afirmando que o falecido não tinha contribuições ou anotações em sua carteira de trabalho e por isso concluiu que não era segurado do Regime Geral da Previdência Social (seq. 1.18).

A parte autora, por sua vez, alega que a de cujus era segurada especial, na qualidade de trabalhador rural. Como início de prova material, a parte autora trouxe prova documental do exercício de sua atividade de rurícola no período de carência – (seq. 1.7 a 1.12), anteriores ao evento morte.

Entre os documentos trazidos pela parte:

a) cópia de Certidão de Casamento celebrada entre Izaltino de Souza e Rosa de Jesus Bento de Souza, na data de 06/06/1981, constando a profissão de Izaltino de Souza como “lavrador” (seq. 1.7); b) cópia de Certidão de Óbito de Rosa de Jesus Bento de Souza em 02/02/2019, constando como seu domicílio o Sítio Caranda, Prop. Olavo Shchirmann, Icatu, em Querência do Norte (seq. 1.8); c) cópia de Carteira de Trabalho e Previdência Social de Izaltino de Souza, trabalhando no cargo de “campeiro” de 01/10/1983 a 30/06/1985; no cargo de “campeiro” de 01/04/1986 a 30 /04/1990; no cargo de “campeiro” de 01/06/1990 a 30/03/1991; no cargo de “serviço gerais em agropecuária” de 15/02/1992 a 15/05/1992; e no cargo de “serviços gerais em agropecuária” de 01/06/1995 a 12/03/2007 (seq. 1.9); d) cópia de Ficha de Paciente de Rosa de Jesus Bento de Souza, emitido pela Secretaria Municipal de Saúde de Loanda, em 19/09/2008, constando como ocupação da falecida “rural” (seq. 1.10).

Tenho que os documentos elencados constituem início razoável de prova material, porquanto todos estão dentro período de carência exigido.

Ademais, a prova oral foi convincente, a qual comprovou o exercício da atividade campesina da falecida até os seus últimos dias, sempre trabalhando como boia fria, na condição de segurado especial.

A parte autora Izaltino de Souza, por ocasião de seu depoimento pessoal, declarou (40.3):

“Era casado com Rosa e nunca chegou a se separar dela. Que tiveram 03 (três) filhos juntos. Que Rosa faleceu em 2019, quando estavam trabalhando e Rosa começou a passar mal, então arrumou uma carona para levar Rosa até o hospital e quando chegou no hospital, Rosa faleceu. Que Rosa estava trabalhando no Icatu quando passou mal. Que o Icatu é um sítio em Querência do Norte e trabalhavam fora, para alguns fazendeiros. Que moravam como um ‘caseiro’ do sítio e trabalhavam como boia fria em outras propriedades, em lavouras de mandioca. Que há um fazendeiro que tem uma roça muito grande de mandioca, seu nome é Leandro, com uma fazenda de 200 (duzentos) alqueires, além das propriedades arrendadas, por isso trabalhavam direto para ele. Que Rosa trabalhava junto com o autor. Já morou na Fazenda Sabará, que fica entre Santa Cruz de Monte Castelo e Loanda, mas isso foi antes de Rosa falecer, depois trabalharam juntos no Icatu. Rosa sempre trabalhou na roça com o autor. Que Rosa sabia ler um pouco, mas o autor não tem estudo nenhum. Que a Fazenda Sabará fica próximo ao Município de Nova Londrina. A vida toda Rosa trabalhou em atividade rural. Que o autor também sempre trabalhou em atividade rural. Todos que moram na região do Icatu trabalham com roça, são poucos os que exercem atividade urbana, pois não há muita opção para quem não tem estudo. Que antes de falecer, Rosa trabalhava em uma roça de mandioca, perto do sítio onde moravam. Que a Fazenda era do Olavo, Sítio Carandá. Que Rosa faleceu aos 51 (cinquenta e um) anos de idade”.

A testemunha Valdeli Vieira Dantas Júnior, declarou (seq. 40.2):

“Conhece o autor há uns 09 (nove) ou 10 (dez) anos, e quando conheceu o autor, ele já era casado. Conheceu a esposa do autor, mas não se recorda o nome dela. Que é trabalhador rural e já chegou a trabalhar com o autor no Icatu. Nessa época trabalhava o autor, a esposa e outras pessoas. Que a esposa do autor trabalhava no meio rural. A última vez que trabalhou com o autor e sua esposa foi em 2018 ou em 2019. Que carpiam roças de mandioca. Que o autor morava em um sítio no Icatu, mas não sabe precisar o local. Que o declarante morava em Loanda e ia para lá trabalhar, de ônibus, todos os dias. Que as pessoas que levava o declarante era Sidinei e Vanildo. Saiam com a turma de Loanda e chegando lá entravam outras pessoas que iam trabalhar. Que Rosa sempre trabalhou com o autor. Que Rosa faleceu em 2018 ou em 2019. Que no dia Rosa estava trabalhando e sentiu umas dores. Nunca viu a falecida trabalhar em outro tipo de serviço, apenas no serviço rural. Estavam com a falecida quando ela disse estar com dores e em seguida faleceu. Se recorda que a autora estava trabalhando em uma roça de mandioca no Icatu. Que o proprietário da roça era Leandro. Trabalhou outras vezes com a falecida em outro lugar, na propriedade do Moreti”.

Por fim, a testemunha Marcos Luis dos Reais confirmou o trabalho do falecido nas lides rurais, em harmonia com os demais depoimentos colhidos durante a instrução processual (seq. 40.1):

“Que trabalhou algumas vezes com o autor, e o autor sempre trabalhou com a esposa. Conhece o autor e a esposa há uns 25 (vinte e cinco) anos e todo esse tempo eles trabalham juntos. Sabe que a falecida trabalhou o dia todo, e na parte da tarde para noite, Rosa passou mal e veio a falecer. No dia do óbito não chegou a trabalhar com Rosa, mas antes disso já trabalhou muito com ela. Que trabalham para a dona Marinoza e para o Leandro, por muito tempo ali na região, por haver muitas roças. Que o autor e a falecida moravam em um sítio no Icatu. Não se recorda o nome do sítio do autor e não sabe dizer de quem é a propriedade desse sítio. Sabe dizer que o autor e a falecida moravam no sítio, mas trabalhavam nas roças em volta. O declarante morava em um sítio também, mas em Loanda, e ia de ônibus para o trabalho. Que havia bastante gente que levava o pessoal para o trabalho, havia o Vanildo, o Sidinei, bastante gente. Nunca soube de a falecida sofrer de qualquer problema de saúde que a impedisse de trabalhar, pois foi de repente a morte de Rosa, foi até uma surpresa quando soube. Pelo que sabe, a falecida apenas trabalhou na roça e nunca a viu trabalhar na cidade”.

Tem-se da prova material e oral colhida a comprovação dos trabalhos realizados pelo falecido na lide rural, na condição de segurado especial, como boia-fria.

...

Vale lembrar que o segurado especial é o trabalhador rural considerado segurado do INSS sem a necessidade de pagar uma contribuição previdenciária, no caso dos autos, a prova material com a prova oral deixaram claro que a falecida era trabalhador rural na época do falecimento, inclusive tendo trabalhado poucos dias antes para do acidente que ocasionou sua morte.

..."

Da documentação carreada aos autos pela parte autora é possível afirmar a vocação rural de sua família, e sendo prova documental idônea, cabe adotar a presunção de que a falecida haja nascido e se criado no campo, tendo exercido o labor rurícola até a época do óbito.

A jurisprudência vem flexibilizando a exigência quanto ao início de prova material para o trabalhador rural em razão da natureza informal de sua atividade. Por causa disso, o peso da prova oral em tais casos é maior, razão pela qual é necessário que os depoimentos sejam coerentes e ricos em detalhes sobre a atividade alegada.

A prova pessoal foi uníssona e confirmou os elementos materiais, pois aponta fundamentalmente para o exercício de atividade rural da falecida, juntamente com o marido, como boia-fria, em fazendas vizinhas, onde cultivava mandioca, até o dia do seu falecimento, quando passou mal enquanto trabalhava na lavoura e veio a óbito em seguida.

Conforme dito alhures, é pacífico o entendimento de que os documentos, para a comprovação do tempo de serviço rural, não precisam estar em nome da trabalhadora mulher, pois, via de regra, nas famílias dedicadas à atividade rural os atos negociais são efetivados em nome do chefe do grupo, geralmente o genitor (Nesse sentido: EDRESP 297.823/SP, STJ, 5ª T, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 26/08/2002, p. 283; AMS 2001.72.06.001187-6/SC, TRF4ªR, 5ªT, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum, DJ 05/06/2002, p. 293).

Dessa forma, os documentos em nome do autor, marido da instituidora, são meios hábeis, idôneos e podem ser utilizados como início de prova material à comprovação do labor rural.

Neste particular, destaque-se a Súmula nº 73 do TRF da 4a Região:

Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.

Sendo assim, os documentos rurais trazidos aos autos suprem a exigência contida no artigo 55, §3°, da Lei nº 8.213/1991. Evidenciou-se, portanto, a prática de atividade rural da de cujus, no período imediatamente anterior ao óbito, o que foi corroborado pela prova testemunhal produzida, confirmando, assim, a sua qualidade de segurada especial.

Note-se, por fim, que não se exige o pagamento de contribuições previdenciárias ao trabalhador rural para o reconhecimento da sua qualidade de segurado, aplicando-se o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, verbis:

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENQUADRAMENTO DO TRABALHADOR BÓIA-FRIA. EQUIPARAÇÃO AO SEGURADO ESPECIAL. ART. 11, VII DA LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Esta Corte consolidou a orientação de que o Trabalhador Rural, na condição de bóia-fria, equipara-se ao Segurado Especial de que trata o inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, no que tange aos requisitos necessários para a obtenção de benefícios previdenciários. 2. Exigindo-se, tão somente, a apresentação de prova material, ainda que diminuta, desta que corroborada por robusta prova testemunhal, não havendo que se falar em necessidade de comprovação de recolhimentos previdenciários para fins de concessão de aposentadoria rural (REsp. 1.321.493/PR, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 19.12.2012). 3. É inegável que o trabalhador bóia-fria exerce sua atividade em flagrante desproteção, sem qualquer formalização e com o recebimento de valores ínfimos, o que demonstra a total falta de razoabilidade em se exigir que deveriam recolher contribuições previdenciárias. 4. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento. (REsp 1.762.211/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª T., DJe 07.12.2018)

No tocante à condição de dependente, tenho que o marido da instituidora possui dependência econômica presumida, a teor do art. 16, I da Lei 8.213/91.

Destarte, diante do conjunto probatório constante nos autos, tanto documental quanto testemunhal, forçoso admitir que a falecida possuía qualidade de segurado especial, até a data do óbito, sendo presumida a dependência econômica da parte autora, nos termos do art. 16, I da LBPS, motivo pelo qual tem direito à concessão do benefício de pensão por morte postulado nestes autos, desde a data do óbito.

Diante disso, não merece provimento o recurso do INSS, devendo ser mantida a sentença de primeiro grau, conforme fundamentação supra.

MULTA DIÁRIA

Insurgiu-se o INSS contra a fixação da multa determinada no caso de atraso na implantação do benefício. Mister salientar que a fixação de multa diária objetiva garantir o cumprimento da decisão que determinou a implantação do benefício. Sendo assim, a argumentação quanto à impossibilidade de fixação de multa não se sustenta, vez que basta que a Autarquia Previdenciária cumpra a decisão no prazo indicado para que nenhuma sanção lhe seja imposta.

Nesse sentido, em situações similares, o seguinte precedente desta Corte:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. TUTELA ESPECÍFICA CONCEDIDA EM SENTENÇA. PREFIXAÇÃO DE MULTA. RECURSO QUE NÃO ATACA A DECISÃO DE MÉRITO. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. 1. A Terceira Seção desta Corte firmou o entendimento de que o acórdão que concedesse benefício previdenciário e sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, em princípio sem efeito suspensivo, ensejava o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, independentemente do trânsito em julgado ou de requerimento específico da parte. 2. Na hipótese dos autos, apesar de ter havido concessão de tutela específica em sentença, enquanto ainda possível a interposição de recurso com efeito suspensivo, observa-se que a apelação do INSS não se volta contra a questão de mérito, que se torna preclusa, mas tão-somente a cominação de multa sem prévia demonstração de recalcitrância. 3. Nesse contexto, torna-se devida a implantação imediata do benefício, não sendo razoável que o cumprimento da decisão seja diferido em razão de recurso que ataca justamente a ferramenta utilizada para dar-lhe celeridade. 4. O argumento da impossibilidade de imposição de multa tampouco se sustenta, tendo em vista que basta ao INSS cumprir a decisão no prazo assinalado que nenhuma penalidade lhe será imposta. Esperar prévia recalcitrância para fixação de multa representa prestígio àquele que descumpre decisão judicial. Precedente desta Corte. 5. Apelação do INSS desprovida. (TRF4, AC 5009519-66.2022.4.04.9999, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 24/08/2022). - Grifei.

Por outro lado, nos termos do artigo 537, §1º, do Código de Processo Civil, o valor ou periodicidade da astreinte pode ser alterado: "o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la", nas hipóteses em que verificar que "se tornou insuficiente ou excessiva" ou "o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para descumprimento".

Com efeito, a redução da multa é medida que se impõe, pois fora fixada em R$ 200,00, sendo razoável sua fixação em R$ 100,00 (cem reais) por dia, visto que a 3ª Seção desta Corte passou a entender que o arbitramento de multa diária cominatória neste montante se afigura suficiente e adequado para garantir o cumprimento da obrigação (AC nº 0021976-70.2012.404.9999/PR, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DE 18-9-2013).

TUTELA ESPECÍFICA - IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO

Em que pese ter sido concedida a antecipação de tutela em primeira instância, não houve comprovação da implantação do benefício nestes autos.

Assim, em face da ausência de efeito suspensivo de qualquer outro recurso, é determinado ao INSS (obrigação de fazer) que implante ao segurado, a partir da competência atual, o benefício abaixo descrito, no prazo máximo de vinte (20) dias para cumprimento.

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTOImplantar Benefício
NB1878334775
ESPÉCIEPensão por Morte
DIB02/02/2019
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB
RMIA apurar
OBSERVAÇÕES

CONSECTÁRIOS LEGAIS

Os consectários legais devem ser fixados nos termos que constam do Manual de Cálculos da Justiça Federal e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/09 que alterou a redação do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, nos termos das teses firmadas pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 810 (RE 870.947/SE) e pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 905 (REsp 1.492.221/PR), ressalvada a aplicabilidade, pelo juízo da execução, de disposições legais posteriores que vierem a alterar os critérios atualmente vigentes (a título exemplificativo, a partir 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deverá ser observado o disposto no art. 3º da Emenda Constitucional n.º 113/2021: incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente).

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Parcialmente procedente o recurso, no tocante à redução da multa imposta em primeira instância e prazo para implantação do benefício, não há majoração da verba honorária nesta instância recursal.

PREQUESTIONAMENTO

Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.

CONCLUSÃO

Apelação parcialmente provida para reduzir o valor da multa diária e determinar a implantação do benefício no prazo de 20 (vinte) dias.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do INSS e determinar a implantação do benefício, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004297914v14 e do código CRC 21911cd9.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 6/3/2024, às 15:53:29


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40004297914.V14


Conferência de autenticidade emitida em 14/03/2024 08:01:42.

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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

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Apelação Cível Nº 5010177-56.2023.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: IZALTINO DE SOUZA

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO DO FALECIDO. TRABALHADOR RURAL. PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. COMPROVAÇÃO. FIXAÇÃO DA MULTA DIÁRIA PARA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. POSSIBILIDADE.

1. A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito. O benefício independe de carência e é regido pela legislação vigente à época do óbito.

2. A qualidade de segurado especial da de cujus deve ser comprovada por início de prova material, corroborada por prova testemunhal, no caso de exercer atividade agrícola como volante ou boia-fria ou mesmo como trabalhador rural em regime de economia familiar.

3. A fixação de multa diária objetiva garantir o cumprimento da decisão que determinou a implantação do benefício, bastando que a Autarquia Previdenciária cumpra a decisão no prazo indicado para que nenhuma sanção lhe seja imposta.

4. Razoável a fixação da multa em R$ 100,00 (cem reais) por dia, visto que a 3ª Seção desta Corte passou a entender que o arbitramento de multa diária cominatória neste montante se afigura suficiente e adequado para garantir o cumprimento da obrigação (AC nº 0021976-70.2012.404.9999/PR, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DE 18-9-2013).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 05 de março de 2024.



Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004297915v5 e do código CRC b8b309cd.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 6/3/2024, às 15:53:29


5010177-56.2023.4.04.9999
40004297915 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 14/03/2024 08:01:42.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 27/02/2024 A 05/03/2024

Apelação Cível Nº 5010177-56.2023.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A): CAROLINA DA SILVEIRA MEDEIROS

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: IZALTINO DE SOUZA

ADVOGADO(A): CLOVIS BARBOSA BRAGA (OAB PR079759)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 27/02/2024, às 00:00, a 05/03/2024, às 16:00, na sequência 258, disponibilizada no DE de 16/02/2024.

Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 14/03/2024 08:01:42.

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