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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA OFICIAL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. REQUISITOS. INÍCIO DE PROVA M...

Data da publicação: 07/09/2020, 07:01:01

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA OFICIAL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. REQUISITOS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. CONSECTÁRIOS. CORREÇÃO MONETÁRIA. ISENÇÃO DE CUSTAS. 1. A remessa necessária não deve ser admitida quando se puder constatar que, a despeito da iliquidez da sentença, o proveito econômico obtido na causa será inferior a 1.000 (mil) salários (art. 496, § 3º, I, CPC) - situação em que se enquadram, invariavelmente, as ações destinadas à concessão ou ao restabelecimento de benefício previdenciário pelo Regime Geral de Previdência Social. 2. A concessão de aposentadoria rural por idade, disciplinada nos parágrafos do artigo 48 da Lei 8.212/91, está condicionada à demonstração do exercício de atividade rural em regime de economia familiar, como segurado especial, pelo período determinado em conformidade com a tabela progressiva constante no artigo 142 combinado com o artigo 143, ambos da Lei 8.213/1991, e o requisito idade, qual seja, 60 anos para homens e 55 para mulheres, não se exigindo prova do recolhimento de contribuições. 3. É legalmente indispensável a existência de início de prova material para a comprovação, mediante o depoimento de testemunhas, de tempo de atividade rural. 4. Considerada a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497, caput, do Código de Processo Civil, e tendo em vista que a decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, é imediato o cumprimento do acórdão quanto à implantação do benefício devido à parte autora, a ser efetivado em 30 (trinta) dias, observado o Tema 709 do STF. 5. Aplica-se o INPC para o fim de correção monetária do débito judicial após 30 de junho de 2009 (Tema nº 905 do Superior Tribunal de Justiça). 6. O INSS está isento do recolhimento das custas judiciais perante a Justiça Federal e perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, cabendo-lhe, todavia, suportar as despesas processuais. (TRF4 5013832-75.2019.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 30/08/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5013832-75.2019.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: ARILDE ZANCO DE SIQUEIRA JULIANOTTI

RELATÓRIO

Em ação ajuizada por Arilde Zando de Siqueira Julianotti contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), foi entregue sentença (em janeiro de 2019) julgando procedente o pedido inicial, para reconhecer o direito ao benefício de aposentadoria por idade rura, desde a protocolização do requerimento na via administrativa, e condenar o réu ao pagamento das prestações vencidas, com correção monetária pelo IPCA-e e juros de mora em 1% ao mês, a contar da citação. O réu foi condenado, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 20% sobre o valor das prestações vencidas até a sentença, e ao pagamento de metade das custas.

.O INSS apelou. Alega, em suma, que a autora não comprovou o exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, durante o período de carência exigido. Ressalta que, após sua separação, embora alegue ter retornado para a casa de seus pais e prosseguido, com eles, no exercício de atividade rural, não comprovou esse fato. Quanto ao período de 2012 a 2017, não comprovou que teria convivido com seu segundo marido, antes do casamento. Pede a reforma da sentença, julgando-se improcedente o pedido inicial. Subsidiariamente, pede que a correção monetária e os juros de mora sejam computados nos termos da Lei 11.960/2009, que seja afastada a condenação ao pagamento das custas e que o índice aplicável para a verba honorária seja reduzido para 10%.

Processada a apelação, vieram os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, também em razão da remessa de ofício.

VOTO

Não conhecimento da remessa oficial

De início, cabe salientar que as disposições do artigo 475 do antigo Código de Processo Civil não se aplicam às sentença proferidas após 18 de março de 2016, quando entrou em vigor o novo CPC (Lei nº 13.105/2015).

Conforme o artigo 29, §2º, da Lei nº 8.213/1991, o valor do salário de benefício não será inferior ao de um salário mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário de contribuição na data de início do benefício.

De acordo com a Portaria Interministerial MTPS/MF nº 1, de 08 de janeiro de 2016, o valor máximo do salário de benefício e do salário de contribuição, a partir de 1º de janeiro de 2016, é de R$ 5.189,82 (cinco mil cento e oitenta e nove reais e oitenta e dois centavos).

No âmbito do Superior Tribunal de Justiça há entendimento sedimentado no sentido de que a sentença ilíquida está sujeita a reexame necessário (Súmula 490). Importa atentar, no entanto, que é excluída da ordem do duplo grau de jurisdição a sentença contra a União e respectivas autarquias e fundações de direito público que esteja a contemplar condenação ou proveito econômico na causa por valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários mínimos, por força do artigo 496, §3º, inciso I, do Código de Processo Civil.

Em ações de natureza previdenciária, o valor da condenação ou do proveito econômico à parte, com correção monetária e juros de mora, em nenhuma situação alcançará o valor de 1.000 (um mil) salários mínimos. É o que se dá mesmo na hipótese em que a renda mensal inicial (RMI) do benefício previdenciário deferido seja fixada no valor máximo (teto) e bem assim seja reconhecido o direito do beneficiário à percepção de parcelas em atraso, a partir daquelas correspondentes a 5 (cinco) anos que antecedem a propositura da ação (art. 103, parágrafo único da Lei nº 8.213/91).

Assim, no presente caso, não se pode fazer projeção alguma de montante exigível que legalmente releve a decisão proferida a reexame necessário.

Da aposentadoria rural por idade

Em demanda previdenciária na qual se postula a concessão de aposentadoria por idade rural. No caso do trabalhador rural, qualificado como segurado especial (inciso VII do artigo 11 da Lei nº 8.213/1991), deve ser aplicado o disposto nos artigos 48, parágrafos 1º e 2º, 25, II, 26, III e 39, I, da Lei nº 8.213/1991. Dessa forma, é necessária a comprovação do implemento da idade mínima (60 anos para o homem e de 55 anos para a mulher) e do exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, ainda que a comprovação seja feita de forma descontínua, sendo dispensável o recolhimento de contribuições.

O artigo 143 da Lei nº 8.213/1991, tratando genericamente do trabalhador rural que passou a ser enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social (na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do Art. 11), assegurou-lhe o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de sua vigência, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência exigida. Complementando o artigo 143 na disciplina da transição de regimes, o artigo 142 da Lei nº 8.213/1991 estabeleceu que, para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial deve obedecer a uma tabela que prevê prazos menores no período de 1991 a 2010.

Em relação ao ano a ser utilizado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei nº 8.213/1991, como regra, deverá ser aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que, até então, já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, neste caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido, conforme disposto na Constituição Federal, art. 5º, inciso XXXVI, e Lei de Benefícios, art. 102, §1º. Nesse sentido, tese firmada no Superior Tribunal de Justiça (Tema 642):

O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade. (REsp 1.354.908-SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 9/9/2015, DJe 10/2/2016).

Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei nº 8.213/1991. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessária ao deferimento do benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, devendo ser verificado o implemento do requisito "tempo equivalente à carência" progressivamente, nos anos subsequentes ao implemento do requisito etário, de acordo com a tabela do mencionado artigo 142 da Lei de Benefícios.

Deve ser observado que nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31/08/1994, data da publicação da Medida Provisória nº 598, que alterou o art. 143 da Lei de Benefícios, (posteriormente convertida na Lei nº 9.063/1995), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/1991.

A disposição contida no art. 143 da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, § 1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.

Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo (STF, RExt. nº. 631240/MG, Rel. Ministro Roberto Barroso, Plenário, julgado em 03/09/2014).

O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida, exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia) e Súmula nº 149 do STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.

Cabe salientar, outrossim, que embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo.

Por outro lado, não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar. Quanto aos meios de comprovação do tempo de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1348633 SP, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, julgado em 28/08/2013, DJe 05/12/2014, firmou a seguinte tese (Tema 638):

Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório.

Ademais, tal entendimento está sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016):

É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.

Aquela Egrégia Corte também consolidou entendimento no sentido de atribuir efeitos prospectivos ao início de prova material, reconhecendo-lhe "(...) eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal" (AgInt no REsp 1606371/PR, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 20/04/2017, DJe 08/05/2017).

No que tange aos documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, saliento que consubstanciam início de prova material do labor rural. Com efeito, o §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família exercem "em condições de mútua dependência e colaboração". Via de regra, os atos negociais da entidade respectiva serão formalizados não individualmente, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta, exercida, normalmente, no caso dos trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.

Importante, ainda, destacar que não descaracteriza automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural, pois, o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/1991 estipula que é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. Ou seja, somente será descaracterizado o regime de economia familiar caso esteja comprovado que a remuneração proveniente do labor urbano do cônjuge importe em montante tal que dispense a renda do labor rural para a subsistência do grupo familiar.

Cumpre ressaltar que, seguidamente, a ré alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Deve-se considerar as conclusões a que chegou o INSS, em âmbito administrativo, de modo a serem corroboradas pelo conjunto probatório produzido no feito judicial. Na existência de conflito entre as provas colhidas na via administrativa e aquelas produzidas em juízo, devem preponderar as últimas, uma vez que produzidas com todas as cautelas legais, diante da garantia do contraditório. Trata-se de situação na qual se deve prestigiar a imparcialidade que caracteriza a prova produzida no curso do processo jurisdicional. Dispondo de elementos que possam obstaculizar a pretensão da parte autora, cabe ao INSS judicializar a prova administrativa, a fim de que seja examinada no conjunto do acervo probatório constante dos autos.

Em relação ao tema da descontinuidade, o art. 143, da Lei nº. 8.213/91, o qual estabeleceu regra transitória para a concessão de aposentadoria por idade em favor dos trabalhadores rurais enquadrados como segurado especiais, dispôs que:

(...) o trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.

Faz-se necessário elucidar o trecho do dispositivo legal citado, na parte em que trata da exigência de comprovação de atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento administrativo. Tal exigência diz respeito à necessidade de ostentar a qualidade de segurado especial no momento da implementação de todos os requisitos (idade e carência), tomando por referência, via de regra, os parâmetros exigidos na data do requerimento administrativo, ou, então, no momento em que implementada a idade mínima para a inativação (55 anos para mulheres ou 60 anos para homens). Vale dizer, deve o segurado provar o exercício de atividade rural desempenhada até o momento imediatamente anterior à implementação de todos os requisitos para a concessão do benefício, pois no caso específico da aposentadoria dos segurados especiais, ao contrário da aposentadoria por idade prevista no caput do artigo 48 da Lei de Benefícios, não se lhes assegura a inovação trazida pelo artigo 3º da Lei nº 10.666/03, no sentido de que os requisitos para a inativação não precisam ser preenchidos de forma simultânea. Quanto ao tema, assim entendeu o Superior Tribunal de Justiça:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REQUISITOS: IDADE E COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE AGRÍCOLA NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. ARTS. 26, I, 39, I, E 143, TODOS DA LEI N. 8.213/1991. DISSOCIAÇÃO PREVISTA NO § 1º DO ART. 3º DA LEI N. 10.666/2003 DIRIGIDA AOS TRABALHADORES URBANOS. PRECEDENTE DA TERCEIRA SEÇÃO.

(...) 5. Não se mostra possível conjugar de modo favorável ao trabalhador rural a norma do § 1º do art. 3º da Lei n. 10.666/2003, que permitiu a dissociação da comprovação dos requisitos para os benefícios que especificou: aposentadoria por contribuição, especial e por idade urbana, os quais pressupõem contribuição.

(...) (Pet 7476/PR, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ Acórdão Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 25/04/2011)

Dessa forma, deve ser demonstrado pelo segurado especial o desempenho de atividade rural pelo número de meses idêntico à carência, no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, ou, então, na data do implemento do requisito etário. Nesse sentido, precedente do Superior Tribunal de Justiça:

PREVIDENCIÁRIO. RURAL. PERÍODO DE CARÊNCIA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL. NÃO DEMONSTRAÇÃO.

(...) 2. Segundo a instância ordinária, o conjunto fático- probatório dos autos não foi suficiente para demonstrar o labor rural em regime de economia familiar, pois a prova testemunhal atestou que a autora não trabalha no campo há mais de 10 anos e que desenvolve atividade não rural para sua subsistência.

3. O implemento da idade para aposentadoria, por seu turno, ocorreu em 2005, ou seja, após o abandono das lides no meio rural. 4. Assim, não se verifica, no caso, o exercício de atividade rurícola no período imediatamente anterior ao requerimento, pelo número de meses idêntico à carência.

(...) (AgRg no REsp 1294351/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 07/02/2012, DJe 05/03/2012)

No que se refere à forma descontínua, diz o artigo 143 que o segurado deve demonstrar o exercício de atividade rural pelo número de meses correspondentes à carência exigida, ainda que de forma não contínua. Assim sendo, de regra, elege-se o marco que definirá o número de contribuições correspondentes à carência necessária para a concessão do benefício (implemento da idade ou o requerimento administrativo). No caso da aposentadoria rural por idade, o número de contribuições equivale ao tempo de labor rural independentemente do recolhimento daquelas. De modo que são fixados os marcos iniciais e finais e, dentro de tais limites, incumbe à parte demonstrar o exercício de trabalho rural pelos números de meses correspondentes à carência.

A interpretação tradicional conferida ao termo "descontínua" orienta-se no sentido de admitir interrupções do exercício das atividades campesinas, durante o período de carência, desde que o afastamento não implique perda da condição de segurado especial. De qualquer forma, deve o segurado demonstrar o desempenho de atividade rural dentro daquele intervalo estabelecido no momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício.

Conquanto não haja vedação legal, fato é que o regramento interno do INSS autoriza a admissão de períodos de trabalho rural intercalados com períodos de atividade urbana para fins dos benefícios previstos no inciso I do artigo 39 e artigo 143, da Lei de Benefícios, desde que a carência seja preenchida exclusivamente com tempo de exercício de labor rural. Quanto ao tema, cabe citar os artigos 145, 148, 214 e 215, da Instrução Normativa INSS/PRES 45, de 06/08/2010:

Art. 145. No caso de comprovação de desempenho de atividade urbana entre períodos de atividade rural, com ou sem perda da qualidade de segurado, poderá ser concedido benefício previsto no inciso I do art. 39 e art. 143, ambos da Lei nº 8.213, de 1991, desde que cumpra o número de meses de trabalho idêntico à carência relativa ao benefício, exclusivamente em atividade rural, observadas as demais condições.

Parágrafo único. Na hipótese de períodos intercalados de exercício de atividade rural e urbana, observado o disposto nos arts. 149 e 216, o requerente deverá apresentar um documento de início de prova material do exercício de atividade rural após cada período de atividade urbana.

Art. 148. Para fins de concessão dos benefícios devidos ao trabalhador rural previstos no inciso I do art. 39 e art. 143, ambos da Lei nº 8.213, de 1991, considera-se como período de carência o tempo de efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, correspondente ao número de meses necessários à concessão do benefício requerido, computados os períodos a que se referem os incisos III a VIII do § 5º do art. 7º, observando-se que:

(...)

Parágrafo único. Entende-se como forma descontínua os períodos intercalados de exercício de atividades rurais, ou urbana e rural, com ou sem a ocorrência da perda da qualidade de segurado, observado o disposto no art. 145.

Art. 214. A aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais referidos na alínea "a" do inciso I, na alínea "g" do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11 da Lei nº 8.213, de 1991, será devida para o segurado que, cumprida a carência exigida, completar sessenta anos de idade, se homem, e cinquenta e cinco anos, se mulher.

§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, o trabalhador rural deverá comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, ou, conforme o caso, ao mês em que cumpriu o requisito etário, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência exigida.

(...)

Art. 215. Para fins de aposentadoria por idade prevista no inciso I do art. 39 e art. 143 da Lei nº 8.213, de 1991 dos segurados empregados, contribuintes individuais e especiais, referidos na alínea "a" do inciso I, na alínea "g" do inciso V e no inciso VII do art. 11 do mesmo diploma legal, não será considerada a perda da qualidade de segurado os intervalos entre as atividades rurícolas, devendo, entretanto, estar o segurado exercendo a atividade rural ou em período de graça na DER ou na data em que implementou todas as condições exigidas para o benefício.

(...)

É possível, portanto, constatar que os fundamentos ora expostos encontram respaldo nas disposições normativas editadas pelo órgão responsável pela concessão de benefícios. Pontuo que a descontinuidade permite o aproveitamento de períodos intercalados de atividade rural, com ou sem a perda da qualidade de segurado, para integrar a carência necessária à concessão de aposentadoria por idade dos segurados especiais. Além disso, o afastamento da atividade campesina não é considerado fator determinante, desde que no período imediatamente anterior ao requerimento ostente a condição de segurado especial.

Assim sendo, faz-se possível admitir o cômputo de períodos de exercício de atividade rural intercalados para fins de concessão de aposentadoria por idade rural, desde que demonstrada a condição de segurado especial no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou implemento do requisito etário.

Ainda, está pacificado pela jurisprudência o entendimento de que (...) é assegurada a condição de segurado especial ao tralhador rural denominado "boia-fria" (REsp 1674064/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 27/06/2017, DJe 30/06/2017). Além disso, dada sua peculiar circunstância e notável dificuldade em portar documentos que comprovem sua condição de trabalhador rural diarista, o egrégio Superior Tribunal de Justiça, em regime de julgamento de recursos repetitivos, ao julgar o REsp 1321493/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 10/10/2012) fixou a seguinte tese, relativamente ao trabalhador rural boia-fria:

TEMA 554: Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.

Por fim, em relação à exigência do recolhimento de contribuições por parte do boia-fria, entendo que não se sustenta a tese de que o art. 143 da Lei 8.213/91, a partir de 31 de dezembro de 2010, perdeu sua vigência, quando passaram a vigorar os arts. 2º e 3º da Lei 11.718/2008, que estabelecem:

Art. 2o Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 143 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010.

Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo ao trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de emprego.

Art. 3o Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural, em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência:

I - até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991;

II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e

III - de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil.

Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo e respectivo inciso I ao trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que comprovar a prestação de serviço de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de emprego.

Interpretando tais dispositivos, afirma-se que o trabalhador rural boia-fria deveria, por ocasião do requerimento do benefício, indicar sob qual regime desempenhou suas atividades (empregado rural ou contribuinte individual), pois desta especificação decorreriam diferentes requisitos. Entretanto, tal exigência fere o direito dos trabalhadores que exercem suas atividades sem qualquer formalização e com remuneração insuficiente para o recolhimento de contribuições.

Tal tese, na prática, excluiria a categoria dos trabalhadores rurais boias-frias do âmbito da Previdência Social, razão pela qual o trabalhador boia-fria necessita continuar sendo enquadrado como segurado especial, mesmo após o advento da referida alteração legislativa, em conformidade com as normas de proteção social e da universalização do acesso à previdência social.

O que estabelecem os arts. 2º e 3º da Lei 11.718/08 é a forma como será contada a carência, para o empregado rural e para o segurado contribuinte individual que presta serviços de natureza rural.

Quanto à carência do trabalhador rural boia-fria, está pacificado o entendimento segundo o qual este se equipara ao segurado especial relacionado no art. 11, VII, da 8.213/91, (e não ao contribuinte individual ou ao empregado rural), sendo inexigível, portanto, o recolhimento de contribuições para fins de concessão do benefício, substituída pela comprovação do efetivo desempenho de labor agrícola, nos termos dos arts. 26, III, e 39, I da Lei de Benefícios.

Neste sentido:

PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. SALÁRIO-MATERNIDADE. PRESCRIÇÃO. SEGURADA BOIA-FRIA. COMPROVAÇÃO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES.

1. Não deve ser acolhida a prejudicial de prescrição se entre o nascimento e o ajuizamento da ação, uma vez que não havendo prévio requerimento administrativo, não se passaram cinco anos.

2. Demonstrada a maternidade e a qualidade de segurada especial, mediante início razoável de prova testemunhal, durante período equivalente ao da carência, é devido o salário-maternidade.

3. Esta Corte já pacificou o entendimento de que o trabalhador rural bóia-fria deve ser equiparado ao segurado especial de que trata o art. 11, VII, da Lei de Benefícios, sendo-lhe dispensado, portanto, o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário.

(AC nº 0017780-28.2010.404.9999/PR, Rel. Vânia Hack de Almeida, D.E. em 22/05/2014)

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. BÓIA-FRIA. ALTERAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. A Lei n. 8.213/1991, ao regulamentar o disposto no inc. I do art. 202 da redação original de nossa Carta Política, assegurou ao trabalhador rural denominado segurado especial o direito à aposentadoria quando atingida a idade de 60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher (art. 48, § 1º).

2. Os rurícolas em atividade por ocasião da Lei de Benefícios, em 24 de julho de 1991, foram dispensados do recolhimento das contribuições relativas ao exercício do trabalho no campo, substituindo a carência pela comprovação do efetivo desempenho do labor agrícola (arts. 26, I e 39, I).

3.O reconhecimento de tempo de serviço rurícola, para efeito de aposentadoria por idade, é tema pacificado pela Súmula 149 desta Egrégia Corte, no sentido de que a prova testemunhal deve estar apoiada em um início razoável de prova material.

4. O rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, inscrito no art. 106, parágrafo único da Lei 8.213/91, é meramente exemplificativo, e não taxativo, sendo admissíveis, portanto, outros documentos além dos previstos no mencionado dispositivo.

5. A análise das questões trazidas pela recorrente demandaria o reexame de matéria fático-probatória, o que é obstado, em âmbito especial, pela Súmula 7/STJ.

6.Não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência estabelecido pelo artigo 143 da Lei nº 8.213/91, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória, vinculando-o, pelo menos, a uma fração daquele período.

7. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 1326080/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 14/9/2012).

Caso concreto

No presente caso, a autora preencheu o requisito etário, 55 (cinquenta e cinco) anos, em 24.11.2016, porquanto. nascido em 24.11.1961. O requerimento administrativo foi protocolizado em 24.11.2016. Dessa forma, a parte autora deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 180 meses imediatamente anteriores ao implemento do requisito etário ou imediatamente anteriores ao requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável.

O processo foi instruído com os seguintes documentos:

- notas de produtor e notas fiscais, referentes à comercialização de produtos rurais, em nome de Zulmir Zanco (pai da autora), emitida em 1979; em nome de Mathilde Zanco, emitidas em 2002, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011e 2013; em nome de Gilceu Ângelo Julianotti (esposo da autora), emitidas em 2011, 2012, 2013 e 2014; e em nome da autora e de Gilceu Angelo Julianotti, emitidas em 2015, 2016 e 2017;

- certidão de nascimento da autora, em 1961, na qual os pais da autora, Zulmir Zanco e Mathilde Zanco, estão qualificados como agricultores;

- certidão de casamento dos pais da autora, em 1958, na qual os nubentes estão qualificados como agricultores;

- certidão de casamento da autora com Gilceu Angelo Julianotti, em 2015, na qual ambos estão qualificados como agricultores;

- certidão de casamento da autora com José Ademar de Siqueira, em 1980, na qual o noivo está qualificado como agricultor; consta anotação do trânsito em julgado da sentença de separação judicial, em 2003;

- declaração de ITR, exercício de 2016, em nome de Gilceu Angelo Julianotti;

- matrícula de imóvel rural;

- relatório de informações de benefício (INFBEN), no qual consta que o pai do autor recebeu benefício de aposentadoria por invalidez - trabalhadora rural, de 1.10.1984 a 7.3.2008;

- relatório de informações de benefício (INFBEN), no qual consta que a mãe da autora recebe benefício de aposentadoria por idade rural, na qualidade de segurada especial, desde 1991;

- relatório de informações de benefício (INFBEN), no qual consta que a mãe da autora recebe benefício de pensão por morte, instituída por segurado especial, desde 2008.

Em audiência, foram ouvidas testemunhas.

Isidoro Perondi: disse que conhece a autora desde que era criança, pois era vizinho da família, morava a distância de 2 km. Afirmou que sempre foi agricultora. A atividade era realizada na propriedade dos pais; um lote, mas não sabe a área, supondo que seja em torno de 20 hectares. Trabalhava somente a família, a autora e seus pais. A autora realizava tarefas como roçar, carpir, e (tirar) leite. O trabalho na lavoura era manual. Cultivavam milho, feijão e mandioca. Viviam somente da lavoura, como até hoje. Quando casou, a autora saiu da propriedade dos pais. Depois que se separou, retornou. Ao contrair novo casamento, saiu novamente. Ao responder novos questionamento, afirmou que, no período em que trabahou com os pais, não tinham empregados, e que a propriedade ficava a 3 km da cidade (do centro urbano).

Anselvo Canton: disse que conehce a autora desde criança, pois morava a, proximadamente, 1000 metros. A autora ajudava o pai dela na roça. Ela fazia roça, capia e plantava. Cultivavamn trigo, milho, soja, feijão, arroz e mandioca. O excedente era vendido. Afirmou que a autora se casou com 18 ou 19 anos de idade; então saiu da casa dos pais. Posteriormente, separou-se e voltou a morar com os pais. Hoje não tá mais na casa dos pais (casou-se, novamente). A família da autora sempre viveu de agricultura e, ressaltando que a mãe dela e as irmãs ainda estão no mesmo lugar. Disse que a propriedade fica a 4 km da cidade.

Edenilson Dal Pizzol: disse que conhece a autora há 5 anos e que é casada com Gilceu. Afirmou que a autora trabalha com o esposo, na agricultora. Disse que não tem empregados e que não trabaha como diarista. Apontou que a propriedade fica a 7 km de Cacique, e que tem uma área de 12 hectares. Disse ser vizinho (do casal). Respondeu que produzem milho, soja, feijão e tudo que uma família necessita de miudezas.

Ivan Dal Pizzol: disse que conhece a autora há 5 anos. Afirnou que é casada com Gilceu e que trabalha com ela, a agricultura. Disse que a autora não trabalha de empregada e que não possui empregados. A propriedade onde atuam tem 12 hectates e fica a 7 km da cidade.

Na entrevista prestada durante o trâmite do processo administrativo, afirmou a autora que, desde criança, trabalhou na agricultura com seus pais, deixando de morar com eles somente quando se casou, em 1980. Disse que, entre 1995 e 1996, se separou e voltou a morar na casa de seus pais. Em momento posterior, conheceu Gilceu Angelo Julianotti, com quem veio a se casar em 2015, ressaltando que com ele já convivia nos 3 anos anteriores ao casamento. Disse, ainda, que, com Gilceu, trabalha na agricultura.

Os documentos acima enumerados, corroborados e complementados pela prova testemunhal, dão conta de que a autora é trabalhadora rural, na condição de segurado especial, por período superior à carência exigida para a obtenção do benefício de aposentadoria por idade rural.

O INSS se insurge, procurando desacreditar, em suma, que a autora tivesse retornado a viver e trabalhar com sua família de origem, alegando não haver documento que demarque esse retorno. Também destaca a ausência de prova de que teria convivido com Gilceu antes do casamento, ocorrido em 2015.

A autora nasceu em 1961. Relativamente ao primeiro período controverso, a prova documental restringe-se a uma nota fiscal, em nome de seu pai , emitida em 1979, e à matrícula de imóvel rural (adquirido por seu pai, em 1962). Contudo, estão corroborados e complementados por depoimentos das testemunhas, o que convence o suficiente para se concluir que a demandante atuou no labor campesino, com sua família, de 24.11.1973, quando compelou 12 anos de idade, até 8.3.1980, quando se casou pela primeira vez.

A autora afirma que a separação, de fato, teria ocorrido entre 1995 e 1996. O INSS não se insurge, propriamente, quanto ao momento da separação da autora, concentrando-se em desqualificar a afirmação de que teria retornado e prosseguido no exercício da atividade rural, com seu grupo familiar de origem.

No entano, além não ser uma situação estranha e fora da normalidade, as testemunhas dão conta, de forma convincente, de que a autora retornou a morar com os pais, tendo, nessa fase, prosseguido com o trabalho agrícola. Note-se que, embora o registro, na certidão de casamento, de que o trânsito em julgado da homologação de separação tenha se dado em 2003, sabe-se que esse tipo de dissolução, no plano fático, ocorrem antes da sua formalização em decisão judicial.

Assim, admissível que se reconheça que, de 1996 até meados de 2013, a autora tivesse trabalhado, na qualidade de segurada especial, em regime de economia familiar, juntamente com seus pais e irmãos. Esse período está alicerçado em robusta prova documental (notas fiscais em nome da mãe da autora e de suas irmãs e em harmônica e convincente prova testemunhal.

Posteriormente, a autora se casou novamente, em 2015, com Gilceu Angelo Julianotti. A sua afirmação de que, por alguns anos antes do casamento, já estaria convivendo maritalmente com Gilceu é razoável e sustentada em indício de prova documental.

O casamento em cartório se deu em 26.6.2015 e, na respectiva certidão, a autora está qualificada como agricultora. Ora, essa qualificação não pode restringir que, somente a partir daquela data, a autora passaria a ser agricultora. Pelo contrário. Informa que, naquele momento ou antes, durante as proclamas, ou em tempo mais remoto, ainda (como se evidencia), já era agricultora. Ou seja, revela uma situação já existente. Aliás, conforme já consignado em tópico anterior, o Superior Tribunal de Justiça reconhece efeitos probantes prospectivos e retrospectivos aos documentos que demonstram a qualidade de trabalhador rural, desde que amaprada por robusta prova testemunhal, o que é o caso. Além disso, a nota fiscal que documenta a comercialização de produtos rurais, emitida em 2015, em nome da autora e de Gilceu, refere-se a venda ocorrida em 8 de abril daquele ano; antes, portanto, do casamento em cartório, em junho do mesmo ano.

Ou seja, deve ser acolhida a alegação de que, desde 2013 ou 2014, a autora já convivia e trabalhava, na atividade rural, com Gilceu. A fixação de um ano ou outro, no caso, é irrelevante, tendo em conta que as testemunhas dão conta de que a autora saiu da casa de sua mãe para morar com Gilceu. Logo, não houve solução de continuidade, sendo relevante, apenas, a verificação de que, desde o momento em que a autora se separou do primeiro marido, em 1996, atuou de forma contínua na atividade rural, na qualidade de segurada especial, seja com sua família materna, num primeiro período, seja durante o convívio com Gilceu, num segundo momento, pelo menos, até 2017.

Com efeito, não procedem as alegações do apelante, devendo ser mantida a sentença quanto ao reconhecimento do direito ao benefício de aposentadoria rural à autora, desde a DER.

Correção monetária e juros

Correção monetária

Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE n. 870.947), a que se seguiu, o dos embargos de declaração da mesma decisão, rejeitados e com afirmação de inexistência de modulação de efeitos, deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece para as condenações judiciais de natureza previdenciária:

As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.

Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91)

Juros moratórios

Os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29 de junho de 2009. A partir de 30 de junho de 2009, os juros moratórios serão computados de forma equivalente aos aplicáveis à caderneta de poupança, conforme dispõe o art. 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.

Custas judiciais e despesas processuais

O INSS é isento do pagamento das custas na Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (art. 5º, inciso I, da Lei Estadual/RS nº 14.634/2014, que instituiu a Taxa Única de Serviços Judiciais). Contudo, a isenção não exime a autarquia previdenciária da obrigação de reembolsar eventuais despesas processuais, tais como a remuneração de peritos e assistentes técnicos e as despesas de condução de oficiais de justiça (art. 4º, inciso I e parágrafo único, Lei nº 9.289/96; art. 2º c/c art. 5º, ambos da Lei Estadual/RS nº 14.634/2014).

Essa regra deve ser observada mesmo no período anterior à Lei Estadual/RS nº 14.634/2014, diante da redação conferida pela Lei Estadual nº 13.471/2010 ao art. 11 da Lei Estadual nº 8.121/1985 e da declaração de inconstitucionalidade da norma estadual que dispensou as pessoas jurídicas de direito público do pagamento das despesas processuais (ADIN estadual nº 70038755864). Desse modo, subsiste a isenção apenas em relação às custas.

No que diz respeito ao preparo e ao porte de remessa e retorno, as autarquias estão isentas por força de norma isentiva do CPC (art. 1007, caput e §1º).

Honorários advocatícios

Na sentença, os honorários advocatícios foram fixados em 20% sobre as parcelas vencidas até a sentença.

No entanto, consideradas as disposições dos §§ 2º e 3º do art. 85 do CPC (aplicável à hipótese, já que a sentença recorrida foi publicada sob a sua vigência), não se verifica qualquer elemento a determinar que a verba honorária seja fixada em patamar superior a 10% sobre as parcelas vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111 do STJ; Súmula nº 76 desta Corte). Registre-se que esse percentual já engloba os honorários relativos à esfera recursal, consoante dispõe o art. 85, §11, do CPC.

Assim, merece ser provida a apelação, quanto a este tópico.

Implantação imediata do benefício

Considerando os termos do art. 497 do CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e o fato de que, em princípio, esta decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (TRF4, AC 2002.71.00.050349-7, Terceira Seção, Relator para Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007), o julgado deve ser cumprido imediatamente, observando-se o prazo de trinta dias úteis para a implantação do benefício postulado, observado o Tema 709 do STF.

Dispositivo

Em face do que foi dito, voto no sentido de não conhecer da remessa oficial, dar parcial provimento à apelação do INSS, para afastar a condenação ao pagamento das custas e para fixar a verba honorária em 10% sobre o valor correspondente às prestações vencidas até a sentença, e, de ofício, fixar os índices de correção monetária e juros de mora aplicáveis e determinar a implantação imediata do benefício.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001930121v50 e do código CRC 5f379f97.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 30/8/2020, às 10:33:54


5013832-75.2019.4.04.9999
40001930121.V50


Conferência de autenticidade emitida em 07/09/2020 04:01:01.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5013832-75.2019.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: ARILDE ZANCO DE SIQUEIRA JULIANOTTI

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA OFICIAL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. REQUISITOS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. CONSECTÁRIOS. CORREÇÃO MONETÁRIA. ISENÇÃO DE CUSTAS.

1. A remessa necessária não deve ser admitida quando se puder constatar que, a despeito da iliquidez da sentença, o proveito econômico obtido na causa será inferior a 1.000 (mil) salários (art. 496, § 3º, I, CPC) - situação em que se enquadram, invariavelmente, as ações destinadas à concessão ou ao restabelecimento de benefício previdenciário pelo Regime Geral de Previdência Social.

2. A concessão de aposentadoria rural por idade, disciplinada nos parágrafos do artigo 48 da Lei 8.212/91, está condicionada à demonstração do exercício de atividade rural em regime de economia familiar, como segurado especial, pelo período determinado em conformidade com a tabela progressiva constante no artigo 142 combinado com o artigo 143, ambos da Lei 8.213/1991, e o requisito idade, qual seja, 60 anos para homens e 55 para mulheres, não se exigindo prova do recolhimento de contribuições.

3. É legalmente indispensável a existência de início de prova material para a comprovação, mediante o depoimento de testemunhas, de tempo de atividade rural.

4. Considerada a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497, caput, do Código de Processo Civil, e tendo em vista que a decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, é imediato o cumprimento do acórdão quanto à implantação do benefício devido à parte autora, a ser efetivado em 30 (trinta) dias, observado o Tema 709 do STF.

5. Aplica-se o INPC para o fim de correção monetária do débito judicial após 30 de junho de 2009 (Tema nº 905 do Superior Tribunal de Justiça).

6. O INSS está isento do recolhimento das custas judiciais perante a Justiça Federal e perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, cabendo-lhe, todavia, suportar as despesas processuais.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, dar parcial provimento à apelação do INSS, para afastar a condenação ao pagamento das custas e para fixar a verba honorária em 10% sobre o valor correspondente às prestações vencidas até a sentença, e, de ofício, fixar os índices de correção monetária e juros de mora aplicáveis e determinar a implantação imediata do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 18 de agosto de 2020.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001930122v4 e do código CRC 0edc546d.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 30/8/2020, às 10:33:54


5013832-75.2019.4.04.9999
40001930122 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 07/09/2020 04:01:01.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 10/08/2020 A 18/08/2020

Apelação/Remessa Necessária Nº 5013832-75.2019.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PROCURADOR(A): JOSE OSMAR PUMES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: ARILDE ZANCO DE SIQUEIRA JULIANOTTI

ADVOGADO: ALEXANDRE LUIZ CALGAROTO (OAB RS103456)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/08/2020, às 00:00, a 18/08/2020, às 14:00, na sequência 263, disponibilizada no DE de 30/07/2020.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, PARA AFASTAR A CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DAS CUSTAS E PARA FIXAR A VERBA HONORÁRIA EM 10% SOBRE O VALOR CORRESPONDENTE ÀS PRESTAÇÕES VENCIDAS ATÉ A SENTENÇA, E, DE OFÍCIO, FIXAR OS ÍNDICES DE CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA APLICÁVEIS E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 07/09/2020 04:01:01.

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