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EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. REQUISITOS. REDISCUSSÃO: IMPOSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO. TRF4. 5003234-62.2020.4.04.7013...

Data da publicação: 09/03/2024, 07:01:41

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. REQUISITOS. REDISCUSSÃO: IMPOSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO. 1. Os embargos de declaração tem cabimento contra qualquer decisão e objetivam esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão e corrigir erro material. 2. O recurso é descabido quando busca meramente rediscutir, com intuito infringente, o mérito da ação, providência incompatível com a via eleita. 3. Consoante precedentes do TRF4, é notório que na atividade de mecânico, seja em oficinas automotivas ou em setores de manutenção mecânica de empresas, os trabalhadores estão expostos a produtos químicos, cada um com composição própria. Nesse sentido, seria, ademais, materialmente inviável que prova técnica apontasse a composição de cada "óleo ou graxa". O reconhecimento do labor nocivo, portanto, faz-se possível em razão da notoriedade do contato com os agentes químicos a que os mecânicos estão expostos. 4. Em face da discussão acerca do prequestionamento e considerando a disciplina do art. 1.025 do CPC/2015, os elementos que a parte suscitou nos embargos de declaração serão considerados como prequestionados mesmo com sua rejeição, desde que tribunal superior considere que houve erro, omissão, contradição ou obscuridade. (TRF4, AC 5003234-62.2020.4.04.7013, DÉCIMA TURMA, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 01/03/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

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EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Cível Nº 5003234-62.2020.4.04.7013/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

EMBARGANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de embargos de declaração opostos pelo INSS em face de acórdão desta Turma, cuja ementa tem o seguinte teor (unânime; juntado aos autos em 10/2023; eventos 5 e 6):

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS RECONHECIDAMENTE CANCERÍGENOS EM HUMANOS: APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEGISLAÇÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. FÓRMULA 85/95. CONCESSÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS.

1. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida.

2. Segundo orientação do TRF4 e, ainda, do Colendo Superior Tribunal de Justiça, pacificou o entendimento de que as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser havidas como distintas as atividades que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao trabalhador, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, e em condições especiais. Assim, mesmo que não haja previsão, atualmente, em decreto regulamentar, se comprovada a insalubridade do ambiente de trabalho pela exposição habitual e permanente a hidrocarbonetos, há o reconhecimento de atividade especial.

3. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição é ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional, consoante a pacífica jurisprudência deste Tribunal e, ainda, do Superior Tribunal de Justiça (v.g., fundamentos do decisum no julgamento do Tema 1.083/STJ).

4. Tratando-se de exposição a hidrocarbonetos, o contato com esses agentes é responsável por frequentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo, bem como problemas hepáticos, pulmonares e renais (nesse sentido: Apelação n° 0001699-27.2008.404.7104/RS, Relator Des. Federal Celso Kipper, DE 26/09/2011, unânime), razão pela qual o uso de EPI, no caso, não descaracteriza a especialidade do labor.

5. A comprovação de exposição do segurado a um dos agentes nocivos elencados como reconhecidamente cancerígenos no Anexo da Portaria Interministerial nº 09, de 07/10/2014, é suficiente ao reconhecimento da especialidade do respectivo labor. Nessa perspectiva, desimporta, para o reconhecimento da especialidade, que o período de labor seja anterior à alteração do art. 68 do Decreto nº 3.048/99, efetuada pelo Decreto 8.123, de 2013, ou mesmo da Portaria Interministerial nº 09, de 07/10/2014, porquanto é certo que o trabalhador já estava exposto a agente cancerígeno - com consequências nefastas à sua saúde - não podendo ser onerado pela demora na evolução científico-tecnológica a respeito da matéria. A atualização periódica das substâncias que ensejam o reconhecimento da atividade especial, editada por norma regulamentar, não se equipara à modulação de regimes jurídicos, os quais são implementados e alterados por lei em sentido formal, razão pela qual o reconhecimento retroativo da prejudicialidade da exposição a determinada substância, além de conferir primazia ao prejuízo sofrido pelo trabalhador, não viola o princípio tempus regit actum.

6. Comprovada a pontuação mínima necessária, a parte autora faz jus à concessão de aposentadoria comum, na forma do disposto no art. 29-C da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela MP nº 676/15, convertida na Lei nº 13.183/15, sem a incidência do fator previdenciário.

7. Verba honorária majorada em razão do comando inserto no § 11 do art. 85 do CPC/2015.

Defende o INSS, em síntese, que o acórdão é omisso, na medida em que não analisou as questões trazidas pela Autarquia Previdenciária na apelação, notadamente em relação à comprovação do tempo especial em relação aos períodos de labor de 05/05/1986 a 09/01/1987, 01/02/1987 a 12/05/1987, 01/04/1991 a 26/04/1994 e 01/10/1998 a 30/11/2016.

É o relatório.

VOTO

Conforme o disposto no art. 1.022 do CPC/2015, os embargos de declaração tem cabimento contra qualquer decisão e objetivam esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão e corrigir erro material. Além das hipóteses que a legislação pretérita já previa e também aquelas há muito tempo admitidas pela jurisprudência como exemplo do erro material, o novo Código de Processo Civil também autoriza a interposição de embargos de declaração contra a decisão que deixa de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos, em incidentes de assunção de competência, ou, ainda, em qualquer das hipóteses descritas no art. 489, § 1º.

A decisão obscura é aquela capaz de gerar dúvida quanto à posição manifestada pelo julgador, podendo ser interpretada de maneiras diferentes; contraditória, quando constam fundamentos ou proposições que se mostram inconciliáveis entre si, ou, então, a fundamentação e a parte dispositiva apresentam discordância; omissa quando deixa de apreciar ponto sobre o qual o juiz deveria se pronunciar de ofício ou a requerimento da parte.

Os embargos de declaração não visam à cassação ou substituição da decisão impugnada e, em razão disso, pode ser interposto por qualquer uma das partes, mesmo que vencedor na causa, mas desde que evidenciada alguma das hipóteses acima elencadas. Vale dizer, a rediscussão do mérito, caso seja a intenção da parte, deve ser veiculada por meio de recurso próprio. Isso porque nova apreciação de fatos e argumentos deduzidos, já analisados ou incapazes de infirmar as conclusões adotadas pelo julgador, consiste em objetivo que destoa da finalidade a que se destinam os embargos declaratórios.

Nesse sentido (grifei):

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. OBSCURIDADE, CONTRADIÇÃO, OMISSÃO (ART. 535 DO CPC) OU ERRO MATERIAL. INEXISTÊNCIA. EFEITOS INFRINGENTES. INCOMPATIBILIDADE. NATUREZA INTEGRATIVA DO RECURSO. EMBARGOS REJEITADOS. 1. Os embargos de declaração são inviáveis se a parte não demonstra a ocorrência de obscuridade, contradição ou omissão, a teor das disposições do art. 535 do CPC, ou ainda erro material no julgado. 2. Na hipótese em que o órgão colegiado, após extenso e expressivo debate entre seus integrantes, delibera por maioria dar provimento ao recurso com a apreciação das questões suscetíveis de cognição na instância especial e necessárias ao deslinde da controvérsia, sem que o acórdão tenha incorrido em vício, não cabe o oferecimento de embargos de declaração. 3. Quando a parte, a pretexto de sanar supostos vícios no decisum questionado, tem por objetivo promover o reexame de matéria já decidida, evidencia-se seu inconformismo com o resultado do julgamento da causa, o que não justifica o manuseio dos embargos de declaração, que, servindo para esclarecer ou aprimorar a decisão, não se prestam ao simples propósito de sua modificação, o que é incompatível com a natureza integrativa desse recurso. 4. Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no REsp 1428903/PE, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/03/2016, DJe 29/03/2016)

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO STF. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. CARÁTER INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. ACLARATÓRIOS ACOLHIDOS, EM PARTE, APENAS PARA AFASTAR A APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 83 DO STJ, SEM EFEITO INFRINGENTES. (...) 4. Os embargos de declaração constituem instrumento processual com o escopo de eliminar do julgamento obscuridade, contradição ou omissão sobre tema cujo pronunciamento se impunha pelo acórdão ou, ainda, de corrigir evidente erro material, servindo, dessa forma, como instrumento de aperfeiçoamento do julgado (CPC, art. 535). Não havendo omissão, obscuridade ou contradição, impõe-se a sua rejeição. 5. Embargos de declaração parcialmente acolhidos, sem efeitos infringentes. (EDcl no AgRg no AREsp 637.679/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/04/2015, DJe 06/05/2015)

De qualquer maneira, nada impede a atribuição de efeitos infringentes aos embargos de declaração para alterar o resultado da decisão impugnada, desde que caracterizado algum dos vícios que autorizam sua interposição (art. 1.023, § 2º, CPC/2015).

Adianto, não há a alegada omissão.

O acórdão embargado analisou a especialidade do labor em relação aos períodos controvertidos, in verbis:

AGENTES NOCIVOS RECONHECIDAMENTE CANCERÍGENOS EM HUMANOS

A redação atual do art. 68 do Decreto nº 3.048/99 prevê (grifei):

Art. 68. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, considerados para fins de concessão de aposentadoria especial, consta do Anexo IV. (...) § 4º. A presença no ambiente de trabalho, com possibilidade de exposição a ser apurada na forma dos §§ 2º e 3º, de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será suficiente para a comprovação de efetiva exposição do trabalhador. (Redação dada pelo Decreto nº 8.123, de 2013)

Já o parágrafo único do art. 284 da Instrução Normativa nº 77/2015 do INSS, dispõe (grifei):

Art. 284. (...)

Parágrafo único. Para caracterização de períodos com exposição aos agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados na Portaria Interministerial n° 9 de 07 de outubro de 2014, Grupo 1 que possuem CAS e que estejam listados no Anexo IV do Decreto nº 3.048, de 1999, será adotado o critério qualitativo, não sendo considerados na avaliação os equipamentos de proteção coletiva e ou individual, uma vez que os mesmos não são suficientes para elidir a exposição a esses agentes, conforme parecer técnico da FUNDACENTRO, de 13 de julho de 2010 e alteração do § 4° do art. 68 do Decreto nº 3.048, de 1999.

Dentre os agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos, constantes do Anexo da Portaria Interministerial nº 09 (Ministérios do Trabalho e Emprego, Ministério da Saúde e Ministério da Previdência Social), de 07/10/2014, encontram-se os seguintes: Acetaldeído associado com o consumo de bebidas alcoólicas;ácido aristólico; ácido aristólico (plantas que o contém); Ácidos Mistos, Inorgânicos Fortes; Aflatoxinas; Alcool isopropílico (manufatura usando ácidos fortes); Alumínio (produção de); 4-Aminobifenila; Arsênio e compostos inorgânicos de arsênio; Asbestos ou amianto (todas as formas, inclusive actinolita, amosita, antofilita, crisotila, crocidolita, tremolita - nota: Substâncias minerais, a exemplo do talco ou vermiculita, que contenham amianto também devem ser considerados como cancerígeno para os seres humanos); Auramina, produção de; Azatioprina; Bebidas Alcóolicas; Benzeno; Benzidina; Benzo[a]pireno; Berílio e seus compostos; Bifenis policlorados; Bifenis policlorados, 'dioxin-like' ('tipo dioxina' ou 'do grupo das dioxinas'); Borracha, indústria de transformação da; Breu de alcatrão de hulha; Bussulfano; 1,3 Butadieno; Cádmio e compostos de cádmio; Ciclofosfamida; Ciclosporina; Clonorchis sinensis, Infecção com; Clorambucil; Cloreto de vinila; Clornafazina; Compostos de cromo (VI); Compostos de níquel; Coque (produção de); Corantes que liberam benzidina no metabolismo; Destilação do alcatrão de hulha; Dietilestilbestrol; Emissões em ambiente fechado na combustão doméstica do carvão; Erionita; Éter bis (clorometílico); éter metílico de clorometila; Etoposide; Etoposide em associação com cisplatina e bleomicina; Exaustão do motor diesel; Fenacetina; Formaldeído; Fósforo 32, como fosfato; Fuligem (como os encontrados na exposição ocupacional dos limpadores de chaminés); Fundição de ferro e aço (exposição ocupacional em), Gaseificação de carvão; Gás Mostarda; Hematita (mineração subterrânea); Magenta (produção de); Material particulado na poluição do ar; Melfalano; Metoxsalen associado com radiação ultravioleta A; 4,4'-Metileno bis (2-cloroanilina) (MOCA); MOPP e outros agentes quimioterápicos, inclusive agentes alquilantes; 2 -Naftilamina; N'-nitrosonornicotina (NNN) e 4-. (metilnitrosamino)-1-(3-piridil)1-butano; Noz de Areca (misturada, ou não, com tabaco); Óleos de xisto; Óleos minerais (não tratados ou pouco tratados); Óxido de Etileno; 3, 4, 5, 3´, 4' - Pentaclorobifenil (PCB - 126); 2 ,3 ,4 ,7 , 8 - Pentaclorodibenzofurano; Pintor (exposição ocupacional como pintor); Plutônio; Poeira de couro; Poeira de madeira; Poeira de sílica (cristalina, em forma de quartzo ou cristobalita); Poluição do Ar; Poluição do ar em partículas; Produtos de fissão, inclusive estrôncio-90; Radiação de Nêutrons; Radiação Ionizante (todos os tipos); Radiação Solar; Radiação ultravioleta emitida por dispositivos de bronzeamento; Radiações X e gama; Rádio-224 e seus produtos de decaimento; Rádio-226 e seus produtos de decaimento; Rádio-228 e seus produtos de decaimento; Radioiodos, incluindo o iodo-131; Radionuclídeos, emissores de partículas alfa, internamente depositados; Radionuclídeos, emissores de partículas beta, internamente depositados; Radônio-222 e seus produtos de decaimento; Semustina [1-(2 -cloroetil) -3-(4-metilciclohexil)-1-nitrosourea, Metil CC-NU]; Tamoxifeno; 2, 3, 7, 8 - Tetraclorodibenzo - para - dioxina; Tiotepa; orto-Toluidina; Treosulfano, Tricloroetileno; Tório-232 e seus produtos de decaimento.

Em resumo, uma vez comprovada a exposição do segurado a um dos agentes nocivos elencados como reconhecidamente cancerígenos no Anexo da Portaria Interministerial nº 09, de 07/10/2014, deve ser reconhecida a especialidade do respectivo período, sendo irrelevante o uso de EPI ou EPC. Nesse sentido: Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (Seção) nº 5054341-77.2016.4.04.0000/SC, IRDR 15, Relator para o acórdão Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE, maioria, juntado aos autos em 11/12/2017).

Sinale-se que desimporta, para o reconhecimento da especialidade, que o período de labor seja anterior à alteração do art. 68 do Decreto nº 3.048/99, efetuada pelo Decreto 8.123, de 2013, ou mesmo da Portaria Interministerial nº 09, de 07/10/2014, porquanto é certo que o trabalhador já estava exposto a agente cancerígeno - com consequências nefastas à sua saúde - não podendo ser onerado pela demora na evolução científico-tecnológica a respeito da matéria.

No caso, o reconhecimento da norma quanto à toxicidade da substância tem caráter simplesmente declaratório, pois admite que os anos em que o segurado estevera exposto à substância cancerígena provocaram-lhe danos à saúde. Assim, não há que se falar em violação do princípio tempus regit actum, já que o brocardo é aplicável aos casos nos quais a norma fundamenta e constitui novos regimes jurídicos, o que não é o caso. Nesse sentido, precedente da Turma: TRF4, AC 5015959-22.2020.4.04.7001, DÉCIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 24/05/2023.

Note-se que o regime jurídico que fundamenta o reconhecimento da atividade especial já existia, sendo irrelevante que o enquadramento da substância como tóxica tenha ocorrido posteriormente, uma vez que este reconhecimento resulta de norma complementar de cunho meramente regulamentar, que se atualiza constantemente conforme os novos resultados de pesquisas científicas, consoante preconiza o próprio Regulamento da Previdência Social (art. 68, § 1º, Decreto nº 3.048/99).

Ademais, ao julgar o Tema 170, a TNU fixou a tese de que os agentes cancerígenos arrolados na LINACH 1 (Grupo 1) pela Portaria Interministerial MTE/MS/MPS n.º 09/2014 tornam a atividade especial nos ambientes de trabalho em que estão presentes, sendo a análise da exposição qualitativa, não existindo EPI eficiente nesses casos, bem como que essa alteração se aplica a qualquer período de trabalho, ainda que anterior à publicação da Portaria. Julgado em 17/08/2018, acórdão publicado em 23/08/2018.

EXAME DO TEMPO ESPECIAL NO CASO CONCRETO

Adoto, no ponto, os próprios fundamentos da sentença como razões de decidir, in verbis:

II.3.2.1. Caso concreto

Ao julgar em definitivo o IRDR nº 15 (autos 50543417720164040000), o TRF desta 4ª Região estabeleceu um "roteiro resumido" definindo o passo a passo obrigatório para aferição da (in)salubridade do ambiente laboral. Esse "roteiro" previu hipóteses de dispensa de perícia para apuração de eficácia do EPI em casos em que sua ineficácia é reconhecida -- vale dizer, em casos de análise qualitativa do agente nocivo, nos quais a mera exposição do trabalhador já traz riscos à sua saúde, sabidamente não afastados pela utilização do equipamento de proteção.

Dentre as hipóteses, taxativas, encontram-se: i) ruído, ii) agentes biológicos, iii) agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos, tais como asbesto (amianto) e benzeno, iv) periculosidade, tal qual a eletricidade e risco de confronto iminente (vigilante), v) calor, vi) radiações ionizantes, vii) trabalhos sob condições hiperbáricas, trabalhos sob ar comprimido.

Assim, basta a prova da efetiva exposição a tais agentes a fim de que se possa reconhecer a insalubridade, afigurando-se despicienda a discussão relativa ao EPI.

No caso concreto, controvertem-se as partes acerca da especialidade do(s) seguinte(s) período(s): 05/05/1986 a 09/01/1987, 01/02/1987 a 12/05/1987, 01/04/1991 a 26/04/1994 e 01/10/1998 a 30/11/2016.

Devido ao encerramento das atividades empresariais dos empregadores, a profissiografia dos cargos exercidos foi esclarecida em audiência.

Em depoimento pessoal o autor esclareceu que, como soldador para Tetsua Inque e Irmão Ltda/Tiil Indústria de Auto Peças Ltda, de 05/05/1986 a 09/01/1987 utilizava solda a ponto o dia todo, montando peças automotivas, utilizando máscara, luvas e botas, apenas. Não trabalha exposto a ruídos elevados ou poeira. Já na Araucária S/A Indústria de Veículos de 01/02/1987 a 12/05/1987 utilizava solda MIG e, eventualmente, auxiliava os colegas na montagem de veículos. Em seguida, na Itapediesel Eletro Peças Ltda ingressou em 01/04/1991 como ajudante na seção de retífica e montagem de motores, valendo-se de óleos, graxas e querosene, sem uso de soldas neste local. O contato com os citados produtos químicos era contínuo. A despeito da diferença de nomenclatura dos cargos, a função era a mesma como mecânico da empresa entre 01/10/1998 a 30/11/2016. Finalmente, disse que não era ambiente ruidoso ou empoeirado (evento 69, DOC2).

Euclídes Dias, primeiro depoente, foi companheiro de trabalho na Itapediesel e confirmou o trabalho como auxiliar e mecânico do autor, com manipulação de óleo diesel e outros químicos para limpeza das peças. Esclareceu que o empregador por vezes não registrava a função correta em CTPS (evento 69, DOC3). Tudo foi corroborado por Juscelino Gomes (evento 69, DOC4)

Conquanto a atividade de soldador não tenha sido atestada pelos depoentos, está devidamente comprovada pela CTPS. Assim sendo, considerando que o laudo técnico anexado como prova por similaridade no ev. 40 é contundente quanto à efetiva exposição a radiação não ionizante no processo de soldagem, outra sorte não há senão reconhecer a insalubridade dos intervalos 05/05/1986 a 09/01/1987 e 01/02/1987 a 12/05/1987.

Do mesmo modo, porque comprovada a atividade relacionada à mecânica automotiva, com manipulação de hidrocarbonetos como óleos, graxas, querosene e solupan indissociáveis das atribuições típicas, a insalubridade por risco químico, nos períodos 01/04/1991 a 26/04/1994 e 01/10/1998 a 30/11/2016, na forma do código 1.2.10 do Anexo I do Decreto 83.080/79, também comporta acolhimento.

Na forma da fundamentação supra, merece ser corretamente interpretado o conceito de habitualidade e permanência. Tenho que a habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição é ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional, consoante a pacífica jurisprudência deste Tribunal e, ainda, do Superior Tribunal de Justiça (v.g., fundamentos do decisum no julgamento do Tema 1.083/STJ).

Consoante orientação desta Corte e, ainda, do Colendo Superior Tribunal de Justiça, pacificou o entendimento de que as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser havidas como distintas as atividades que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao trabalhador, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, e em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991). Nesse sentido, decisão da 1ª Seção do STJ: REsp 1306113/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, julgado em 14/11/2012, DJe 07/03/2013.

Assim, mesmo que não haja previsão, atualmente, em decreto regulamentar, se comprovada a insalubridade do ambiente de trabalho pela exposição habitual e permanente a hidrocarbonetos, há o reconhecimento de atividade especial, consoante pacífica jurisprudência deste TRF4.

Nesse sentido, "os hidrocarbonetos constituem agente químico nocivo (Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080/1979, o Anexo IV do Decreto nº 2.172/1997 e o Anexo IV do Decreto nº 3.048/99 - códigos 1.2.11, 1.2.10; 1.0.3, 1.017 e 1.0.19, respectivamente), de modo que a atividade exercida sob a sua exposição habitual e permanente goza de especialidade" (TRF4 5024866-96.2014.4.04.7000/PR, minha relatoria, unânime, julgado em 01/08/2018, unânime).

A exigência relativa à necessidade de explicitação da composição e concentração dos agentes químicos a que o segurado estava exposto não encontra respaldo na legislação previdenciária, a qual reconhece a especialidade do labor quando existe contato com agentes químicos nocivos à saúde, elencados na legislação de regência. Nesse sentido: Embargos Infringentes nº 5004090-13.2012.404.7108, 3ª Seção, Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, por unanimidade, juntado aos autos em 06/12/2013.

Ainda no tocante à necessidade de análise quantitativa dos agentes químicos, a Norma Regulamentadora n.º 15 (NR-15), do Ministério do Trabalho, somente é aplicável a partir de 03/12/1998, data da publicação da MP n.º 1.729, convertida na Lei 9.732/1998, quando a redação do artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/1991 passou a incluir a expressão "nos termos da legislação trabalhista". Também o Decreto nº 3.265/99, de 29/11/1999, modificou o item 1.0.0 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, passando a prever que o agente químico é nocivo quando apresenta "nível de concentração superior aos limites de tolerância estabelecidos."

Contudo, mesmo após essas alterações, é dispensável o exame da concentração do agente químico (análise quantitativa) para as substâncias arroladas no Anexo 13 da NR-15, em relação às quais é suficiente a avaliação qualitativa de risco. Isso porque a própria norma regulamentadora dispensa, em relação a esses agentes químicos, a análise quantitativa, a qual fica reservada aos agentes arrolados no Anexo 11. Essa distinção é inclusive reconhecida administrativamente pelo INSS, que a incorporou à Instrução Normativa nº 45/2010 (art. 236, § 1º, I) e à Instrução Normativa nº 77/2015 (art. 278, § 1º).

Ademais, tratando-se de agentes químicos como hidrocarbonetos aromáticos, o contato com esses agentes é responsável por frequentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo, bem como problemas hepáticos, pulmonares e renais (nesse sentido: Apelação n° 0001699-27.2008.404.7104/RS, Relator Des. Federal Celso Kipper, DE 26/09/2011, unânime), razão pela qual o uso de EPI, nesses casos, não afasta o labor nocivo.

Nego, pois, provimento à apelação do INSS no ponto.

Consoante precedentes do TRF4, é notório que na atividade de mecânico, seja em oficinas automotivas ou em setores de manutenção mecânica de empresas, os trabalhadores estão expostos a produtos químicos, cada um com composição própria. Nesse sentido, seria, ademais, materialmente inviável que prova técnica apontasse a composição de cada "óleo ou graxa". O reconhecimento do labor nocivo, portanto, faz-se possível em razão da notoriedade do contato com os agentes químicos a que os mecânicos estão expostos.

Já com relação à exposição à radiação não ionizante, além da prova testemunhal, houve a produção de prova documental, laudo por similaridade.

Ou seja, em relação a tais questões, o INSS na realidade busca a rediscussão do julgado, o que se mostra inviável em sede de embargos de declaração. O STJ vem decidindo no sentido do descabimento de embargos de declaração interpostos com objetivo de rediscutir a causa já devidamente decidida.

Rejeito os EDs.

Ademais, em face da discussão acerca do prequestionamento e considerando a disciplina do art. 1.025 do CPC/2015, os elementos que a parte suscitou nos embargos de declaração serão considerados como prequestionados mesmo com sua rejeição, desde que tribunal superior considere que houve erro, omissão, contradição ou obscuridade.

Ante o exposto, voto por negar provimento aos embargos de declaração.



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40004333017.V4


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

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EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Cível Nº 5003234-62.2020.4.04.7013/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

EMBARGANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. REQUISITOS. REDISCUSSÃO: IMPOSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO.

1. Os embargos de declaração tem cabimento contra qualquer decisão e objetivam esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão e corrigir erro material.

2. O recurso é descabido quando busca meramente rediscutir, com intuito infringente, o mérito da ação, providência incompatível com a via eleita.

3. Consoante precedentes do TRF4, é notório que na atividade de mecânico, seja em oficinas automotivas ou em setores de manutenção mecânica de empresas, os trabalhadores estão expostos a produtos químicos, cada um com composição própria. Nesse sentido, seria, ademais, materialmente inviável que prova técnica apontasse a composição de cada "óleo ou graxa". O reconhecimento do labor nocivo, portanto, faz-se possível em razão da notoriedade do contato com os agentes químicos a que os mecânicos estão expostos.

4. Em face da discussão acerca do prequestionamento e considerando a disciplina do art. 1.025 do CPC/2015, os elementos que a parte suscitou nos embargos de declaração serão considerados como prequestionados mesmo com sua rejeição, desde que tribunal superior considere que houve erro, omissão, contradição ou obscuridade.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento aos embargos de declaração, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 27 de fevereiro de 2024.



Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004333018v3 e do código CRC 427da4e7.Informações adicionais da assinatura:
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5003234-62.2020.4.04.7013
40004333018 .V3


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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/02/2024 A 27/02/2024

Apelação Cível Nº 5003234-62.2020.4.04.7013/PR

INCIDENTE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A): RODOLFO MARTINS KRIEGER

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: JOAO LEITE GONCALVES (AUTOR)

ADVOGADO(A): ALISSON LUCAS DE MIRANDA SANCHES (OAB PR074676)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/02/2024, às 00:00, a 27/02/2024, às 16:00, na sequência 198, disponibilizada no DE de 07/02/2024.

Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA



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