Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA. TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR À LEI Nº 8. 213/1991. REGIME DE ECONOMIA F...

Data da publicação: 05/09/2020, 15:01:09

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA. TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR À LEI Nº 8.213/1991. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. 1. A remessa necessária não deve ser admitida quando se puder constatar que, a despeito da iliquidez da sentença, o proveito econômico obtido na causa será inferior a 1.000 (mil) salários (art. 496, § 3º, I, CPC) - situação em que se enquadram, invariavelmente, as ações destinadas à concessão ou ao restabelecimento de benefício previdenciário pelo Regime Geral de Previdência Social. 2. O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de vigência da Lei nº 8.213/1991, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência. 3. Admite-se a ampliação da eficácia probatória do início de prova material, para atingir período anterior ou posterior àquele pertinente aos documentos apresentados, desde que seja complementado por convincente prova testemunhal. 4. Mesmo após o matrimônio, os documentos em nome de familiares podem ser considerados como início de prova material, se a atividade rural continuou a ser exercida na mesma propriedade em regime de economia familiar. 5. Não se descaracteriza a condição de segurado especial dos demais integrantes do grupo familiar, quando as circunstâncias do caso concreto indicam que a renda percebida por um dos membros da família que exerça atividade urbana é insuficiente para o sustento de toda a família (Tema nº 532 do Superior Tribunal de Justiça). 6. Nas ações previdenciárias, após 30 de junho de 2009, aplica-se o INPC como índice de correção monetária e incide a taxa de juros da caderneta de poupança (Tema nº 905 do Superior Tribunal de Justiça). (TRF4 5031649-89.2018.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 28/08/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5031649-89.2018.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: ALECENI ROSA LAUCSEN SANTINI

ADVOGADO: MARLOVE BENEDETTI PIMENTEL (OAB RS066616)

ADVOGADO: TÂNIA MARIA PIMENTEL (OAB RS034093)

RELATÓRIO

A sentença proferida na ação ajuizada por Aleceni Rosa Laucsen Santini contra o INSS julgou procedente o pedido, para o fim de condenar o réu a: a) reconhecer o tempo de serviço rural no período de 02-02-1973 a 31-12-1977; b) conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a data do requerimento administrativo (25-06-2014); c) pagar as prestações atrasadas com atualização monetária pela variação do IGP-DI, a partir do vencimento de cada parcela, e juros de mora de 1% ao mês a contar da citação. O INSS foi condenado ainda ao pagamento de honorários advocatícios, em percentual a ser fixado por ocasião da liquidação da sentença.

O INSS interpôs apelação. Alegou que o parco início de prova material apresentado não comprova o exercício de atividade rural, pois não existe um único documento que evidencie a comercialização da produção rural. Ponderou que a declaração do sindicato de trabalhadores rurais não atende aos requisitos legais e não está embasada em início de prova material consistente. Pontuou que o marido da autora afirmou que trabalhava em atividade urbana desde o ano de 1972, conforme salientou a sentença proferida na ação citada, de modo que o início de prova material em seu nome não pode ser aproveitado pela autora. Salientou ainda que o marido da autora recolheu contribuições à Previdência Urbana a partir de julho de 1976, requereu a baixa da inscrição no Sindicato de Trabalhadores Rurais de Lagoa Vermelha em 10 de janeiro de 1977 e foi qualificado como motorista em 7 de julho de 1977. Preconizou o cálculo dos juros de mora com base na taxa de juros da caderneta de poupança.

A parte autora ofereceu contrarrazões.

A sentença foi publicada em 29 de maio de 2018.

VOTO

Não conhecimento da remessa necessária

No caso dos autos, a sentença foi proferida após 18 de março de 2016, quando entrou em vigor o novo CPC (Lei nº 13.105/2015). O art. 496, § 3º, do CPC atual, ao tratar da remessa necessária, dispõe:

§ 3º Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:

I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;

II - 500 (quinhentos) salários-mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados;

III - 100 (cem) salários-mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autarquias e fundações de direito público.

Conforme o artigo 29, §2º, da Lei nº 8.213/1991, o valor do salário de benefício não será inferior ao de um salário mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário de contribuição na data de início do benefício.

De acordo com a Portaria do Ministério da Fazenda nº 15, de 16 de janeiro de 2018, o valor máximo do salário de benefício e do salário de contribuição, a partir de 1º de janeiro de 2018, é de R$ 5.645,80 (cinco mil seiscentos e quarenta e cinco reais e oitenta centavos).

Em ações de natureza previdenciária, o valor da condenação ou do proveito econômico à parte, com correção monetária e juros de mora, em nenhuma situação alcançará o valor de 1.000 (um mil) salários mínimos. É o que se dá mesmo na hipótese em que a renda mensal inicial (RMI) do benefício previdenciário deferido seja fixada no valor máximo (teto) e bem assim seja reconhecido o direito do beneficiário à percepção de parcelas em atraso, a partir daquelas correspondentes a 5 (cinco) anos que antecedem a propositura da ação (art. 103, parágrafo único da Lei nº 8.213/91).

No âmbito do Superior Tribunal de Justiça há entendimento sedimentado no sentido de que a sentença ilíquida está sujeita a reexame necessário (Súmula 490). No entanto, importa atentar que a premissa para afastar a remessa necessária é a certeza de que o valor da condenação ou o proveito econômico não ultrapassa o limite de 1.000 salários mínimos. Ora, se é certo que o valor da condenação ou o proveito econômico não atingirá o teto que determina a sujeição ao reexame necessário, a despeito de a sentença ser ilíquida, não há fundamento a amparar a aplicação da Súmula nº 490 do STJ.

Por outro lado, a questão submetida a julgamento no recurso especial representativo de controvérsia (REsp 1.101.727/PR) refere-se ao não conhecimento de reexame necessário, no caso em que o valor da causa é tomado como parâmetro para aplicação do art. 475, § 2º, do CPC de 1973. Eis a redação da tese firmada no Tema nº 17 do Superior Tribunal de Justiça: A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.

Uma vez que a orientação fixada no Tema nº 17 do STJ menciona expressamente o valor da condenação ou do direito controvertido inferior a sessenta salários mínimos, depreende-se que o acórdão proferido em recurso especial repetitivo é aplicável apenas às sentenças proferidas sob a égide do antigo CPC. Desse modo, não se trata de precedente a ser observado pelo Tribunal, nos termos do art. 927, inciso III e IV, do CPC, pois a sentença foi prolatada quando estava em vigor o art. 496, § 2º, do novo CPC.

Assim, no presente caso, não se pode fazer projeção alguma de montante exigível que legalmente releve a decisão proferida a reexame necessário.

Nesse contexto, a remessa oficial não deve ser conhecida.

Tempo de serviço rural anterior à Lei nº 8.213/1991

Segundo o art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência da Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência. Ainda que o marco final estabelecido seja a entrada em vigor da Lei nº 8.213/1991, o Decreto nº 3.048/1999, no art. 127, inciso V, estendeu a possibilidade de aproveitamento do tempo rural até 31/10/1991.

O legislador ordinário não concedeu uma benesse aos trabalhadores rurais, ao permitir o cômputo de serviço anterior à Lei nº 8.213/1991, mesmo sem o recolhimento de contribuições previdenciárias; apenas concretizou a norma do art. 194, parágrafo único, inciso II, da Constituição de 1988, que assegurou a uniformidade e a equivalência dos benefícios e serviços aos trabalhadores urbanos e rurais. No regime anterior à Lei nº 8.213/1991, os trabalhadores rurais contavam somente com o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL) instituído pela Lei Complementar nº 11/1971. Os beneficiários do PRORURAL, além do trabalhador rural que exercia a atividade individualmente ou em regime de economia familiar, eram o empregado rural (contratado por produtor rural pessoa física ou jurídica), o avulso rural (contratado mediante a intermediação de sindicato ou órgão gestor de mão de obra) e o trabalhador rural eventual (volante, diarista ou boia-fria). Os benefícios oferecidos pelo PRORURAL não requeriam o pagamento de contribuições, porém eram limitados e tipicamente assistenciais, não prevendo a aposentadoria por tempo de serviço. A regra do art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, assim, objetiva conciliar a substancial diferença entre o velho e o novo regime previdenciário, no tocante à contagem de tempo de serviço.

Além de todos os beneficiários do antigo PRORURAL, o art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, abarca os membros do grupo familiar, visto que o art. 11, inciso VII, da Lei de Benefícios, define como segurado especial não só o produtor rural que exerce suas atividades individualmente ou em regime de economia familiar, mas também o cônjuge ou companheiro e filhos maiores de dezesseis anos ou a ele equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo.

A idade mínima de dezesseis anos referida no art. 11, inciso VII, da Lei de Benefícios, considera a redação do art. 7º, inciso XXXIII, da Constituição, dada pela Emenda Constitucional nº 20/1998. Em relação ao período anterior à Lei nº 8.213/1991, a jurisprudência admite o reconhecimento da atividade rural exercida por menor a partir dos doze anos, pois as normas que proíbem o trabalho do menor foram editadas para protegê-lo e não para não prejudicá-lo. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ampara esse entendimento:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADORA RURAL. MENOR DE 16 ANOS DE IDADE. CONCESSÃO DE SALÁRIO-MATERNIDADE. ART. 7º, XXXVIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NORMA PROTETIVA QUE NÃO PODE PRIVAR DIREITOS. PRECEDENTES. Nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o art. 7º, XXXIII, da Constituição “não pode ser interpretado em prejuízo da criança ou adolescente que exerce atividade laboral, haja vista que a regra constitucional foi criada para a proteção e defesa dos trabalhadores, não podendo ser utilizada para privá-los dos seus direitos” (RE 537.040, Rel. Min. Dias Toffoli). Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 600616 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 26/08/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-175 DIVULG 09-09-2014 PUBLIC 10-09-2014)

Para a comprovação do tempo de atividade rural, o art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, exige início de prova material, não aceitando prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito. A legalidade da norma é corroborada pela jurisprudência do STJ, consoante a Súmula nº 149: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário. Em julgado mais recente, apreciado sob a sistemática dos recursos repetitivos, o STJ reafirmou o entendimento no Tema nº 297 (REsp 1133863/RN, 3ª Seção, Rel. Ministro Celso Limongi, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).

Entende-se que a tarifação da prova imposta pelo art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios, dirige-se apenas à prova exclusivamente testemunhal. Portanto, o início de prova material não está restrito ao rol de documentos contido no art. 106 da Lei nº 8.213/1991, cujo caráter é meramente exemplificativo. Qualquer meio material que evidencie a ocorrência de um fato, aceito no processo judicial, é hábil à demonstração do exercício da atividade rural. Dessa forma, os documentos públicos nos quais consta a qualificação do declarante como agricultor possuem o mesmo valor probante dos meios de prova previstos na Lei nº 8.213/1991, sobretudo quando forem contemporâneos do período requerido. Assim, representam início de prova material as certidões de casamento, nascimento, alistamento no serviço militar, do registro de imóveis e do INCRA, escritura de propriedade rural, histórico escolar, declaração da Secretaria de Educação, entre outros documentos públicos.

Desde que os elementos documentais evidenciem o exercício do trabalho rural, não é necessário que se refiram a todo o período, ano por ano. A informalidade do trabalho no campo justifica a mitigação da exigência de prova documental, presumindo-se a continuidade do exercício da atividade rurícola, até porque ocorre normalmente a migração do meio rural para o urbano e não o inverso. A jurisprudência vem relativizando o requisito de contemporaneidade, admitindo a ampliação da eficácia probatória do início de prova material, tanto de forma retrospectiva como prospectiva, com base em firme prova testemunhal. Assim, não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de atividade rural, desde que as lacunas na prova documental sejam supridas pela prova testemunhal. Nesse sentido, estabelece o Tema nº 638 do STJ:

Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório. (REsp 1348633 SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2013, DJe 05/12/2014)

Os documentos em nome de terceiros, integrantes do mesmo grupo familiar, sobretudo pais ou cônjuge, são aceitos como início de prova material. O art. 11, § 1º, do art. 11 da Lei de Benefícios, define o regime de economia familiar como aquele em que os membros da família exercem em condições de mútua dependência e colaboração. Na sociedade rural, geralmente os atos negociais são formalizados em nome do chefe de família, função exercida pelo genitor ou cônjuge masculino. Na Súmula nº 73, este Tribunal preceitua: Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.

O membro de grupo familiar que exerça outra atividade enquadrada no regime geral de previdência social ou em outro regime, mesmo que continue trabalhando nas lides rurais, perde a qualidade de segurado especial, conforme dispõe o art. 11, § 9º, da Lei nº 8.213/1991, incluído pela Lei nº 11.718/2008.

O exercício de atividade urbana por um dos integrantes da família repercute em dois aspectos: a caracterização do regime de economia familiar e a comprovação do exercício da atividade rural pelos demais membros do grupo familiar.

Entende-se que, se ficar comprovado que a remuneração proveniente da atividade urbana de um dos membros da família é apenas complementar e a principal fonte de subsistência do grupo familiar continua sendo a atividade rural, não se descaracteriza a condição de segurado especial do outro cônjuge ou dos demais integrantes da família. Contudo, se as provas materiais do labor rural estão em nome do membro do grupo familiar que não ostenta a qualidade de segurado especial, por possuir fonte de renda derivada de atividade urbana, não é possível aproveitar o início de prova material para os demais membros da família.

A matéria já foi enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça, em recurso representativo da controvérsia (REsp 1304479/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012), e resultou nas seguintes teses:

Tema nº 532: O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).

Tema nº 533: Em exceção à regra geral (...), a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.

Em suma, o exercício da atividade rural no período anterior à Lei nº 8.213/1991 pode ser comprovado por qualquer meio documental idôneo que propicie a formação de convencimento do julgador, não se exigindo a demonstração exaustiva dos fatos por todo o período requerido. O sistema de persuasão racional permite a livre valoração das provas, mas impõe ao juízo que examine a qualidade e a força probante do acervo colhido no processo, com base nas normas legais, motivando, assim, as razões pelas quais entendeu ou não comprovados os fatos. Dessa forma, a prova oral representa importante subsídio complementar ao início de prova material, devendo formar um conjunto probatório firme e coerente, sem indício de desempenho de atividade laboral urbana no período.

Caso concreto

A controvérsia diz respeito ao exercício de atividade rural pela parte autora no período de 02-02-1973 a 31-12-1977.

A título de início de prova material, foram juntados aos autos os seguintes documentos (evento 3, anexospet3):

a) certidão do Registro de Imóveis de Lagoa Vermelha, referente à transmissão de imóvel rural, na data de 7 de maio de 1971, na qual consta que a autora é proprietária da parte ideal de 6 hectares;

b) matrícula no Registro de Imóveis de Lagoa Vermelha, aberta em 9 de maio de 1977, relativa ao imóvel transmitido anteriormente, com área de 42 hectares, na qual consta que a autora é proprietária da parte ideal de 6 hectares;

c) ficha de filiação do marido da autora no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Lagoa Vermelha, com data de admissão em 2 de janeiro de 1973 e baixa em 10 de janeiro de 1977;

d) certidão de casamento da autora, na data de 21 de fevereiro de 1973, constando a qualificação do marido como agricultor;

e) certidão de nascimento do filho da autora, em 24 de outubro de 1973, constando a qualificação do pai como agricultor;

f) certidão de nascimento da filha da autora, em 28 de junho de 1977, na qual o pai é qualificado como motorista;

g) declaração de exercício de atividade rural firmada pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Lagoa Vermelha e Capão Bonito do Sul.

Na audiência judicial, foram ouvidas duas testemunhas.

A testemunha Juraci Franciso Trevisan afirmou que conheceu a autora na localidade de Sítio do Herval, desde criança; a família da autora trabalhava na agricultura; a autora casou com Francisco Santini e continuou morando na propriedade dos pais por mais dez anos, mais ou menos; a autora morava em uma casa separada, construída em uma área cedida pelo pai, que tinha 5 ou 6 hectares; após o casamento a autora permaneceu trabalhando na agricultura; é certo que a autora ficou na atividade rural até por volta de 1980, quando a testemunha saiu da localidade; o marido da autora trabalhou em uma fazenda como empregado, o serviço era cuidar do gado; a fazenda ficava distante mais ou menos 4 quilômetros; a autora continuou na lavoura, ela trabalhava sozinha, o marido ajudava um pouco; a autora plantava milho, arroz, feijão; ela não tinha empregados, às vezes algum irmão ajudava; não tinha maquinário, era só junta de boi; a autora não arrendou a terra durante o período em que o marido trabalhou na fazenda e não tinha outra atividade além da rural.

A testemunha Francisca Noeli Moresco disse que conhece a autora há quarenta anos, eram vizinhas de sítio e conviveu bastante com ela; a família da autora sempre viveu da agricultura; conheceu também o marido da autora; depois que casou, a autora continuou na atividade rural; ela tinha a sua própria casinha, perto dos pais, que ficava no pedaço de terra deles; o marido da autora trabalhava na granja dos Nedeff e a autora cuidava da lavoura no sítio; ela sempre permaneceu trabalhando nas suas terras; a autora plantava milho, trigo, arroz, feijão; ela tinha ajuda dos pais, dos irmãos que estavam ainda em casa; ela não tinha empregados nem maquinário e nunca arrendou as terras.

As alegações expendidas pelo INSS não procedem.

Qualquer meio material idôneo que evidencie a ocorrência de um fato relacionado ao exercício da atividade rural e propicie a formação de convencimento do julgador constitui prova documental. As notas fiscais de comercialização ou de entrega dos produtos agropecuários à cooperativa rural demonstram, sem dúvida, o efetivo desenvolvimento do trabalho rurícola, porém não representam o único meio de prova da atividade rural.

O próprio INSS admite a aptidão probatória da certidão de casamento e de nascimento dos filhos, da ficha de associado em cooperativa ou sindicato de trabalhadores rurais e o título de propriedade de imóvel rural, desde que conste no documento a profissão ou qualquer outro dado que evidencie o exercício da atividade rurícola e seja contemporâneo ao fato nele declarado, entre outros documentos arrolados no art. 54 da Instrução Normativa INSS/PRES nº 77/2015.

Os documentos juntados aos autos conformam o lastro probatório exigido pela legislação previdenciária para a comprovação do tempo de serviço rural atendem o requisito da contemporaneidade.

Por outro lado, conquanto as provas documentais não se refiram a todo o período requerido, admite-se a ampliação da eficácia probatória do início de prova material, pois as testemunhas relataram, de modo firme e coerente, que a autora trabalhou na agricultura com os pais e irmãos desde criança e continuou exercendo a atividade rural na mesma propriedade após o casamento, pelo menos até 1980, individualmente e com a ajuda eventual do marido e dos pais e dos irmãos.

Cabe salientar que, na ação nº 5008686-52.2012.404.7104, o INSS reconheceu o exercício de atividade rural no período de 09-08-1967 a 01-02-1973, em que a autora exerceu o labor rurícola junto com os pais e irmãos. A decisão judicial, por sua vez, declarou o tempo de serviço rural entre 01-01-1978 e 31-12-1983, com base nas notas de comercialização de produtos agrícolas em nome do esposo da autora.

A alegação de que o marido da autora, Franciso Santini, trabalhava em atividade urbana desde o ano de 1972 não encontra apoio na prova dos autos. Consoante a anotação na carteira de trabalho, o esposo da autora laborou em estabelecimento agropecuário, no cargo de capataz de gado, no período de 05-06-1972 a 23-02-1976 (evento 3, pet17, p. 9-12). Logo, ele também era vinculado à previdência rural no intervalo em questão.

Na verdade, o marido da autora passou a contribuir como autônomo, em razão do exercício de atividade urbana, a partir de 1º de julho de 1976 (evento 3, anexospet3, p. 34-38). Todavia, isso não afasta a condição de segurada especial da autora, visto que, mesmo após o casamento, continuou residindo na área rural, em local próximo à sua família de origem, exercendo as lides rurícolas individualmente e ainda com o auxílio eventual dos pais e irmãos e do marido. Ainda que algumas provas do período de 01-07-1976 a 31-12-1977 estejam em nome do esposo, a autora possui documento em seu próprio nome (matrícula do registro de imóveis). Cabe considerar, ainda, que os recolhimentos à previdência urbana correspondem ao valor mínimo, evidenciando que a remuneração percebida pelo marido não tornava dispensável o trabalho rural da autora para a subsistência do grupo familiar.

Constata-se, assim, que o conjunto probatório está alicerçado em razoável início de prova material, complementado por robusta prova testemunhal, hábil a produzir o convencimento quanto ao efetivo exercício do labor rural pela autora no período de 02-02-1973 a 31-12-1977.

Correção monetária e juros de mora

A matéria relativa à atualização monetária e aos juros de mora pode ser examinada de ofício, consoante a interpretação do art. 491 do CPC.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema nº 810, declarou a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança. Em relação aos juros de mora, reputou constitucional a aplicação do índice de remuneração da caderneta de poupança (RE 870.947, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 20/09/2017).

Os embargos de declaração opostos no RE 870.947 foram rejeitados pelo STF, não sendo acolhido o pedido de modulação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade.

Dessa forma, devem ser observados os critérios de correção monetária e juros de mora fixados no Tema nº 905 do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG, REsp 1.492.221/PR, REsp 1.495.144/RS, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 22/02/2018):

3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária.

As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).

Assim, a correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada parcela, conforme a variação do INPC, a partir de abril de 2006 (art. 41-A da Lei nº 8.213/1991).

Os juros moratórios incidem a contar da citação, conforme a taxa de juros da caderneta de poupança, de forma simples (não capitalizada).

O art. 5º da Lei nº 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, dispõe que haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança. Ao empregar a expressão “uma única vez”, o legislador afastou a capitalização, ou seja, a aplicação de juros sobre parcelas que já incluam juros.

Honorários recursais

Com fundamento no art. 85, § 11, do Código de Processo Civil de 2015, aplicável às sentenças proferidas após 18 de março de 2016, é cabível a fixação de honorários recursais no caso em que a apelação é integralmente desprovida quanto ao mérito.

O percentual dos honorários recursais corresponde a 20%, o qual incidirá sobre o percentual definido na sentença. Logo, o valor dos honorários, com a majoração, é de 12% sobre as prestações vencidas até a data da sentença, conforme a Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e a Súmula nº 76 deste TRF.

Implantação imediata do benefício

Assim dispõe o art. 497 do CPC: "Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente".

Dessa forma, considerando as disposições do art. 497 do CPC e a ausência de recurso com efeito suspensivo por força da lei, determina-se a implantação imediata do benefício no prazo de até trinta dias úteis.

Incumbe ao representante judicial do INSS que for intimado desta decisão dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.

Conclusão

Não conheço da remessa necessária.

Nego provimento à apelação do INSS.

De ofício, determino a aplicação da variação do INPC e da taxa de juros da caderneta de poupança e concedo a tutela específica.

Em face do que foi dito, voto no sentido de não conhecer da remessa necessária, negar provimento à apelação do INSS e, de ofício, determinar a aplicação do INPC e da taxa de juros da caderneta de poupança e conceder a tutela específica.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001960394v39 e do código CRC 4a788f4b.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 28/8/2020, às 21:21:32


5031649-89.2018.4.04.9999
40001960394.V39


Conferência de autenticidade emitida em 05/09/2020 12:01:08.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5031649-89.2018.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: ALECENI ROSA LAUCSEN SANTINI

ADVOGADO: MARLOVE BENEDETTI PIMENTEL (OAB RS066616)

ADVOGADO: TÂNIA MARIA PIMENTEL (OAB RS034093)

EMENTA

previdenciário. processual civil. não conhecimento da remessa necessária. tempo de serviço rural anterior à lei nº 8.213/1991. regime de economia familiar. início de prova material. correção monetária. juros de mora.

1. A remessa necessária não deve ser admitida quando se puder constatar que, a despeito da iliquidez da sentença, o proveito econômico obtido na causa será inferior a 1.000 (mil) salários (art. 496, § 3º, I, CPC) - situação em que se enquadram, invariavelmente, as ações destinadas à concessão ou ao restabelecimento de benefício previdenciário pelo Regime Geral de Previdência Social.

2. O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de vigência da Lei nº 8.213/1991, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência.

3. Admite-se a ampliação da eficácia probatória do início de prova material, para atingir período anterior ou posterior àquele pertinente aos documentos apresentados, desde que seja complementado por convincente prova testemunhal.

4. Mesmo após o matrimônio, os documentos em nome de familiares podem ser considerados como início de prova material, se a atividade rural continuou a ser exercida na mesma propriedade em regime de economia familiar.

5. Não se descaracteriza a condição de segurado especial dos demais integrantes do grupo familiar, quando as circunstâncias do caso concreto indicam que a renda percebida por um dos membros da família que exerça atividade urbana é insuficiente para o sustento de toda a família (Tema nº 532 do Superior Tribunal de Justiça).

6. Nas ações previdenciárias, após 30 de junho de 2009, aplica-se o INPC como índice de correção monetária e incide a taxa de juros da caderneta de poupança (Tema nº 905 do Superior Tribunal de Justiça).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária, negar provimento à apelação do INSS e, de ofício, determinar a aplicação do INPC e da taxa de juros da caderneta de poupança e conceder a tutela específica, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 18 de agosto de 2020.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001960395v5 e do código CRC 242b0578.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 28/8/2020, às 21:21:32


5031649-89.2018.4.04.9999
40001960395 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 05/09/2020 12:01:08.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 10/08/2020 A 18/08/2020

Apelação/Remessa Necessária Nº 5031649-89.2018.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PROCURADOR(A): JOSE OSMAR PUMES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: ALECENI ROSA LAUCSEN SANTINI

ADVOGADO: MARLOVE BENEDETTI PIMENTEL (OAB RS066616)

ADVOGADO: TÂNIA MARIA PIMENTEL (OAB RS034093)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/08/2020, às 00:00, a 18/08/2020, às 14:00, na sequência 489, disponibilizada no DE de 30/07/2020.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A APLICAÇÃO DO INPC E DA TAXA DE JUROS DA CADERNETA DE POUPANÇA E CONCEDER A TUTELA ESPECÍFICA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 05/09/2020 12:01:08.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora