Ao completar sete décadas de existência, o conjunto de leis que reuniu sob o mesmo guarda-chuva a legislação trabalhista do país e garantiu aos trabalhadores direitos como férias remuneradas, licença-maternidade e salário mínimo pode sofrer alterações. Levantamento do G1 na Câmara dos Deputados e no Senado revelou que, atualmente, há 569 propostas parlamentares em tramitação no Congresso sugerindo mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que completa 70 anos nesta quarta-feira (1º).

Criada por meio de um decreto-lei em 1º de maio de 1943, durante o Estado Novo de Getúlio Vargas (1937-1945), a CLT conta com os mesmos 922 artigos desde que nasceu. Hoje, no entanto, o conjunto de leis trabalhistas é alvo de 437 projetos de lei na Câmara dos Deputados e de outros 132 no Senado, segundo informações fornecidas pelas duas casas legislativas.

Congresso Nacional
Congresso Nacional

Parte das modificações nas normas que regem as relações de trabalho no Brasil coloca em trincheiras opostas empregados, patrões e o governo federal. O Palácio do Planalto, por exemplo, tem mobilizado sua base aliada na Câmara para impedir a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que põe fim ao fator previdenciário, fórmula que estimula o retardamento da aposentadoria.

De autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), parlamentar que integra a base governista, o projeto prevê a fixação do benefício a partir da média aritmética dos últimos salários de contribuição. O governo alega que a aprovação da proposta causaria um prejuízo bilionário aos cofres da Previdência Social. Diante das pressões do Planalto, a proposta se arrasta desde 2008 na Casa.

“Essa fórmula rouba na hora da aposentadoria cerca de 50% do salário da mulher, e de 45% do salário do homem. Felizmente, o Senado já aprovou, em 2008, a nossa proposta que acaba de vez com o famigerado fator. Infelizmente, o projeto está parado há cinco anos na Câmara, na mão dos deputados federais”, reclamou Paim na tribuna do Senado, na última segunda (29).

Outro projeto que causa polêmica no parlamento é o que propõe a regulamentação do trabalho terceirizado. A proposta, de autoria do empresário e deputado federal Sandro Mabel (PMDB-GO), é apontada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) como uma das prioridades legislativas do empresariado.

Deputado Sandro Mabel (PMDB-GO)
Deputado Sandro Mabel (PMDB-GO)

Em dezembro, a entidade divulgou um documento com 101 propostas de modernização das leis trabalhistas, com sugestões para atualizar a CLT, e destacou a proposta que trata sobre o trabalho terceirizado como uma das mais importantes para o setor.

O projeto de Mabel regula os contratos de prestação de serviço a terceiros e as relações de trabalho que decorrem dessas parcerias. Apesar da argumentação da CNI de que o projeto irá aumentar a rede de proteção aos funcionários contratados de forma indireta, a Justiça do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho veem a proposta do peemedebista com ressalvas.

Para o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Carlos Alberto Reis de Paula, deputados e senadores têm de “refletir” para estabelecer os marcos legais da terceirização.

“Me preocupa a filosofia a ser adotada. Se estivermos precarizando o trabalho, reduzindo garantias dos trabalhadores, isso nos preocupa muito. Se você estabelecer que quem vai responder pelas obrigações trabalhistas é quem fornece o empregado, o que irá ocorrer se a empresa for inadimplente? Não me agrada a menção de que a responsabilidade é subsidiária”, enfatizou o magistrado ao G1.

O trecho polêmico da legislação, destacado pelo presidente do TST, ressalta que a empresa que contrata os serviços é “subsidiariamente” responsável pelas obrigações trabalhistas dos funcionários terceirizados. O texto diz ainda que, em caso de ser obrigado a assumir dívidas trabalhistas da empresa contratada, o empresário poderá solicitar judicialmente ressarcimento do valor pago ao trabalhador e das despesas processuais.

Tribunal Superior do Trabalho
Tribunal Superior do Trabalho

Para a gerente de Relações de Trabalho da CNI, Sylvia Lorena Teixeira de Sousa, ao contrário das críticas que vem sofrendo, a proposta da responsabilidade subsidiária protege o trabalhador.

“Esse projeto traz essa proteção. As pessoas confundem que terceirização é sinônimo de precarização. Precarizar é ter trabalhadores sem carteira assinada”, reclamou Sylvia.

Especialista em advocacia trabalhista, o procurador-geral do Trabalho, Luís Antônio Camargo de Melo, também defende mudanças na CLT. O chefe do Ministério Público do Trabalho, contudo, disse ao G1 que limitaria as modificações no conjunto de leis ao capítulo que trata sobre o direito coletivo do trabalho. Camargo de Melo critica o fato de a legislação engessar a criação de sindicatos.

“Fala-se em modernização da legislação do trabalho. A melhor forma de você modernizar a legislação do trabalho é fazer com que as partes construam essa via, investindo em negociação coletiva. Como você vai investir na negociação coletiva se você tem uma estrutura anacrônica, que ainda está submetida à vontade do estado”, disparou.

 

Fonte: Globo.com (G1)

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