A divergência jurisprudencial existente entre Turmas Recursais de Juizados Especiais Federais e Turmas de Tribunais Regionais Federais é uma verdadeira pedra no sapato do advogado previdenciarista, que muitas vezes tem de esperar meses para ajuizar uma ação para que a mesma ultrapasse o valor de 60 salários mínimos e, consequentemente, afaste a competência do JEF.
Uma das técnicas utilizadas por diversos advogados é a de cumular pedido de indenização por danos morais com o pedido principal (concessão, restabelecimento ou revisão do benefício).
Mas será que essa técnica é válida? Se sim, quais os critérios adotados pelos tribunais? É o que iremos abordar neste post.
- Quer entender mais sobre dano moral previdenciário? Sugerimos a leitura do blog elaborado pela Dr. Fernanda a respeito do tema.
- Sobre a importância da escolha de ritos processuais, também temos um blog escrito pela Dra. Fernanda.
Sumário:
- É possível cumular pedido de danos morais no valor da causa de ação previdenciária?
- Tribunal Regional Federal da 1ª Região
- Tribunal Regional Federal da 2ª Região
- Tribunal Regional Federal da 3ª Região
- Tribunal Regional Federal da 4ª Região
- Tribunal Regional Federal da 5ª Região
- Qual o risco de se utilizar o pedido de indenização por danos morais?
É possível cumular pedido de danos morais no valor da causa de ação previdenciária?
A jurisprudência a respeito da condenação do INSS ao pagamento de indenização por danos morais vem se mostrando extremamente defensiva e intransigente com o pleito dos segurados.
De qualquer maneira, o direito de petição dos segurados ainda é plenamente resguardado. Pedir, fundamentadamente, uma indenização por danos morais, cumulada com pedido de concessão, restabelecimento ou revisão de benefício ainda é possível.
Nesse sentido, para saber o valor da causa, devemos aplicar o art. 292, VI, do CPC, que estabelece que na ação em que há cumulação de pedidos, o valor da causa correspondera à soma dos valores de todos eles.
Assim, o valor da causa nestes casos corresponde à soma da indenização por danos morais com as parcelas vencidas e 12 vincendas do benefício em discussão.
Diante deste cenário, será que bastaria acrescentar um pedido de dano moral com o valor que faltaria para superar o teto dos JEFs?
Veremos na sequência como cada um dos TRFs lida com a questão.
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
O TRF1 adota um critério subjetivo para adequação do pedido de danos morais em ações previdenciárias. Ou seja, quando o montante fixado pelo advogado no valor da causa se descola da situação fática do benefício postulado, o valor pode ser reduzido (e a competência absoluta do Juizado Especial Federal atraída, por consequência):
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. BENEFÍCIO CUMULADO COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. COMPETÊNCIA. JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. VALOR DA CAUSA INFERIOR A 60 (SESSENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS. LEI Nº 10.259/2001. 1. “O valor da causa há de corresponder ao conteúdo econômico da pretensão judicialmente deduzida, assim ao benefício patrimonial que a parte pretende obter por meio da demanda, e, especialmente quando se tratar de elemento definidor de competência absoluta” (in CC 0021726-40.2015.4.01.0000 / BA, Rel. Desembargador Federal Kassio Nunes Marques. 1ª Seção, in DJe de 14/12/2017). 2. Nas ações nas quais se busca benefício previdenciário cumulado com pagamento de indenização por danos morais, o valor da causa deve corresponder ao montante total postulado. 3. “Quanto ao valor da indenização por dano moral, impende destacar Firme é o entendimento no sentido de que que inexiste parâmetro legal definido para a sua fixação, devendo ser quantificado segundo os critérios de proporcionalidade, moderação e razoabilidade. O quantum da reparação, portanto, não pode ser ínfimo, para não representar uma ausência de sanção efetiva ao ofensor, nem excessivo, para não constituir um enriquecimento sem causa em favor do ofendido, (…)” (in AC 0008803-40.2010.4.01.3400/DF, Relator Desembargador Federal Souza Prudente, Quinta Turma, Publicação 26/09/2017 e-DJF1). 4.O caput do art. 3º da Lei nº 10.259/2001 define a competência dos juizados especiais federais para demanda cujo valor da causa não ultrapasse 60 (sessenta) salários mínimos, salvo as exceções inseridas no §1º do referido artigo, considerado o valor vigente na data da propositura da ação. 5. No caso, com base no art. 292, §3º do CPC o valor do dano moral foi reduzido, haja vista estar dissociado da situação fática. Assim, a competência é do juizado especial federal, uma vez que o valor da causa – benefício previdenciário cumulado com pagamento de indenização por danos morais – é inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, não se enquadrando nas exceções previstas no §1º do art. 3º da referida lei. 6. Agravo de Instrumento desprovido. (AG 0047121-63.2017.4.01.0000, JUIZ FEDERAL GUILHERME MENDONÇA DOEHLER (CONV.), TRF1 – SEGUNDA TURMA, e-DJF1 17/04/2018 PAG.)
Tribunal Regional Federal da 2ª Região
O TRF2 aplica plenamente a regra do art. 292, VI, do CPC, somando todos os pleitos apresentados na petição inicial:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA ENTRE JUÍZO FEDERAL E JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. PEDIDO DE RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO. PEDIDOS DIVERSOS. SOMA DOS VALORES PARA A FIXAÇÃO DO VALOR DA CAUSA QUE ULTRAPASSA O DO LIMITE LEGAL DE COMPETÊNCIA DO JEF. CONHECIMENTO DO CONFLITO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO. (…) 4. É certo que a partir de uma interpretação sistemática dos dispositivos legais que disciplinam a matéria, infere-se a competência absoluta do Juizado Especial Cível para processar, conciliar e julgar causas da competência da Justiça Federal, de menor complexidade, com valor fixado até sessenta salários mínimos, exceto nas hipóteses descritas no §1º do citado artigo 3º, da Lei n.º 10.259/2001. 5. Acontece que a fixação do valor da causa, regulado pelos artigos 291 e seguintes do CPC, deve corresponder ao efetivo proveito econômico perseguido pela parte autora e nesse sentido deve ser levado em consideração os diferentes tópicos do pedido, aferindo-se, inclusive, o 1 conteúdo econômico subjacente à demanda, para que o mesmo possa ser corretamente identificado, haja vista que, quando há cumulação de pedidos, incide o disposto no art. 292, VI, do CPC, preceito que determina a soma dos valores relativos a cada item do pleito. 6. Em tal contexto, embora a causa de pedir seja uma só, qual seja, a existência do direito ao benefício, foram formulados diferentes pedidos a ela relacionados, tais como: o pagamento dos valores devidos após a suspensão; abstenção da cobrança do que foi pago a título de benefício e indenização por danos morais, O primeiro é relativo a valores futuros. O segundo relativo a valores pretéritos e o terceiro concernente à indenização postulada. Todos possuem valor determinável e devem ser levados em consideração para efeito de fixação do valor da causa. Como o valor somado de tais pleitos supera 60 salários mínimos, afasta-se, necessariamente, competência do JEF para o processamento do feito, declarando-se a competência do competência do Juízo da 6ª Vara Federal Cível/ES (Suscitado), pra o processamento e julgamento do processo nº0022011-67.2017.4.02.5001. Precedente desta Corte. 7. Hipótese em que se conhece do presente Conflito de Competência para declarar a competência do Juízo da 6ª Vara Federal Cível/ES (Suscitado). (TRF2, CC 0100462-40.2018.4.02.0000, 1ª TURMA ESPECIALIZADA, Relator GUSTAVO ARRUDA MACEDO, julgado em 28/06/2019)
Ainda assim, deve-se utilizar com prudência o pedido de danos morais, eis que valores desarrazoados podem levar à progressiva restrição da jurisprudência.
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
O TRF3 vem adotando um critério objetivo para o pedido de dano moral nas ações previdenciárias, na qual o valor da indenização por dano moral não pode superar o valor dos danos materiais (parcelas vencidas + 12 vincendas):
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. DANOS MORAIS. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. VALOR EXCESSIVO. LIMITAÇÃO. VALOR DA CAUSA. INFERIOR A 60 SALÁRIOS MÍNIMOS. RETIFICAÇÃO DE OFÍCIO. COMPETÊNCIA DO JEF. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO.
1.Recurso conhecido, com interpretação extensiva ao artigo 1.015, III, do CPC.
2. O agravante ajuizou ação de conhecimento objetivando a concessão do benefício de aposentadoria especial c.c. indenização por danos morais. Atribuiu à causa a quantia de R$ 63.952,00 (R$ 23.952,00 principal + R$ 40.000,00 danos morais).
3. A regra geral do cúmulo de pedidos vem expressa no art. 327 do Código de Processo Civil.
4. Consoante precedentes desta E. Corte, quando o valor atribuído à demanda se mostrar excessivo em razão da importância pretendida a título de dano moral, sem justificativas plausíveis a tanto, convém adotar, como parâmetro compatível, o proveito econômico decorrente da pretensão material deduzida, de modo que aquela em muito não o exceda.
5. No caso dos autos, foi atribuído à causa o valor de R$ 63.952,00, sendo R$ 23.952,00 (principal) e R$ 40.000,00 (danos morais). O valor atribuído a título de danos morais – R$ 40.000,00 – se revela não compatível com o valor dos danos materiais – R$ 23.952,00, mesmo considerando que o parâmetro para eventual condenação não seja apenas o valor das 12 parcelas vincendas do benefício pleiteado, mas também as diferenças resultantes de parcelas vencidas, bem como as resultantes da incidência de correção monetária e juros legais.
6. Não obstante a cumulação de pedidos seja cabível, considerando que o valor almejado a título de danos morais – R$ 40.000,00 – ultrapassa o valor econômico pretendido – R$ 23.952,00 – o mesmo deve ser fixado em, no máximo, R$ 23.952,00 e, desta forma, ter-se-á o valor da causa no importe de R$ 47.904,00, sendo 23.952,00 principal + danos morais R$ 23.952,00, ou seja, valor inferior a 60 (sessenta) salários mínimos (artigo 3º, caput, da Lei n. 10.259/2001), vigente na época do ajuizamento da ação, motivo pelo qual, a r. decisão agravada deve ser mantida.
7. Agravo de instrumento improvido.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, AI – AGRAVO DE INSTRUMENTO – 5024218-21.2019.4.03.0000, Rel. Juiz Federal Convocado NILSON MARTINS LOPES JUNIOR, julgado em 05/03/2020, e – DJF3 Judicial 1 DATA: 11/03/2020)
Portanto, para os advogados previdenciaristas que atuam perante o TRF3, deve-se adequar o valor da indenização por danos morais ao pedido principal postulado, sob pena de adequação de ofício nos termos do art. 292, §3º do CPC.
Tribunal Regional Federal da 4ª Região
Por sua vez, o TRF4 adota o mesmo critério objetivo do TRF3, limitando o valor do pedido de indenização por danos morais ao limite total de parcelas vencidas, acrescidas de 12 vincendas:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS. POSSIBILIDADE. VALOR DA CAUSA. COMPETÊNCIA PREVIDENCIÁRIA. PRECEDEDENTES. 1. É permitida a cumulação, num único processo, de vários pedidos contra o mesmo réu, ainda que entre eles não haja conexão, bastando que sejam compatíveis entre si, que seja competente para conhecer deles o mesmo juízo e que o tipo de procedimento escolhido seja adequado a todos os pedidos formulados. In casu, os pedidos para a concessão de benefício previdenciário e indenização por danos morais apresentam origem comum, qual seja, o indeferimento administrativo do benefício, sendo possível a cumulação. 2. A condenação por dano moral decorrente do indeferimento administrativo de benefício previdenciário deve ter como limite o total das parcelas vencidas, acrescidas de 12 vincendas, relativas ao benefício pretendido, conforme entendimento firmado na Terceira Seção deste Tribunal. 3. Hipótese em que o valor da causa, correspondente ao montante pleiteado a título de danos morais, acrescidos das parcelas vencidas e de 12 vincendas do benefício prequerido pelo segurado, é inferior ao montante de 60 salários mínimos, restando fixada, assim, a competência do Juizado Especial Federal para o processamento e julgamento do feito. 4. O julgamento do feito cujo pedido engloba a concessão de benefício previdenciário cumulado com indenização por danos morais cabe ao juízo com competência em matéria previdenciária. (TRF4, AG 5036984-79.2019.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 11/03/2020)
Portanto, para os advogados previdenciaristas que atuam perante o TRF4, fica o mesmo recado dado aos atuantes perante o TRF3: adeque o valor da indenização por danos morais ao pedido principal postulado, sob pena de adequação de ofício nos termos do art. 292, §3º do CPC.
Tribunal Regional Federal da 5ª Região
Por fim, o TRF5 se alinha com o TRF1, no sentido de adotar o critério subjetivo para avaliar se o valor do pedido de indenização por danos morais é válido:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE CUMULADO COM DANO MORAL. VALOR ATRIBUÍDO À CAUSA SUPERIOR A SESSENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. RETIFICAÇÃO DE OFÍCIO PELO JUÍZO DA CAUSA. CABIMENTO. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. VERIFICAÇÃO. REMESSA DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE.
1. Na análise da competência, deve ser verificado se o benefício econômico pretendido é compatível com o valor da causa, o qual deve corresponder ao proveito econômico perseguido na ação.
2. Hipótese em que o juízo a quo, considerando o pedido em epígrafe, redimensionou o valor atribuído à causa, restando caracterizada a competência dos Juizados Especiais Federais, a qual é absoluta, nos termos do parágrafo 3.º do art. 3º da Lei 10.259/01.
3. Nesse sentido, já decidiu o eg. STJ: “O valor da causa pode ser motivadamente alterado de ofício quando não obedecer ao critério legal específico ou encontrar-se em patente discrepância com o real valor econômico da demanda, implicando possíveis danos ao erário ou a adoção de procedimento inadequado ao feito.” (CC 97.971/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, j. em em 22/10/2008, DJe 17/11/2008)
4. Inviável a simples remessa dos autos, em razão da diversidade das plataformas do sistema de Processo Eletrônico, na qual tramita o presente feito, e a do processo virtual dos Juizados Especiais (CRETA), fazendo imperiosa a extinção do feito.
5. Apelação desprovida. (PROCESSO: 08026133120144058200, AC – Apelação Civel – , DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS WAGNER DIAS FERREIRA (CONVOCADO), 3ª Turma, JULGAMENTO: 29/10/2015)
Assim, para os advogados previdenciaristas que atuam perante o TRF5, deve-se ter cautela ao utilizar o pedido de indenização por danos morais, sendo que nossa sugestão é de não ultrapassar o valor do pedido principal.
Qual o risco de se utilizar o pedido de indenização por danos morais?
Já verificamos que a utilização do pedido indenização por danos morais em demandas previdenciárias é aceita pelos tribunais, ainda que com ressalvas. Contudo, devemos também alertar para os riscos desta técnica.
Caso o seu pedido de indenização por danos morais seja julgado improcedente, e o pedido principal seja julgado procedente, teremos uma sucumbência parcial.
Neste caso, caso o seu cliente não possua o benefício da gratuidade da justiça, terá de pagar os honorários sucumbenciais à Procuradoria Federal, nos termos do art. 85, § 14 do CPC:
§ 14. Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial.
Portanto, nestes casos deve ser avaliado se o risco de uma eventual sucumbência parcial superará o ganho com a utilização da técnica abordada neste post.
Ficou com alguma dúvida? Já obteve sucesso em uma demanda envolvendo dano moral previdenciário? Deixe seu comentário abaixo!
Deixe um comentário