A revogação de benefício concedido em sede de tutela antecipada é um tema que acarreta grande controvérsia, e que certamente todo advogado previdenciarista já se deparou.

A tutela antecipada trazida pelo CPC de 2015, “é baseada em cognição sumária, e dá eficácia imediata à tutela definitiva pretendida”[1] ou seja, antecipa os efeitos de uma decisão, que somente seria proferida após cognição plena e exauriente do julgador.

Contudo, a doutrina caracteriza a tutela provisória como sendo uma decisão de natureza ‘precária’, tendo em vista a possibilidade de mudança ou revogação da decisão a qualquer tempo, de modo que não é atingida pela coisa julgada, enquanto não confirmada[2].

Diante disso, discute-se frequentemente na seara previdenciária a respeito da possibilidade de manutenção da qualidade de segurado, após a revogação da tutela antecipada que concedeu benefício à segurado do RGPS.

Nesse contexto, a Lei 8.213/91 prevê, nos incisos do artigo 15, as possibilidades de manutenção de qualidade de segurado, como por exemplo, a manutenção da qualidade de segurado sem limite de prazo para quem está em gozo de benefício, exceto, para o beneficiário de auxílio acidente.

Todavia, não prevê a legislação quanto à possibilidade (ou não) da manutenção da qualidade de segurado após a cessação de benefício previdenciário concedido por força de tutela antecipada, que posteriormente vier a ser revogada.

Tendo em vista a omissão legislativa, os Tribunais são instigados a decidir tal questão. A Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, por exemplo, já se manifestou quanto à possibilidade de manutenção da qualidade de segurado, veja-se:

PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. TUTELA DE URGÊNCIA. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. O SEGURADO EM GOZO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO POR INCAPACIDADE LABORATIVA, CONCEDIDO POR MEIO DE TUTELA DE URGÊNCIA, NÃO ESTÁ OBRIGADO A RECOLHER CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS, UMA VEZ QUE NÃO CONSTA DO ROL DO ARTIGO 11, DA LEI 8.213/91 E NÃO SE ENQUADRA NO DISPOSTO NO ARTIGO 13, DA LEI N. 8.213/91. EMBORA OPERE EFEITOS EX TUNC, A REVOGAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA OU DA TUTELA DE URGÊNCIA NÃO IMPEDE A UTILIZAÇÃO DO PERÍODO DE PERCEPÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, CONCEDIDO POR FORÇA DE TUTELA PROVISÓRIA, PARA EFEITOS DE MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. 2. FIXAÇÃO DA TESE DE QUE O PERÍODO DE PERCEPÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, CONCEDIDO POR FORÇA DE TUTELA PROVISÓRIA, PODE SER UTILIZADO PARA EFEITOS DE MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. 3. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DESPROVIDO (PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI (TURMA) Nº 5002907-35.2016.4.04.7215/SC RELATOR: JUIZ FEDERAL FABIO CESAR DOS SANTOS OLIVEIRA REQUERENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS REQUERIDO: JOVANA HERMES FERREIRA)

No mesmo sentido entendeu a Turma Regional de Uniformização da 4ª Região:

PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO REGIONAL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. GOZO DE BENEFÍCIO. TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. ART. 15, I, DA LEI 8.213/91. APLICABILIDADE. RECURSO IMPROVIDO. 1. Uniformizada a tese de no sentido de que “a previsão legal de manutenção da qualidade de segurado, contida no art. 15, I, da Lei 8.213/91, inclui os benefícios deferidos em caráter provisório, inclusive os implantados por força de tutela antecipada. 5. Pedido de Uniformização improvido.   (5019682-24.2012.404.7100, TURMA REGIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DA 4ª REGIÃO, Relator para Acórdão HENRIQUE LUIZ HARTMANN, juntado aos autos em 25/06/2015, com grifos acrescidos)

Aqui, merece destaque o voto vencedor, proferido pelo Juiz Federal Henrique Luiz Hartmann, perceba (com grifos acrescidos):

Entendo que a qualidade de segurada da parte autora foi mantida em todo o período em que recebeu o auxílio-doença, seja pela boa-fé com que recebeu as verbas, seja pela impossibilidade legal de retorno ao trabalho enquanto em gozo de benefício por incapacidade que, repita-se, lhe fora deferido judicialmente.

Entendo que a Lei, ao dispor que mantém a qualidade de segurado quem está em gozo de benefício, não distingue as hipóteses de concessão administrativa ou judicial. Ainda que o benefício tenha sido concedido de forma precária, por força de antecipação de tutela, tenho que implica na manutenção da qualidade de segurado.

Até porque, seria inexigível do segurado em gozo de benefício que continuasse recolhendo contribuições ao RGPS para se precaver contra futura cassação da medida antecipatória.

Logo, depreende-se que os tribunais especializados na matéria preservam o melhor interesse do segurado, eis que entendem pela possibilidade da manutenção da qualidade de segurado, ainda que seja o benefício concedido em sede de tutela antecipada, tendo em vista a inexigibilidade de recolhimento de contribuições ao RGPS enquanto estiver ativo o benefício.

Assim, no que tange ao tema em questão, o advogado previdenciarista tem o amparo jurisprudencial na defesa de seus clientes, pois, seria claramente injusto retirar os efeitos previdenciários do gozo de benefício pelo fato deste ter sido concedido em sede de tutela antecipada, ainda que se trate de decisão provisória.

 

[1] DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria. CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL: Teoria da prova, Direito Probatório, Decisão Precedente, Coisa Julgada e Tutela Provisória. 10 ed. Salvador: JusPodium, 2015, v.2.

[2] DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria. CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL: Teoria da prova, Direito Probatório, Decisão Precedente, Coisa Julgada e Tutela Provisória. 10 ed. Salvador: JusPodium, 2015, v.2.

 

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