Desde a Lei 11.718/08, que alterou profundamente o conceito do segurado especial (art. 11, inc. VII da Lei 8.213/91), o tamanho do imóvel rural passou a ser um elemento importante na análise do enquadramento e dos direitos aos benefícios previdenciários dos trabalhadores rurais.
A utilização desse critério provém da legislação que trata das políticas públicas voltadas à agricultura familiar, especialmente a Lei 11.326/06 e a normatização do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar). Ou seja, a quantidade de terra tem sido um critério usado por várias normas que se aplicam ao meio rural.
Conforme a Lei 8.213/91, é segurado especial quem explora atividade agropecuária em área de até quatro módulos fiscais. Mas, o que é um módulo fiscal? A única lei que define módulo fiscal é a Lei 4.504/64 (Estatuto da Terra) e assim determina:
Art. 50. Para cálculo do imposto, aplicar-se-á sobre o valor da terra nua, constante da declaração para cadastro, e não impugnado pelo órgão competente, ou resultante de avaliação, a alíquota correspondente ao número de módulos fiscais do imóvel, de acordo com a tabela adiante:
- 2º O módulo fiscal de cada Município, expresso em hectares, será determinado levando-se em conta os seguintes fatores;
- a) o tipo de exploração predominante no Município:
I – hortifrutigranjeira;
Il – cultura permanente;
III – cultura temporária;
IV – pecuária;
V – florestal;
- b) a renda obtida no tipo de exploração predominante;
- c) outras explorações existentes no Município que, embora não predominantes, sejam expressivas em função da renda ou da área utilizada;
- d) o conceito de “propriedade familiar”, definido no item II do artigo 4º desta Lei.
A consulta ao módulo fiscal de cada município pode ser feita pelo site da Embrapa.
O menor módulo fiscal do Brasil é cinco hectares (p. ex. Porto Alegre) e o maior 110 hectares (p. ex. Corumbá). Para qualquer efeito, deve-se somar os imóveis que estão sendo explorados pelo segurado, porém, utilizando-se o módulo fiscal de cada município separadamente. Por exemplo, no município A o segurado tem 30 hectares e o módulo é 20. Logo, ele tem 1,5 módulo. No município B, ele tem 20 hectares e o módulo é 10. Logo ele tem 2 módulos. Ao todo, nesse caso, ele tem 3,5 módulos fiscais.
Vigência do critério do tamanho do imóvel – posicionamento do INSS
A Instrução Normativa 128/22 esclarece que o tamanho da propriedade rural somente deve ser considerado para a análise de períodos de trabalho posteriores à Lei 11.718/08, quando esse critério foi introduzido na legislação. Assim dispõe a IN:
Art. 110. § 8º A delimitação do tamanho da terra em quatro módulos fiscais tem vigência a partir de 23 de junho de 2008, data da vigência da Lei nº 11.718, de 2008, de forma que os períodos de atividade do segurado especial anteriores devem ser analisados independentemente do tamanho da propriedade.
Esse entendimento do INSS atende a um dos princípios mais importantes do direito que é a irretroatividade da norma jurídica.
Relativização do tamanho do imóvel – Fundamento legal e entendimento do CRPS
A Lei 4.504/64 esclarece que o cálculo deve levar em conta a área aproveitável do imóvel rural:
Art. 50. § 3º O número de módulos fiscais de um imóvel rural será obtido dividindo-se sua área aproveitável total pelo modulo fiscal do Município.
- 4º Para os efeitos desta Lei; constitui área aproveitável do imóvel rural a que for passível de exploração agrícola, pecuária ou florestal. Não se considera aproveitável:
- a) a área ocupada por benfeitoria;
- b) a área ocupada por floresta ou mata de efetiva preservação permanente, ou reflorestada com essências nativas;
- c) a área comprovadamente imprestável para qualquer exploração agrícola, pecuária ou florestal.
Quando se analisa o enquadramento do segurado, portanto, deve-se considerar no cálculo somente a área aproveitável. Entendo haver uma diferença entre área aproveitável do imóvel x área explorada: a primeira é a que pode ser usada e a segunda seria aquela efetivamente usada. Entretanto, na prática, vem se utilizando ambas as hipóteses com o mesmo efeito.
A comprovação da área explorada tem sido feita, em regra, pelo Cadastro Ambiental Rural, que foi introduzido pelo Código Florestal (Lei 12.651/12):
Art. 29. É criado o Cadastro Ambiental Rural – CAR, no âmbito do Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente – SINIMA, registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento.
Nesse ponto – de utilizar-se somente a área explorada – encontramos um enunciado do Conselho de Recursos da Previdência Social:
Enunciado 8, inc. II: II – A atividade agropecuária efetivamente explorada em área de até 4 módulos fiscais, individualmente ou em regime de economia familiar na condição de produtor, devidamente comprovada nos autos do processo, não descaracteriza a condição de segurado especial, independente da área total do imóvel rural.
Como preencher os dados do imóvel na autodeclaração
Na autodeclaração – formulário onde se deve prestar as informações sobre o trabalho rural do segurado – mais especificamente no item 3.1, devem ser informados os seguintes dados do(s) imóvel(is) em que o segurado exerceu a atividade: registro do ITR, se possuir; nome da propriedade; município e estado; área total do imóvel (em hectares); área explorada (em hectares); nome e CPF do proprietário.
Com exceção dos dados ITR e nome da propriedade, os demais são obrigatórios. Na autodeclaração eletrônica sequer é possível concluir o preenchimento se não foram informados os campos essenciais.
Tema 1.115 do STJ – Tese e andamento processual
Apesar de constar no texto da Lei 8.213/91, para o Superior Tribunal de Justiça, o tamanho do imóvel rural não deve ser critério para afastamento do regime de economia familiar. Essa questão foi debatida no Tema Repetitivo 1.115, em que tese firmada foi:
O tamanho da propriedade não descaracteriza, por si só, o regime de economia familiar, quando preenchidos os demais requisitos legais exigidos para a concessão da aposentadoria por idade rural.
O INSS interpôs recurso extraordinário, que foi admitido mas ainda não houve remessa para o STF. Significa dizer, portanto, que poderá ser dada outra interpretação para a matéria.
É importante alertar que muitas vezes o indeferimento do INSS é porque a área explorada por quatro módulos fiscais (ou consta erroneamente nos dados importados do Cadastro dos Imóveis da Receita Federal), o que seria facilmente corrigido no Judiciário, mas este acaba por utilizar outros critérios, tais como quantidade de produção, utilização de maquinário, etc…
No fim, é como se a lei autorizasse possuir quatro módulos, porém não torná-los produtivos, pois é óbvio que se a área é maior, a produção também deve ser, pelo menos em regra. Com isso, quero dizer que a tese firmada no Tema 1.115 não soluciona o problema do enquadramento, por causa da utilização de outros elementos, sequer previstos expressamente em lei.
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