Bastante incompreendido pelo senso comum, o benefício de auxílio-reclusão é mais um dos benefícios que sofreu significativa mudança não só com a conversão da MP 871 na Lei 13.846/2019, como também, agora, com a aprovação da Reforma da Previdência.
Desde 18 de junho de 2019, o auxílio-reclusão passou a apresentar como requisito o preenchimento de 24 meses de carência para a sua concessão, o que já passou a dificultar um pouco mais o seu acesso. A partir das novas regras da Reforma da Previdência, porém, a sua forma de cálculo sofreu mais um baque com as alterações trazidas pelo art. 27. Veja como ficou a redação do referido dispositivo:
Art. 27. Até que lei discipline o acesso ao salário-família e ao auxílio-reclusão de que trata o inciso IV do art. 201 da Constituição Federal, esses benefícios serão concedidos apenas àqueles que tenham renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 1.364,43 (mil trezentos e sessenta e quatro reais e quarenta e três centavos), que serão corrigidos pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
§ 1º Até que lei discipline o valor do auxílio-reclusão, de que trata o inciso IV do art. 201 da Constituição Federal, seu cálculo será realizado na forma daquele aplicável à pensão por morte, não podendo exceder o valor de 1 (um) salário-mínimo.
Apesar de ter mantido a forma de apuração da renda bruta mensal do segurado (a ser calculada com base no últimos 12 salários de contribuição, conforme a Lei 13.846/2019), o critério da renda passou a constar expressamente da redação do artigo 27, que estabeleceu o limite atual de R$ 1.364,43 para a renda bruta mensal do segurado, a ser corrigido de acordo com os índices dos benefícios do RGPS.
A mudança significativa, porém, ficou para o cálculo salário de benefício que, embora siga utilizando os mesmos parâmetros do benefício de pensão por morte (que também passou por mudanças drásticas), a EC 103/2019 passou a determinar a impossibilidade de que o benefício seja superior a 1 salário-mínimo. Isso, porém, nos leva à seguinte pergunta: é possível que ele seja inferior a esse montante?
Em um primeiro momento, acredito que a resposta seja negativa. Isso porque se trata de garantia prevista pelo art. 29, §2º, da Lei 8.213/91, “o valor do salário-de-benefício não será inferior ao de um salário mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário-de-contribuição na data de início do benefício”, bem como a partir de uma possível aplicação do art. 201, §2º, da Constituição Federal, que prevê a garantia do salário-mínimo aos benefícios da Previdência.
Ao fim e ao cabo, porém, essa conclusão significa também que o salário do auxílio-reclusão, em verdade, sempre será no valor do salário-mínimo (já que não pode ser maior e tampouco menor a ele). Nesse caso, é evidente a afronta ao princípio da proteção social que deriva de todas essas alterações destinadas ao auxílio-reclusão, ainda mais considerando que boa parte dos dependentes que podem ter acesso à benesse são crianças e adolescentes, filhos e filhas do segurado recluso.
A legislação já parte da premissa de que o segurado instituidor é baixa renda e que, portanto, os seus dependentes não contam com muito dinheiro para sobreviver. No momento em que, apesar de garantir o benefício, a legislação reduz significativamente o seu montante, por óbvio os prejudicados serão os dependentes do segurado instituidor.
Veja-se que a margem entre o salário-mínimo e o valor máximo estabelecido como limite para a renda bruta mensal do segurado já é pequena – atualmente, está em torno de pouco mais de R$ 300,00 -, todavia já faz diferença na vida daqueles que dependem da pessoa que foi presa. Assim, a partir do momento em que se retira o pouco que os dependentes já contavam para sobreviver, é certo que a Previdência Social passa a deixar de cumprir o seu principal propósito com a instituição do benefício, que era a de proteger aquele grupo familiar que ficará sem o seu provedor por determinado período de tempo.
É imperioso ressaltar que, apesar do que o senso comum tende a difundir, o auxílio-reclusão não se trata de uma “bolsa-presidiário”. Antes disso, muito pelo contrário, o benefício foi criado para que aqueles que dependiam do segurado recluso, não fiquem totalmente desamparados na sua ausência, o que tem sido afetado pelas mudanças iniciadas pela MP 871 e continuadas com a a Reforma da Previdência.
Por fim, considerando que o seu cálculo permanece equiparado ao benefício de pensão por morte, no caso do rateio do auxílio-reclusão entre mais de um dependente será possível que a cota de cada um deles seja inferior ao salário-mínimo. Novamente, mais um vilipêndio. Seja na pensão por morte, seja no auxílio-reclusão, o que se pode concluir é que a Emenda Constitucional 103/2019 não veio para ser amigável aos dependentes de segurados do Regime Geral de Previdência Social.
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