Olá!

Meses atrás, escrevi sobre a habilitações dos herdeiros no processo em caso de falecimento do autor. Convido você a prestigiar aquela matéria:

Na coluna de hoje, venho chamar a atenção para um aspecto muito interessante.

Crédito deve ser individualizado

É certo que o art. 100, § 8º da Constituição Federal veda o fracionamento de precatório para fins de enquadramento no regime de RPV (requisição de pequeno valor).

Contudo, essa vedação não alcança os créditos pertencentes a titulares diversos.

Para facilitar o entendimento, imagine a seguinte situação.

Durante o curso da ação previdenciária de concessão de aposentadoria, João vem a óbito. Seus filhos Carlos e Pedro são habilitados no processo e dão prosseguimento ao feito. Julgada a procedência da ação, os herdeiros iniciam a fase de cumprimento de sentença, para a satisfação do valor de R$ 100.000,00.

Nesse caso, em que pese o valor total da obrigação supere o limite de 60 salários mínimos (teto para expedição de RPV), é possível que o montante seja pago por RPV: R$ 50.000,00 para cada exequente.

Isto, pois, com o óbito de João, Carlos e Pedro são os novos e diferentes titulares do crédito. E, em havendo mais de um exequente, deve ser operada a individualização do crédito, sem que isso caracterize ofensa ao art. 100, § 8º da CF/88.

Aqui, necessário trazer a Resolução nº 303 de 18/12/2019 do Conselho Nacional de Justiça:

Art. 7o Os ofícios precatórios serão elaborados individualmente, por beneficiário.

[…]

§ 2o Havendo pluralidade de exequentes, a definição da modalidade de requisição considerará o valor devido a cada litisconsorte, e a elaboração e apresentação do precatório deverão observar: […]

Na minha opinião, a norma acima é bastante clara quanto à possibilidade de individualizar o crédito.

Mesmo assim, entendo por bem trazer o entendimento jurisprudencial.

Vejam este precedente do Supremo Tribunal Federal:

STF

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. EXECUÇÃO. PRECATÓRIO. REQUISIÇÃO DE PEQUENO VALOR. INDIVIDUALIZAÇÃO DO CRÉDITO. POSSIBILIDADE. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I – Esta Corte já assentou que não há violação da cláusula constitucional que veda o fracionamento de precatório à individualização dos créditos pertencentes a titulares diversos, como no caso do autos, não se vislumbrando afronta à Constituição quando existirem credores distintos. II – Agravo regimental a que se nega provimento.

(ARE 1124735 AgR, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 29/05/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-138  DIVULG 03-06-2020  PUBLIC 04-06-2020)

Ainda no âmbito do STF, vale fazer referência ao trecho do voto da Ministra Carmen Lúcia, por ocasião do julgamento do Tema 148:

[…] sendo legítima a execução ou o pagamento singularizado dos valores devidos a partes que integraram litisconsórcio facultativo simples. A forma de pagamento, se requisição de pequeno valor ou precatório, dependerá dos valores singularmente considerados, como concluído no acórdão recorrido.

O entendimento do TRF/4 é no mesmo sentido:

TRF/4

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. ÓBITO. HABILITAÇÃO DE HERDEIROS. BENEFICIÁRIO. INDIVIDUALIZAÇÃO DO VALOR EXECUTADO PARA FINS DE EXPEDIÇÃO DE RPV. POSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I. É firme, na jurisprudência, o entendimento no sentido de que, a despeito de os sucessores atuarem em litisconsórcio, cada um deles tem direito autônomo a uma parcela do crédito a que fazia jus o(a) servidor(a) falecido(a). II. essa perspectiva, deve ser considerado, para fins de expedição de requisição de pagamento (precatório ou RPV), o valor (total) devido a cada sucessor, e não o montante resultante do somatório desses, porque, com o óbito do(a) credor(a) originário(a), houve alteração da titularidade do crédito – que se fracionou -, fato superveniente que repercute na sistemática do respectivo adimplemento. III. Nem se diga que a expedição de requisições de pequeno valor, de forma individualizada, contraria o disposto no artigo 100, § 8º, da Constituição Federal, uma vez que a vedação lá estatuída só incide quando o crédito é único e pertencente a um único titular, o que inocorre na espécie, porquanto, falecido(a) o(a) credor(a) originário(a), deverão receber o crédito os seus sucessores – ou seja, houve a individualização dos valores pertencentes a titulares diversos, sendo os credores, portanto, distintos. […]  (TRF4, AG 5024165-76.2020.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 02/08/2020)

Entendo que os tribunais vêm dando interpretação correta à matéria, sobretudo considerando a  Resolução nº 303 de 18/12/2019 do Conselho Nacional de Justiça.

E aí, pessoal, vocês sabiam dessa possibilidade?

Por fim, e com o objetivo de auxiliá-los nas demandas, vou disponibilizar um modelo de petição relacionado.

Grande abraço e até a próxima!

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